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1.3.1 Fase aguda

O diagnóstico laboratorial da doença de Chagas deve ser direcionado de acordo com a fase da doença em que o paciente se encontra, baseando-se na busca direta ou indireta do parasito e na detecção de anticorpos anti-T. cruzi.

A doença de Chagas aguda caracteriza-se pelo surgimento de imunoglobulinas de classes específicas. Em geral ocorre uma produção inicial de IgM com pico perto do 17º dia após a infecção, seguido de queda dos níveis até o 66º dia, não retornando aos níveis basais até o 93º dia após a infecção. Níveis específicos de IgG também se elevam após uma ou duas semanas de infecção, alcançando pico de produção no 30º dia, perdurando por toda fase crônica caso não haja tratamento e cura parasitológica (GRAUERT et al., 1993).

Na infecção aguda são utilizados testes sorológicos para a pesquisa de IgM. Atualmente há dificuldades para o diagnóstico sorológico de fase aguda devido a escassez de kits comercialmente disponíveis e carência de controles positivos para IgM. Uma possibilidade de diagnóstico já comercializada e que apresenta a vantagem de ser rápida e de fácil execução, é o Simple CHAGASWB (Operon, S.A), que consiste em um teste imunocromatográfico que utiliza antígenos recombinantes para a detecção de anticorpos anti-T. cruzi.

Em laboratórios regionais de referência, recomenda-se a utilização de metodologias de maior complexidade a partir de IFI-IgM (Imunofluorescência Indireta com pesquisa de IgM), Western Blot e ELISA- IgM (Consenso Brasileiro em doença de Chagas, 2005). A detecção de anticorpos IgM através de imunoblotting utilizando antígenos de tripomastigotas secretados ou excretados (TESA blot) tem demonstrado ser uma técnica de grande utilidade para o diagnóstico em casos de suspeita de fase aguda ou infecção congênita. Além disso, a alta sensibilidade do TESA blot na detecção de casos crônicos associada a ausência de reações cruzadas com outras infecções, indica

que esta técnica pode ser uma alternativa aos testes sorológicos convencionais (UMEZAWA et al., 1996 a).

Em casos de suspeita de fase aguda, em decorrência da alta parasitemia, devem ser priorizados os exames parasitológicos diretos, que são realizados rapidamente e apresentam resultado imediato. O exame do sangue periférico a fresco devido a sua simplicidade e elevado índice de resultados satisfatórios deve ser o método de escolha nessa fase. Porém, para sua realização é necessário que haja treinamento específico quanto à preparação da lâmina e identificação do parasito (LUQUETTI & RASSI, 2000). Em caso de negatividade do exame a fresco e forte suspeita de doença aguda, como na presença de sintomas por mais de trinta dias, métodos de concentração como micro-hematócrito, teste de Strout, Quantitative Buffy Coat (QBC), gota espessa, e lâmina com esfregaço corado devem ser priorizados (Consenso Brasileiro em doença de Chagas, 2005). Esses métodos apresentam sensibilidade entre 80 a 90%, entretanto devido ao alto custo do QBC, atualmente recomenda-se o uso do micro-hematócrito ou teste de Strout como método de concentração escolhido.

Se os exames parasitológicos diretos forem negativos, métodos parasitológicos indiretos, como o xenodiagnóstico (BRUMPT, 1914) e a hemocultura (CHIARI et al., 1989), devem ser utilizados. Apesar da possibilidade desses exames apresentarem 100% de positividade na fase aguda, estas metodologias são indicadas para o diagnóstico da fase crônica da infecção dada à complexidade para sua realização, que exige condições de laboratório muito especializadas, como também pela demora de obtenção dos resultados.

1.3.2 Fase crônica

Os baixos níveis de parasitemia nessa fase da infecção indicam a sorologia como escolha para o diagnóstico confirmatório. Para tal, é essencial a aplicação de um teste de elevada sensibilidade associado a outro com alta especificidade, como os testes de Imunofluorescência Indireta (IFI), Imunoensaio Enzimático (ELISA), e Hemaglutinação Indireta (HAI). Entretanto, apesar da alta sensibilidade e especificidade, esses testes podem gerar resultados não conclusivos ou conflitantes, devido aos diferentes procedimentos empregados nas suas preparações antigênicas.

