• Nenhum resultado encontrado

Apesar de ser uma infecção antiga, a sífilis vêm sendo um tema atual em todo o mundo, inclusive no Brasil. A literatura (Dantas et al., 2017; Maciel et al., 2017; Luppi et al., 2018) ainda apresenta poucos estudos no que diz respeito ao seu perfil epidemiológico, principalmente referente à sífilis adquirida.

O presente estudo teve como objetivo analisar o perfil epidemiológico da sífilis em um município de médio porte populacional do Estado de São Paulo, a fim de contribuir para o planejamento das ações de saúde no município a partir das informações levantadas. O estudo do perfil epidemiológico de uma doença ou agravo é essencial para o conhecimento de seu comportamento em uma determinada população e, o avanço da tecnologia trouxe consigo, ferramentas úteis, como os softwares de geoprocessamento, além da ampliação do acesso às informações. Juntas, essas informações são capazes de contribuir para uma melhor análise epidemiológica, a partir da distribuição espacial dos casos estudados e propor ações embasadas nas informações obtidas (Chowell e Rothenberg, 2018). Baseado nos dados epidemiológicos encontrados neste estudo identificou-se a necessidade da utilização de ferramentas de geoprocessamento, o que permitiu conhecer a distribuição dos casos ao longo dos anos e identificar as áreas e populações de maior vulnerabilidade, relacionadas à renda familiar dos bairros estudados.

Tendo como base os resultados da distribuição dos casos notificados, que agregaram informação ao estudo do perfil epidemiológico, identificou-se uma necessidade de ir além deste perfil, avançando nos dados obtidos com o intuito de conhecer mais sobre a ocorrência e comportamento da infecção no município. Esse processo deu origem ao segundo artigo deste estudo cujo objetivo foi verificar a tendência da infecção a partir da série temporal dos casos notificados.

A distribuição espacial dos casos de sífilis adquirida, identificada no presente estudo, apontou para uma maior concentração de casos notificados nas regiões Central e Sul do município. O perfil epidemiológico apontou que a infecção afetou, principalmente, homens adultos, brancos, com oito anos ou mais de estudo. Houve aumento da taxa de detecção dos casos no período e a análise da série temporal apresentou tendência crescente, não estacionária e estatisticamente significantes. Esses dados indicam que a detecção de casos tem aumentado,

podendo estar relacionado com um aumento da vigilância em saúde e, consequentemente, das notificações compulsórias. Entretanto, o fato de acometer com maior frequência a população de adultos jovens indica que, apesar desta população ser munida de informações sobre prevenção e Infecções Sexualmente Transmissíveis (IST), a ausência do uso do preservativo torna essa população mais susceptível ao contágio (Macêdo et al., 2017).

No que diz respeito aos casos de sífilis em gestante, a distribuição dos casos apresentou maior concentração de casos notificados nas regiões Leste e Oeste, e afetou principalmente as adolescentes, brancas, também com tempo de estudo de oito anos ou mais. O mesmo perfil epidemiológico e distribuição da infeção no município foram encontrados para os casos notificados de sífilis congênita. As séries temporais destes agravos também se apresentaram não estacionária, crescente e estatisticamente significante, entretanto, o maior coeficiente da sífilis em gestantes provavelmente é resultado de um diagnóstico mais preciso realizado durante o acompanhamento pré-natal e incentivado por meio de políticas públicas, como a Rede Cegonha, por exemplo, que amplia as chances de diagnóstico precoce da gestante, a partir dos exames de rotina e da instituição dos testes rápidos que incluem diagnóstico de sífilis.

A Rede Cegonha foi instituída com a finalidade de reduzir a mortalidade materno- infantil, a partir de uma rede de cuidados que inclui o acompanhamento pré-natal, a realização de exames de rotina no primeiro e terceiro semestre gestacional, e a disponibilização e descentralização dos testes rápidos, que antes eram responsabilidade apenas dos Centros de Testagem e Aconselhamento (CTA) (Brasil, 2010; Lopes e al., 2016).

Os dados encontrados no presente estudo demonstram que, apesar do número de notificações de sífilis ter aumentado nos últimos nos, a taxa de detecção dos casos de sífilis em gestante está sendo maior que a taxa de incidência de sífilis congênita, o que indica que os casos estão sendo diagnosticados e tratados durante o acompanhamento pré-natal, resultando na diminuição da transmissão vertical e, consequentemente, dos casos de sífilis congênita.

