• Nenhum resultado encontrado

DISCUSSÃO

No documento MAYKON TAVARES DE OLIVEIRA (páginas 71-85)

4. MATERIAL E MÉTODOS

7.0 DISCUSSÃO

A espécie T. cruzi, agente etiológico da doença de Chagas, é constituída de subpopulações heterogêneas que circulam tanto em ambiente silvestre como no doméstico (Chagas, 1909; Brener, 1965; Silva, 1959; Andrade, 1974; Brener, 1969; Devera et al., 2003, Macedo et al., 1992) e essa diversidade pode ser detectada tanto em nível morfológico (Chagas, 1909; Brener & Chiari, 1963; Chiari e Brener, 1965) como biológico (Andrade & Andrade, 1966; Andrade, 1985; Brener, 1965; Silva, 1959; Andrade, 1974; Brener & Chiari, 1963; Brener, 1965; Brener, 1969; Andrade et al., 1997) e genético (Macedo et al., 1992; Morel et al., 1980; Steindel et al., 1993; Tibayrenc & Ayala, 1988), Em decorrência da intensa variabilidade observada nesta espécie, vários trabalhos que avaliaram suas características genéticas foram realizados na tentativa de agrupar as populações do parasito que apresentavam similaridade.

Em 1999, com a realização do primeiro Consenso Taxonômico para o T. cruzi a espécie ficou dividida em duas linhagens principais, T. cruzi I e T. cruzi II (Anonymous, 1999), mas existiam ainda isolados que não se enquadravam em nenhum dos dois grupos por apresentarem perfil híbrido ou incongruência entre marcadores. Desse modo, a fim de melhor entender a variabilidade no interior dessa espécie e as relações filogenéticas entre as subpopulações, novas abordagens fundamentadas no estudo de outros alvos gênicos foram desenvolvidas e outras subdivisões significativas desta espécie foram propostas (Brisse et al., 2000ª,b; Freitas et al., 2006, Westenberger et al., 2006; Subileau et al., 2009).

Com objetivo de unificar as abordagens referentes à classificação dos isolados do T. cruzi, em 2009 foi reconhecida oficialmente a divisão da espécie em seis DTU’s (Discrete Typing units) como proposto por Zingales et al. (2009).

Entretanto, para acessar a identificação genética dos isolados de T. cruzi nas suas respectivas DTU(s) é necessário o emprego de diferentes marcadores moleculares para realizar com confiabilidade a genotipagem, empregando alvos no DNA nuclear e mitocondrial do parasito. Nesse contexto, Lewis et al. (2009) propuseram um tripé de análise fundamentado na associação do perfil de bandas apresentado após a amplificação do gene 24Sα rDNA juntamente com os perfis de fragmentos amplificados dos genes HSP60 e GPI submetidos a RFLP-PCR com enzimas de restrição

específica. A combinação dos resultados obtidos por esses três marcadores permitiram segundo os autores, a identificação das seis linhagens de modo eficaz e acurado.

Nesse contexto, o presente estudo foi desenvolvido com intuito de identificar as linhagens genéticas do T. cruzi isoladas de pacientes chagásicos crônicos residentes no Vale do Jequitinhonha, MG, considerada uma região de intensa transmissão da doença de Chagas na década de 80 (Dias et al., 1985) e, avaliar a variabilidade genética no interior dessa população. Entretanto, a identidade dos isolados do T. cruzi obtidos dos pacientes não pode ser completamente definida empregando o esquema de identificação proposto por Lewis et al. (2009), uma vez que ocorreram divergências nos resultados obtidos por esses marcadores em oito amostras avaliadas, apresentando combinações distintas daquelas propostas pelos mesmos. É importante enfatizar que nesses casos, as amostras dos clones de referências das seis linhagens do parasito produziram os padrões esperados para os três marcadores.

