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Capítulo III – Apresentação dos resultados

1- Discussão dos resultados 54

Este estudo demonstrou que o treino regular e devidamente estruturado de desportos de combate pode proporcionar a aquisição de hábitos sociais bastante positivos, nomeadamente a aquisição de competências sociais. Essas competências podem auxiliar os jovens no quotidiano nos diversos contextos onde se encontram inseridos, seja treino, competição e até mesmo ao nível escolar. Os resultados evidenciaram que, independentemente da frequência aos treinos, tipo de Arte Marcial/Desporto de Combate, experiência de treino e idade, todos consideraram que a prática deste tipo de desportos proporciona, indubitavelmente, efeitos positivos nas suas vidas, nomeadamente a aquisição e aplicação das referidas competências nas suas relações. Todas as variáveis supracitadas se relacionaram com “Os desportos de combate e o meu dia a dia…”, “Os desportos de combate e as minhas atividades escolares…”, “Os meus treinos e/ou competições…”, “As minhas competições nos desportos de combate…”.

Com os resultados apurados, é evidente que praticar desportos de combate induz os jovens na aquisição e desenvolvimento de competências sociais, pelo que, aconselha-se a sua prática para que possam ocorrer esses benefícios sociais. A título de exemplo, aponta-se Funakoshi (2005), que refere que deve praticar-se Karaté ao longo da vida, realçando a sua importância na formação do caráter, sendo aconselhada em todas as idades, com salvaguarda dos seus valores reais.

Respeitante ao objetivo associado à variável idade, constatou-se que o treino deste tipo de desportos pode desenvolver nos jovens distintas perceções na valorização de algumas competências. Todavia, constatou-se que essa valorização é homogénea verificando-se, em função dos dados apresentados, que se registaram apenas diferenças na categoria cooperação. Foi o grupo menos jovem que apresentou uma média superior. O grupo etário mais jovem teve um nível de concordância superior face ao menos jovem. Porém, no geral, há tendência para os atletas de idades mais avançadas apresentarem resultados superiores em todas as competências sociais. Ambos os grupos tiveram consciência sobre a aquisição de competências sociais com base na prática de desportos de combate. Tal facto poderá dever-se à popularidade deste tipo de desportos. A esse propósito Theeboom et al (2009) referem que a popularidade das Artes Marciais é bastante considerável, sobretudo entre os jovens, sendo na

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Europa o décimo desporto mais praticado a partir dos 15 anos. A perceção do desenvolvimento das competências sociais pode também correlacionar-se com o contexto em que se desenvolvem os desportos de combate. Incluiu o ambiente no treino e desportivo. Por exemplo, Binder (2007), refere que, em comparação direta com outras atividades, as Artes Marciais proporcionam maiores benefícios psicossociais, que se constatam em todos os estilos. Igualmente, a personalidade e o tradicionalismo do instrutor poderão influenciar os níveis de agressividade dos atletas e, consequentemente, os benefícios psicossociais. Sem diferenças significativas, a homogeneidade na valorização indicou que, apesar de distintos tecnicamente, os desportos de combate têm qualidades comuns na aquisição das competências supracitadas, o que poderá correlacionar-se com a origem das artes marciais, que é maioritariamente de culturas orientais, e geralmente muito exigentes. Exímios, Levine (1984) e Schmidt (1986), consideram que apesar de diferentes entre si ao nível de estilos, as artes marciais encerram em si ética e virtudes comuns nas formas tradicionais. Similarmente Silva (2005), citado por Vieira e Moreira (2008), defende que poucas atividades possuem a capacidade de criar nas pessoas o espírito da competitividade, lealdade, disciplina e amizade como as artes marciais proporcionam. Este objetivo confirmou a hipótese de que quanto maior a idade, maior é a probabilidade de valorização das competências sociais.

