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Diferença entre as variáveis dependentes quanto ao gênero

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I. 1 – REVISÃO SISTEMÁTICA DA LITERATURA

III. 3. Diferença entre as variáveis dependentes quanto ao gênero

Possíveis diferenças nas variáveis respostas (distorções cognitivas, aceitação da violência, estresse, ansiedade e depressão) em relação ao gênero foram analisadas utilizando o teste de Mann-Whitney e constatou-se que não há diferença estatisticamente significativa, conforme mostra a Tabela 8 (p. 79).

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As Tabelas 11, 12,13, apresentam as correlações entre as variáveis respostas e explicativas. As correlações também foram apresentadas em um heatmap, conforme mostra a figura 5.

A análise de regressão não foi incluída, pois as variáveis não satisfazem as suposições de diversas técnicas. Ao aplicar a regressão linear, por exemplo, temos que a única variável significativa é o escore de neuroticismo.

Tabela 11 – Teste de correlação das variáveis com estresse

N=286 Coeficiente Valor p Neuroticismo 0.291 <0.001** Exigência Mãe -0.033 0.578 Exigência Pai 0.000 1.000 Responsividade Mãe -0.049 0.414 Responsividade Pai -0.003 0.966 Extroversão -0.155 0.010** Abertura a novas Experiência 0.062 0.301 Amabilidade 0.007 0.911 Conscienciosidade -0.112 0.061

**Correlação é significativa no nível 0.01.

Tabela 12 – Teste de correlação das variáveis com aceitação de violência

N=286 Coeficiente Valor p Neuroticismo 0.586 <0.001** Exigência Materna -0.125 0.037* Exigência Paterna -0.174 0.004** Responsividade materna -0.156 0.009** Responsividade paterna -0.239 <0.001** Extroversão -0.187 0.002**

Abertura a novas experiência 0.118 0.048*

Amabilidade -0.154 0.010**

Conscienciosidade -0.137 0.022*

Tabela 13 – Teste de correlação das variáveis com distorções cognitivas N=286 Coeficiente Valor p Neuroticismo 0.0037 0.951 Exigência Materna -0.064 0.289 Exigência Paterna -0.09 0.125 Responsividade materna -0.123 0.041* Responsividade paterna -0.0629 0.295 Extroversão -0.0562 0.349

Abertura a novas experiências -0.019 0.747

Amabilidade -0.0638 0.288

Conscienciosidade 0.127* 0.034*

*Correlação é significativa no nível 0.05.

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IV - DISCUSSÃO

A discussão dos resultados será realizada de acordo com o ordenamento da apresentação nos tópicos anteriores. Assim sendo, serão retomados os aspectos sociodemográficos e as possíveis relações entre variáveis dependentes e independentes estudadas.

A amostra de participantes adveio dos seguintes cursos: psicologia, biomedicina e do programa de licenciaturas (biologia, matemática, pedagogia e filosofia).

Ao considerar-se o total da amostra, verificou-se que 27% correspondiam a participantes masculinos, enquanto 73% foram de participantes femininos (Tabela 2). Esses dados são corroborados pelo Censo da Educação Superior (INEP, 2018), o qual relata que as mulheres são maioria nas escolas, universidades e cursos de qualificação, sendo sua média de idade de 21 anos. Ao verificar-se a distribuição de gênero por curso, os dados coletados revelaram que 71,8% (N=181) dos estudantes do curso de psicologia são mulheres e 28,1% (N=58) são homens. Já no curso de biomedicina, o percentual feminino sobe para 79,41% (N=27) e os homens ficam em (N=7) 20,59%. Nos cursos de licenciatura o percentual para mulheres é de 80% (N=20) e o de homens fica em (N= 5) 20%.

Ainda que tal tendência seja postulada pelo referido portal, não se pode afirmar que a universidade, local do estudo, possua maioria feminina de estudantes, considerando-se que a amostra da presente pesquisa foi casual e por conveniência (Rea & Parker, 2012).

