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O DIAGNÓSTICO LABORATORIAL

No documento ROSA MARIA RIBEIRO VIEIRA (páginas 38-44)

1.2 O COMPLEXO E NTAMOEBA HISTOLYTICA /E NTAMOEBA DISPAR

1.2.6 O DIAGNÓSTICO LABORATORIAL

Após o reconhecimento do complexo formado pela E. histolytica patogênica e invasiva e pela E. dispar comensal do intestino humano, a OMS recomendou que a E.histolytica deve ser identificada por testes específicos e que os pacientes por ela infectados, sejam eles sintomáticos ou assintomáticos, devem ser tratados (WHO, 1997).

O diagnóstico laboratorial da amebíase compreende uma variedade de testes que, individualmente ou em conjunto, objetivam identificar corretamente a E. histolytica. Os testes disponíveis utilizam materiais biológicos e metodologias diferentes onde cistos, trofozoítos, antígenos da superfície da ameba, antígenos recombinantes, anticorpos produzidos contra antígenos amebianos e as características bioquímicas e genéticas das cepas são pesquisados.

No Brasil e nos demais países em desenvolvimento, a amebíase é mais comumente diagnosticada através do EPF baseado na identificação microscópica, utilizando critérios morfológicos de cistos e trofozoítos de amebas em amostras de fezes (Haque et. al., 2003), técnica que certamente diagnosticou e ainda é capaz de diagnosticar muitos casos de colite amebiana, quando utilizados por profissionais qualificados e treinados (Stanley, Jr., 2003).

Diferentes métodos podem ser utilizados no EPF. O método direto não requer concentração, pode ser útil para a identificação do trofozoíta vivo presente em fezes diarréicas, e a observação de eritrócitos fagocitados, no seu interior, permite a distinção entre E. histolytica e E. dispar. Esse material deve ser posteriormente corado, para melhor visualização das estruturas. Dois métodos de coloração são recomendados: hematoxilina férrica e tricrômica (De Carli, 2001). Para a identificação da forma cística, geralmente, presente em fezes moldadas, métodos de concentração devem ser utilizados como: sedimentação espontânea (Hoffman et al.,1934) ou por centrifugação e flutuação com sulfato de Zinco (Faust et al., 1938).

A cultura da E. histolytica seguida da análise eletroforética do perfil de algumas isoenzimas introduzida por Sargeaunt e Williams, em 1978, foi o primeiro método laboratorial capaz de diferenciar com precisão E. histolytica de E. dispar (Huston et. al., 1999) e é considerada “padrão ouro” para o diagnóstico diferencial da amebíase (Abd-Alla et al., 1993; Gonin & Trudel, 2003). A metodologia apresenta limitações que podem se traduzir em falsos resultados negativos. Além disso, não é um método prático e muito menos rápido para o diagnóstico, já que requer entre uma e várias semanas para se completar e

necessita de aparelhagem apropriada. Isso limita sua utilização, em países em desenvolvimento, onde os recursos são escassos e ocorre a maioria dos casos de amebíase invasiva (Haque et. al., 1997; Huston et al.,1999). A cultura é mais sensível que o exame parasitológico de fezes, a análise de isoenzimas diferencia as duas espécies do complexo (González-Ruiz et al., 1994). Porém, falsos resultados negativos são observados em amostras positivas pela microscopia. Duas possíveis explicações são a demora no processamento das amostras, pois os trofozoítas não resistem por muito tempo no meio externo e o uso de terapêutica anti-amebiana anterior à coleta da amostra (Haque et. al., 1998).

Outros testes utilizados no diagnóstico da amebíase se baseiam em reações imunológicas onde são pesquisados antígenos da E. histolytica e anticorpos produzidos pelo organismo contra estes antígenos. Enquanto a pesquisa do antígeno é útil para determinar a prevalência da infecção, os testes sorológicos fornecem experiência cumulativa da infecção por E. histolytica na população. A pesquisa do antígeno é baseada nas diferenças antigênicas entre as lectinas da E.histolytica e da E.dispar e é realizada por um ensaio imunoenzimático que utiliza anticorpos monoclonais para epítopos antigênicos da E. histolytica (Haque et al.,1997). O antígeno em questão é a lectina de adesão específica de galactose e N-acetil-galactosamina. É um método sensível, específico, capaz de diferenciar a forma invasiva da forma não invasiva (Haque et. al., 1999), padronizado para detectar antígenos em amostras de fezes (coproantígenos). Foi também utilizado com sucesso, na pesquisa de antígeno circulante, no soro de indivíduos com diagnóstico confirmado de abscesso

hepático amebiano, antes do início do tratamento, onde os autores detectaram antígeno em 22 (96%) de 23 casos de abscesso hepático (Haque et. al., 2000).

