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TRAÇOS DE PERSONALIDADE

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I. 1 – REVISÃO SISTEMÁTICA DA LITERATURA

I.3. TRAÇOS DE PERSONALIDADE

Há muitos elementos que desempenham um importante papel na constituição da personalidade. Um deles são os determinantes genéticos, os quais definem as características peculiares de um indivíduo, aquilo que lhe é único - via de regra são mais significativos na inteligência e no temperamento. Os determinantes ambientais também agregam marcas que aproximam, mas também diferenciam sujeitos de uma mesma sociedade. Podemos citar entre estes determinantes a cultura (experiência devido ao pertencimento a um mesmo ambiente), classe social (fatores que influenciam a maneira como o indivíduo vê a si mesmo e aos membros de outras classes), família (os padrões de comportamento parental afetam o desenvolvimento da criança) e pares (experiências grupais que estão além do núcleo familiar) (Pervin, & John, 2004).

O ser humano difere-se também na forma como observa e interpreta a realidade e as suas perspectivas de futuro. Essas distinções estão presentes nas diferenças de personalidade. Historicamente, um termo utilizado para referir-se a essas distinções é caráter. Ele tem sua origem no grego  e significa “instrumento usado para gravar”, “imagem impressa”, “marca”, “exata correspondência com produção perfeita” (Taylor, 1991).

Teofrasto, filósofo grego, nascido na ilha de Lesbos (370-287 a.C.), aluno de Platão e discípulo e Aristóteles, escreveu “Os caracteres” (Japiassú & Marcondes, 1993). Sua intenção era retratar diferentes tipos de caráter como o adulador, o vaidoso, o charlatão, o supersticioso, entre outros.

Os tipos de caráter propostos por Teofrasto remetem aos postulados da teoria do traço. Traços são características de personalidade e comportamentos constantes exibidos em diferentes situações (Feldman, 2015). Tal modelo teórico propõe que o

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ser humano apresenta certos traços, porém o grau em que determinado traço aplica- se a uma pessoa apresenta variabilidade e pode ser quantificável.

Pervin e John (2004) destacam que os traços podem ter três funções importantes: resumir, prever e explicar a conduta de uma pessoa.

Na origem da elaboração da teoria dos traços, o desafio científico foi o de identificar os traços primários mais específicos para descrever a personalidade.

Gordon Allport define traços como unidades básicas da personalidade. Estão baseados no sistema nervoso e representam disposições generalizadas da personalidade. Tais disposições esclarecem as regularidades no funcionamento da pessoa em diferentes contextos e no decorrer do tempo (Pervin & John, 2004). Também os traços se definem de acordo com três propriedades: frequência,

intensidade e variedade de situações – analisando, por exemplo, se uma pessoa com

traço agressivo seria frequentemente agressiva de uma forma intensa e em uma diversidade de situações.

Allport (1961) dedicou-se à extenuante tarefa de analisar um dicionário completo da década de 30 com mais de 18.000 verbetes. Ao término de sua tarefa, ele encontrou três categorias fundamentais de traços, as quais ele chamou de

cardeais, centrais e secundários (Allport, 1966).

Traços cardeais referem-se àquela característica que direciona a maior parte de atividades de uma pessoa (Feldman, 2015). Uma pessoa autoritária, por exemplo, vê quase tudo de maneira estereotipada, semelhante à distorção cognitiva,

pensamento dicotômico, proposta por Beck, Rush, Shaw e Emery (1997).

Traços centrais (como a assertividade e a bondade) são as características fundamentais da pessoa (Pervin & John, 2004).

Traços secundários (como gostar de praticar esportes) influenciam o comportamento em menor grau, numa quantidade menor de situações.

De acordo com Cloninger (2003), os traços progridem no decorrer do tempo, são modificados pelas experiências e por novas formas de adaptação ao mundo.

Para Allport (1966), personalidade é a organização dinâmica dos diversos sistemas físicos, fisiológicos, psíquicos e morais, os quais, integrando-se, determinam o ajustamento do ser humano ao ambiente.

Embora Gordon Allport enfatizasse o conceito de traço procurando esclarecer sua relação com a situação, produziu escassas pesquisas objetivando estabelecer a

existência e utilidade de traços específicos (Pervin & John, 2004). Quem empregou esforços nessa direção foram Eysenck e Catell.

Hans J. Eysenck (1916-1997), em sua pesquisa inicial, encontraram duas dimensões básicas da personalidade: extroversão e neuroticismo – estável/instável (Pervin & John, 2004).