Tal modelo de amostra não proporciona precisão estatística, conquanto oferte determinadas vantagens ao pesquisador, visto que em casos de pesquisa com estudantes, a concretização desta em sala de aula permite o contato com um número maior de entrevistados em reduzido período com menor custo.

A média de idade geral ficou em torno de 22,1 anos, sendo que os participantes masculinos apresentaram média de idade (22,7) ligeiramente superior ao feminino (21,9). Ristoff (2013) revela, em estudo feito pelo Grupo Estratégico de Análise da Educação Superior (GEA), que a faixa etária do estudante universitário brasileiro está situada entre 18 e 24 anos. Portanto, a presente amostra é

consistente com a média geral brasileira, dado este corroborado pelo baixo s (desvio padrão) sendo s -0,5 para os homens e s -03 para as mulheres.

No que tange à situação dos participantes quanto à universidade, os dados coletados manifestaram que 72% (N=222) dos estudantes são calouros. Já no segundo ano, o percentual cai para 27% (N=84). Intermediários e últimoanistas perfazem 1% (N=4) do total.

Cabe aqui uma breve consideração quanto aos calouros (maior parcela entre os participantes) e como estes percebem práticas violentas. Costa, Dias, Dias, Souza e Canela (2013), em estudo sobre trote entre acadêmicos da saúde, objetivaram identificar a opinião destes acerca da participação no trote de calouros, além de possíveis constrangimentos relacionados. Participaram 202 respondentes com idade média de 20 anos, na qual a maioria (77,5%) não vê o trote como violência e 67,8% deles participaram ao ingressarem em seus respectivos cursos. Ao que parece, a percepção sobre violência desse segmento tende a ser culturalmente distorcida, ou seja, passar pelo ritual violento do trote é aceito e visto como algo necessário para ingressar no mundo universitário. Um aspecto que merece destaque também é o de que nos últimos anos as práticas violentas do trote, no meio universitário, têm se voltado mais para o público feminino, levando este muitas vezes a desistir do curso (Bandeira, 2017). Não se objetiva, aqui, afirmar que os calouros desta amostra aceitam práticas violentas, todavia, o fato de um número significativo deste segmento compor a amostra sugere maior atenção quanto à verificação sobre aceitação de práticas violentas, o que se dará mais adiante.

Do total da amostra, 19,0% (N=58) dos participantes informaram que o grau de escolaridade de seu pai apresenta-se no nível fundamental. 8% (N=25) apontou que seu pai cursou até o ensino médio, porém sem completá-lo. Já 30% (N=94) do grupo indicou que seu pai alcançou a escolaridade média completa. No nível superior incompleto aparecem 6% (N=18). Quanto ao pai que atingiu a formação em nível superior completo registrou-se 24% (N=76). Finalizando, 13% (N=40) dos participantes assinalaram que seu pai fez uma pós-graduação.

Merece destaque aqui que 27% dos pais dos participantes apresentam baixo nível de escolaridade. A literatura sobre o tema aponta que a baixa escolaridade dos homens está correlacionada com situações de agressão (Deeke, Boing, Oliveira, & Coelho, 2009; Galvão & Andrade, 2004; Labronici, Ferraz, Trigueiro, & Fegadoli, 2010). Apesar de os pais não terem sido a população-alvo deste estudo, tal

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informação adquire relevância na medida em que este dado pode relacionar-se com o histórico de desenvolvimento dos participantes, ou seja, em que medida estes entraram em contato com alguma forma de violência paterna, além da violência implícita na prática parental dominante. Na sequência dessa discussão, foi verificado que um percentual significativo da amostra (41%) já testemunhou episódios de violência intrafamiliar.

Quanto ao grau de escolaridade materna, os dados coletados revelaram que 16% (N=51) das mães cursaram o nível fundamental. 6% (N=17) se encontram no médio incompleto. Já no ensino médio completo o percentual de mães sobe para 29% (N=90). Aquelas com superior incompleto ficam em 8% (N=25). Nos cursos superiores completos o percentual de mães alcança 27% (N=83), finalizando com as que fizeram pós-graduação em 14% (N=45). A amostra revela um certo equilíbrio entre a formação de pais e mães com a diferença variando em torno de 2 pontos percentuais.

