• Nenhum resultado encontrado

O objetivo deste estudo foi investigar a relação entre a cultura organizacional de uma empresa multinacional no seu processo de internacionalização noutro país, através de um caso de estudo conduzido na subsidiária desta empresa, sediada em Portugal.

Procurámos apresentar uma visão geral sobre o debate a respeito da cultura organizacional e da sua relação com o processo de internacionalização. Utilizando autores e literatura diversos, pretendemos genericamente compreender fenómeno cultural no interior das organizações, num processo de internacionalização.

Tal como, também, constatámos, a importância de uma identidade cultural, e a influência que a cultura organizacional tem no comportamento das pessoas é hoje, segundo Neves (2001), muitíssimo reconhecida.

Podemos, então, afirmar que a construção de uma organização se faz pela partilha de valores, normas, ações, pelos mecanismos de coordenação, pela hierarquia, pela comunicação, quer interna quer externa. Compreender o conceito de cultura organizacional é conhecer o interior de uma empresa, compreender os comportamentos e práticas dos colaboradores, o grau de ligação com a empresa. Estes são pontos essenciais para fazer uma investigação desta natureza.

Citamos Schein (2009: 219): “Uma vez que as organizações têm uma cultura, os pressupostos tácitos compartilhados que compõem essa cultura vão influenciar todos os aspetos do funcionamento dessa organização. Missão, estratégia, estrutura, meios utilizados, sistemas de medição, sistemas de correção, linguagem, normas de grupo, de sistemas de inclusão e exclusão, de status e de desempenho, os conceitos de tempo, espaço, trabalho, natureza humana, relações humanas e gestão do incontrolável estão todos refletidos na cultura”.

Nos dias de hoje, as empresas querem ser cada vez mais eficientes e competitivas, com melhor desempenho e melhores resultados e, portanto, analisar a cultura nas organizações torna-se primordial para atingir estes objetivos.

Ao longo da realização do estudo de caso, procurámos compreender e obter provas empíricas sobre a ligação entre as dimensões da cultura organizacional da empresa-mãe e da subsidiária.

Esta empresa á caracterizada por uma cultura forte, com características próprias e pretende que sejam uniformes em todo o mundo. Estas características criam uma

104

imagem positiva, objetiva, principal e omnipotente, que se reproduz na subsidiária e cria uma relação de lealdade e respeito por parte dos colaboradores da subsidiária, que a reproduzem e a refletem junto de novos colaboradores.

É nesta conquista e nesta tentativa de criar uma única cultura de empresa, que se salienta uma forma de controlo da subsidiária. A empresa-mãe integra uma estrutura coordenada e controlada e a sua estrutura apresenta duas formas: formal ou informal (Porter et al., 1975 in Ferreira et al., 2001). Assim sendo, desenvolvem-se e fluem pela estrutura, relações espontâneas, de sociabilização, de entendimento mútuo, elementos, por vezes, difíceis de observar, mas que contribuem para a coesão das equipas envolventes. Elementos estes que não estão previstos e são incertos e, por isso, dificeis de controlar, e que podem gerar tensão entre os membros, pois não são passíveis de controlo nem obedecem a regras burocráticas ou de supervisão hierárquica (Scott, 2004a). No entanto, embora seja um enorme desafio, conclui-se que é possível articular e coordenar todos os elementos que caracterizam uma organização, é possível chegar a um equilíbrio entre a incerteza e as regras organizacionais, e assim criar uma “energia” organizacional única em toda a empresa, de forma a que a missão a que se propõe e os objetivos definidos sejam cumpridos (Thompson, 1967 in Davis e Powell, 1992).

A análise dos dados originou um conjunto de variados resultados, nas vertentes da cultura organizacional e da relação entre a empresa-mãe e a subsidiária, e da gestão da cultura no processo de internacionalização, no sentido de maximizar o desempenho e o processo de implementação da empresa no país.

Considerando o problema de investigação, e as questões de partida, analisamos os aspetos e variáveis da cultura organizacional e da intensidade das dimensões na relação que estabelecemos entre a cultura organizacional da empresa-mãe e da subsidiária. Em primeiro lugar, é de salientar que, de facto, houve um complemento entre as várias metodologias utilizadas, e que, sem a observação direta e a participação ativa na empresa, as conclusões seriam menos claras. A aplicação do questionário, assim como as duas entrevistas formais, mostrou que os colaboradores da empresa responderam principalmente de acordo com as normas partilhadas na organização, de acordo com os valores incutidos pela empresa, e não deixaram transparecer o que na prática acontece. Ou seja, os valores explícitos, formais, estão bem incorporados na subsidiária, no entanto, os valores práticos põem em causa os explícitos.

105

Em segundo lugar, é de referir que a empresa implementada em Portugal é muito recente, não teve tempo suficiente para criar a estrutura e base necessárias para sedimentar a cultura organizacional por que o grupo se formalmente se identifica e representa. Vimos, por exemplo, como a supervisão hierárquica parece contradizer as afirmações de autonomia e trabalho de equipa.

