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Ao narrar sobre o meu fazer pedagógico como CPG, utilizo o diário como dispositivo de investigação, pesquisa e análise para compreender o processo de constituição da minha identidade profissional. Por meio da escrita cotidiana dos diários, posso expressar, contar e relatar as minhas histórias, buscando materializar o fato vivido, dar expressão aos meus pensamentos e ao meu fazer pedagógico vivenciados na minha rotina.

Tal escrita se dá por meio de uma construção narrativa. Ao narrar minha vida por meio dos diários do CPG, também estou me reconstruindo como ser humano por meio da minha experiência pessoal e profissional. Dessa maneira, os meus relatos no diário revelam um processo ativo, dinâmico, descritivo, argumentativo e reflexivo sobre o meu fazer pedagógico, na busca de se tornar compreensível para o outro a minha experiência como CPG.

Nesse processo de tornar a minha experiência narrativa compreensível para o outro, identifico-me com os caminhos propostos por Mills (1982, 2009). Segundo Mills (1982), o narrador é representado pela figura do “artesão intelectual”. Para o autor, narrar seria uma aventura intelectual e existencial que se entrelaçam num continuum, onde o narrador da experiência vai se aperfeiçoando no seu “oficio”. Segundo o autor, [...] “a experiência deve ser examinada e interpretada continuamente” (Mills, 2009, p. 22).

Para Mills (2009), a experiência cotidiana narrada é o ingrediente que permite um processo de contínua reflexão e de interpretação da produção intelectual. Dessa maneira, ao produzir minhas próprias narrativas sobre o meu fazer pedagógico, estou me formando e me aperfeiçoando dentro do meu próprio ofício. Nesse percurso da escrita, o diário se apresenta como um arquivo para “reunir o que se está fazendo intelectualmente e o que está

experimentando como pessoa” (MILLS, 2009, p. 22). Para o autor, ao fazer anotações no diário sobre a minha própria experiência, estou realizando um processo de autorreflexão combinando minha experiência pessoal e profissional, e segundo Mills (2009), esse processo requer um trabalho do tipo artesanal.

O processo artesanal é desenvolvido por meio da narrativa das experiências vividas e narradas nos meus diários, assim vou juntando as peças de um enredo diariamente. A sensação é de montar um quebra-cabeça cujo CPG é a figura a ser descoberta. As peças do jogo representam os cenários e as situações vivenciadas no cotidiano. As cenas estão embaralhadas, mas vão se encaixando na medida em que faço uma reflexão e busco interpretar os significados e sentidos da minha escrita, revelando pistas sobre a minha identidade profissional.

Esse processo artesanal de escrita dos diários pressupõe uma biografia raciocinada e reflexiva sobre a minha própria experiência (pessoal e profissional). Ao narrar minha experiência revelo meus pensamentos, minhas crenças, meus posicionamentos, minhas reações, decisões e o meu fazer pedagógico no exercício da função de CPG na escola.

Ainda sobre a escrita de diários, Holly (1995, p. 101), em seus estudos, relata que os educadores que optam pela elaboração de diários profissionais e pessoais escolheram observar-se a si próprios, tomar a experiência em consideração e tentar compreendê-la. Desobservar-se modo, a escrita dos meus diários representa uma experiência pessoal de constituição de mim mesma como pessoa e profissional. Narrar os acontecimentos em forma de diários me possibilitou analisar as minhas experiências vividas por meio da tessitura, isto é, organização e estruturação de uma trama narrativa sobre o meu fazer pedagógico.

As histórias contadas em forma de diário representam a minha experiência pessoal e profissional e têm uma dimensão reflexivo-pessoal, pois me possibilita compreender e explicar a minha atuação pedagógica como CPG, por meio do que acontece na minha rotina de trabalho.

Dessa forma, o diário é o documento para as anotações das impressões sobre o que acontece na minha rotina de trabalho como CPG. Para Zabalza (2004), o diário é um dispositivo que serve de apoio à memória e guia, tornando possível rever as ações realizadas, possibilitando uma constante reflexão sobre o fazer pedagógico docente.

Zabalza (2004), em seu livro “Diários de aula”, propõe o uso do diário como dispositivo de investigação sobre a rotina do trabalho docente e conclui que escrever diários de aula permite a identificação dos dilemas presentes nas práticas dos docentes em seus contextos de atuação.

Segundo o autor, a escrita de diários é uma metodologia de formação e de reflexividade que contribui para o desenvolvimento profissional dos professores por meio da memória, da escrita, da reflexão, não mais na ação, mas sobre as ações, potencializando o registro dos acontecimentos vividos.

Foi o uso do diário, periodicamente, que me permitiu reunir informações, achados e hipóteses sobre o meu fazer pedagógico como CPG. A partir das minhas anotações, impressões e relatos, pude realizar uma rememoração das cenas, dos cenários e personagens, que fazem parte do meu ambiente de trabalho.

Ao reler e interpretar as narrativas produzidas, realizo uma reflexão contínua sobre o meu fazer pedagógico, busco interpretar minhas ações, reconstruindo saberes, significados e sentidos, visando a melhoria da minha prática. Neste sentido, o diário é uma “ferramenta útil para o aperfeiçoamento do trabalho docente, especialmente por permitir ao professor uma reflexão crítica sobre sua prática e, por se caracterizar, uma mola propulsora do desenvolvimento profissional docente” (CUNHA, 2010, p. 219).

Segundo Cunha (2010), essa mola propulsora se dá a partir da reflexão crítica sobre a minha prática e do reconhecimento de mim mesma, como protagonista da minha ação e formação. Freire (1996, P. 43-44) argumenta que isso é possível porque “a prática docente crítica envolve o movimento dinâmico, dialético, entre o fazer e o pensar e o pensar sobre o fazer, e o da reflexão crítica sobre a prática”.

Nessa concepção, o diário tem uma dimensão reflexiva, crítica, investigativa e formativa. Segundo Liberali (1999), possibilita a formação continuada docente a partir da avaliação constante da própria prática, em uma perspectiva crítico-reflexiva. Além das dimensões já citadas pelos autores, o diário representou na minha prática um dispositivo de autoescuta. Ao reler as narrativas, reconheço-me como CPG, protagonista da minha ação e formação e torno-me narradora da minha própria história, pois “o narrador revela que escrever sobre si remete o sujeito para uma dimensão de "autoescuta” de si mesmo, como se estivesse contando para si próprio suas experiências e aprendizagens que construiu ao longo da vida, através do conhecimento de si (SOUZA, 2004, p. 72).

A escrita de si por meio dos diários oportunizou rememorar a minha história e permitiu que diferentes vozes se expressassem, fundamentando a reflexão sobre o meu fazer pedagógico e ressignificando as minhas práticas.

Tomar os meus escritos como objeto de reflexão é acreditar que a escrita de si, por ser uma escrita autobiográfica, constitui-se em um momento singular para desenvolver a competência interpretativa e reflexiva sobre si e sobre o cotidiano escolar. Escrever sobre si é um exercício que promove uma autorreflexão, isso porque essa escrita permite.” (GASPAR, PEREIRA, PASSEGGI, 2012, p. 221).

Dessa maneira, como dispositivo de investigação, o diário crítico, investigativo, formativo e reflexivo representa na minha prática profissional, na escola, uma forma de autoconhecimento e reconhecimento da mim mesma como CPG, protagonista do meu fazer pedagógico e se constitui como “um testemunho biográfico da minha experiência” (PORLÁN;

MARTÍN, 1997, p. 18).