O referido resultado merece um tipo de discussão diferente do que a feita em relação à questão da escolaridade paterna. Encontrou-se aqui que 22% das mães dos participantes apresentaram baixo nível de escolaridade. Alguns estudos indicam que o público feminino com esta característica está entre os principais alvos de violência do parceiro. Por exemplo, em pesquisa sobre a prevalência de violência física do parceiro íntimo, Lindner, Coelho, Bolsoni, Rojas e Boing (2015) apontam que esta ocorre em todos os estratos socioeconômicos, numa frequência maior com mulheres de maior idade, viúvas/separadas, pobres, menos escolarizadas e negras. Em revisão sistemática sobre violência sexual contra a mulher, Baigorria, Warmling, Neves, Delziovo e Coelho (2017) destacam que dentre os fatores associados a tal prática está a baixa escolaridade. Ferreira, Vasconcelos, Filho e Macena (2016) verificaram que a baixa escolaridade é uma das características de mulheres em situação de violência doméstica abrigadas em uma unidade de proteção estadual. Não é possível afirmar que estes 22% de mães dos participantes que apresentam baixa escolaridade tenham sido vítimas de violência do parceiro, mas o que se sabe é que 41% dos integrantes da amostra em algum momento de sua vida tiveram contato com violência intrafamiliar. Logo, de acordo as pesquisas citadas anteriormente, esta parcela apresenta uma probabilidade maior de ter sofrido algum tipo de violência, a qual pode ter sido testemunhada pelos participantes do estudo, conforme item histórico de violência (Tabela 2).

Sobre a distribuição de renda familiar mensal, os dados levantados mostraram que 25% (N=79) dos estudantes dispõem de uma renda familiar entre R$ 1.000 e 3.000,00 por mês (de 1 a 3 salários mínimos). 41% (N=126) encontram-se entre R$ 3.000,00 e 5.000,00 por mês (de 3 a 5 salários mínimos). Já a terceira faixa entre R$ 5.000 e 10.000,00 por mês (de 5 a 10 salários mínimos) cai para 16% (N=50). Aqueles entre R$ 10.000 e 20.000,00 (de 10 a 20 salários mínimos) representam 14% (N=44) da amostra, finalizando com os que estão na faixa acima de 20.000,00 mês (acima de 20 salários mínimo), os quais representam 4% (N=12).

Tais percentuais são consistentes com a análise de perfil socioeconômico feita por Ristoff (2014). Percebe-se, de acordo com o mesmo autor, que ao se considerar os três primeiros ciclos do Exame Nacional de Desempenho do Estudante (ENADE - 1991-2012) a renda familiar mensal, superior à 10 salários mínimos dos estudantes de psicologia, caiu de forma significativa, sendo que no primeiro ciclo perfazia um total de 32%, no segundo 19% e no terceiro 16%. No presente estudo, tal grupo representou 14% da amostra, sugerindo uma leve queda, possivelmente pela crise econômica que atravessa o país. Ainda merece destaque o expressivo contingente de estudantes nas faixas 2 e 3, os quais possivelmente teriam dificuldades em manterem- se no curso, o que, segundo Ristoff (2014), não ocorre em função das políticas de permanência, como o Fundo de Financiamento Estudantil (FIES).

Quanto ao item situação conjugal, a amostra ficou distribuída da seguinte forma: 43% (N=134) dos pais dos estudantes estão casados; 18% (N=56) divorciados; 16% (N=49) separados; 8% (N=25) viúvos e 15% (N=47) apresentam- se em união estável.

Outro item abordado neste estudo junto à amostra pesquisada foi se esta, em algum momento de sua história, havia vivenciado situações de violência. A reprodução da violência através das gerações tem recebido atenção no debate científico, particularmente no aspecto etiológico (Oliveira & Sani, 2009). Tais autores, embasados no modelo da transmissão intergeracional da violência, apontam que existe uma relação entre as experiências com violência na família de origem (particularmente na infância) e a experiência com as relações de violência em namoros futuros.

