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Parte IV: A via do NF-κB e a resistência ao MTX

5. Discussão

Resistência ao MTX e sua associação com a proliferação celular

A resistência a drogas é um fenômeno com causas multifatoriais. Quanto ao MTX especificamente, os principais mecanismos moleculares de resistência foram mencionados na Introdução deste trabalho. Uma vez que o MTX (e, mais especificamente, suas versões com cauda poliglutâmica, MTXPGs) interfere na síntese de novos nucleotídeos, é de se esperar que sua ação seja dependente da ciclagem celular – mesmo que a concentração de MTXPGs per se não esteja relacionada com a fase de síntese do ciclo celular (57). De fato, já foi observado que a produção da enzima DHFR, o principal alvo do MTX, varia entre as etapas do ciclo celular. Em linhagem celular de ovário murino, a síntese da DHFR aumentou 2 h antes do início da fase S e permaneceu elevada até o fim desta etapa; durante este período, houve um aumento de 90% da atividade enzimática, resultado do aumento de 250% nos níveis da enzima (167).

O presente trabalho mostrou a existência de correlação positiva entre o tempo de duplicação celular e o nível de resistência das células leucêmicas ao MTX (considerados como o valor do IC50). Algumas linhagens de LLA com crescimento lento apresentaram tempo de duplicação ao redor de 72 h, de modo que durante o tratamento curto com MTX (48 h) uma parcela significativa de suas células pode não ter entrado na fase S do ciclo, resultando em uma aparente resistência. Um tempo de tratamento longo (96 h) permitiu que todas as células passassem pelo menos uma vez pela fase de síntese do ciclo celular, experimentando, assim, a ação citotóxica do MTX. Nesta condição, a correlação entre tempo de duplicação e resistência ao MTX foi perdida, de modo que a resistência à droga em tempos longos de tratamento deve ser atribuída a outros mecanismos moleculares não relacionados à velocidade da proliferação.

Na oncologia clínica, uma atenção crescente tem sido dada às células-tronco cancerígenas (cancer stem cells), caracterizadas por uma considerável semelhança com as células-tronco normais, mas capazes de darem origem a todos os tipos de células que compõem uma neoplasia. Algumas dessas células-tronco cancerígenas podem ser quiescentes, isto é, apresentar tempo de duplicação extremamente lento (168,169), o que as torna particularmente resistentes a quimioterápicos que dependam do ciclo celular para atuarem, como é o caso do MTX. Uma estratégia eficaz de combate a essas células com proliferação lenta foi reportada em câncer de pulmão: ao contrário da gemcitabina, um quimioterápico que

elimina preferencialmente células em divisão, inibidores da sobrevivência celular (bloqueadores de Bcl-2/Bcl-xL) se mostraram agentes terapêuticos promissores dado que tais células expressam constitutivamente os alvos destes inibidores (170). Regimes poliquimioterápicos que combinem MTX com agentes que atuem em células quiescentes podem vir a ser vantajosos no tratamento da LLA.

Efeitos do MTX no metaboloma celular

Crescente atenção tem sido dada à metabolômica clínica – área da metabolômica que busca determinar o perfil metabólico de amostras biológicas em patologias e condições clínicas visando à melhora no diagnóstico (e, portanto, na estratificação dos pacientes) e na avaliação da resposta à terapia (171–173). Um breve apanhado sobre os principais trabalhos em metabolômica clínica – incluindo os ainda incipientes trabalhos feitos em leucemia – pode ser encontrado em Canevarolo e cols. (109). São poucos os trabalhos que versaram sobre os efeitos metabólicos do MTX, aplicados à artrite reumatoide (174,175), à hepatotoxicidade (176), ao osteossarcoma (177) ou que encontraram biomarcadores metabólicos (MTXPGs e homocisteína) no soro de pacientes que receberam o antifolato (178,179). Um destaque deve ser dado ao estudo de Tedeschi e cols. (180) que, usando análise de fluxo (marcação com carbono 13C), rastreou metabólitos em linhagens de câncer de mama tratadas com MTX, de maneira que uma das principais observações dos autores foi precisamente o acúmulo de glicina após o tratamento das células com o quimioterápico.

