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Na direção dos jovens e da sociedade civil: Financiamento na luta contra a radicalização.

CAPÍTULO 3. A EVOLUÇÃO DA ABORDAGEM DA UNIÃO EUROPEIA FACE AO TERRORISMO E A RADICALIZAÇÃO

3.4 Na direção dos jovens e da sociedade civil: Financiamento na luta contra a radicalização.

3.4 Na direção dos jovens e da sociedade civil: Financiamento na luta contra a radicalização.

Percebendo o seu contexto social e as mutações a que este estava sujeito e afetado de forma continua e crescente, no ano de 2005 a União Europeia lançou o Livro Verde Uma nova Solidariedade entre Gerações face às Mutações Demográficas (Comissão Europeia 2005) onde são identificados desafios que a União estava a enfrentar, incluindo a baixa taxa de emprego,

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principalmente jovem e a dificuldade de integração dos jovens156. Com uma taxa de desemprego jovem de 17,9% nos jovens de 25 ou menos anos, e uma taxa de desemprego de 7.7% das jovens maiores de 25 anos, o Livro aponta para risco de pobreza, sendo discriminados com a justificação da idade e falta de experiência, assim como género, raça e origem social. Contribui ainda para essa descriminação o insucesso escolar, onde 16.5% dos jovens entre os 18 e os 24 anos abandonavam a escola no ano de 2002, cabendo assim a difícil tarefa de “[Z]elar por um equilíbrio entre as gerações” e “[I]nventar novas transições entre as idades” à União. (Comissão das Comunidades Europeias 2005)

Assim, se tivermos em conta que fatores como a dificuldade de acesso à educação, a exclusão social, a marginalização e a desigualdade são relevantes no que toca à radicalização e argumentos usados no ato de recrutamento (Ares 2015) e contando com o fato de que jovens entre os 15 e os 25 anos são os mais afetados pela ideologia extremista salafista, percebe-se que o principal alvo deste tipo de radicalismos jovens é a juventude que está num percurso ainda de busca de significado para as suas vidas.

Estas fragilidades exploradas pelos “pregadores extremistas” para justificar atos de violência e o recrutamento. Mas, é importante referir que a religião usada de forma desviante pelos extremistas, pode desempenhar um papel fundamental na prevenção dessa mesma radicalização, sendo utilizada como motor de construção do sentimento de pertença, sendo um guia no caminho das pessoas procurarem um sentido positivo e um fator de unidade das comunidades. (Comissão Europeia 2016) Neste âmbito, em 2007 a Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) lançou o Toledo Guiding Principles on Teaching about Religions and Beliefs in Public Schools (OSCE 2007) que tem como objetivo criar estratégias de fomentação do respeito mútuo, a liberdade religiosa e de crenças, contando assim com quem lhes está mais próximo157. Assim como apoia o ensino de religião nas escolas, com vista a evitar mal-entendidos e estereótipos resultantes do desconhecimento na matéria, mostrando que é evidente a posição estratégica da educação, e a evidente relação das agências de inteligence e as instituições de ensino. (Ghosh et, all. 2016)

156 Josep M. Lloveras (2015) refere que o terrorismo e radicalização, inimigos difusos à estabilidade da União, necessitam uma resposta

concertada, onde de nada, ou de pouco servem as respostas convencionais mais Hard Power. Sendo necessária, uma abordagem mais Soft Power, uma articulação dos meios policiais, judiciais, culturais, sociais e religiosos, de forma a proporcionar a integração necessária a todos os emigrantes, inclusive os emigrantes de segunda geração muçulmanos.

157Marije Meines (2017) refere que a melhor maneira de identificar um processo de radicalização é utilizar as pessoas (profissionais) que estão

em contato com os possíveis radicalizados, isto quer dizer, o nível local da sociedade. Salientando que uma deteção atempada pode ser mais eficiente.