Os dados colhidos neste estudo fortalecem esta hipótese. Por exemplo, ao perguntar-se quantos respondentes tiveram contato com comportamentos violentos, obteve-se os seguintes dados: 41% da amostra referiu que em algum momento de

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sua história teve contato com uma experiência violenta; dentre este público com histórico de violência, 92 mulheres (75%) e 30 homens (25%) relataram ter sofrido algum tipo de violência em sua história pessoal.

Eriksson e Mazerolle (2015), em estudo com o objetivo de examinar os efeitos do abuso infantil e da violência intrafamiliar na perpetração da violência do parceiro íntimo entre uma amostra de homens encarcerados (N=303), verificaram que a violência praticada por pais e a violência intraparental bidirecional é preditiva de violência pelo parceiro íntimo. Askeland, Evang e Heir (2011) analisaram as associações entre vitimização da infância e adolescência e violência do parceiro na vida adulta. Experiências de violência intrafamiliar foram relatadas por 60% dos participantes (N=480 homens). As análises de regressão mostraram que tais experiências de violência, especialmente a violência física, foram associadas à violência em adultos (p <0,05). Simons, Simons, Lei, Hancock e Fincham (2012) a fim de testar a hipótese da teoria da aprendizagem social, a qual sugere que a hostilidade dos pais, intercalada com demonstrações de afeto, amplia a probabilidade de comportamento violento nos filhos, realizaram um estudo com 2.088 estudantes de graduação de uma grande universidade do sudeste do Estados Unidos. As descobertas sugerem que, em vez de atenuar os efeitos negativos da hostilidade, demonstrações de afeto intercalada com atos de hostilidade parecem ampliar a probabilidade de que os filhos imitem comportamentos agressivos em seus próprios relacionamentos românticos. Logo, pode-se considerar que o fato de 41% da amostra pesquisada ter entrado em contato com algum tipo de comportamento violento em seu histórico seja um indicador significativo para relações de violência em namoros futuros.

Quanto ao tipo de violência experimentado pelos participantes, verificou-se que 41% das mulheres sofreram violência física, sendo a violência psicológica a que apresenta o maior percentual (45%). As vítimas de violência sexual ficam em torno de 7,5%. Quanto aos homens, a vivência de violência física é maior: 47% relataram ter experimentado algum tipo de agressão e 32% dizem ter sofrido com violência psicológica. Todavia, faz-se necessário destacar que, no universo da amostra, o grupo de mulheres vítimas de violência é bem maior (N=93) quando comparado ao de homens (N=34).

Segundo Martins e Jorge (2010), as mulheres estão mais expostas aos eventos violentos, especialmente na violência física e sexual. Em estudo sobre prevalência e

fatores associados à violência por parceiro íntimo em mulheres, Barros, et al. (2016) encontraram os seguintes índices por tipo de violência sofrida: emocional, 52,7%; física, 46,1%; e sexual, 13,6%. Em estudo sobre violência intrafamiliar, realizado na cidade de Puno (Peru) com 100 adolescentes grávidas, Sullca e Schirmer (2006) observaram que 63% do grupo referiram já ter sofrido violência física. Em outro trabalho sobre violência contra a mulher em Vitória (Espírito Santo, Brasil), Leite, Amorim, Wehrmeister e Gigante (2017) observaram a prevalência das violências psicológica (25,3%), física (9,9%) e sexual (5,7%).

Um dos aspectos aos quais a violência psicológica manteve-se associada neste estudo foi o histórico materno de violência por parceiro íntimo. A violência sexual foi mais frequente nas mulheres de menor renda e que sofreram abuso sexual na infância. Os dados apontados por pesquisas similares indicam que a amostra deste trabalho, particularmente das mulheres, aparenta uma probabilidade maior de vitimização por violência do parceiro.