Os achados metabolômicos de nosso trabalho parecem apontar na direção do:

 Aumento da concentração da glicina: o metabólito mais modulado pelo MTX foi a glicina. O quimioterápico aumentou as concentrações intracelulares deste aminoácido de modo muito consistente, e duas explicações podem ser oferecidas para isto: uma relacionada à maior síntese, outra ao menor catabolismo deste aminoácido. Com relação à síntese, já foi demonstrado em câncer que uma significativa parcela do carbono que percorre a via glicolítica é divergida para a biossíntese de serina e glicina por meio da enzima fosfoglicerato desidrogenase (PHGDH), a partir do intermediário glicolítico 3-fosfoglicerato, reduzindo com isso a produção de lactato, alanina e piruvato (181). Curiosamente, os dados de expressão de PHGDH se mostraram inversamente correlacionados à concentração de glutationa e à resistência ao MTX em nossas linhagens de LLA, mas nenhuma associação foi encontrada com a concentração de glicina (dados não mostrados). Quanto ao catabolismo da glicina, uma

explicação plausível para o seu acúmulo encontra-se no sistema de clivagem da glicina (glycine cleavage system, GCS) – o principal sistema de catabolismo deste aminoácido, composto por uma série de enzimas e desencadeado por altas concentrações da glicina (182) (Figura 24).

Figura 24. Reação do sistema de clivagem da glicina, sugerindo que a causa do acúmulo

deste aminoácido pode ser a escassez de THF (por inibição da enzima DHFR pelo MTX) e NAD+ (observado empiricamente em nossos experimentos metabolômicos).

O produto desta reação, 5,10-metileno-THF, é um dos poucos doadores de carbono utilizado na biossíntese de purinas e metionina (183). O MTX, ao inibir a DHFR, reduziu drasticamente os níveis de THF, produto da enzima, bem como as concentrações de NAD+. A redução da disponibilidade de dois substratos do principal sistema de metabolização da glicina pode ter resultado no acúmulo do aminoácido. Neste cenário, o aumento da concentração da glicina seria uma consequência indireta da ação do MTX e não teria necessariamente atribuição em sua ação citotóxica – ainda que esta hipótese careça de comprovação.

No trabalho mencionado de Tedeschi e cols. (180), a concentração de glicina em média dobrou após o tratamento com MTX, o que não difere significativamente das concentrações que observamos em nossas análises. A glicina é importada do meio extracelular, mas a sua taxa de importação, assim como a sua utilização na síntese proteica, são reduzidas pelo MTX. A conversão de serina à glicina adquire a mesma velocidade que a via oposta, pois tanto THF (que favorece a reação) quanto 5-metenil-THF (que favorece o sentido oposto) estão comprometidos pela ação do MTX. Desta forma, uma elevação na concentração de glicina não era esperada. Por fim, após desconsiderarem a colina como provável origem do aumento da glicina, os autores atribuíram este acúmulo a uma fonte metabólica desconhecida.

 Inibição da via das pentoses-fosfato e da síntese de purinas: três metabólitos que tiveram suas concentrações diminuídas pelo MTX (o UDP-glicuronato, seu precursor, a

UDP-glicose e o mio-inositol) são produzidos a partir da glicose-6-fosfato quando esta é desviada da via glicolítica para a via das pentoses-fosfato por ação da enzima glicose-6- fosfato desidrogenase (G6PD). A via das pentoses-fosfato é anabólica e culmina na produção de NADPH e ribose-5-fosfato (Figura 25). Um dos usos do NADPH é prevenir o estresse oxidativo, ao reduzir a glutationa oxidada via glutationa redutase (GSSG + NADPH  2 GSH + NADP+); já a ribose-5-fosfato é um precursor da via das purinas e formará nucleotídeos e coenzimas como o ATP, NADH, FADH2 e coenzima A. Já foi observado que o MTX é capaz de inibir a enzima G6PD in vitro (101), o que indica que a inibição in vivo da via das pentoses-fosfato pelo MTX é um fenômeno plausível. A inibição da via das pentoses- fosfato culmina na escassez de purinas, incluindo a adenina, fundamental para a síntese de NAD+, hipoxantina, AMP, ADP e ATP – todos inibidos pelo tratamento com MTX, sendo que a redução concomitante da concentração de AMP, ADP e ATP ainda atesta a favor da inibição da enzima ATIC (5-aminoimidazol-4-carboxamida ribonucleotídeo formiltransferase/IMP ciclohidrolase) – o principal alvo do MTX em seu mecanismo anti- inflamatório (184). A inibição da síntese de purinas pelo MTX é clássica e já foi mostrada em outros trabalhos (185,186).

Figura 25. Vários metabólitos das vias anabólicas das pentoses-fosfato e das purinas tiveram

sua concentração reduzida após tratamento com MTX (em azul). A causa desse fenômeno pode ser a inibição das enzimas G6PD e ATIC, respectivamente.