Posto isto, é de notar que a estabilidade é o valor mais importante e de relevo desta empresa. É visível através das práticas e é bastante explícito na análise, quer da empresa, quer da subsidiária. A empresa aposta no recrutamento jovem e qualificado, e na continuidade dos colaboradores, o que indicia perspetivas de progressão profissional a cada colaborador. Este é o aspeto mais visível, talvez o mais motivador no interior da organização, aquele que gera confiança e, eventualmente, o que justifica algum do sentimento (mais do que a observação direta mostrou) de autonomia refletido no questionário. A empresa dá importância à estabilidade emocional e pessoal do trabalhador, não coloca demasiada pressão no ritmo do cumprimento dos objetivos, e flexibiliza as relações entre a vida profissional e a pessoal.

Percebemos que a estabilidade da subsidiária, pela sua "juventude" e ainda pouca penetração no mercado português, só é possível através de um forte controlo e coordenação por parte da empresa-mãe. É esse controlo que faz com que a subsidiária veicule uma imagem sólida e coesa, mas que, na prática, gera tensões entre as normas da empresa-mãe e aquelas que seriam mais adequadas ao mercado português – sob a forma de uma equipa jovem, dinâmica e autónoma, e de uma cultura relativamente informal, encontramos um conteúdo de normas, objetivos e decisões de gestão que reproduzem os da sede. Isto significa que, mesmo o reporte de outputs (questionado no inquérito), não é de grande partilha e, principalmente, tem menor eco junto dos superiores do que os colaboradores referem. As estratégias implementadas em Portugal são, portanto, como uma réplica das adotadas em Espanha. Este facto dever-se-á, em parte, a haver um diretor comercial para a empresa implementada nos países na Europa Continental, como a própria empresa-mãe em Espanha e em Portugal. No entanto, é de salientar que o mercado português não é como o mercado espanhol, entre outros fatores dado a liberalização do setor energético só ter sido possível a partir de 2003, e mais intensamente a partir de 2008, o que, também junto dos clientes, significa resistência à

106

mudança. Na prática, algumas situações geram prejuízos financeiros e tensões na comunicação com os clientes.

De uma maneira geral, não há adaptação das ferramentas e dos métodos de trabalho à realidade portuguesa.

A forte dependência por parte de Espanha, na tomada de decisões e na implementação de estratégias é, indiretamente, referida pela própria diretora comercial, na entrevista, quando responde que se trata de ir ao encontro com os objetivos definidos pela sede. (Anexo V). Concluímos que a subsidiária não tem autonomia suficiente para desenvolver princípios e práticas que contrariem os da sede. A dimensão em que se verifica um esforço de adaptação é a relativa às regras dos concorrentes diretos (comercializadores).

Esta questão segue as conclusões do estudo clássico de Hofstede (1980a, 1983) quando demonstrou que o peso das culturas nacionais das empresas (isto é, dos seus países de origem) é determinante na cultura das subsidiárias.

A empresa transmite uma cultura aberta, em ligação com a sociedade envolvente e com uma equipa multicultural, o que vai de acordo com uma empresa essencialmente comercial. No entanto, a estratégia de internacionalização parece veicular, ao contrário, uma cultura defensiva. Outro exemplo prende-se com o próprio estudo, relativamente ao qual a empresa começou por demonstrar abertura e mesmo interesse, tendo no entanto progressivamente receado que os resultados pudessem fragilizar a coesão da equipa. Na parte prática desta investigação, tentámos ao máximo não revelar de qual empresa se tratava (sabendo que não é fácil dadas as características singulares da empresa), e por esse motivo, também houve características não reveladas e que ficaram por analisar, para não interferir a questão profissional com a académica. Por esse motivo também, como referi na introdução, percebemos o contraste entre a cultura universitária e a cultura empresarial, em que cada uma tem objetivos e realidades diferentes, e sendo o meu tema um pouco “invasivo” à empresa, este foi desde logo um entrave à minha investigação. Significa, também, que a cultura de uma empresa, por vezes, não é tão aberta e tão disponível para poder cumprir os objetivos das universidades.

Em suma, observa-se que há uma forte marca da empresa-mãe na subsidiária em todos os níveis estratégicos e estruturais.

107

Esta, ainda jovem como dissemos, não tem uma cultura organizacional definida e com identidade própria, o que reforçou os obstáculos ao nosso estudo. Seria interessante regressar a este problema no futuro e avaliar permanências e transformações, ou se, como objetivo da empresa-mãe, a subsidiária já tinha consolidado uma cultura organizacional semelhante à da empresa-mãe. Outro desenvolvimento deste estudo seria alargar o seu âmbito e comparar várias subsidiárias, para verificar se as nossas conclusões são reforçadas (em particular o forte domínio da empresa-mãe) ou relativizadas por características específicas de cada subsidiária.

108