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Nosso estudo avaliou a associação entre a hipovitaminose D (25(OH)D < 30 ng/mL) e os distúrbios metabólicos em um grupo de trabalhadores de turno alternante da mineração. Nossos resultados mostram uma prevalência de 23% de deficiência e 50% de insuficiência de vitamina D. Considerando que a hipovitaminose D abrange estas duas faixas, a prevalência total foi de 73. A média dos níveis de 25(OH)D foi baixa nessa população, sendo igual a 26,1 ng/mL. A ocorrência de hipovitaminose D associou-se de modo independente a fatores bioquímicos, tais como, triglicérides, LDL-c, e ao excesso de gordura visceral, com um padrão de dose-resposta. Em relação à prevalência da hipovitaminose D, vários autores têm observado uma ampla distribuição mundial podendo afetar até metade da população adulta saudável de países desenvolvidos (Wahl et al., 2012). Mesmo sendo um evento subclínico, a hipovitaminose D é reconhecida como um dos fatores mais importantes que influenciam a integridade do esqueleto e algumas doenças crônicas (Norman, 2008; Ross et al., 2014). Enquanto níveis de 25(OH)D abaixo de 30 ng/mL são comuns na maioria das populações, níveis inferiores a 10 ng/mL, o qual constituem a deficiência severa de vitamina D, são mais comumente vistos em populações de risco, particularmente em idosos (Mithal et al., 2009) onde o processo de envelhecimento, leva ao afinamento da epiderme e derme, com consequente diminuição da reserva do colesterol precursor (7-deidrocolesterol) da vitamina D.

Dentre os principais fatores que estão significativamente associados com baixos níveis de 25(OH)D cita-se a idade avançada, incidência de radiação solar, que varia com a latitude, a estação do ano e a poluição do ar, pigmentação da pele mais escura, menor exposição ao sol (Mithal et al., 2009). Para manter os níveis de 25(OH)D adequados, a forma mais recomendada é a exposição dos braços e pernas por cerca de 20 minutos à luz solar (Francis et al., 2013). O Brasil, apesar da latitude privilegiada, não está isento de apresentar índices inadequados de 25(OH)D. Unger e colaboradores (2010) avaliando os níveis de 25(OH)D em uma população adulta saudável de São Paulo, após o inverno e verão, observaram uma redução da prevalência nos períodos mais quentes do ano, porém 40 dos participantes ainda apresentavam níveis inadequados nesses períodos do ano (Unger et al., 2010).

A exposição à luz solar reduz significativamente em função do meio ocupacional (Ward et al., 2011). O trabalho em turnos ou em ambiente fechado limita a exposição à luz solar. Maeda et al (2007) avaliando uma população jovem brasileira, encontrou níveis de 25(OH)D

50 significativamente mais baixos em um grupo de médicos residentes que trabalhavam no turno noturno (26,8 ng/mL) comparado a estudantes (32,4 ng/mL) e trabalhadores diurnos de ambiente fechado (37,6 ng/mL) (Maeda et al., 2007). É interessante observar que a média de 25(OH)D observada para esses médicos com atividade noturna, foi muito semelhante à dos trabalhadores de turno alternante do presente trabalho.

A atividade física ao ar livre é outro fator que contribui para manutenção dos níveis adequados de 25(OH)D (Maeda et al., 2007). No entanto, neste estudo não foi possível observar uma associação significativa com os níveis de 25(OH)D, provavelmente em função de apenas 22 dos participantes relatarem a prática de atividades físicas moderadas ao ar livre três vezes ou mais na semana, como recomendado pela OMS (WHO, 1995). Um estudo sugere que a atividade física deve ser aliada a suplementação ou inclusão de alimentos com alto nível de vitamina D nos grupos de trabalhadores para que a influência negativa do meio ocupacional seja eliminada (Jeong et al., 2014).

