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Diferencial dos produtos das indústrias criativas

2.4 Características e dualidades das indústrias criativas

2.4.4 Diferencial dos produtos das indústrias criativas

Da centralidade da criatividade nas indústrias criativas derivam duas características destas: a primeira característica é que os produtos gerados por estas indústrias são diferenciados verticalmente. Isto porque o maior nível de criatividade e de ativos intangíveis que neles estão embutidos resulta em singularidades que os distanciam dos produtos oriundos das indústrias tradicionais, de massa (BENDASSOLLI et al., 2009; UNCTAD, 2010; REIS, 2012).

Acerca dos diferentes tipos de diferenciação de produtos e serviços, Sarkar (2014) explica que a diferenciação é do tipo vertical quando o produto ou serviço difere em termos de qualidade, distinguindo-se assim da diferenciação horizontal, que ocorre quando os produtos ou serviços, tendo a mesma qualidade, possuem algumas características diferentes; da diferenciação natural, quando os produtos ou serviços se diferenciam através de processos naturais que não são desenvolvidos pelos produtores; e da diferenciação estratégica, que é controlada diretamente pelos produtores através de estratégias de publicidade e promoção de características primárias do produto ou de serviços adicionais com ele relacionados.

Outra característica distintiva dos produtos gerados pelas indústrias criativas é que eles possuem dupla face: uma mercadológica e uma simbólica, por resultarem do esforço criativo de indivíduos que manipulam objetos do mundo externo adicionando-lhes suas fantasias, desejos e crenças, simbólicas e culturais (CAVES, 2000; WINNICOTT, 1975; BENDASSOLLI et al., 2009; SOUZA; LIMA, 2009; SEC, 2011).

Potts et al. (2008) também apontam esse dualismo entre mercado e simbologia dos produtos criativos, e argumentam que essa dupla face dos produtos confere aos mesmos grande especificidade e diferenciação dos demais produtos de indústrias tradicionais, o que inclusive leva os autores a criticarem a própria terminologia indústrias criativas, uma vez que o primeiro termo remete à ideia da indústria tradicional, baseada numa cultura de massa.

Nesta esteira, Souza e Lima (2009) criticam os que enxergam as indústrias criativas por meio de abordagens econômicas tradicionais, pois afirmam que para contemplar as especificidades da produção de bens simbólico-culturais as indústrias criativas constituem-se por redes, e devem ser estudadas mediante abordagens de redes, tanto na esfera de produção como na esfera de consumo.

Um aspecto que pode ser observado no que tange essa dupla face mercadológica e simbólica, é que os consumidores dos produtos das indústrias criativas acreditam consumir não apenas objetos materiais, mas sim objetos culturais (BENDASSOLLI et al., 2009). O consumo de artefatos culturais emerge em associação ao surgimento, a partir da década de 1990, de uma nova classe de serviços que combinava capital cultural e capital econômico (BOURDIEU, 1984, 1990), e à transformação do consumo material em consumo cultural num cenário de estetização da vida cotidiana (FEATHERSTONE, 1991).

Em relação à estetização da vida cotidiana, Lipovetsky e Serroy (2015) afirmam que ocorreu nas últimas três décadas o deslocamento do capitalismo de produção para um capitalismo do tipo cultural, marcando um tempo em que a produção, distribuição e consumo industriais e a cultura não mais constituem universos separados ou inconciliáveis e fazendo

surgir o que os autores denominam de capitalismo artista ou criativo transestético. Neste capitalismo, as principais mercadorias são bens e serviços impregnados de um componente estético-emocional, resultantes do trabalho dos “criativos”, que se impõem como os novos criadores e desenvolvedores de mercado (LIPOVETSKY; SERROY, 2015).

Assim, dada a dupla face dos produtos gerados pelas indústrias criativas, eles não têm função unicamente prática, material ou fisiológica, e seu valor não deriva somente das suas propriedades físicas ou materiais, mas do valor que o consumidor lhes atribui na experiência de consumo, daí serem denominados como bens de experiência. Tampouco este valor é fruto apenas de cálculos racionais relacionados a aspectos econômicos: o valor atribuído pelo consumidor está associado a lógicas culturais, sociais e coletivas (CAVES, 2000; LASH; URRY, 1994; NEGRI; LAZZARATTO, 2001; McCRACKEN, 2003).

Assim, no consumo dos produtos gerados pelas indústrias criativas, a percepção de utilidade e o valor dos produtos culturais derivam da carga dos sentidos e significados socialmente compartilhados pelo consumidor no ato do consumo (CAVES, 2000; GRISWOLD, 1987; BENDASSOLLI et al., 2009). Ressalta-se que hodiernamente o valor atribuído pelo consumidor no consumo de bens culturais está cada vez mais associado a propósitos hedonistas, ou seja, à busca de prazer, distração, emoções e sensações (LIPOVETSKY, 2010).

Se para o consumidor, os produtos criativos constituem bens de experiência que acontece no próprio ato do consumo, para os produtores os benefícios advindos dos produtos criativos não são exauridos em seu consumo, atribuindo aos produtos criativos uma perenidade a qual Caves (2000) denomina de ars longa. Isto porque os referidos benefícios podem ser usufruídos durante um longo período por meio de ganhos advindos de pagamentos de royalties pela utilização das obras, seja em forma de reprodução ou publicação; tais ganhos devem ser gerenciados por regras específicas de propriedade intelectual (CAVES, 2000).

Isto posto, surgem os questionamentos: o que os profissionais criativos entendem ser o diferencial dos seus produtos? Nas suas concepções de diferencial, estão contemplados aspectos materiais e simbólicos dos produtos?

3 METODOLOGIA DA PESQUISA

A presente seção descreve os procedimentos metodológicos traçados com o fito de alcançar os objetivos geral e específicos estabelecidos para a pesquisa. Apresenta-se ao longo de oito subseções: o paradigma em que se funda a pesquisa, sua classificação tipológica, a estratégia adotada, a amostra e os sujeitos da pesquisa, os procedimentos para coleta, tratamento e análise de dados, o instrumento de coleta e as categorias analíticas e unidades de registro.