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Capítulo II – Perceção de risco e turismo

2.5. Dimensões da perceção de risco no turismo

“Nobody takes a risk in the expectation that it will fail!” (in Peter Bernstein, 1996: 22)

Considerando que o turismo é uma atividade que nos transporta para fora do quotidiano, associado à ideia de prazer, deixa de fora uma análise dos fatores de risco. A

este propósito, Heiderich (2005) tem uma frase que parece dar valor a esta afirmação: “Il est intolèrable, voire indécent, mourir pendant les vacances!”

O estudo da perceção de risco constitui uma área fundamental na compreensão do comportamento do turista, nomeadamente no que toca: (i) ao processo de tomada de decisão de viajar; (ii) à motivação de viagem; (iii) à escolha do destino turístico; (iv) à dimensão temporal (época do ano); (v) às características psicográficas; e (vi) às características socio-culturais (Mansfeld, 1996, Mansfeld, 2006; Oltedal et al, 2004; Reisinger & Mavondo, 2005; Sharpley, 1994). A perceção de risco está, na maioria dos casos, relacionada com fatores individuais. Variando de tamanho, forma ou natureza, a perceção dos riscos presentes no turismo assumem valores que estão dependentes de fatores, como a experiência em viagens anteriores; locus de controlo17; a informação sobre o destino; o género, entre outros (Waite, 2009).

A perceção de risco aplicada ao estudo do turismo foi definida como um acontecimento negativo que pode ocorrer no destino durante a estada do turista. Os riscos foram classificados com base em diferentes critérios de avaliação: o transporte, a segurança pública, o saneamento básico, o alojamento, as características climáticas do destino (Tsaur, Tzeng & Wang,1997). A este propósito, Bettman (1973) apresenta dois tipos de riscos posteriormente aplicados no estudo do turismo: (i) o risco inerente e (ii) o risco manuseável. O primeiro definiu-o como sendo o risco latente presente num determinado produto; o segundo como sendo o risco controlável pelo indivíduo ou pela indústria turística.

Inicialmente, a grande maioria dos estudos em torno da perceção de risco no turismo adotou cinco dimensões de risco: o físico, o social, o psicológico, o financeiro e o temporal. Posteriormente, surgiram outras dimensões, nomeadamente, a de risco político (Sönmez & Graefe, 1998b). Roehl e Fesenmaier (1992) introduziram a noção de

risco de saúde, risco político ou de instabilidade política e de terrorismo. Estudos mais específicos, com enfoque na relação entre perceção de risco e turismo centram-se sobretudo em dimensões concretas de risco (vide tabela 2.2): 1) físico; 2) saúde; 3) financeiro; 4) social; 5) temporal; 6) equipamento; 7) satisfação; 8) psicológico; 9) político; 10) terrorismo e 11) comunicação.

17 Este constitui um conceito importante na perceção de risco e prende-se com a crença de que o resultado das nossas ações provém daquilo que fazemos (interno) ou é condicionado por algo exterior. “A locus of control orientation is a belief whether the outcomes of our actions are contingent on what we do […] or on events outsider our personal control […] (Zimbardo cit in Waite; p.19).”

Para Roehl e Fesenmaier (1992) o risco físico é o mais importante para os turistas que se deslocam para destinos internacionais, paralelamente com o risco funcional ou de equipamento. Por risco físico entende-se a possibilidade de algo correr mal durante a viagem, com consequências negativas a nível físico, lesão ou doença.

Neste tipo de risco incluem-se os turistas vítimas de crime (Pizam, 1999; Pizam, Tarlow & Bloom, 1997).

A perceção de que os turistas são alvos preferenciais para a prática de crimes, por exemplo, roubos, está associada ao facto de estes, na grande maioria dos casos, se tornarem demasiado visíveis por se fazerem acompanhar de quantias elevadas de dinheiro, objetos valiosos ou por apresentarem comportamentos arriscados. A tudo isto, acresce ainda o facto de frequentarem locais não recomendados e de não falarem a língua local (Barker, Page & Meyer, 2002). Na realidade, é a perceção de risco associada ao crime que tem conduzido à alteração do comportamento dos turistas no destino, bem como à própria tipologia da viagem. Por esse motivo, atualmente o turista prefere viagens organizadas (packages) para resorts onde possa desfrutar do seu tempo de lazer em segurança e, sobretudo, mantendo a sua “redoma ambiental” (Cohen, 1972).

