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O diálogo das fontes nos conflitos normativos envolvendo tratados de direitos

2.4 O CASO ESPECIAL DOS TRATADOS SOBRE OS DIREITOS HUMANOS

2.4.1 O diálogo das fontes nos conflitos normativos envolvendo tratados de direitos

a Constituição Federal de 1988 (RESEK, 2008).

Na seção 1.2 deste trabalho, examinou-se o método diálogo das fontes dando-se ênfase aos tipos de diálogos que podem ocorrer entre as normas interna e internacional, e demostrou-se em que consiste cada espécie de diálogo; e ainda se expôs que a dicotomia monista-dualista não se mostra totalmente inadequada para os tratados de direitos humanos.

Neste capítulo se analisará, também, o método diálogo das fontes e o seu consectário, o princípio internacional pro homine, buscando, principalmente, se aferir as consequências da aplicação destes na pirâmide hierárquica dos direitos humanos, o que será feito na próxima seção.

2.4.1 O diálogo das fontes nos conflitos normativos envolvendo tratados de direitos humanos

Em razão do princípio internacional pro homine, como já aduzido, sempre se deverá resolver os conflitos envolvendo norma sobre direitos humanos colocando-se o homem em primeiro plano; assim procura-se garantir a proteção e o desenvolvimento dos direitos fundamentais do homem (GOMES, 2008).

O fato de determinado tratado versar sobre direitos humanos torna este tratado especial, e, por tal motivo, o mesmo terá um tratamento diferenciado pelo ordenamento jurídico do Estado, que buscará salvaguardar e tornar efetivo os direitos humanos regulados pelo pacto internacional.

Este, também, é o entendimento de Cançado Trindade, para quem

Os tratados de direitos humanos, diferentemente dos tratados clássicos que regulamentam interesse recíprocos entre as partes, consagram interesses comuns superiores, consubstanciados em última análise na proteção do ser

humano. Como tais, requerem interpretação e aplicação próprias. (TRINDADE, 1999, p. 49 apud CRUZ, 2010, p. 89).

Contudo, a necessidade de se adequar o critério de hierarquia jurídica com a hegemonia inconteste da norma mais favorável ao ser humano, conduz ao afastamento, em regra, do direito internacional dos direitos humanos do estrito critério hierárquico rígido e formalista prevalecente no direito comum (BARROS, 2009; DELGADO, 2007; MAZZUOLI, 2008a), ou seja, poderá, no caso concreto, por exemplo, uma lei ordinária ser aplicada em detrimento de um tratado de direitos humanos, no caso daquela assegurar mais direitos ao indivíduo.

Desta forma, a pirâmide hierárquica normativa, referente aos direitos humanos, se constrói de modo plástico e variável, elegendo-se para o vértice dominante a norma mais favorável à pessoa humana, no caso concreto (GOMES,, 2008; MAZZUOLI, 2008a). Consequentemente, diferente do que ocorre no direito comum, nem sempre estará a Constituição Federal de 1988 no vértice da pirâmide hierárquica normativa, quando se tratar de normas de direitos humanos.

Por ser a pirâmide hierárquica das normas de direitos humanos flexível e não rígida, não se pode fixar abstratamente a posição dos tratados de direitos humanos no ordenamento jurídico brasileiro, eis que a posição hierárquica de tais tratados só poderá ser fixada no caso concreto.

E, tendo em vista que todas as normas de direitos humanos são vigentes e aplicáveis, será através da utilização do método diálogo das fontes que se chegará à norma mais favorável à pessoa humana, eis que tal método permite, inclusive, a aplicação conjunta da norma nacional e internacional, como demonstrado no primeiro capítulo.

Através do diálogo das fontes não se terá a exclusão de uma norma pela outra, pois as normas conflitantes, interna e internacional, passam a coexistir e a conviverem em harmonia e coerência (MAZZUOLI, 2008a). Podendo inclusive, se ter a

[...] aplicação conjunta das duas normas ao mesmo tempo e ao mesmo caso, seja complementarmente, seja subsidiariamente, seja permitindo a opção voluntária das partes sobre a fonte prevalente (especialmente em matéria de convenções internacionais e leis-modelos), ou mesmo permitindo uma opção por uma das leis em conflito abstrato. Uma solução flexível e aberta, de interpretação, ou mesmo a solução mais favorável ao mais fraco da relação (tratamento diferente dos diferentes). (MARQUES, 2006, p. 28- 29 apud MAZZUOLI, 2008a, p. 156).

Luiz Flávio Gomes, no entanto, defende que, por força do princípio interpretativo pro homine, “quando se trata de normas que asseguram um direito,

vale a que mais amplia esse direito; quando, ao contrário, estamos diante de restrições ao gozo de um direito, vale a norma que faz menos restrições” (2008, p.54).

O entendimento acima defendido por Luiz Flávio Gomes (2008) mostra-se equivocado, pois impõe à norma constitucional proibitiva limite para a incidência desse critério hierárquico especial, tendo em vista que em razão da supremacia da Constituição Federal de 1988, examinada na seção 2.1 deste trabalho, somente o tratado de direitos humanos com status de norma constitucional poderá retirar a eficácia de uma norma constitucional proibitiva, prevalecendo assim tal tratado sobre a norma constitucional.

Registre-se, ainda, que a própria Constituição Federal de 1988 trata da posição hierárquica dos tratados de direitos humanos no ordenamento interno brasileiro. Assim, defender a tese de Luiz Flávio Gomes no que se refere as normas proibitivas, é tornar sem efeito o parágrafo 3° do art. 5° da Constituição Federal de 1988 (ANGHER, 2010, p. 28).

Após ter sido visto que, em razão do princípio pro homine, se aplicará, através do método diálogo das fontes, a norma mais benéfica ao indivíduo, no caso concreto; e, por tal motivo, se tem, em regra, uma pirâmide hierárquica no direito internacional dos direitos humanos flexível e não rígida, em cujo no vértice se poderá ter qualquer norma de direitos humanos, seja ela interna ou internacional. E, em razão de impor a norma constitucional proibitiva limite para a aplicação desse critério hierárquico especial, será analisada, em seguida, a posição hierárquica dos tratados sobre direitos humanos, segundo a Constituição Federal de 1988.