Nos dados apresentados no objetivo “ Verificar se a valorização das competências sociais dos praticantes variam em função da experiência dos mesmos”, os atletas mais experientes representaram cerca de metade da amostra e, evidenciaram que a experiência não é uma variável diferenciadora na valorização das competências supracitadas. Esta conclusão pode ser contraditória quando comparada com a revisão da literatura. Segundo Binder (2007), é indicado que quanto mais experientes, ou mais graduados os atletas/praticantes, maior é a capacidade de dominarem sentimentos de ansiedade, agressão, hostilidade e neuroticismo. Neste caso, pressupõe-se o autocontrolo ser diretamente proporcional a maior tempo de prática. A experiência não constituiu dissemelhanças na valorização das competências mas poderá indiciar que atletas principiantes também as reconheçam quando iniciam a prática dum desporto de combate, podendo inclusivamente estar na base da sua escolha. Woodward (2009), exemplarmente, refere que os praticantes procuram nas Artes Marciais um meio de autodomínio/autocontrolo. Indica, para os alunos iniciantes, que na génese dos motivos da sua prática, para além da autodefesa, está implícito o desenvolvimento da autoconfiança, disciplina e também participação em exercício físico. Apesar de a experiência não ter demonstrado que pode marcar diferenças na valorização de competências, ficou evidenciado que os jovens efetivamente as valorizam/reconhecem no dia a dia, proveniente da influência

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da prática de desportos de combate. Genericamente, os atletas com mais tempo de treino (mais experientes) apresentaram valores médios superiores em quase todas as variáveis. Esses resultados correlacionam-se com Binder (2007) e demonstram a capacidade de aprender, no mundo desportivo/marcial, competências que auxiliam no quotidiano. Estes resultados não são contraditórios quando correlacionados com as respostas às entrevistas dos treinadores. Os mesmos revelaram que, apesar de dependerem de vários fatores, existe nos atletas um período de carência até 3 anos para se verificarem efeitos positivos na aquisição das competências sociais. Tal leva a crer que, quanto mais experiente, maior será o reconhecimento dessas competências. Assim como a bibliografia investigada, os treinadores referiram que o treino deverá contemplar a existência de características positivas para ser possível a aquisição de competências, como por exemplo o respeito.

Há evidências que de acordo com o objetivo “Comparar a perceção dos praticantes de ambos os géneros quanto aos efeitos que a prática desportiva dos desportos de combate tem nas competências sociais”, a perceção difere em função do género. Foi na responsabilidade e integridade que prevaleceram diferenças significativas, sendo o género feminino aquele que revelou um maior grau de concordância. Todavia, também as outras competências tiveram um maior desenvolvimento no sexo feminino, uma vez que apresentaram valores médios superiores em quase todas. Há, no entanto, contradição quando comparados estes resultados com a investigação bibliográfica. Mencionam-se Lakes e Hoyt (2004), referidos por Vicenzo et al (2011) que investigaram a autorregulação em crianças de ambos os géneros, em dois grupos distintos. Um usufruiu e outro não usufruiu de aulas de taekwondo. Verificaram-se melhorias no grupo que usufruiu, o que vem demonstrar a influência positiva da prática de desportos de combate na aquisição de competências. Também estes autores confirmaram diferenças entre géneros. Contudo, foi o género masculino que evidenciou as melhorias, podendo esses maiores índices dever-se a inúmeros fatores, tais como: maior indisciplina dos rapazes, no início do estudo.

Apesar de a experiência não ter sido uma variável diferenciadora na valorização das competências supracitadas, verificaram-se diferenças significativas no objetivo “Verificar se as competências sociais diferem em função do número de treinos por semana”. Os dados apresentados evidenciam que, relativamente ao número de treinos por semana, há diferenças significativas nos grupos estudados e, em todos os casos, foram os praticantes com maior número de treinos que evidenciaram maior concordância. Verificaram-se nas competências autocontrolo, responsabilidade, perseverança e cooperação as diferenças referidas, constatando-se que os atletas que treinam mais, revelaram um maior grau de concordância,