Assim todas as 51 amostras avaliadas neste estudo apresentaram perfil de bandas de 125pb pelo rDNA, que permitiria classificá-las como TcII ou TcVI (Zingales et al., 2012); mas para os isolados 452, 748, 1205, 1337, 2118, 2119, 229 e 798 foi encontrado padrões duplos de bandas para o fragmento do gene da GPI digerido com a enzima HhaI, padrão típico das DTU(s) TcI e TcIII. Quando avaliados pelo perfil de RFLP-PCR do gene da HSP60 foi observado que os isolados 452, 748, 1205, 1337, 2118 e 2119 apresentaram padrões triplo de bandas, característico das linhagens híbridas (TcV e TcVI), enquanto as amostras 229 e 798 apresentaram padrão de banda único (típicos de TcI, TcII e TcIV). As demais amostras (84,3%) foram classificadas como TcII apresentando fragmento de 125pb para o rDNA, padrão de banda triplo para a GPI/HhaI e simples para HSP60/ECORV.

Os resultados obtidos por Lewis et al. (2009) já apontavam variações em alguns perfis dos clones avaliados em seu trabalho. O clone Saimiri3 cl1, por exemplo, apresenta perfil de TcIV na metodologia de RAPD, entretanto, pelo tríplice ensaio apresentou identificação inconclusiva, obtendo perfis mais próximos do grupo TcII que qualquer outro genótipo. Outra questão que pode dificultar a identificação dos isolados é a ocorrência de infecções mistas já documentadas em vetores, reservatórios e casos humanos (Bosseno et al., 1996; Yeo et al., 2007). Quando ocorre a mistura de

TcII com TcIII os autores detectaram perfis semelhantes a TcV e TcVI, o que poderia resultar em identificação errônea dos isolados uma vez que as amostras aqui estudadas não foram clonadas para esclarecer esta questão.

Os resultados obtidos para essas oito amostras sugerem que pode estar ocorrendo algum processo de deleção ou inserção na seqüência de bases nitrogenadas do gene GPI, o que estaria impedindo que a enzima cortar a seqüência do DNA no seu ponto específico. A análise isoenzimática desses isolados por quatro sistemas enzimáticos (GPI, IDH, G6PD e GDH) evidenciou que somente na GPI foi observado um perfil de bandas distintos do esperado para estoques pertecentes a DTU TcVI (dados não mostrados), correspondente aquele esperado para as DTU (s) TcIII e TCIV, o que poderia sugerir uma variação mais extensa nesse gene. Westenberg et al. (2005) avaliando diversos genes deste protozoário não observaram variação no gene da GPI entre estoques pertencentes a diferentes linhagens, mesmo utilizando várias enzimas para digerir o produto amplificado. O mesmo ocorreu no trabalho de Gaunt et al. (2003) quando avaliaram possíveis processos de hibridização ocorridos entre os grupos do T. cruzi.

Em relação ao emprego do gene HSP60 como marcador não há muitas publicações que o abordam, exceto a de Sturm et al. (2003), que assim como os autores (Westenberg et al., 2005 e Sturm et al., 2003) também não detectaram variações entre os representantes de uma mesma linhagem, quando avaliaram esse gene empregando a metodologia de RFLP-PCR. Contudo, é importante ressaltar que os autores (Sturm et al. 2003), utilizaram clones de referências previamente genotipados e enzimas de restrição diferentes, o que poderia justificar a ausência de divergências em suas análises como foi observado no presente estudo que trabalhou com amostras provenientes de um importante área endêmica para doença de Chagas no Brasil.

Rimoldi et al. (2012) foram os primeiros autores que utilizaram o mesmo critério de genotipagem proposto por Lewis et al. (2009). Eles identificaram 18 isolados provenientes de gatos domésticos e vetores de uma região endêmica de doença de Chagas da Bahia, todos pertencentes ao grupo de TcII. Esses resultados corroboram aqueles obtidos nesse estudo, indicando que essa metodologia é eficiente na identificação da DTU II, mostrando que 43 isolados dos pacientes da região

geográfica em estudo foram pertencentes a essa linhagem. Contudo, oito amostras permaneceram com sua identificação inconclusiva, o que demonstra que pode haver variações entre amostras provenientes de diferentes regiões geográficas e, que a identificação deve ser feita com cautela fundamentada em um maior número de marcadores.