Os níveis de PTH se mostraram elevados em apenas 1,4% dos participantes com média de 31,4 pg/mL. Destaca-se que este percentual de participantes com PTH elevado apresentavam níveis insuficientes de 25(OH)D. Alternativamente, o PTH tem sido considerado um dos marcadores de insuficiência e suficiência de 25(OH)D. Muitos estudiosos aceitam que o ponto que determina a elevação dos níveis de PTH se define quando as concentrações de 25(OH)D estão entre 20 e 30 ng/mL (níveis insuficientes) (Heaney, 2005; Silva et al., 2008a; Rosen, 2011; Steingrimsdottir & Page, 2005). Os estudos que avaliaram populações de várias regiões e de várias faixas etárias conseguiram detectar essa correlação negativa, como por exemplo, um estudo, com uma amostra de várias regiões da França, o qual avaliou a correlação dos níveis de 25(OH)D e PTH observando uma correlação negativa significativa (r = - 0,79, p = 0,01) onde os níveis de PTH começaram a elevar-se quando as concentrações de 25(OH)D estavam abaixo de 31 ng/mL (Chapuy et al., 1997). Porém, estudos mais recentes propõem que não existe um limiar absoluto dos níveis séricos de 25(OH)D em que os níveis de PTH se elevam (Heaney, 2005; Steingrimsdottir & Page, 2005).

Apesar dos níveis de PTH apresentarem um padrão de distribuição decrescente do primeiro ao último quartil dos níveis de vitamina D, os dados do presente estudo apresentaram uma correlação negativa fraca (r = - 0,167) entre os níveis de 25(OH)D e PTH. As correlações obtidas entre PTH e 25(OH)D são de pequena magnitude e mostram ampla variação mesmo em

51 pessoas idosas. Em populações de jovens adultos e adultos esta correlação nem sempre é observada, sendo o caso no presente estudo (Rosen, 2011).

O status adequado de vitamina D pode ter um papel importante na prevenção de doenças cardiovasculares (DCV) (Anderson et al., 2010) sendo que a sua inadequação já é considerada como um tipo de marcador de risco para DCV (Zittermann et al., 2009). Dados da literatura já descrevem a importância da associação da insuficiência de vitamina D com a hipertensão arterial, diabetes tipo 2 e um perfil lipídico desfavorável.

A relação da vitamina D com a hipertensão pode ocorrer via sistema renina-angiotensina e função vascular (Vaidya & Forman, 2010). A hipertensão ocorre principalmente pela ativação inadequada do sistema renina-angiotensina. Estudos de longa data já apontavam que os níveis séricos de 1,25(OH)2Destavam inversamente associados à pressão arterial ou à atividade da renina plasmática em normotensos e hipertensos (Resnick et al. 1986; Imaoka et al., 1991). Em 2008, Kong et al. demonstraram que a supressão da expressão de renina pela 1,25(OH)2D in vivo é independente do PTH e do cálcio (Kong et al., 2008). Estudos experimentais demonstraram que a 1,25(OH)2D inibe a expressão da renina no aparelho justaglomerular (Li et al., 2002) e bloqueia a proliferação das células da musculatura lisa vascular (CMLV) (Vaidya & Forman, 2010). Além disso, a 1-α hydroxilase, enzima de conversão da 25(OH)D em 1,25(OH)2D, tem expressão em diversos tecidos, como células endoteliais, CMLV, além das células renais (Zehnder D. et al., 1999), sugerindo um efeito parácrino da 25(OH)D independente dos níveis circulantes de 1,25(OH)2D.

O presente estudo avaliou as pressões sistólica e diastólica separadas nos grupos suficiente e insuficiente de 25(OH)D. Os pontos de pressão sistólica de 130 mmHg e pressão diastólica de 85 mmHg apresentaram diferença significativas entre os grupos sugerindo que esses pontos de corte são possíveis alvos a serem avaliados em maiores detalhes em estudos futuros. Porém, no nosso estudo, após ajuste por fatores de confusão como idade e sazonalidade, estes pontos perderam significância. Mesmo com a perda de significância, após ajuste, é importante destacar que a análise da distribuição dos níveis pressóricos nos quartis da 25(OH)D foi significativa e apresentou um padrão decrescente à medida que os níveis de 25(OH)D aumentaram. Este dado corrobora com o que é visto na literatura e talvez devido ao nosso número amostral a diferença entre os grupos não pôde ser detectada após ajuste no modelo logístico.