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comparativamente aos atletas que treinam menos. Tal facto indica que a maior frequência aos treinos poderá influenciar (mais) positivamente os atletas. Poderá haver aqui conclusão contraditória, na medida em que presume-se que atletas que treinam mais, são à partida mais experientes. Os resultados - no número de treinos semanais - podem enquadrar-se com a teoria de Binder (2007), que defende que, quanto mais experientes ou mais graduados os atletas/praticantes, maior é a capacidade de dominarem sentimentos de ansiedade, agressão, hostilidade e neuroticismo, tornando por exemplo o autocontrolo diretamente proporcional ao maior tempo de prática. Estes dados demonstraram o efeito positivo nas competências sociais derivado da prática de desportos de combate e, os atletas com maior frequência de treinos, assumem geralmente uma maior tendência em desenvolvê-las. Devido apresentarem maiores valores médios em todas as outras variáveis de competências sociais, os atletas mais assíduos, têm uma maior probabilidade em desenvolvê-los, o que torna o treino diretamente proporcional à aquisição de competências sociais.

Em termos de categorias e na análise aos resultados, concluiu-se que a integridade é geralmente a categoria com menor valorização. Excetua-se apenas o objetivo: “Comparar a perceção dos praticantes de ambos os géneros quanto aos efeitos que a prática desportiva dos desportos de combate tem nas competências sociais ”, onde foi o autocontrolo. Tal facto indicia a homogeneidade das respostas dos jovens atletas. A integridade, para além de ser a categoria menos valorizada, foi também aquela que nos dois grupos de idade (12-14 e 15 - 18 anos) e, também nos dois grupos com diferentes experiências de treino (1-2 anos e 3 ou + anos) apresentou a menor média. Com estes dados verificamos que a integridade é a categoria menos valorizada em qualquer idade independentemente da experiência de treino. Tal facto poderá significar que a integridade é a competência social com menor influência no dia a dia dos jovens praticantes deste tipo de desportos. É também dado adquirido de que esta é a categoria menos valorizada nos jovens atletas, independentemente do número de treinos semanais.

Se correlacionarmos a idade com a experiência, e por sua vez com o número de treinos semanais há indícios de que a integridade é a competência social cuja influência menos se destaca em resultado da prática de desportos de combate. Se os atletas mais velhos forem os mais experientes, e também aqueles que treinam mais vezes por semana, observamos que estar mais envolvidos nos desportos de combate não é proporcional a maior desenvolvimento da integridade, observando-se o oposto no saber estar. Se correlacionarmos os mesmos objetivos, mas com ênfase para a competência mais valorizada, observamos que o saber estar é em todos aquele que mais se destaca em resultado da prática deste tipo de desportos.

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Na análise aos resultados obtidos concluiu-se que o saber estar é geralmente a categoria com maior valorização, excetuando-se apenas no objetivo: “Identificar as competências sociais adquiridas através dos desportos de combate que são mais valorizadas/reconhecidas no dia a dia dos praticantes”. Aqui a categoria mais valorizada foi o respeito. Excetua-se também no objetivo “Verificar se existem diferenças significativas quanto à valorização das competências sociais por parte dos praticantes com diferentes idades”, mas apenas na categoria 15 - 18 anos, onde mais uma vez o respeito é a categoria mais valorizada. O objetivo “Verificar se a valorização das competências sociais dos praticantes variam em função da experiência dos mesmos” apresentou exceção na categoria 3 ou + anos, onde também o respeito foi o mais valorizado.

Concluiu-se que geralmente as categorias que mais se destacam no quotidiano dos jovens atletas, sob a influência positiva do treino de desportos de combate são o saber estar e respeito. Com as mesmas condições de treino, as categorias que menos se destacam são a integridade e o autocontrolo.

Dados estes factos há indícios de que os jovens atletas apresentam no seu quotidiano comportamentos de boa-fé de acordo com princípios éticos, sem preconceitos nem falsos moralismos, é agir sempre de acordo com princípios de boa educação e cortesia: saber saudar e cumprimentar, ser pontual, respeitar regras e normas de convivência, aceitar a diferença e evitar julgar, Fernandes e Casanova (2012).