Conforme já visto nesta discussão, o contato com a violência por si só é danoso, porém foi intenção deste estudo verificar, em termos de percepção, o quanto que contatar com práticas violentas influencia o comportamento atual. Nesse sentido, perguntou-se aos participantes o quanto estes entendiam que suas experiências com atos de violências influenciavam seu comportamento atual.

Pode-se observar nas respostas que tanto homens (24%) quanto mulheres (66%) reconhecem que o fato de terem experimentado algum tipo de violência em sua história tem influência sobre seu comportamento atual.

Kinsfogel e Grych (2004) investigaram as maneiras pelas quais a exposição ao conflito interparental pode afetar as relações de namoro entre adolescentes em uma amostra de 391 adolescentes com idades entre 14 e 18 anos. Segundo tais autores, meninos expostos a maior discórdia parental eram mais propensos a ver a agressão como justificável em um relacionamento romântico, apresentaram maior dificuldade em controlar a raiva e acreditavam que o comportamento agressivo era mais comum nos relacionamentos de namoro entre seus pares. O testemunho do conflito interparental esteve associado a níveis mais altos de agressão verbal e física em relação a seus próprios parceiros românticos.

A fim de verificar se existe associação direta ou mediada entre comportamento parental disfuncional na infância tardia e envolvimento em violência no namoro em uma amostra (N=717) de meninos (a partir de 10 anos de idade) com baixo nível

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socioeconômico durante a adolescência, Lavoie, et al., (2002) realizaram um estudo longitudinal (8 anos). Verificaram que os participantes que perceberam negligência no acompanhamento de seus pais no final da infância e que relataram comportamento antissocial aos 15 anos de idade, como delinquência e abuso de substâncias, apresentaram maior risco de se envolverem em relacionamentos violentos aos 16 anos. Práticas parentais autoritárias de 10 a 12 anos também foram preditores de violência no namoro.

Em estudo sobre vitimização em relações de namoro na adolescência (15 anos) e no início da idade adulta (21 anos), Vézina, et al. (2015) avaliaram 443 participantes do sexo feminino. Análises de regressão logística multinomial revelaram que, dentre outros fatores, a história de violência familiar esteve associada a um risco aumentado de mulheres serem vitimizadas (psicológica e/ou fisicamente/ sexualmente) em suas relações de namoro, seja na adolescência e/ou vida adulta.

Verifica-se, portanto, que, a exposição à violência pode ser um preditor na formação de alguém que usa de violência no namoro. Todavia, presenciar violência parental também pode ser um preditor de aceitação de violência no namoro.

Nas considerações finais de seu artigo sobre cronicidade de violência física no namoro entre jovens universitários, Aldrighi (2004) propõe que modelos de relacionamento aprendidos desde muito cedo nas relações de família de origem podem levar à compreensão distorcida de que a agressão é algo inerente às relações. Bandura, Azzi e Polydoro (2008) entendem o comportamento violento como uma série de atos aprendidos por observação e imitação, de modo que os comportamentos resultantes são moldados por meio de incentivos e recompensas.

Uma pessoa que tenha sido exposta à violência durante a infância e/ou adolescência tende a perceber o comportamento violento em um relacionamento como algo aceitável (Oliveira & Sani, 2009). A aceitação da violência no namoro é um preditor de comportamento violento na conjugalidade e, nesse sentido, de perpetração da violência (Dorotéia, 2013). Por exemplo, durante o namoro, adolescentes desenvolvem suas atitudes em relação a intimidade, incluindo as expectativas a respeito dos papéis de gênero e experiências de formas de controle. Tais aspectos podem contribuir para o desenvolvimento de crenças distorcidas, do tipo “as mulheres devem submissão aos seus maridos” ou “em certas circunstâncias do relacionamento a violência faz parte” (Pimentel, Moura, & Cavalcanti, 2017). Portanto, se a aceitação de violência no namoro pode ser

entendida como uma atitude, tal visão pode contribuir na prevenção de comportamentos específicos, como a violência nos relacionamentos de namoro. A variável aceitação de violência no namoro será objeto de discussão mais adiante.

