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Neste estudo compararam-se os resultados dos exames citológicos e histopatológicos em cadelas com neoplasia mamária. A população estudada compreendeu um total de 31 lesões neoplásicas, nas quais se procedeu a análise citológica (através de PAAF) e histopatológica, tendo sido efetuados testes de validação diagnóstica calculando-se os indicadores: sensibilidade, especificidade, valor preditivo positivo, valor preditivo negativo e acurácia do exame citológico, comparativamente ao exame histopatológico, considerado como o teste de referência (“gold standard”).

De um modo geral, importa referir que a sensibilidade é a capacidade de um teste diagnóstico identificar os verdadeiros positivos nos indivíduos verdadeiramente doentes, neste caso concreto as neoplasias malignas. Quando um teste é sensível raramente não se detectam os indivíduos com a doença. A especificidade é a capacidade de um teste diagnóstico identificar os verdadeiros negativos nos indivíduos verdadeiramente sãos. O Valor Preditivo Positivo é a proporção de indivíduos verdadeiramente positivos em relação aos diagnosticados positivos apresentados pelo teste, enquanto o Valor Preditivo Negativo é a proporção de indivíduos verdadeiramente negativos em relação aos diagnósticos negativos realizados pelo teste. Os valores preditivos de um teste são variáveis e dependem da prevalência da doença na população (a sensibilidade e a especificidade não são afectadas). No estudo de uma doença cuja prevalência é baixa, mesmo com um teste muito específico, vão-se obter muitos resultados falsos positivos, devido ao elevado número de indivíduos sãos. Se a prevalência é alta, pode-se esperar um maior número de resultados falsos negativos, na aplicação de teste com boa sensibilidade. Portanto, quanto menor for a prevalência da doença, menor será o valor preditivo do resultado positivo e maior o valor preditivo do resultado negativo. E o contrário no caso de a prevalência ser alta. A acurácia diagnóstica é a proporção de acertos, ou seja, o total dos verdadeiramente positivos e verdadeiramente negativos, em relação à amostra estudada (Misodor, 2008).

Neste estudo, o exame citológico apresentou os seguintes valores: sensibilidade de 94,74%, especificidade de 100%, VPP de 100%, VPN de 80% e acurácia diagnóstica de 95,65%, sendo estes semelhantes a estudos anteriores (Cassali et al., 2007; Varallo, 2013).

Cassali et al. (2007) realizaram um estudo envolvendo 77 canídeos fêmeas. Obtiveram uma especificidade de 88,6%, sensibilidade de 100 %; VPP de 84%, VPN de 100% e

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acurácia de 92,86% para a deteção de neoplasias malignas. Também Sontas et al. (2012) referem que foi possível determinar uma especificidade de 100%, sensibilidade de 96,2%; VPP de 100%, VPN de 66,7% e acurácia de 96,5% num estudo envolvendo 55 canídeos fêmeas. Num outro estudo mais recente levado a cabo por Varallo (2013), os resultados obtidos em 57 cadelas revelaram 83,9% de sensibilidade, 100% de especificidade, 100% de valor preditivo positivo (VPP), 91 % de valor preditivo negativo (VPN) e 84,1% de acurácia da técnica citológica em detectar neoplasias mamárias malignas.

Os estudos efetuados consideram que o exame citopatológico é um método fiável que visa a análise de possíveis alterações na morfologia celular de um tecido para, assim, estabelecer um diagnóstico definitivo ou presuntivo (Varallo, 2013).Por outro lado, a citologia obtida por PAAF é um procedimento clínico rápido, de fácil execução, pouco dispendioso, não invasivo e que não requer equipamentos sofisticados. Por estas razões, a PAAF é uma técnica muito utilizada na prática clínica, para o estabelecimento do diagnóstico de lesões neoplásicas e não neoplásicas (Cassali et al, 2007).

Neste trabalho, em oito (25,8%) lesões não foi possível emitir um diagnóstico citológico. Esta percentagem é semelhante à apresentada por Sontas et al. (2012), cujas amostras inadequadas na análise atingiram os 27,7%. Tal como no nosso trabalho, estes autores, ao considerarem estas análises para o cálculo dos testes de validação, provocam a diminuição dos seus valores, que descem para sensibilidade de 60,7%, VPN de 15,4% e acurácia diagnóstica 63,3% (Sontas et al., 2012).