Reportando o rendimento escolar, Hartmann e Bailey et al (2008), confirmam uma relação direta, e positiva, entre prática desportiva e resultados académicos. Também para Neto (2012) e Singh (2012), é evidente que a prática desportiva, de uma forma geral, favorece o sucesso escolar. No contexto escolar, segundo Santos (2008), as escolas/colégios que utilizam as Artes Marciais na Educação Física têm, acima de tudo, uma influência positiva no rendimento escolar dos seus alunos. Refere que as escolas que não contemplam a prática de Artes Marciais nos seus currículos de Educação Física, o rendimento escolar é consideravelmente mais baixo. Nos desportos de combate aponta-se Favorito (2011), cujos resultados evidenciados indicaram que a prática do Taekwondo induz a diferenças positivas, incluindo-se um maior sucesso escolar, conseguido através da melhoria das notas.

Contrariamente aos estudos supramencionados, o nosso, e reportando-nos ao objetivo “Verificar se o aproveitamento escolar difere em função dos anos de experiência dos praticantes de desportos de combate”, (que contextualizou a amostra em clubes), evidenciou que a prática dos Desportos de Combate não é uma variável diferenciadora no que se refere ao aproveitamento escolar - quando correlacionada com a experiência. No entanto, dos grupos

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estudados, concluiu-se que os atletas mais experientes têm geralmente melhor aproveitamento escolar - tal como aconteceu na valorização de competências sociais. Os Desportos de Combate não são os únicos cujo treino não está correlacionado com sucesso escolar. Soares e Antunes (2011) apresentaram no Ténis de Mesa, na Ginástica e na Natação, maiores taxas de aprovação, em comparação com o Futsal, o Atletismo, o Futebol e o Andebol. Estes autores também concluíram que a prática desportiva não foi uma variável diferenciadora para aprovação ou reprovação escolar. Portanto, parecem haver evidências de que a prática desportiva não é sinónimo de melhor sucesso escolar/aproveitamento escolar.

Não obstante, o nosso estudo permite-nos concluir que de entre os dois tipos de Desporto (o coletivo e o individual), são os desportos individuais que apresentam maior sucesso escolar, nomeadamente os Desportos de Combate. Segundo Gonçalves, Silva e Cruz (2007), Lee, Whitehead e Balchin (2000) as modalidades individuais têm maiores comportamentos de responsabilidade. Esta competência correlaciona-se, por exemplo, com o rigor das tarefas e, atletas mais responsáveis, tendem a melhor sucesso escolar. No nosso estudo os motivos pelos quais a prática desportiva não está correlacionada com melhor aproveitamento escolar podem ser vários. Segundo Resende e Gomes (2009), Gomes (1997), pode estar relacionado com fatores: a organização do tempo dos atletas, o apoio parental, os horários dos treinos, a capacidade individual de aprendizagem e o contexto/ambiente escolar. Também o número de treinos e competições e o descanso entre ambos poderão ser fatores influenciadores do aproveitamento escolar.

No nosso caso não determinamos na investigação o número de competições, embora estejam à partida correlacionadas com os atletas que treinam mais, devido às necessidades implícitas nas competições.

Relativamente ao objetivo “Verificar se existem diferenças significativas ao nível do aproveitamento escolar dos praticantes com diferente número de treinos por semana”, os dados apresentados evidenciaram que não houve diferenças significativas em relação à média de concordância de ambos os grupos no aproveitamento escolar. Os motivos que apontam não existirem essas diferenças significativas podem estar relacionados com as teorias já referenciadas de Resende e Gomes (2009), e Gomes (1997). Estes dados foram, curiosamente, contraditórios relativamente à aquisição de competências sociais em função do número de treinos semanais, onde se verificaram diferenças significativas. Apesar de não haver diferenças significativas são, também, os atletas que treinam mais, que geralmente apresentam um melhor aproveitamento escolar. Tal facto poderá significar que esses atletas têm à partida

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reunidas melhores condições de organização de tempo e apoio parental, para obterem melhor aproveitamento escolar quando comparados com o grupo que treina menos.

No objetivo “Verificar se os rapazes e raparigas têm a mesma perceção quanto ao favorecimento do aproveitamento escolar, através da prática de desportos de combate”, apurou-se a existência de diferenças significativas em relação à média de concordância; concomitantemente, verificou-se um valor mais elevado de concordância nas raparigas. Foram mais os atletas do género feminino que consideraram que a prática deste tipo de desportos favorece o aproveitamento escolar.

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