Outro problema relacionado ao esquema proposto por Lewis et al. (2009) é concernente a metodologia que visa amplificar a região 3’ da subunidade 24Sα do rDNA (Souto et al., 1996), devido a possibilidade de divergências que pode influenciar profundamente a identificação das amostras. Segundo os autores, os produtos amplificados do rDNA podem apresentar perfis de bandas de 110pb, associados com a linhagem TcI; 125pb relacionados com isolados pertencentes a linhagem TcII e perfil duplo 110pb +125pb associados com os isolados que sofreram processos de hibridização. Entretanto, Brisse et al. (2001) e Lewis et al. (2009) observaram a possibilidade de alguns isolados híbridos (TcV) não apresentarem perfil de bandas duplas, apresentando apenas o perfil de 125pb. Kawashita et al. (2001) também averiguaram a ocorrência de amplicons de 117pb em isolados híbridos, banda esta correspondente ao perfil intermediário (110pb e 125pb) em isolados pertencentes ao grupo híbrido TcV. Em alguns casos (Kawashita et al., 2001) já foram também registrados isolados pertecentes a DTU TcV, que apresentam um perfil duplo de 125pb + 140pb, ao invés de 110pb + 125pb. O perfil de 140pb já havia sido anteriormente encontrado em algumas amostras isoladas e caracterizadas como pertencente ao DTU II (IIb descrita por Brisse et al., 2000) e VI (IIe), mas até então nunca associado com a DTU V.

Atualmente, para identificação dos isolados de T. cruzi tem sido adotado o seguinte protocolo (Zingales et al., 2012): produtos amplificados do rDNA de 110pb são associados a linhagem TcI e TcIII; de 125pb a TcII e TcVI; de 120pb associados as linhagens de TcIV com variação para os isolados obtidos na América do Norte de 130pb e de 110pb +125pb para os isolados pertencentes a DTU TcV. No presente estudo, é importante mencionar que não ocorreram problemas relativos a amplificação do rDNA nas amostras analisadas.

Segundo Burgos et al. (2007) quando ocorre incongruência na identificação de isolados com provável perfil híbrido é importante fazer a caracterização do isolado por

RFLP-PCR do gene da COII (Freitas et al. 2006) para se ter certeza do perfil da amostra. Após corte dos produtos amplificados com a enzima ALUI a amostra apresentando perfil relacionado com o haplogrupo mitocondrial B pode ser considerada como pertencente às DTU(s) TCIII, TCIV, TcV ou TcVI. D´avilla et al. (2009) empregando essa metodologia combinada à avaliação do polimorfimos do gene da região 3´do rDNA e da região intergênica do gene do mini-exon do T. cruzi (SL-IR) também sugeriram um esquema rápido, barato e eficaz para identificação das linhagens desse parasito.

No presente trabalho, as oito amostras isoladas dos pacientes chagásicos crônicos (229, 452, 748, 798, 1205, 1337, 2118 e 2119) após RFLP da COII/ALU I apresentaram perfil de bandas idêntico aos clones representativos do haplótipo mitocondrial B (294pb + 81pb), que pode corresponder as DTU(s) híbridas V e VI e as DTU(s) III e IV. A SL-IR identifica o grupo TcIII e TcIV que apresenta uma banda de 200pb. Todas as amostras analisadas neste trabalho amplificaram por essa metodologia um fragmento de aproximadamente 150 a 157pb, excluindo a possibilidade dos isolados serem identificados como TcIII ou TcIV, permitindo afirmar que essas amostras são realmente híbridos pertencentes a DTU TcVI, devido também aos resultados obtidos na análise do rDNA. O restante dos isolados teve confirmada a genotipagem com TcII, corroborando a classificação segundo a metodologia de Lewis et al. (2009).