O emprego de antígenos de T. cruzi secretados ou excretados em técnicas imunodiagnósticas tem revelado altas especificidade e sensibilidade quando comparado

a técnicas de sorologia convencional. Em um trabalho recente realizado em uma área endêmica da Bolívia, foi demonstrada a aplicabilidade dos testes baseados no TESA (Antígenos de T. cruzi secretados ou excretados) em relação aos testes aplicados na sorologia convencional. De 742 amostras de soro coletadas, 329 foram positivas pelo TESA, que detectou 9 indivíduos infectados não diagnosticados pela sorologia convencional (ZARATE-BLADES et al., 2006). Esse achado é um indicativo de que testes baseados no TESA podem ser uma alternativa aos extratos antigênicos utilizados na sorologia convencional.

Entretanto, a sorologia convencional realizada por ELISA, IFI e HAI, baseada na pesquisa de anticorpos IgG anti-T.cruzi, permanece ainda como a escolha para a rotina diagnóstica. A OMS recomenda para o diagnóstico da doença de Chagas a utilização de duas técnicas sorológicas com princípios distintos, que, se discordantes, devem ser repetidas. Se houver ainda discordância, é recomendada a realização de uma terceira técnica sorológica, e caso esta persista uma quarta técnica deve ser aplicada ou outro método diagnóstico não sorológico deve ser realizado (WHO, 1991; 2002, MS, 2000).

Os anticorpos detectados na sorologia convencional são classificados como não protetores, já aqueles capazes de induzir lise de formas tripomastigotas na presença do Complemento são classificados como protetores, sendo denominados como anticorpos líticos (KRETTLI, 1982). Esses anticorpos reconhecem uma proteína de 160KD localizada na superfície da membrana de tripomastigotas vivos.

Os anticorpos líticos são detectados através de duas técnicas, a lise mediada pelo Complemento (KRETTLI & BRENER, 1982) e a citometria de fluxo (MARTINS- FILHO et al., 1995). Essas técnicas têm ampla aplicabilidade para a realização de controle de cura, considerando-se que os anticorpos da sorologia convencional podem ser detectados por vários anos após o tratamento da infecção, não distinguindo os curados dos não curados. Os anticorpos líticos só reconhecerão formas vivas do parasito, e sua detecção em soros de pacientes já tratados é um indicativo da infecção ativa, sendo por isto sua pesquisa empregada como critério de cura (KRETTLI, 1982; GALVÃO et al., 1993).

Uma outra possibilidade mais sofisticada disponível com o uso de testes sorológicos é a identificação de classes das imunoglobulinas e de suas subclasses empregada no estudo do perfil da resposta imune humoral do paciente.

Na fase crônica da infecção, a parasitemia é em geral baixa e variável, o que torna os métodos parasitológicos diretos não aplicáveis. Nessa fase, os métodos de diagnóstico parasitológico indireto geralmente não ultrapassam 50,0% de positividade.

Desde a década de 50, a técnica de hemocultura vem sendo aplicada, inicialmente com resultados inferiores aos obtidos com o xenodiagnóstico. Com o objetivo de aumentar sua sensibilidade, algumas modificações foram introduzidas na técnica tais como: a remoção do plasma contendo anticorpos (MOURÃO & MELLO, 1975), a coleta de um volume maior de sangue (30mL) (CHIARI et al., 1989) e maior período de cultivo e observação (MINTER-GOELDBLOED, 1978).

CHIARI et al. (1989) obtiveram uma taxa de hemocultura positiva de 55,08% com a aplicação de modificações como a lavagem das células com meio LIT ou PBS e remoção imediata por centrifugação, incubação das culturas a 28ºC e exames no 15o, 30o, 45o e 60o dias de cultivo. Quando não era possível o imediato processamento, o plasma era removido, ao sedimento era acrescentado meio LIT, e o material preservado a 4ºC até processamento de toda técnica.

LUZ et al. (1994) demonstraram a importância do rápido processamento à baixa temperatura na sensibilidade da técnica. Utilizando a metodologia proposta por CHIARI et al. (1989), reduzindo o tempo de processamento da amostra e usando uma centrífuga refrigerada foi possível alcançar 94,0% de positividade quando três hemoculturas foram realizadas no mesmo paciente.

A PCR (GONZALEZ et al., 1984; ASHALL et al., 1988) apresenta resultados promissores, indicando que no futuro esta técnica poderá ser utilizada como teste confirmatório e de rotina, apesar de sua complexidade e necessidade de laboratórios especializados com protocolos definidos e técnicas padronizadas para sua execução (Consenso Brasileiro em doença de Chagas, 2005; WHO, 2002). O uso da técnica de PCR está indicado em algumas situações como em indivíduos com testes sorológicos não conclusivos, em controle de cura pós-tratamento, em estudos comparativos com outras técnicas sorológicas ou parasitológicas, na detecção do nível de parasitemia em imunossuprimidos e em transplantados (PORTELA-LINDOSO et al., 2003).