A extroversão refere-se ao grau de sociabilidade (introversão-extroversão). Inclui fatores primários de sociabilidade, vitalidade, assertividade e dominância. Deste modo, a dimensão introversão caracteriza-se pela disposição a ser quieto, reservado, reflexivo e evitar riscos, enquanto a dimensão extroversão caracteriza-se pela disposição para ser sociável, simpático e correr riscos (Silva D. L., 2010).

A dimensão neuroticismo refere-se à estabilidade emocional (estável-instável). É definida por traços como tensão, mal humor e baixa autoestima (Pervin & John, 2004). De acordo com Hutz e Nunes (2001), indivíduos com níveis elevados de neuroticismo são mais predispostos a experimentar instabilidade emocional, processos dissociativos da realidade, excesso de ansiedade, baixa tolerância, frustração e estratégias de enfrentamentos desadaptativas. Além disso, exibem baixa autoestima e comprometimento do bem-estar psicológico, o que, por sua vez, pode elevar a sintomatologia depressiva e pensamentos suicidas.

Eysenck ainda acrescentou uma terceira dimensão (Feldman, 2015), denominada psicoticismo, a qual refere-se ao grau em que a realidade é distorcida.

Estes três fatores (extroversão, neuroticismo e psicoticismo) formaram a teoria dos três fatores da personalidade proposta por Eysenck. Tais fatores foram observados em diferentes países (Eysenck & Long, 1986), de onde conclui-se a presença destas três dimensões em diversas culturas além de indicativos para a presença de um componente hereditário.

Outro pesquisador que se dedicou ao estudo dos traços de personalidade foi Raymond B. Catell (1905-1998), o qual tinha como objetivo em suas pesquisas definir e medir os principais componentes da personalidade (Davidoff, 1983).

Neste sentido, traços, enquanto unidades de personalidade, têm valor preditivo. Cattell (1979) definiu um traço como "aquilo que define o que uma pessoa vai fazer quando confrontada com uma situação particular."

Com a finalidade de avaliar as diferenças de personalidade entre a população como um todo, Cattell desenvolveu o questionário 16 PF (Cloninger, 2003) - a sigla PF vem do inglês: personality factors (fatores de personalidade).

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O grande alcance da visão de Cattell, ao propor um modelo de traços baseado em evidências que poderiam cobrir todo o espectro da personalidade, impactou outros pesquisadores originando um novo modelo: os Big Five.

Embora muitos pesquisadores tenham estudado os Big Five (Cinco Grandes Fatores), Paul Costa e Robert McCrae tornaram-se referência nessa tarefa. O principal objetivo deles foi descrever a personalidade (Cloninger, 2003). O próprio nome, Big Five, propõe a existência de cinco fatores básicos que descrevem a personalidade.

Tais fatores foram desenvolvidos a partir da análise fatorial das palavras que as pessoas usam no senso comum para descrever a personalidade, o chamado enfoque léxico da personalidade (Goldberg, 1981, 1982; Norman, 1963).

A razão para se partir da linguagem cotidiana reside no princípio de que as pessoas estão sintonizadas com as diferenças de personalidade, dessa forma, a linguagem da vida diária deve, ao longo dos séculos, refletir importantes dimensões da personalidade (Cloninger, 2003).

Os Big Five são compostos por cinco traços gerais de personalidade:

a) Neuroticismo – traço de personalidade presente em pessoas que lidam negativamente com seu estado emocional. São atormentadas por emoções como preocupação e insegurança (McCrae & Costa Jr.,1987). Segundo Widiger (2009) tais pessoas são mais suscetíveis a apresentar sentimentos como ansiedade, irritabilidade e depressão.

b) Amabilidade – é entendida no Brasil como socialização (Feldman, 2015). Esse traço é um indicador para a qualidade das relações interpessoais, ou seja, se é capaz de construir vínculos agradáveis, harmoniosos e amistosos (Damásio & Laros, 2014). Segundo Graziano e Tobin (2009), esse é um fator que apresenta as diferenças e singularidades de uma pessoa mediante o contato com outra.

c) Conscienciosidade – também conhecido como realização (Feldman, 2015), este traço caracteriza pessoas focadas em metas, cumpridoras de normas, que procuram controlar rigidamente seus impulsos.

d) Abertura para a experiência – traço indicativo da disponibilidade do indivíduo em novos ambientes, no acesso a novos conhecimentos e novas informações.

e) Extroversão – característica de pessoas com boa capacidade para interação, para expor suas ideias publicamente e construir amizades. Levando-se em conta o objetivo desta pesquisa, o traço de personalidade denominado neuroticismo será avaliado a partir do NEO-FFI-R (descrito no método), instrumento baseado no modelo penta-fatorial das personalidades - cinco grandes fatores de personalidade.

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