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A 17 de março de 2015, os Ministros da Educação e a Comissão Europeia adotaram a “Declaração de Paris sobre a promoção da cidadania e dos valores comuns da liberdade, tolerância e não discriminação através da educação”, que define objetivos comuns para os Estados-Membros e apela a ações de apoio a nível da UE. Neste contexto, a Comissão já mobilizou os seus instrumentos políticos financeiros e adotará outras medidas concretas para apoiar os Estados-Membros no seu trabalho, conquanto os Estados-Membros sejam responsáveis pelos seus próprios sistemas de educação e de formação, a ação política da UE pode apoiar a ação nacional e contribuir para dar resposta a desafios comuns, nomeadamente no quadro de cooperação em matéria de Educação e Formação 2020. Os Ministros da Educação e a Comissão Europeia, adotaram, em 17 de março de 2015 a Declaração de Paris sobre a Promoção da Cidadania e dos Valores Comuns da Liberdade, Tolerância e não Discriminação através da Educação definindo com isto objetivos comuns para todos os Estados-Membros nesta matéria. (Comissão Europeia 2016)

O relatório TE-SAT de 2016 aponta para o aumento crescente do envolvimento de jovens, e especialmente das mulheres tanto nas operações como no recrutamento, salientando que 26% dos indivíduos presos nesse ano eram mulheres, número superior face a 2015 que foi de cerca de 18%, apontando que “[E]les são inspirados pela propaganda e mensagem jihadista, mas não recebem necessariamente orientação pessoal ou de qualquer grupo.”158, o que torna ainda mais difícil prever qual o ponto alvo da propaganda ou qual o individuo radicalizado e possível de radicalização. Importa referir ainda a “luta de poderes” existente entre a Al-Qaeda e o Daesh, que dificulta assim ainda mais o combate e prevenção do sucesso destas organizações face à propaganda, apontando o relatório que

[A]s the volume of IS propaganda diminished, al-Qaeda and its affiliates attempted to take advantage of the situation and increased their efforts to reach new audiences. The nominal head of al-Qaeda, Ayman al-Zawahiri, appeared in several video messages in 2016, trying to position al-Qaeda as a credible alternative to IS. (Europol 2016, 22/30)

Para que todas as políticas, medidas e ações da União sejam implementadas, devido à dissemelhança vivida em cada um dos EM, é necessário criar meios e fundos de financiamento para desenvolver e aplicar iniciativas, assim como estabelecer novos organismos. O financiamento é um fator importante no que toca ao desenvolvimento e à readaptação de meios para formação e investigação de casos de radicalização e possível radicalização. Neste sentido, a

158 Tradução livre de Tiago Castro: “[T]hey are inspired by jihadist propaganda and messaging, but not necessarily receiving personal direction or

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nova Agenda Europeia para a Segurança prevê o aumento do financiamento por parte da União Europeia, no sentido de fomentar a formação específica dos funcionários públicos, assim como promover acções de monitorização, comunicação de incidentes e registo dos mesmos, no tocante a crimes de ódios ou incitamento ao ódio. (Comissão Europeia 2015)

Tendo estas tendências de radicalização que serem investigadas, a UE, através do programa Horizonte 2020159, apoia a investigação sobre assuntos como diversidade religiosa, radicalização e inclusão. A Agenda a importância crucial para a prevenção da radicalização, do acesso à educação, o diálogo intercultural e interconfessional, assim como, não menos importante, a participação dos jovens de forma a promover uma educação inclusiva, contribuindo assim para a prevenção e luta da marginalização e das desigualdades. (Comissão Europeia 2015)

Na mesma linha é previsto dar continuação a medidas concretas no sentido da promoção de valores inclusivos, nomeadamente no âmbito do “Quadro Estratégico para a Cooperação Europeia no domínio da Educação e da Formação («EF 2020»), da “Estratégia Europeia para a Juventude”, do “Plano de Trabalho da UE para o Desporto” e do “Plano de Trabalho da Cultura” (Comissão Europeia2015, 17), mobilizando ainda financiamento para programas como “Europa Criativa” e “Erasmus +”. Dando também enfase ao futuro, a Comissão dará início à promoção de novos projetos de investigação no âmbito do Horizonte 2020, direcionados à compreensão de motivos e causas de radicalização. (Comissão Europeia 2015)