Sabe-se que no mundo pós-moderno os relacionamentos iniciam-se de modo cada vez mais precoce (Santrock, 2014). Dessa forma, fez-se necessário identificar o tempo de relacionamento dos integrantes da amostra. O maior percentual do grupo (N=128; 41%) está envolvido em um relacionamento há mais de 2 anos. A segunda maior parcela, entre 1 e 2 anos, é de 23% (N=70).

A pergunta que se faz neste momento é se o tempo de namoro pode ou não estar relacionado à conduta e tipo violência.

Flake (2013) relaciona, em estudo com jovens universitários no estado de São Paulo, o tipo de violência com o tempo de relacionamento de namoro e conclui que há uma tendência de aumento dos episódios de violência (sofrida ou perpetrada) com o passar dos anos, em ambos os sexos. A referida autora ainda destaca que 84% dos universitários participantes de seu estudo relataram sofrer e perpetrar violência contra seu (sua) parceiro(a), independentemente do sexo.

Calvete, Gámez-Guadix, Fernández-Gonzalez, Orue, e Borrajo (2018), através de um estudo longitudinal (três anos) analisaram numa amostra de 933 adolescentes, se a exposição à violência familiar, tanto na forma de vitimização direta quanto testemunhando violência, seriam preditores de vitimização à violência no namoro em adolescentes.

Os achados indicam que o testemunho da violência familiar prediz o aumento da vitimização por violência no namoro ao longo do tempo através da mediação de esquemas desadaptativos, particularmente entre as mulheres. A vitimização direta na família prediz sincronicamente a vitimização da violência no namoro. Além disso, esquemas desadaptativos contribuem para a perpetuação da vitimização da violência no namoro ao longo do tempo.

Na presente pesquisa verificou-se que dentre as pessoas (N=122) que apresentaram alguma experiência com violência, seja diretamente ou testemunhando, 38% (N=46) destas estão há mais de dois anos em seus relacionamentos e 21% (25) entre 1 e 2 anos. Dentre esse grupo com maior tempo de namoro, 43% das relações amorosas são descritas como ciumentas; 27% como possessivas e 17% como conflituosas.

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Segundo dados obtidos pelo Instituto de Medicina Legal de Coimbra e do Porto, o sentimento de ciúme é um dos principais desencadeadores da agressão do homem para com a mulher (Lisboa, Vicente, Carmo, & Nóvoa, 2003). A forma como este grupo percebe seu relacionamento não é evidência clara de perpetuação de violência no namoro, todavia é um indicativo de que existe um nível de tensão e conflito na sua relação.

No decorrer desta discussão, já se verificou que as práticas parentais têm algum tipo de impacto sobre a forma como o relacionamento de namoro é percebido. Um dos dados obtidos nesta coleta foi o de que existe diferença entre os escores de percepção quanto à prática parental paterna da materna.

As mães foram vistas pelos participantes como mais exigentes, bem como mais responsivas que os pais (Tabela 5). Também foi encontrada diferença estatística significativa ao relacionar-se comportamento parental materno e aceitação de violência no namoro (Tabela 6), bem como comportamento parental paterno e aceitação de violência no namoro (Tabela 7).

Verificou-se que, possivelmente, filhos(as) de mães e pais mais autoritários(as) tendem a aceitar comportamentos violentos no namoro. De acordo com Baumrind (1966), o estilo parental autoritário é predominantemente restritivo e punitivo, com ênfase no controle e obediência sem questionamentos, além do estabelecimento de limites e controles rígidos. Para Oliveira, et al., (2002), os filhos de mães autoritárias em geral apresentam comportamento de externalização (agressão verbal ou física, destruição de objetos, mentira) e de internalização (retração social, depressão, ansiedade).

Povedano, et al. (2014), em estudo com o objetivo de examinar as relações entre as práticas parentais e violência no namoro entre 2.399 adolescentes, verificaram que adolescentes de famílias com estilos parentais mais autoritários apresentam maior probabilidade de envolverem-se em relacionamentos violentos de

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