No risco de saúde a perceção está diretamente ligada às áreas geográficas que apresentam um maior número de infeções (por exemplo, Malária, HIV), na sua maioria países em vias de desenvolvimento ou com determinadas características climáticas, por exemplo, clima tropical. Comparativamente, a Europa e os Estados Unidos são percecionados, segundo estudos realizados, como sendo as áreas mais seguras para se viajar no que toca a questões de saúde (Carter, 1998; Cartwright, 2000).

Este tipo de risco em viagem tem constituído uma preocupação constante da OMS (Organização Mundial de Saúde) em parceria com a OMT (Organização Mundial do Turismo) e de outro tipo de organismos em diferentes países, como por exemplo, o Center for Disease Control and Prevention (nos Estados Unidos da América). O objetivo destas organizações tem sido informar os turistas de riscos potenciais que correm quando viajam para determinados destinos internacionais. De facto, a viagem está associada a um conjunto de riscos de saúde que devem ser tomados em consideração pelo turista, pelos governos e pela indústria turística dos destinos afetados. A redução do risco de saúde está na identificação, a nível mundial, das áreas geograficamente afetadas e das medidas de segurança propostas pela OMS. Assim, o turista, para além de tomar conhecimento, pode ainda atuar no sentido da prevenção,

reduzindo o risco de contrair uma doença, através da alteração dos comportamentos de risco durante a viagem (Cartwright, 2000).

O risco financeiro prende-se com a ideia de que o dinheiro gasto na viagem e o resultou num mau investimento (Yuksel & Yuksel, 2006).

O risco social é definido por Roehl e Fesenmaier (1992) como sendo a possibilidade da escolha de um destino, ou viagem, influenciar e/ou afetar a opinião que os outros têm a respeito de quem a faz e/ou a forma como o indivíduo experimenta interna ou externamente esse facto.

Risco funcional ou de equipamento corresponde à possibilidade de ocorrência de determinados problemas que envolvam questões técnicas, mecânicas ou falhas de equipamento (Tsaur, Tzeng e Wang, 1997).

O risco temporal foi identificado como uma dimensão importante e significa o receio de que uma viagem para determinado destino constitua uma perda de tempo com a preparação ou com o local escolhido (Roehl & Fesenmaier, 1992)

O risco de satisfação diz respeito à possibilidade da escolha de um destino não corresponder às expectativas criadas pelo turista. Num estudo, Sönmez e Graefe (1998a)

concluíram que os turistas que evitam viajar para o continente africano apresentavam valores mais elevados de perceção de risco de satisfação. Por este facto, alguns destinos são “excluídos” das intenções de viajar porque não correspondem ao “imaginário de viagem” do turista.

O risco psicológico é entendido como a possibilidade de uma viagem não se enquadrar no tipo de personalidade do turista ou não refletir na sua autoimagem. Os autores sublinham ainda que na comparação entre turistas nacionais (turismo doméstico ou interno) e internacionais pode existir divergências consideráveis na apreciação que fazem deste tipo de risco (Roehl e Fesenmaier, 1992).

O risco político e/ou de instabilidade política é importante na escolha de um destino e representa um risco com grande impacto na indústria turística. Alguns autores (Fatehi-Sedeh & Safizadeh, 1989; Fuchs & Reichel, 2006) sustentam a ideia de que não existe uma definição universal de risco político. Este tipo de risco é considerado como a possibilidade de existir uma interferência governamental (direta ou indireta), através de decisões ou acontecimentos governamentais que afetam a capacidade de investimento num país.

A perceção do risco de terrorismo representa a possibilidade de que um atentado terrorista por qualquer tipo de motivação (política, religiosa, ou outras) possa ocorrer. Este risco tornou-se especialmente estudado a partir da década de 70 do século XX, quando nos Jogos Olímpicos de Munique ocorreu um ataque aos atletas israelitas, do qual resultaram 11 mortos. Este acontecimento teve um forte impacto pelo facto de ter recebido cobertura mediática mundial, no caso concreto do terrorismo os meios de comunicação desempenham um papel crucial na reprodução da mensagem.