 Desvio da síntese de pirimidinas: indicado pelo aumento da concentração de uridina e dCTP. Uma explicação para este achado é que o MTX inibe a enzima timidilato sintase (TYMS), que converte dUMP a dTMP. Com o bloqueio desta conversão, o excesso de dUMP pode ser desviado para a formação de uridina e dCTP (Figura 26). Tedeschi e cols. (180), no entanto, não observaram alteração nas concentrações de pirimidinas após o tratamento das linhagens de câncer de mama com MTX.

Figura 26. A elevação da concentração de uridina e dCTP após tratamento com MTX foi

provavelmente causada pela inibição de TYMS por MTX.

 Acúmulo de aminoácidos e inibição do ciclo de Krebs: verificou-se um

aumento da concentração de diversos aminoácidos: isoleucina, valina, leucina, fenilalanina, tirosina, treonina, alanina, arginina, histidina. Todos eles compartilham a particularidade de seus produtos de degradação participarem diretamente do metabolismo energético (Figura

27). Os aminoácidos essenciais de cadeia ramificada (Iso, Val e Leu) produzem succinil-CoA,

precursor do succinato, partícipe do ciclo de Krebs e reduzido com o tratamento por MTX. A treonina pode ser convertida em glicina (187) ou gerar propionil-CoA, que por sua vez é metabolizado em acetil-CoA e succinil-CoA – ambos implicados no ciclo do ácido cítrico. A fenilalanina, outro aminoácido essencial, produz fumarato, componente do ciclo do ácido cítrico. A alanina pode ser convertida a piruvato, que irá produzir acetil-CoA. A arginina participa do ciclo da ureia, da síntese de diversos outros aminoácidos, mas também da produção de piruvato. A histidina, outro aminoácido essencial, pode produzir glutamato, e este, 2-oxoglutarato, o qual participa do ciclo do acido cítrico. Outro precursor de succinato, o

ácido 4-aminobutírico (GABA), também foi reduzido pelo tratamento com a droga. No entanto, trabalhando com linhagem celular de câncer de próstata tratadas com MTX por 24 h, Tedeschi e cols. (186) mostraram a ausência de alteração no consumo de glicose, produção de lactato e atividade da oxidação fosforilativa em células tratadas com o quimioterápico.

Figura 27. Em vermelho, aminoácidos que tiveram suas concentrações aumentadas após

tratamento com MTX; já succinato e GABA tiveram suas concentrações reduzidas, sugerindo uma inibição global do ciclo de Krebs.

 Inibição do metabolismo de fosfolipídios: a redução de fosfocolina e sn- glicero-3-fosfocolina, precursores da fosfatidilcolina – o principal componente das membranas celulares, que responde por 50% do conteúdo lipídico membranar (188) – indica que a parada no ciclo celular provocada pela escassez de nucleotídeos (devido ao tratamento com MTX) está associada à redução da produção dos componentes que constituirão a membrana celular das células-filhas. Na continuação desta via, a fosfocolina produz colina, que por sua vez é convertida em betaína e esta em dimetilglicina – também reduzida pelo

MTX (Figura 28). Em estudo metabolômico por RMN de linhagem celular de osteossarcoma, Lamego e cols. também concluíram que o MTX parece inibir a síntese de membranas (177).

Figura 28. Metabolismo de fosfolipídeos. Em azul, metabólitos precursores da

fosfatidilcolina, o principal componente das membranas celulares, que tiveram sua concentração reduzida por ação do MTX.

 Aumento do ácido fórmico (formato): a importância do formato no metabolismo intermediário é reconhecida desde na década de 1940, quando foi mostrado que o carbono do formato pode ser incorporado em nucleotídeos e na síntese da serina (189,190). Esta incorporação, entretanto, é dependente de tetrahidrofolato (THF) (191), de modo que o metabolismo do formato está intimamente ligado ao do folato (192) (Figura 29). Na década de 1950, foi verificado que ratos com dieta deficiente em ácido fólico apresentam aumento da concentração de formato no plasma e na urina (193,194). Uma explicação para estes achados veio posteriormente: o formato pode ser produzido por vias dependentes ou independentes de folato e a elevação dos níveis de formato no plasma de animais privados de folato provavelmente foi devida à contínua produção de formato pelas vias folato-independentes, dentre as quais o catabolismo de metanol, triptofano e aminoácidos de cadeia ramificada (192) (Figura 29). Um aumento na produção de formato a partir da dimetilglicina e da sarcosina foi observado, por exemplo, em ratos com dieta restritiva a folato (195). Este resultado foi atribuído ao fato de que as enzimas dimetilglicina desidrogenase e sarcosina desidrogenase produzem, a partir de seus respectivos substratos, formaldeído (que é então convertido em formato pela enzima formaldeído desidrogenase) na ausência de THF (196) – exatamente o folato mais inibido pela ação do MTX.