A relação do cálcio sérico e do PTH com o desenvolvimento do DMT2 é bem estabelecida (Levy, 1999), entretanto, estudos em humanos sugerem que a 25(OH)D pode atuar como

52 potente agente modificador do risco para o aparecimento dessa doença (Gregori et al., 2002). Estudos confirmam essa hipótese, pois demonstram que indivíduos com redução na concentração de 25(OH)D sérica apresentam maior risco para desenvolver DMT2 (Pittas et al., 2007). A deficiência de vitamina D pode predispor à intolerância à glicose, a alterações na secreção de insulina e, assim, ao desenvolvimento do DMT2. Esse possível mecanismo ocorre em razão da presença do receptor de vitamina D em diversas células e tecidos, incluindo células- β do pâncreas, no adipócito e no tecido muscular (Schuch et al., 2009).

Da mesma forma que os dados de pressão arterial, a glicemia de jejum e a presença de diabetes tipo 2 ou tolerância à glicose diminuída perderam a significância após ajuste pelos mesmos fatores de confusão e não permaneceu no modelo logístico final como variável independentemente significativa. Em relação à distribuição da glicemia de jejum nos quartis da 25(OH)D também observou-se o padrão decrescente do primeiro ao último quartil. Esse achado reforça a relação que pode existir entre o diabetes tipo 2 e a hipovitaminose D.

O efeito da hipovitaminose D sobre a regulação do perfil lipídico é um dos mecanismos propostos para a relação com DCV (Saedisomeolia et al., 2014). A maioria dos estudos observacionais está de acordo que baixos níveis de vitamina D estão associados a um perfil lipídico desfavorável, porém alguns estudos clínicos, não confirmam esses achados (Jorde & Grimnes, 2011). Gonzalez et al. (2014a) encontraram, após ajuste por confundidores, uma relação inversa entre níveis deficientes de 25(OH)D (< 20 ng/mL) e hipertrigliceridemia. No entanto, não observaram associação com a dislipidemia, ao contrário do observado na população do presente estudo. Além disso, outros autores (Karhapää et al., 2010) também encontraram resultados parecidos com os do presente estudo onde há uma associação inversa significante entre a 25(OH)D e o LDL-c e o TG.

Dentre os parâmetros bioquímicos associados de forma independente à hipovitaminose D, após ajuste por fatores de confusão, a LDL-c foi um dos componentes do perfil lipídico que permaneceram significativos e mais chamou a atenção devido a um risco sete vezes maior de apresentar hipovitaminose D em indivíduos com níveis acima de 160 mg/dL. A LDL-c em excesso na circulação participa da formação do ateroma, após serem modificadas por oxidação. Em relação ao processo aterosclerótico, existe a teoria da resposta à retenção que afirma que a interação entre as lipoproteínas e a matriz é o ponto chave da aterosclerose, ao passo que a hipótese da modificação oxidativa destaca o papel da oxidação das LDL-c como o principal contribuinte para que a doença se desenvolva (Abdalla & Sena, 2008; Stocker & Keaney, 2004).

53 Embora essas teorias ofereçam diversos mecanismos para explicar a aterosclerose, existem pontos comuns, como por exemplo, o envolvimento da inflamação e a LDL-c como partícula fundamental no processo. As lipoproteínas do plasma são partículas heterogêneas que variam no tamanho, na densidade, na carga elétrica e na composição lipídica e proteica. O processo oxidativo que ocorre nestas partículas causa modificação da estrutura lipídica e proteica, culminando na peroxidação lipídica e na oxidação de resíduos de aminoácidos das apolipoproteínas, o que causa alterações nas suas propriedades físico-químicas.

Lesões ateroscleróticas iniciais apresentam células espumosas que são constituídas, em grande parte, por macrófagos repletos de colesterol esterificado. Pelo fato de a captação da LDL-c oxidada não regular a atividade dos receptores “scavengers”, sua remoção contínua leva ao acúmulo de colesterol intracelular, o qual é reesterificado pela ACAT (acil colesterol aciltransferase) – enzima responsável pelo armazenamento do colesterol no citoplasma. A hipovitaminose D tem sido considerada um fator de risco independente para o processo aterosclerótico, estando associada com a disfunção endotelial e aumento da peroxidação lipídica que ocorre nas lipoproteínas plasmáticas, além de outros mecanismos (Brewer et al., 2011; Weng et al., 2013). Um estudo que avaliou o efeito da suplementação de vitamina D na função endotelial mostrou efeitos favoráveis (Tarcin et al., 2009). No mesmo estudo, a concentração de substâncias reativas ao ácido tiobarbitúrico (SRAT), as quais são utilizadas como indicadores da peroxidação lipídica, diminuiu significativamente após suplementação em indivíduos com níveis inadequados de 25(OH)D. Como os autores não observaram associação entre a dilatação mediada pelo fluxo e os níveis de 25(OH)D, concluiu-se que os efeitos positivos sobre a função endotelial ocorreram devido à redução do stress oxidativo pela 25(OH)D. Portanto, a hipovitaminose D associada à disfunção endotelial pode predispor a taxas mais elevadas de DCV no inverno.

