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Diretrizes nacionais para o atendimento a crianças e adolescentes em situação

5 A DEFESA DO DIREITO A NÃO SER DE RUA É TAMBÉM DIREITO

5.2 Efetivação do direito à educação e a Política Nacional para População em

5.2.2 Diretrizes nacionais para o atendimento a crianças e adolescentes em situação

A aprovação da Política Nacional para a População em Situação de Rua, em 2009, representou avanço no que diz respeito à efetivação de direitos dessa população. Entretanto, tendo sido elaborada de acordo com os interesses dos movimentos de catadores de material reciclado, não garantiu as especificidades relativas às crianças e aos adolescentes (SECRETARIA NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE; ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE O PEQUENO NAZARENO, 2017, p. 22).

Nesse contexto, no período entre 2007 e 2014, os movimentos de defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes em situação de rua realizaram, ao menos, “90 (noventa) atos públicos de sensibilização pelo país reivindicando uma política nacional, 60 (sessenta) fóruns de debate sobre o tema em todos os estados da Federação.” (SECRETARIA NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE; ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE O PEQUENO NAZARENO, 2017, p. 22).

Assim, durante a 234ª Assembleia do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), foi apresentado um conjunto de subsídios para elaboração de uma Política Nacional de Atenção à Criança e ao Adolescente em Situação de Rua, propondo linhas gerais para o atendimento às crianças e aos adolescentes que vivem nas ruas das cidades brasileiras (SECRETARIA NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE; ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE O PEQUENO NAZARENO, 2017, p. 20).

O CONANDA deliberou, então, pela criação de um Grupo de Trabalho (GT) formado pelos Conselhos Nacionais de Assistência e Saúde, o Comitê Intersetorial de Avaliação e Monitoramento da Política Nacional de Inclusão da População de Rua (CIAMPRUA) e o próprio CONANDA, além dos ministérios da Educação, do Desenvolvimento Social e Agrário e da Saúde, tendo como finalidade formular e propor estratégias de articulação de

112 serviços e políticas públicas para o atendimento, promoção, proteção e defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes em situação de rua, nos termos do artigo 1º, da Resolução nº 173, do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, de 8 de abril de 2015 (CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, 2015, p. 1).

Discutindo a respeito dos subsídios para elaboração da Política Nacional107, o GT elencou quatro eixos considerados essenciais para uma política de atendimento108 às crianças e adolescentes em situação de rua: i) o conceito nacional sobre crianças e adolescentes; ii) a orientação nacional para educadores sociais em projetos, programas e serviços com crianças e adolescentes em situação de rua; iii) a inclusão de um tópico a respeito do acolhimento institucional para crianças e adolescentes em situação de rua na Resolução nº 01, do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) e do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), de 18 de junho de 2009, que estabeleceu orientações técnicas para o serviço de acolhimento institucional; e iv) os centros de referência especializados para população em situação de rua voltados para crianças e adolescentes (SECRETARIA NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE; ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE O PEQUENO NAZARENO, 2017, p. 21).

107O objetivo do documento é contribuir com a elaboração de uma política nacional para crianças e adolescentes em situação de rua, tendo como finalidade a garantia da efetivação de seus direitos fundamentais através da estruturação de uma Rede Nacional de atenção à criança e ao adolescente e em situação de rua e da composição de um Comitê Nacional (COMITÊ NACIONAL DE ATENÇÃO À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE EM SITUAÇÃO DE RUA, 2014, p. 23). Dentre as ações estratégicas estão: assistência social, cultura, desporto e lazer, direitos humanos, educação, intersetorialidade, planejamento, monitoramento e avaliação, profissionalização, saúde, segurança pública e justiça, e turismo. No que diz respeito à garantia do direito à educação, foram estabelecidas 7 (sete) diretrizes: i) qualificação dos profissionais da educação para o acolhimento de crianças e adolescentes em situação de rua na rede de ensino formal; ii) acesso e permanência de crianças na educação infantil, estejam elas na rua com sua família de origem ou não, de forma desburocratizada; iii) acesso e a permanência de crianças e adolescentes em situação de rua nas escolas, nas creches, bem como em outros espaços educativos, inclusive no ensino profissionalizante, por meio da implementação das mudanças administrativas e pedagógicas que contemplem as especificidades deste público; iv) ampliar as relações de convivência entre família e escola e outros espaços educativos à luz do Plano Nacional de Convivência Familiar e Comunitária (PNCFC), que estejam contemplados no projeto político pedagógico institucional; v) garantia da formação continuada dos profissionais da educação, incluindo a temática dos Direitos Humanos de crianças e de adolescentes em situação de rua e vulnerabilidades afins; vi) imprescindibilidade de se incentivar, implementar e garantir círculos restaurativos como boa prática de mediação de conflitos na escola e nos demais espaços educativos; e vii) realização de palestras de conscientização nas escolas sobre o preconceito contra crianças e contra adolescentes em situação de rua (COMITÊ NACIONAL DE ATENÇÃO À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE EM SITUAÇÃO DE RUA, 2014, p. 27-28).