Os resultados obtidos nesse estudo estão em acordo com vários trabalhos publicados na literatura, que afirmam que a DTU TcII está mais associada com a infecção humana e reservatórios naturais com distribuição geográfica entre os eixos Norte e Sul do Brasil (Fernades et al., 1998; Zingales et al., 1998; Zingales et al., 1999; Brenière et al., 1998; Barnabé et al., 2000; Barnabé et al., 2001, Di Noia et al., 2002; Buscaglia & Di Noia, 2003; Zalloum et al., 2005,D’ávilla et al., 2006; Lages Silva et al., 2006; Steindel et al., 2008; Brito et al., 2008; D’ávilla et al., 2009; Abollis et al., 2011).

Em uma recente revisão englobando a ecoepidemiologia das diferentes DTU(s) do T. cruzi, Zingales et al. (2012) reafirmam que a DTU TcII é encontrada predominantemente nas regiões sul e central da América do Sul. Essa DTU foi encontrada tanto ao ciclo silvestre como ao doméstico da Doença de Chagas (Fernandes et al, 1999; Zingales et al, 1999; ) e parece estar intimamente relacionada

com as manifestações clínicas cardíacas e digestivas (megacólon e megaesôfago) nos casos de infecção humana (Freitas et al, 2005; Yeo et al, 2005; Lages-Silva et al, 2006). Câmara et al. (2010) confirmam a distribuição geográfica e o predomínio da DTU II associada com a infecção humana e reservatórios domésticos no Brasil. Os autores analisaram isolados provenientes de casos humanos crônicos e vetores no estado do Rio Grande do Norte e mostraram que 91,7% dos casos humanos foram pertencentes a DTU TcII , semelhante ao observado na região do Vale do Jequitinhonha-MG.

Mantilla et al. (2010) encontraram em amostras de tecidos de um mesmo caso humano da Colômbia uma mistura das DTU(s) TcI e TcII. Semelhantemente Zafra et al. (2011) que também analisaram tecidos de pacientes com a forma cardíaca grave da doença de Chagas na Colômbia detectaram a presença da linhagem TcII. Em geral, na região da Colômbia, assim como em vários países da bacia Amazônica, ocorre o predomínio da infecção humana pelo DTU TcI e, essa linhagem, está mais relacionada com a infecção aguda assintomática e/ou com raríssimas manifestações clínicas crônicas (Miles et al, 1981a; Zingales et al, 1999; Coura et al, 2002). No entanto, a infecção por essa linhagem tem causado mortes em algumas regiões da Venezuela, Colômbia, México e parte do Brasil, onde a linhagem TcII é rara ou ausente (Miles et al, 1981a; Añez et al, 2004; Zafra et al, 2008; Llewellyn et al, 2009b). Miles et al. (1981) já haviam demonstrado a clara endemicidade dessa linhagem nos países que compreendem essa região geográfica, principalmente, relacionado com o ciclo silvestre da doença de Chagas. Isolados silvetres identificados como TcI tem sido encontrado desde o Alabama nos Estados Unidos (Roellig et al., 2009) até o sul do Chile (Apt et al., 1987) em várias situações, ocorrendo concomitantemente com outras DTU(s) do parasito. Atualmente, dados recentes tem demonstrado também a presença da DTU TcI associada ao ciclo doméstico mais ao norte da América do Sul e na América Central. Já as linhagens TcIII e TcIV estão mais associadas ao ciclo silvestre no Brasil, Venezuela e Argentina, e infecções humanas por essas linhagens são raras nessas regiões (Llewellyn et al, 2009; Marcili et al, 2009; Cardinal et al, 2008).

A presença dos grupos híbridos representados pelas DTU(s) TcV e TcVI são geralmente associadas a vetores e humanos no ciclo doméstico da infecção, sendo rara o seu registro no ciclo natural do parasito em diversas regiões geográficas da