Outro parâmetro bioquímico associado de forma independente à hipovitaminose D, após ajuste por fatores de confusão, foi o TG o qual apresentou um risco 2,4 vezes maior de apresentar hipovitaminose D em indivíduos com níveis acima de 150 mg/dL.

Neste estudo, a concentração de TG foi significativamente maior no primeiro em relação ao quarto quartil das concentrações séricas de 25(OH)D. Esse padrão decrescente está de acordo com outros estudos (Martins et al., 2015; Zittermann et al., 2009).

Existem dois mecanismos principais postulados para explicar a redução dos níveis de TG mediada pela 25(OH)D. O primeiro mecanismo está relacionado com a função clássica da

54 vitamina D de aumentar a absorção de cálcio via intestinal com consequente elevação dos seus níveis séricos. A elevação do cálcio sérico diminui a síntese de TG hepáticos e sua secreção através de seu efeito supressor em uma proteína de transferência microssomal de TG conhecida com MTP (Microsomal triglyceride transfer protein) (Chaudhuri et al., 2013; Cho et al., 2005; Zittermann et al., 2009).

O segundo mecanismo diz respeito ao efeito supressor da vitamina D sobre a concentração de PTH no soro. A atividade lipolítica pós-heparina é reduzida pela concentração elevada de PTH (Chaudhuri et al., 2013; Lacour et al., 1982; Zittermann et al., 2009), baixos níveis séricos de PTH podem reduzir os níveis de TG via remoção periférica aumentada. Além disso, dois outros mecanismos também têm sido implicados. A vitamina D podem regular o metabolismo dos TG através do aumento da expressão de receptores de VLDL-c, em alguns tipos de células (Jouni et al., 1995), promovendo maior captação de TG pelas células. Por fim, a resistência à insulina pode explicar a associação entre o 25(OH)D e TG: quando a deficiência de vitamina D está presente, aumenta o risco de resistência à insulina (Ayesha et al., 2001; Chiu, et al., 2004; Pittas & Dawson-Hughes, 2010; Tai et al., 2008) que por sua vez está associada a um aumento dos níveis de colesterol VLDL e triglicérides (Ginsberg, Zhang, & Hernandez-Ono, 2005).

Os níveis elevados de LDL-c, TG e GV são importantes indicadores de um desvio nutricional nesta população. Um estudo que avaliou a mesma população de trabalhadores de turno alternante sugeriu possíveis explicações para as altas prevalências de dislipidemias e adiposidade (Alves, 2012). A desregulação dos ritmos biológicos e as alterações dos hábitos alimentares são os principais contribuintes apontados. Dados apontam que o trabalho em turnos alternantes leva a um desequilíbrio hormonal com queda nos níveis de leptina e o aumento dos níveis de grelina, o que pode levar ao aumento da ingestão calórica (Spiegel, et al., 2004; Gauraulet, et al., 2010). Rotineiramente, os trabalhadores de turno costumam fazer muitas refeições à noite que é período onde o efeito termogênico do alimento se mostra menor comparado ao período da manhã e da tarde (Atkinson, et al., 2008). Como apontado por alguns estudos, a falta de refeições frequentes em companhia da família leva os trabalhadores de turnos a optar por alimentos de rápido preparo, os quais muitas vezes são caracterizados por altos teores de gordura (De Assis & Moreno 2003).

Aliado à questão nutricional está a prática de atividade física insuficiente e as horas de trabalho sentado e com baixa exposição solar, que colaboram principalmente com os parâmetros bioquímicos alterados, adiposidade e níveis inadequados de 25(OH)D. No presente estudo, apesar de não ter permanecido no modelo logístico final como variável independentemente

55 significativa, a prevalência de hipovitaminose D no grupo com baixa frequência de atividade física foi de 85, o que mostra o quão importante é prática de atividade física não só para manutenção do peso corporal e dos níveis ideais dos componentes dos perfil lipídico como também para manter os níveis de 25(OH)D adequados. Permanece a necessidade de estudos clínicos que avaliem estes parâmetros nesta população para o direcionamento de medidas de intervenção.