 Inibição da interiorização de ácidos biliares: um dos achados metabolômicos mais intrigantes foi a constatação de que o tratamento com MTX reduziu a concentração intracelular de colato e glicocolato, dois ácidos biliares. Provavelmente, esses ácidos biliares são oriundos do soro fetal bovino que compõe o meio de cultura das linhagens e a

internalização destes ácidos foi direta ou indiretamente modulada pelo MTX. Tais ácidos, produzidos no fígado a partir do colesterol, são internalizados pelos transportadores ABCC3 e ABCC8, que também têm a capacidade de internalizar o MTX (197,198) ou externalizá-lo,

Figura 29. Em cima, a reação que incorpora o formato no pool dos folatos, via enzima

MTHFD1. A escassez de THF, devido à inibição da DHFR pelo MTX, é a provável causa do acúmulo de formato. Embaixo, o formato sendo produzido a partir do formaldeído (subproduto de diversas reações enzimáticas), em vias folato-independentes.

desde que este não possua uma cauda poliglutâmica (199). O transportador ABCC3 já foi associado a prognóstico em LLA infantil (200,201), e SNPs no gene do transportador de ácido fólico (SLC19A1, que também interioriza MTX e ácidos biliares) foram preditivas do clearance da droga em crianças com LLA (55). Já foi mostrado que ácidos biliares como taurocolato e colato são eficientes inibidores competitivos da absorção do MTX em hepatócitos (202,203). Nossa hipótese é que o fenômeno oposto esteja ocorrendo em células leucêmicas, isto é, que o MTX esteja inibindo (por competição simples ou algum mecanismo regulatório) a importação de ácido biliares do meio extracelular. Ademais, em uma análise preliminar, a expressão gênica do transportador de folatos (SLC19A1) mostrou-se positivamente correlacionada à: i) sensibilidade ao MTX (IC50 para 48 h) e ii) concentração de colato (p = 0,02) em células tratadas com o antifolato (dados não mostrados). Experimentos futuros poderão mostrar se a concentração de ácidos biliares tem potencial preditivo da resistência ao MTX.

 Sinais CB-MTX e CB-MTX2: experimentos adicionais em RMN (de tipo 2D TOCSY e NOESY, isto é, modalidades de aquisição de dados que permitem a determinação da estrutura química do composto) e em espectrometria de massas possibilitarão a identificação inequívoca dos metabólitos responsáveis por estes sinais.

Associação entre concentração metabólica e resistência ao MTX

A análise do metaboloma das linhagens de LLA evidenciou uma interessante correlação entre concentração metabólica e resistência ao MTX. Em (somente) linhagens T- derivadas, os metabólitos em questão foram:

 4-hidroxifenilacetato: metabólito formado a partir do aminoácido tirosina – sendo seu catabolismo feito principalmente por bactérias entéricas (204). Não encontramos nenhuma referência na literatura que tenha estudado este metabólito no contexto da leucemia ou do MTX. É possível que a sua correlação com a resistência ao MTX tenha sido fortuita.

 Histidina: aminoácido essencial ao organismo, a histidina tem propriedades antioxidantes, antissecretórias e anti-inflamatórias – esta última, atribuída à capacidade de seu anel imidazol de sequestrar ROS produzido nos tecidos inflamados (205). A histidina parece suprimir a expressão de citocinas pró-inflamatórias em adipócitos, possivelmente via NF-κB (206). Nenhum registro específico da relação deste aminoácido com leucemia ou MTX foi encontrado.

 Uridina: único metabólico que apresentou correlação inversa à resistência ao MTX em linhagens tratadas com a droga. Formado pela ligação de uma uracila com uma ribose, precursor de UMP, UDP e UTP, também pode ser convertido nos demais nucleosídeos pirimidínicos (isto é, que contêm citosina ou timina). Vários estudos clínicos mostraram sua capacidade de ―resgatar‖ pacientes da toxicidade causada por 5-fluorouracil (5-FU) – molécula que inibe a enzima timidilato sintase (TYMS) – sem alterar sua atividade antitumoral (207–209). Em linhagem promielocítica HL-60, a suplementação do meio de cultura com uridina provocou uma inibição dose-resposta da proliferação celular, resultando na parada do ciclo celular em fase G2/M – fenômeno que precede a formação de células diferenciadas (210). Este efeito foi reduzido quando as células foram cotratadas com NBMPR, um inibidor do transportador de nucleosídeos (210). As concentrações de uridina apenas se correlacionaram com a resistência ao MTX em células tratadas com a droga; como discutido no tópico anterior, um dos efeitos do MTX, ao inibir TYMS, foi desviar o