De facto, deve existir uma preocupação acrescida com os procedimentos de colheita de material e respectivo envio para o laboratório de referência, os quais devem ser realizados de forma adequada, no sentido de se obter um diagnóstico citológico conclusivo. O acondicionamento dos esfregaços em porta-lâminas apropriados, e o afastamento destes de locais com possíveis vapores de formol é muito importante para a preservação do material, pois os vapores de formol alteram o material da amostra, modificando os detalhes celulares e as afinidades tintoriais da amostra (Sontas et al., 2012). A informação acerca da localização da lesão e do tipo de tecido é extremamente útil para a emissão de um diagnóstico de boa qualidade. Idealmente, quem deve efectuar a colheita de material para exame citológico deve ser a pessoa que vai observar a lâmina ao microscópio (Simon et al., 2009). Importa referir que neste estudo não foi o patologista a realizar a PAAF, pelo que foi de extrema importância a identificação dos esfregaços enviados.

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A citologia aspirativa de uma neoplasia benigna é por vezes de difícil interpretação; geralmente os esfregaços obtidos são pobres em células; contêm elementos típicos da mama normal (adipócitos, sangue, e algumas células de revestimento ductal) e células inflamatórias. Neste estudo, as amostras pouco celulares, e portanto inconclusivas, corresponderam a carcinomas complexos e a fibroadenomas. Por outro lado, as neoplasias diagnosticadas como malignas caracterizaram-se por hipercelularidade, enquanto as benignas se apresentaram moderadamente celulares. A citologia aspirativa de uma neoplasia maligna na qual se tenha obtido um número muito reduzido de células, não só dificulta o diagnóstico correcto pela fraca probabilidade de encontrar formas citológicas anormais, como pode assumir, à partida, a aparência de uma neoplasia benigna (Simon et al, 2009). Por outro lado, a maioria dos tumores mamários é complexo ou misto, o que nem sempre permite uma colheita adequada e está associada a uma população heterogénea, nem sempre representada na citologia. Também a presença de células necrosadas, sangue ou macrófagos e a presença de grande quantidade de líquidos durante a colheita das amostras pode dificultar a obtenção de um bom esfregaço (Sontas et al., 2012).

Uma limitação apontada à análise citológica é a impossibilidade de esta fornecer informações sobre a arquitectura geral da massa aspirada e de não estabelecer a relação das células com os tecidos vizinhos (Simon et al., 2009; Sontas et al 2012; Varallo 2013).

Relativamente à análise histológica, verificou-se que 83,9% das lesões eram malignas e 16,1% benignas, ou seja, o número das neoplasias malignas superaram de longe as benignas. No estudo de Colodel et al. (2012), obtiveram-se resultados semelhantes: os carcinomas representaram 84,6% dos nódulos mamários, enquanto que os tumores benignos, representaram apenas 9,7%. Outros estudos referiram que cerca de um terço a metade das neoplasias mamárias caninas corresponderam a neoplasias malignas (Misdorp, 2002), sendo as neoplasias malignas frequentemente sobrediagnosticadas. Neste trabalho, a maioria das lesões apresentou um diâmetro superior a 3 cm, sendo provavelmente lesões que surgiram há bastante tempo, o que terá permitido a sua evolução neoplásica.

Dentro do grupo dos carcinomas simples (constituídos por um único tipo de célula epitelial), o tipo histológico que predominou foi o carcinoma tubulopapilar; seguiram-se os carcinomas complexos e os de tipo especial. A literatura refere que os carcinomas são as neoplasias mais frequentes, assumindo padrões histológicos distintos,

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nomeadamente sólido ou tubulopapilar. Apesar dos valores de sensibilidade elevados para a citologia observados neste e noutros trabalhos prévios, o exame histopatológico é o de eleição para a identificação das características de uma neoplasia, pois permite avaliar o grau histológico, a invasão linfática e vascular (Varallo, 2013). Possibilita ainda o exame da arquitetura e dos padrões de crescimento da neoplasia, ao analisar um fragmento do tecido neoplásico; permite a observação da sua relação com os tecidos circundantes, bem como a correta caracterização e diferenciação dos tipos celulares envolvidos (Magalhães et al., 2001; Varallo, 2013) Desta forma, proporciona o diagnóstico conclusivo na maioria das situações neoplásicas (Varallo, 2013) permitindo estabelecer o comportamento biológico da neoplasia e o prognóstico para um animal específico (Cassali et al., 2011).