América Latina (Solari et al., 1992; Brenière et al., 1998, Brenière et al., 2002). Segundo alguns autores, nas regiões da Argentina e Chile a prevalência de TcVI é maior no hospedeiro invertebrado do que em casos humanos (Coronado et al., 2006;Rozas et al., 2007). Rozas et al. (2007) ao analisar isolados provenientes de diversos hospedeiros no Chile observaram que o grupo TcVI estava mais relacionado com infecção em vetores que em qualquer outro hospedeiro avaliado. Coronado et al. (2006) também corroboraram esses resultados ao caracterizar isolados de pacientes humanos e vetores do Chile, verificando também o predomínio do grupo TcVI em amostras provenientes dos triatomíneos. Vasques-Prokopec et al. (2006) estudando a dinâmica de distribuição de vetores infectados pelo T. cruzi na Argentina afirmaram que a DTU Tc IIe (TcVI) é predominante em hospedeiros domésticos e silvestres e não relacionados com casos humanos. Cardinal et al. (2006), estudando reservatórios domiciliares, cães e gatos no noroeste da Argentina, comprovaram a existência de cães domésticos infectados pelo TcVI nesta região.

Entretanto, contradizendo o predomínio quase que exclusivo da infecção do DTU TcVI em triatomíneos e alguns mamíferos em certas regiões geográficas da América Latina, dados crescentes tem envolvido a DTU TcVI como uma importante linhagem envolvida em infecções humanas na região do Chaco e países vizinhos, como Bolívia, Chile, norte da Argentina e sul do Brasil (Diosque et al, 2003; Virreira et al, 2006b; Valadares et al., 2007; Cardinal et al, 2008). Valadares et al. (2007) e Burgos et al. (2007) demonstraram a presença dessa linhagem em casos de transmissão congênita na Argentina e no Brasil (no Rio Grande do Sul). Burgos et al. (2010) avaliando amostras de biopsia do miocárdio e pele de pacientes com forma clínicas graves da Doença de Chagas identificaram a DTU TcVI nesses tecidos. Schijman et al. (2009) avaliaram pacientes humanos com co-infecção Chagas/HIV e encontraram também populações do parasito pertencentes tanto ao grupo TcV como TcVI no sangue periférico dos pacientes. Solari et al. (1992) avaliaram a dinâmica de distribuição dos isolados de T. cruzi em diversos hospedeiros, vertebrados, invertebrados e casos humanos, em algumas regiões do Chile, demonstrando a presença dos genótipos híbridos nas regiões estudadas, principalmente do genótipo 39 (TcV) dentre as amostras isoladas e analisadas. Semelhantemente, Brenière et al.

(1998) e Brenière et al. (2002), estudando a importância epidemiológica do Triatoma sordida como potencial vetor ativo da Doença de Chagas na Bolívia e a distribuição das linhagens do T. cruzi em pacientes chagásicos crônicos, provenientes de uma mesma região Boliviana observaram o predomínio da infecção nos invertebrados e dos pacientes humanos também pelos genótipos híbridos na região, bem como a existência de infecção mista entre as linhagens híbridas e a linhagem TcII.

Confirmando a existência do DTU TcVI em humanos no Brasil, Andrade et al. (2011) caracterizaram 11 cepas isoladas de pacientes envolvidos com a transmissão oral no estado de Santa Catarina e demonstraram a ocorrência de infecção mista de TcII com TcVI em um dos pacientes. Em outras três amostras foram observadas uma mistura de populações caracterizadas como TcI e TcII. Os autores empregaram a metodologia descrita por D´Ávila et al. (2009), que além de se mostrar um ótimo critério de identificação dos diferentes grupos genéticos, foi também capaz de identificar as misturas, enfatizando a necessidade de abordagens metodológicas que permitam a detecção de infecções mistas em amostras do parasito isoladas de humanos, reservatórios e vetores.

No presente estudo, não foram detectadas misturas em nenhum dos 51 estoques de T. cruzi isolados de pacientes crônicos. Uma das possíveis explicações para estes achados podem estar relacionada ao longo tempo de infecção dos pacientes da região do Vale do Jequitinhonha, que podem ter servido como filtro biológico para algumas subpopulações de outros grupos genéticos. No trabalho de Andrade et al. (2011) a genotipagem foi feita de casos humanos obtidos por infecção oral recente, provavelmente por altas cargas parasitárias provenientes dos triatomíneos triturados, o que pode ter favorecido o encontro de infecções mistas nos isolados avaliados.