Apesar de existirem estudos que colocam a ênfase na questão da linguagem como um fator importante na escolha do destino turístico, só com Hann (2005) foi apresentado o risco de comunicação. Este tipo de risco prende-se sobretudo com a facilidade, ou não, com que o turista pode comunicar no espaço visitado. A comunicação pode trazer-lhe um sentimento de bem-estar, por se fazer compreender, ou, pelo contrário, de desagrado ou tensão. Tal como referimos no ponto 1.7 do capítulo 1, a língua é um fator importante na escolha do destino turístico e a incapacidade linguística pode constituir uma barreira nas viagens internacionais.

A tabela 2.2 sintetiza os principais tipos de risco presentes na atividade turística, os quais foram determinantes para a construção do trabalho empírico desta investigação.

Tabela 2.2 – Síntese das tipologias de riscos no turismo

Tipo de Risco Autor Descrição

1 Financeiro Bontempo, 1997; Murphy & Enis, 1986;Cheron & Ritchie, 1982 cit in Han, 2005

A possibilidade da experiência de viagem não estar de acordo com o valor despendido

2 Social Han, 2005; Roehl & Fesenmaier, 1992 Possibilidade de afetar a opinião dos outros 3 Psicológico Roehl & Fesenmaier, 1992 A viagem pode não refletir a personalidade do turista 4 Físico Roehl & Fesenmaier , 1992 Possibilidade da viagem resultar em perigo físico 5 Funcional ou de

Equipamento Tsaur, Tzeng & Wang, 1997

Possibilidade de a experiência ser afetada por problemas operacionais, de equipamento ou mecânicos

6 Ambiental Cheron & Ritchie, 1982 Possibilidade de danos naturais ou humanos 7 Temporal Roehl & Fesenmaier (1992) Possibilidade da experiência ser considerada uma perda

de tempo

8 Situacional Priest, 1992 Possibilidade da experiência turística produzir demasiadas incertezas para o turista

9 Satisfação Sonmez & Graefe, 1998a Possibilidade da escolha do destino não corresponder diretamente em termos de satisfação pessoal 10 Comunicação Han, 2005 (In)capacidade de comunicar no espaço visitado 11 Saúde Cartwright, 2000

Roehl & Fesenmaier , 1992

Contrair uma doença provocada por vírus ou bactérias ou pela ingestão da comida local

12 Risco

político/Instabilidade Política

Fatehi - Sedeh & Safizadeh, 1989; Formica, 1996; Kobrin, 1979; Robock, 1971; Sethi & Luther, 1986 cit in Han 2005

Possibilidade de a interferência do governo ter impactos na atividade económica, incluem-se também a instabilidade política, golpes de estado.

13 Terrorismo

Fleischer & Buccola, 2006; Floyd, Gibdon, Pennington-Gray & Thapa, 2003; Mansfeld, 2006; Mawby, 2000, Pizam, Tarlow & Bloom, 1997; Sonmez, Apostolopoulos & Tarlow, 1999; Pizam & Mansfeld, 2006; Tarlow, 2000

Possibilidade de um atentado terrorista por qualquer tipo de motivação (política, religiosa, social, económica)

Como vimos, a perceção de risco é um conceito importante para ser explorado quando queremos perceber os motivos de escolha dos destinos turísticos. Essa perceção pode conduzir a diferentes níveis de segurança experienciados (enquanto imagem mental, ou aquando da estada no destino). No próximo capítulo daremos relevância aos aspetos de segurança no turismo.

2.6. Síntese conclusiva

A perceção de risco aplicada ao estudo das atividades turísticas tem merecido nos últimos anos uma atenção muito particular. As diferentes visões sobre o conceito de risco apresentadas por investigadores na área das ciências exatas e sociais deram a este

conceito maior amplitude de análise. Em resultado, concluímos que tanto o risco como a resposta a este são um constructo social (Douglas & Wildavsky, 1982; Thompson, Ellis & Wildavsky, 1990; Slovic, 2000).

Procurámos fazer uma ligação entre os fatores de risco e os determinantes da perceção, primeiro numa leitura geral e, posteriormente, na relação com o estudo do turismo. Na sequência, identificámos e definimos os principais tipos de risco proposto na literatura de forma a dar continuidade à caracterização teórica das variáveis de investigação.

CAPÍTULO III

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