108 Conforme a Amostragem realizada entre os anos de 2012 e 2013, os tipos de atendimento mais comumente recebidos por crianças e adolescentes em situação de rua foram: atividades lúdicas, 32%, acolhimento, 25%, e redução de danos, 17% (TORQUATO; ABREU; AQUINO, 2013, p. 27). Atividades relacionadas ao acompanhamento escolar e à profissionalização, por exemplo, representaram 0,5% dos atendimentos, cada uma (TORQUATO; ABREU; AQUINO, 2013, p. 27).

113 Como resultado dos trabalhos109, foram aprovadas: i) a Nota Técnica nº 01, do Ministério da Saúde (MS) e do Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), de 10 de maio de 2016, que dispõe sobre diretrizes, fluxos e fluxograma para atenção integral às mulheres e adolescentes em situação de rua e/ou usuárias de álcool e/ou crack/outras drogas e seus filhos recém-nascidos110; ii) a Resolução Conjunta nº 01, do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) e do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), de 15 de dezembro de 2016, que dispõe sobre o conceito e o atendimento de criança e adolescente em situação de rua111; iii) a Resolução nº187, do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, de 9 de março de 2017, que aprova o documento Orientações técnicas para educadores sociais de rua em programas, projetos e serviços com crianças e adolescentes em situação de rua112; e iv) a Resolução nº 01, do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) e do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), de 07 de junho de 2017, que estabelece as diretrizes políticas e metodológicas para o atendimento às crianças e adolescentes em situação de rua no âmbito da Política de Assistência Social113.

Todas as propostas e normativas resultantes do Grupo de Trabalho proposto pelo CONANDA são necessárias para a garantia dos direitos das crianças e dos adolescentes em situação de rua. Todavia, no que diz respeito à garantia do direito fundamental à educação, uma proposta merece destaque: criação de Centro de Referência especializado para população em situação de rua – crianças e adolescentes.

109 Como forma de promover a proteção e a garantia dos direitos das crianças e dos adolescentes em situação de rua, foi aprovada a Resolução nº 203, do CONANDA, de 14 de dezembro de 2017, que dispõe acerca da instituição de grupo de trabalho no âmbito dos Conselhos Estaduais, Distrital e Municipais dos Direitos da Criança e do Adolescente, considerando sua atribuição quanto à deliberação de políticas públicas para crianças e adolescentes no âmbito de sua unidade da federação. Nos termos do artigo 2º, da Resolução nº 203, do CONANDA/2017, o grupo de trabalho deve promover a integração e a articulação entre os integrantes do Sistema de Garantia de Direitos (SGD), as instâncias governamentais e a sociedade civil com vistas a viabilizar o conhecimento e a implementação das Diretrizes Nacionais para o Atendimento de Crianças e Adolescentes em Situação de Rua, sobretudo, no que se refere à articulação intersetorial entre políticas públicas, a exemplo da Assistência Social, Educação e Saúde, e órgãos do Sistema de Justiça, com objetivo de garantir a oferta de atendimento integrado e qualificado, bem como a promoção, proteção e garantia dos direitos de crianças e adolescentes em situação de rua e suas famílias (CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE, 2017, p. 2).

110A Nota Técnica 01/MS/MDS/2016 está disponível em: http://www.mds.gov.br/webarquivos/legislacao/bolsa_familia/nota_tecnica/nt_conjunta_01_MDS_msaude.pdf. 111 A Resolução Conjunta 01/CNAS/CONANDA/2016 está disponível em: <http://www.mds.gov.br/cnas/legislacao/resolucoes/arquivos-2016/resolucoes-2016/>.