Como já demonstrado, no Brasil, o panorama da distribuição da diversidade genética do T. cruzi, principalmente nas regiões centro, sul e suldeste, ocorre pelo predomínio da DTU TcII, relacionada tanto com a infecção em hospedeiros invertebrados, vertebrados e humanos associados principalmente com o ciclo doméstico da Doença de Chagas, e relacionado com graves manifestações clínicas em pacientes humanos. Por outro lado, outros dados mais recentes, demonstram o

encontro de populações híbridas do parasito (TcVI) associado a infecção humana e diversos hospedeiros no ciclo doméstico da doença de Chagas no Brasil (Macedo et al., 2002; Steindel et al., 2003; Macedo et al., 2004, Zalloum et al., 2005; Lages Silva et al., 2006, D’ávilla et al., 2006; Valadares et al., 2007; Burgos et al., 2007; D’ávilla et al., 2009; Oliveira e Silva., 2009; Andrade et al., 2011.

Desse modo, nossos resultados estão de acordo com os dados documentados na literatura que mostram que as linhagens TcII e TcVI são extremamente associadas a infecção em humanos e vetores domiciliados em países como o Brasil e outros vizinhos da América do Sul (Barnabé et al., 2000; Di Nóia et al., 2002; Lages Silva et al., 2002; Freitas et al., 2005; Lages Silva et al., 2006; Rozas et al., 2007).

Para estudar a variabilidade no interior desses grupos foi empregada neste trabalho a metodologia de RAPD, que tem sido muito utilizada no estudo das relações filogenéticas entre isolados de diferentes hospedeiros e provenientes de diversas regiões (Steindel et al., 1993; Tibayrenc et al., 1993; Gomes et al., 1998; Brisse et al., 2000b).

A avaliação do perfil genético dos 51 isolados e clones de referência do T. cruzi pelo RAPD demonstrou claramente a subdivisão dessa espécie em suas seis linhagens genéticas e corroborou os resultados obtidos através da genotipagem para todos os isolados, agrupando-os em conjunto com os clones de referência das DTU(s) II e VI. Além disso, foi observada alguma estruturação entre os isolados dessas linhagens, indicativa da existência de discreta variabilidade genética dentre os grupos. Macedo et al. (2002) e Macedo et al. (2004) demonstraram uma tendência de diminuição da variabilidade genética dos isolados quando comparadas parasitos isolados de pacientes nas fases aguda e crônica da infecção avaliados pelas metodologias de RAPD e de microssatélites. Esses resultados são compatíveis com a idéia de que os clones de T. cruzi são capazes de estabelecer a infecção em diversos hospedeiros, que podem manter uma relação com esse protozoário e servir de filtros para algumas sub- populações do parasito (Macedo e Pena, 1998; Macedo et al., 2002, 2004). No presente trabalho foi observada grande semelhança entre os perfis de bandas apresentados pelos isolados, empregando diferentes iniciadores. Talvez o longo tempo de infecção desses pacientes possa ter propiciado a seleção de populações mais

adaptadas aos mesmos ou as condições ecoepidemiológicas da região em estudo. Essa hipótese justificaria a semelhança entre os isolados agrupados em um determinado ramo do fenograma. Contudo, para comprová-la seria necessário o estudo em reservatórios e vetores da região para melhor entendimento da ecoepidemiologia desse parasito na região.

Steindel et al. (1993) avaliaram 32 amostras de T. cruzi isoladas de diversos hospedeiros de algumas regiões do Brasil por RAPD e mostraram que 18 cepas eram pertencentes ao zimodema I (ZI). Essas apresentavam um percentual significativo de bandas compartilhadas (59% de similaridade) mesmo quando provenientes de diferentes regiões. Apesar desse alto índice de similaridade, eles conseguiram observar a estruturação desses isolados em grupos de acordo com a origem geográfica de cada amostra. Na comparação entre os isolados pertencentes a grupos genéticos distintos,

No documento MAYKON TAVARES DE OLIVEIRA (páginas 71-85)