Ainda que possamos dizer que o autoproclamado Estado Islâmico está a ser derrotado, do ponto de vista ideológico o mesmo não se pode afirmar tão convictamente, uma vez que “derrota militar não significa o fim de uma ideia”. Exemplo disso é o passado recente da al- Qaeda, que, tendo sido dada como derrotada, na clandestinidade reorganizou as suas forças, recrutando e reforçando a sua ideologia com o contributo de antigas tropas do exército de Saddam Hussein. Posto isto, e tendo em conta o regresso à sua forma mais tradicional no que respeita ao terrorismo pelo Estado Islâmico, a União Europeia prende-se agora com uma “nova160” ameaça: o regresso, ou possível regresso dos jihadistas combatentes nos teatros de

159 Programa de cariz concursal, de apoio ao desenvolvimento. Atribuiu uma verba de 8.5 milhões de euros para a definição de uma abordagem

global à radicalização violenta no seio da União Europeia. Atribuindo também uma verba de 5 milhões de euros para a investigação sobre as tendências de radicalização e as suas consequências na UE. (Comissão Europeia 2016)

160 Tiago Pinto (2018, 21) refere que de novo este fenómeno, a migração terrorista, nada tem, uma vez que já aos seculos que esta migração de

combatentes/mercenários/voluntários, com o objetivo de combater em outros países (Afeganistão, Bósnia) que não o seu de nascimento, já existe, afirmando que a novidade é a dimensão deste mesmo fenómeno.

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conflito, que se estima que sejam mais de cinco mil, incluindo cidadão portugueses e espanhóis, que se alistaram e viajaram com uma convicção ideológica justificada pelo desejo de viver numa sociedade “verdadeiramente muçulmana”, um desejo de proteção a favor da comunidade muçulmana afetada pela conduta de Bachar al Assad, ou o simples e perigoso desejo de viver uma aventura. Estima-se assim que na atualidade o número de combatentes que tenham já regressado é de 20% a 30%, número preocupante uma vez que estes combatentes aprenderam em grande parte como usar uma armas e até mesmo construir uma bomba, sendo assim possíveis autores de ataques futuros no seio da União Europeia. (Pinto 2018, 21/22)

Desaparecendo o Daesh, ou seja, o íman que atraí os terroristas, com tudo que isto traz de bom, não nos podemos esquecer que os resistentes direcionam o seu raio de acção para outros territórios, que não apenas Síria e Iraque, O que levanta ainda mais dificuldades dada a complexidade de lutar contra um elemento disperso. Podemos afirmar assim que existe de fato uma hybrid warfare, com uma nova estratégia, centrada na dimensão psicológica do conflito, contando com as novas gerações para a sua ação, propagação e projeção futura.

Sendo o espaço virtual o futuro, e contando com o fato de que na contemporaneidade é um meio e um palco no que toca aos mais nefastos e complexos conflitos, Jean-Claude Juncker (2017)161 apontava como objetivo para o ano de 2018, a criação de uma Agência Europeia de Cibersegurança. Em dezembro foi aprovada a transformação da ENISA na EU Cybersecurity Agency.

Com este capítulo podemos facilmente perceber que a União Europeia tem vindo a estar consciente dos desafios e tem respondido às ameaças, o que não significa que a sua resposta seja sempre eficaz. A ameaça da radicalização na Europa cresceu e, em comparação com o terrorismo pós 11M, têm-se vindo a readaptar e a encapotar aos olhos das sociedades e das autoridades competentes da sua prevenção. Parece assim que mais do que criar políticas e adaptar meios, é necessária uma consciencialização da sociedade civil para o problema e envolver essa mesma sociedade civil de forma ativa, concertada e preparada neste projeto a longo prazo.