A multiplicidade lesional, característica dos tumores mamários da cadela, cria dificuldades específicas. Ao colher-se um fragmento não há garantias de que a zona seleccionada seja a que apresenta malignidade mais elevada e mesmo quando se retira material na íntegra, a partir de uma ou mais neoplasias, há sempre a possibilidade de não serem escolhidas as zonas mais representativas da lesão (Sontas et al., 2012). Desta forma, é fundamental retirar amostras de vários pontos da lesão, procurando igualmente abranger zonas de transição entre o processo lesional e os tecidos aparentemente sãos; esta larga abrangência pretende não só permitir ao anatomopatologista a apreciação do grau de invasão local e da reacção inflamatória envolvente, mas também possibilitar a avaliação da existência de lesões de displasia mamária, que com frequência acompanham as neoplasias (Simon, 2009). Estes cuidados na recolha dos fragmentos são particularmente importantes, dado que as neoplasias da mama da cadela atingem, por vezes, dimensões muito consideráveis, dificultando o seu envio integral para o laboratório. A dimensão dos tumores também pode criar problemas na escolha das áreas a biopsiar, pelo que nos casos de lesões volumosas ou múltiplas, devem ser colhidas múltiplas amostras (Simon et al., 2009). No presente estudo, foram colhidas múltiplas preparações de cada nódulo sempre que possível, razão pela qual não houve um número superior de diagnósticos inconclusivos.

Quanto à caracterização etária das cadelas com neoplasias mamárias, obteve-se uma média de 11 anos, sendo que a faixa com maior percentagem foi a de 13 anos (31,3% n=5). Também Varallo et al. (2013) observaram que cadelas com 9, 10, 11 e 12 anos de idade desenvolveram neoplasias mamárias com maior incidência. A apresentação clássica da doença inclui fêmeas de meia-idade a idosas, entre sete a doze anos de idade,

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e com o envolvimento de mais de uma glândula (Rutteman et al., 2001; Misdorp, 2002; Varallo et al., 2013), à semelhança do observado no presente estudo.

Relativamente à localização dos tumores de mama, verificou-se que a grande percentagem surge nas mamas abdominais com 67,6% dos casos, seguido pelas glândulas inguinais com 20,6% dos animais e por fim as glândulas torácicas com 11,8%, à semelhança dos estudos realizados por Cassali et al. (2007), Simon et al. (2009). Sontas et al. (2012) e Varallo (2013) observaram que as mamas abdominais eram as mais afectadas, seguidas das inguinais e torácicas. Este aspecto não está relacionado com o comportamento tumoral, mas com o maior volume destas glândulas e com as correspondentes alterações proliferativas em resposta aos estrogénios (Varallo, 2013). Sontas et al., (2013) refere que não se conhece a razão pela qual a frequência nas glândulas mamárias abdominais é maior.

Observou-se que a raça indeterminada foi a que apresentou uma maior percentagem (75%) de indivíduos com neoplasias em relação às raças Caniche, Doberman, Cocker, Pastor Alemão com 6,3%. No entanto, importa referir que a maioria dos animais atendidos no Hospital Veterinário do Baixo Vouga são de raça indeterminada, sendo por isso difícil afirmar se existe ou não predisposição nestes animais em relação aos de raça. No estudo de Simon et al., (2009) também se verificou que a raça indeterminada foi a que apresentou maior percentagem em relação às outras raças, com 36%. O número de mamas afectadas por animal, foi em média de 2 mamas. Os estudos afirmam que é frequente existir mais de uma glândula atingida.

Este estudo demonstra a validade da citologia relativamente à histopatologia, o teste de referência, no diagnóstico de neoplasias malignas mamárias caninas. Salvaguardando-se o facto de não substituir a avaliação histopatológica, que é sempre aconselhada pelo médico veterinário após extirpação cirúrgica (muitas vezes curativa), a citologia pode ser particularmente útil em determinados casos, nomeadamente quando há dúvidas acerca da natureza neoplásica da lesão (lesões difusas ou carcinomas inflamatórios inoperáveis); em casos de recorrência; quando há linfadenomegalia regional (os linfonodos também devem ser aspirados); quando está em causa a eutanásia do animal.

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