Anticorpos séricos desempenham um papel importante no diagnóstico da forma hepática da amebíase, quando a maioria dos pacientes não apresenta antígeno nas fezes (Petri, Jr & Singh, 1999). São marcadores de infecção corrente ou passada (Haque et. al., 1999) e também distinguem infecção por E. histolytica, pois a presença da E. dispar, no organismo, não induz resposta imune. Diversos testes utilizando metodologias diferentes ajudam no diagnóstico sorológico da amebíase. São eles: a hemaglutinação ativa indireta (HAI), os ensaios imunoenzimáticos (EIA), a imunofluorescência indireta (IFI), a aglutinação em látex (AL), a imunodifusão em gel (ID), a contraimunoeletroforese (CIE), etc. sendo EIA, IFI e HAI os mais utilizados. Todos detectam anticorpos específicos contra antígenos amebianos e são marcadores de doença invasiva. A principal desvantagem destes testes é que eles podem permanecer positivos por anos, após a infecção (Hughes & Petri, Jr., 2000). As diferenças entre sensibilidade e especificidade dos diferentes métodos dependem dos antígenos, dos conjugados e dos procedimentos por diferentes laboratórios, levando a uma grande diversidade de resultados (Carvalho et al.,1994). O HAI, teste rápido de baixo custo e de fácil execução, tem alta sensibilidade e especificidade, preenchendo assim os requerimentos para investigação epidemiológica (Hira et. al.,2001) e tem sido o mais utilizado na rotina diagnóstica da amebíase (Roche & Benito,1999). Os testes imunoenzimáticos têm sensibilidade e especificidade comparadas a HAI sendo os métodos de escolha em muitos laboratórios. A ID é específica, porém, menos sensível que a HAI e o EIA e requer mais tempo para

se completar. Atualmente existem kits comerciais para detecção de anticorpos para a E. histolytica pelas metodolgias HAI, EIA e ID. Os métodos sorológicos tem sido limitados pela utilização de preparados antigênicos brutos não bem definidos. O maior problema dos testes que pesquisam anticorpos séricos utilizando antígenos totais da E. histolytica é que nas áreas de alta endemicidade, os indivíduos podem permanecer positivos por anos, após a infecção, o que não ocorre quando o antígeno é a lectina de adesão da ameba. Um trabalho conduzido, na África do Sul, com este antígeno mostra que os anticorpos anti- lectina parecem ter vida curta e sugerem que este é o teste sorológico mais específico para a amebíase invasiva aguda (Haque et al,2000).

A detecção de anticorpos da classe Imunoglobulina M (IgM) pode constituir uma estratégia importante para um diagnóstico precoce da amebíase. A regressão dos anticorpos IgM anti-lectina no soro acontece por volta do terceiro mês, em cerca de 50% dos casos (anticorpo de fase aguda que não permanece detectável por muito tempo no soro), e o seu reaparecimento ou aumento tardio dos títulos, representa um importante fator prognóstico (re-agudização ou re- infecção) (Abd-Alla et al., 1998). Esses mesmos autores, dois anos depois, apontaram a pesquisa de antígeno (lectina) e de anticorpos IgG e IgA na saliva, como uma outra alternativa diagnóstica.

Vários métodos baseados na reação em cadeia da polimerase (PCR) que amplificam e detectam o DNA da E. histolytica em amostras de fezes têm sido desenvolvidos, com semelhante sensibilidade e especificidade à da cultura, seguida pela análise isoenzimática (Huston et al.,1999). A PCR é, porém, muito mais sensível do que a pesquisa do antígeno nas fezes, quando amplifica

genes do ácido ribonucleico (RNA) ribossômico e quando a fonte do DNA e de antígeno são trofozoítas em cultura (Haque et al.,1998; Huston et al,1999). Quando comparado com a detecção do parasito nas fezes, método mais utilizado na rotina diária, ambas as técnicas parecem ter a mesma sensibilidade (Haque et al., 1998). Avanços nas técnicas de PCR fazem deste método uma outra possibilidade diagnóstica, principalmente, quando se necessita fazer a genotipagem das cepas (Stanley, Jr., 2003). A PCR multiplex, por exemplo, é uma metodologia capaz de amplificar simultaneamente dois fragmentos de DNA espécie específicos utilizando dois pares de iniciadores “primers”. A amplificação genética por PCR de genes nos quais existe polimorfismo entre duas espécies permite a diferenciação do patógeno do não patógeno (Pillai & Kain, 2000). A grande dificuldade reside na purificação de quantidades suficientes de DNA genômico de boa qualidade. A fonte é invariavelmente fezes, onde contaminantes e inibidores de amplificação persistem. Soma-se a isso o fato de que significante porção do DNA genômico da Entamoeba se encontra encapsulado, na forma cística, o que não é de fácil purificação (Pillai et al., 2001). A PCR tem como desvantagem o fato de ser cara, trabalhosa, demorada, e não disponível para uso em países em desenvolvimento onde a amebíase é prevalente e representa um grave problema de saúde coletiva (Haque et al.,1998).

Pelo amplo espectro clínico da amebíase, envolvendo desde portadores assintomáticos, até quadros graves e fatais de doença intestinal, extra- intestinal e pelas características do parasito e do hospedeiro, todos os testes disponíveis (desde a microscopia até a genética, passando pelos bioquímicos e imunológicos) têm sua importância e suas limitações e nenhum deles,

isoladamente, é capaz de fechar um diagnóstico de amebíase nas suas diferentes formas de expressão clínica. Talvez, os que mais se aproximem da meta de serem marcadores únicos sejam a detecção de trofozoítas hematófagos nas fezes e a detecção de antígeno sérico por ELISA e/ou por PCR, para os quadros de colite e de amebíase extra-intestinal respectivamente.

No documento ROSA MARIA RIBEIRO VIEIRA (páginas 38-44)

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