metabolismo das pirimidinas, aumentando a concentração de uridina e dCTP. O MTX, ao bloquear TYMS, gera escassez de dTTP e um substancial aumento de dUTP (211). A incorporação de dUTP na síntese de DNA ativa o sistema de reparo; no entanto, uma vez que a escassez de dTTP persiste, incontáveis quebras na dupla fita do DNA ocorrem, levando a célula à morte (212,213). A uridina, portanto, seria uma espécie de indicador da eficácia do MTX em promover o desbalanço nucleotídico e, em último caso, do grau de resistência celular ao antifolato. Novos experimentos poderão mostrar se a aferição deste parâmetro (inclusive in vitro) teria potencial preditivo da resposta clínica dos pacientes ao quimioterápico.

Quatro metabólitos se correlacionaram com a resistência ao MTX quando todas as células foram consideradas conjuntamente (B- e T-derivadas):

 Citrato: maiores concentrações deste aminoácido foram encontradas nas células mais resistentes ao MTX somente após o tratamento com a droga. Este achado está em concordância com a hipótese que levantamos no tópico anterior: o MTX provocaria uma redução do ciclo do ácido cítrico, a julgar pela diminuição do succinato e do 4-aminobutirato, bem como pelo aumento dos aminoácidos que compõem as vias anapleróticas, sugerindo a diminuição do ―escoamento‖ dessas vias para o ciclo do ácido cítrico. Se esta proposição estiver correta, a inibição deste ciclo metabólico seria tão mais proeminente quanto mais sensível a célula for à droga. Apesar de o citrato ter efeito citotóxico em células leucêmicas (214), o tratamento da leucemia com MTX em meio suplementado com citrato (ou outras abordagens de ativação ou bloqueio do ciclo do acido cítrico) evidenciaria se a interação entre droga e metabólito é sinérgica ou antagônica, expandindo, portanto, a compreensão dos efeitos biológicos do MTX.

A correlação positiva entre resistência ao MTX e concentrações intracelulares dos três metabólitos a seguir, tanto antes quanto depois do tratamento com a droga, sugere que o quimioterápico não está modulando a concentração destes metabólitos. As características basais do metaboloma das linhagens parecem ser determinantes a priori do fenótipo de resistência celular e pouco sofrem com o distúrbio metabólico provocado pelo MTX.

 Asparagina: já é sabido desde a década de 1970 que L-asparaginase (um importante quimioterápico que depleta a asparagina do sangue) e MTX podem interagir sinergicamente, dependendo do regime de aplicação das drogas (215–217). Aplicações de MTX seguidas de L-asparaginase se mostraram bem mais eficientes in vivo do que a ordem

inversa dessa aplicação (216). Isto porque a depleção severa de asparagina causou diminuição da síntese proteica e de RNA ribossômico e parada do ciclo celular (218), o que desfavoreceu a ação do MTX. A dose das drogas também pode influenciar no resultado da interação: em linhagem leucêmica murina, o pré-tratamento com baixas doses de L-asparaginase predispôs as células aos efeitos do MTX; altas doses da enzima, ao contrário, protegeram as células do efeito do antifolato (217). A L-asparaginase não alterou a taxa de importação celular do MTX, mas provocou aumento do tempo de duplicação celular e redução dos níveis de MTXPGs, a forma ativa do antifolato retida intracelularmente (219,220). Em suma, estes trabalhos indicam que a depleção de asparagina extracelular provoca um aumento do tempo de duplicação da leucemia, o que induziria resistência ao MTX. Nossos resultados indicam que altas concentrações intracelulares (e não a depleção) do aminoácido estão associadas com resistência ao antifolato, o que sugere que um mecanismo distinto de regulação possa estar acontecendo. O trabalho recente de Krall e cols. (221) demonstrou pela primeira vez uma função metabólica para a asparagina, muito além de apenas servir como matéria-prima para a síntese proteica. Foi mostrado que asparagina funciona como um fator de troca no transporte de aminoácidos, especialmente serina, arginina e histidina e, desta forma, regula a ativação do complexo 1 de Mtor (mTORC1), a síntese proteica e de nucleotídeos e a proliferação celular.

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