112 A Resolução 187/CONANDA/2017 está disponível em: http://www.direitosdacrianca.gov.br/conanda/resolucoes/resolucao-no-187-de-23-de-maio-de-2017/view.

113 A Resolução nº 01/CNAS/CONANDA/2017 está disponível em:

<http://www.mds.gov.br/cnas/legislacao/resolucoes/arquivos-2017/cnas-2017-001-07-06-2017-resolucao- conjunta-cnas-e-conanda-no-1-de-2017.pdf/view?searchterm=None>.

114 A criação do CENTRO-POP, como discutido acima, resultou em uma das principais ofertas de atendimento à população em situação de rua, todavia, “este equipamento que se encontra em fase de implementação em todo o País, tem recorte etário restrito para a população acima de 18 anos, por isso não atende crianças e adolescentes.” (SECRETARIA NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE; ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE O PEQUENO NAZARENO, 2017, p. 63).

Segundo a proposta, o Centro de Referência voltado para a população infantojuvenil em situação de rua deve ser implementado por municípios, estados e Distrito Federal a partir de um diagnóstico quantitativo e qualitativo desta população, ofertando os seguintes serviços: i) serviço de Educação Social de Rua integrado ao Centro de Referência especializado para população em situação de rua – crianças e adolescentes, cuja metodologia difere do tradicional Serviço especializado de abordagem social, incorporando aspectos da pedagogia de Paulo Freire; ii) atendimento de equipe multidisciplinar; iii) segurança alimentar, nutricional e autocuidado; iv) Ouvidoria; e v) bolsa-convivência (SECRETARIA NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE; ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE O PEQUENO NAZARENO, 2017, p. 65).

A prestação de serviço por equipe especializada (formada por assistente social, psicólogo, advogado, arte educador, nutricionista, administrador, dentre outros profissionais) deverá permitir a recepção das crianças e adolescentes em situação de rua e de suas famílias, o fortalecimento das relações de mediação e o acompanhamento da criança e do adolescente durante o retorno familiar, garantido a superação da situação de vulnerabilidade e o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários, bem como funcionamento ininterrupto, inclusive aos finais de semana e implementação de sistema de informações (SECRETARIA NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE; ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE O PEQUENO NAZARENO, 2017, p. 65-66).

Além dos serviços diretamente ofertados, a proposta inclui acesso a outros serviços, tais como: i) registro de nascimento e documentação civil; ii) benefícios sociais; iii) acolhimento em família acolhedora ou acolhimento institucional; iv) saúde; v) educação; vi) apoio à inclusão socioeconômica; vii) habitação; viii) cultura; ix) esporte; x) proteção e defesa; e xi) rede socioassistencial e organizações da sociedade civil (SECRETARIA NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE; ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE O PEQUENO NAZARENO, 2017, p. 66-68).

Especificamente em relação à garantia do direito à educação, o Grupo de Trabalho destaca a necessidade de parceria com a rede de ensino municipal, estadual ou distrital com a

115 finalidade de que possam recepcionar crianças e adolescentes em situação e rua em suas salas de aula, garantindo, ainda, profissional responsável pelo acompanhamento individual, construção de metodologias diferenciadas para aprendizagem (considerando a irregularidade da frequência à escola durante o período de vivência em situação de rua e a distância dos padrões de idade escolar) e um fluxo comunicativo entre a escola, a família, o Centro e o acolhimento institucional, quando for o caso, para que o processo de aprendizagem e a convivência no ambiente escolar possam ser acompanhados (SECRETARIA NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE; ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE O PEQUENO NAZARENO, 2017, p. 67).

É perceptível, portanto, a partir dessas considerações, que a exigibilidade judicial é um meio de exigência quanto à efetivação do direito subjetivo à educação, uma vez que, no contexto de um Estado Social, “o fundamento para a exigência de cumprimento de uma prestação positiva por parte da Administração encontra-se nas leis e políticas públicas constitucionalmente delineadas, que constituem a base para a ação concreta dos Poderes Públicos” (DUARTE, 2006, p. 273). Assim, desrespeitados tais parâmetros, há uma reação dos cidadãos através da legitimidade de agir, consequência processual para solucionar a irregularidade (DUARTE, 2006, p. 273).

5.3 A previsão da responsabilidade educacional como forma de efetivação do direito à