Apesar das políticas públicas e ações que visam a redução da mortalidade materno- infantil no Brasil, este estudo identificou que houve gestantes com tratamento considerado inadequado e parceiros não tratados. De acordo com o Ministério da Saúde, o diagnóstico e tratamento adequado dos casos de sífilis em gestante e, concomitantemente, de seu parceiro, resultam na diminuição da reinfecção pela gestante e transmissão vertical da sífilis para a criança, consequentemente diminuindo a incidência de sífilis congênita (Brasil, 2007). Cabe ressaltar que,

até Setembro de 2017, a não realização do tratamento do parceiro concomitante ao da gestante, fazia com que o tratamento da sífilis em gestante fosse considerado inadequado. A partir da nota informativa Nº 2-SEI/2017 de 19 de setembro de 2017, o tratamento do parceiro continua sendo essencial para que não haja uma reinfecção desta gestante, entretanto, esse critério não é mais contabilizado na classificação do tratamento de sífilis em gestante como inadequado.

Dentre os critérios que definem o tratamento adequado/inadequado da gestante, o diagnóstico e tratamento iniciado a menos de 30 dias do parto, estão inclusos. Embora o acompanhamento pré-natal e número de consultas realizadas apresentem um efeito protetor para as mães e seus filhos, segundo a literatura, mesmo diante do aumento do número de casos e da taxa de detecção de sífilis em gestantes, como encontrado neste estudo, as dificuldades no diagnóstico, relacionadas a qualidade da assistência pré-natal e a não realização dos exames de rotina estipulados pela Rede Cegonha (Macêdo et al.,2017), além do desconhecimento dos sinais e sintomas por profissionais da saúde, podem contribuir para um diagnóstico e tratamento errôneos e tardios, que podem resultar em graves sequelas tanto para gestante quanto para seu concepto (Andrade et al.,2018).

Dentre os achados no presente estudo, cabe ressaltar que o município em questão vem desenvolvendo ações para o controle da sífilis, que vão desde a instauração do Comitê de Mortalidade Infantil à intensificação das ações de vigilância em saúde. No que diz respeito ao Comitê de Mortalidade Infantil, este tem por finalidade, investigar e transmitir as informações resultantes das investigações às unidades de saúde, perante situações de mortalidade de crianças menores de dois anos. Quanto às ações de vigilância em saúde, esta é realizada através da intensificação da conscientização da necessidade de notificação compulsória dos casos por parte dos profissionais de saúde. As ações desenvolvidas pela vigilância epidemiológica ao longo do período estudado resultaram em uma redução dos casos de nati/mortalidade por sífilis, passando de cinco em 2015 para zero em 2017.

Embora tenham sido encontradas algumas limitações durante a realização deste estudo, devido a subnotificação e a utilização de dados secundários e, consequentemente, o comprometimento da qualidade dos dados e restrição de informações, todas as fichas foram acessadas e examinadas, permitindo o conhecimento do perfil epidemiológico dos casos.

Dentre os principais desafios encontrados estão a identificação das dificuldades de diagnóstico na população e do tratamento do parceiro das mulheres identificadas, uma vez que faz-se necessária a conscientização do homem para que o tratamento seja bem sucedido.

Diante da magnitude da sífilis e dos esforços para o aumento da notificação dos casos diagnosticados, é de extrema relevância o levantamento do perfil epidemiológico dos casos notificados. Conhecer o perfil da população mais acometida pela sífilis é de extrema importância e fornece subsídios ao município para o planejamento de ações e intensificação do monitoramento, além de subsidiarem investimentos e recursos necessários para ações mais efetivas.

A partir da distribuição espacial dos casos de sífilis notificados, foi possível identificar o comportamento da infecção no município. O conhecimento das regiões de maior ocorrência torna-se um ponto de partida para investigações locais subsequentes e planejamento de intervenções, tendo como porta de entrada, a atenção primária. As informações da localização e perfil dos sujeitos devem ser levadas em consideração, visando ações de educação em saúde, melhora na assistência pré-natal e triagem diagnóstica e de acompanhamento dos casos notificados com sífilis.

Documentos relacionados