Dado relevante, no presente estudo, foi revelado, após ajuste por fatores de confusão, que a hipovitaminose D apresentou uma associação significativa inversa dose dependente com o LDL-c, triglicérides e gordura visceral. Indivíduos com níveis de LDL-c e TG elevados apresentaram um risco 11 vezes maior para hipovitaminose D em relação aos indivíduos com níveis normais. Outro tipo de interação que foi observada foi entre TG e GV, onde indivíduos com níveis elevados de TG e maior área de GV apresentaram um risco 8,2 vezes maior em relação aos indivíduos com tais parâmetros normais. Poucas publicações descreveram este padrão crescente de risco para a hipovitaminose D quando ocorre a interação dos fatores citados.

O trabalho de turno predispõe o indivíduo a vários componentes da síndrome metabólica (SM) (Kawabe et al., 2014), dentre os quais cita-se a hipertrigliceridemia, diminuição do HDL e produção de partículas de LDL-c de menor tamanho conhecidas como LDL pequena e densa (LDLpd). Estes fatores juntos caracterizam o fenótipo lipídico aterogênico da SM (Abdalla & Ferreira, 2006). As concentrações aumentadas de LDL-c elevam o risco cardiovascular, mas sabe-se que seu tamanho pode ser um preditor ainda mais importante. As LDLpd são mais suscetíveis à oxidação devido a maior exposição das moléculas de apolipoproteínas B (apoB) ao meio aquoso. A elevação da quantidade da apoB é um parâmetro indicativo da presença de partículas pequenas de LDL-c, sendo sua concentração no plasma diretamente proporcional à quantidade de triglicérides.

Nosso estudo não encontrou quedas significativas nos níveis de HDL para compor a tríade do fenótipo lipídico aterogênico da SM e para fins diagnósticos, apenas as concentrações séricas elevadas de TG e baixas de HDL fazem parte dos parâmetros sugeridos pelo National Cholesterol Education Program/Adult Treatment Panel III (NCEP-ATPIII) (NCTP-ATPIII, 2002). Porém a presença de LDL-c no fenótipo lipídico aterogênico da SM já foi sugerida em alguns estudos, mostrando associação consistente entre LDLpd e doença isquêmica cardíaca (Lamarche et al., 1997; St-Pierre et al., 2001).

56 A característica que tem uma relação mais consistente com status inadequado de vitamina D é o sobrepeso e obesidade (Cheng et al., 2010), sugerindo que a hipovitaminose D não seja apenas consequência da baixa exposição ao sol por indivíduos obesos mas sendo lipossolúvel, possa estar aprisionada no tecido adiposo. Levando em conta estes fatores de confusão, a maioria dos estudos observacionais não pode assumir se a hipovitaminose D é causa ou consequência do sobrepeso e obesidade. Estudos clínicos apontam a deficiência de vitamina D como um dos fatores que desencadeia o acúmulo de gordura corporal por mecanismos que desestimulam a lipólise e estimulam a lipogênese (Schuch & Garcia, 2009). Este estudo, em concordância com outros estudos (Peterson et al., 2014; Wortsman et al., 2000), observou que os maiores valores de IMC em kg/m2 estavam distribuídos nos menores quartis da concentração de 25(OH)D mostrando uma correlação inversa. Um estudo recente, que utilizou uma abordagem genética limitando a interferência de fatores de confusão, explorou a relação causal entre IMC e 25(OH)D encontrando que o aumento do IMC pode conduzir a baixos níveis de 25(OH)D (Vimaleswaran et al., 2013).

Atualmente, dentre os estudos que objetivaram avaliar a relação dos baixos níveis de 25(OH)D com a obesidade, poucos incluíram medidas diretas de adiposidade. Nessa população de trabalhadores de turno alternante, o excesso de gordura visceral interagindo com a hipertriglicemia apresentou uma forte associação (OR=8,2) com a hipovitaminose D. A adiposidade visceral é um importante fator envolvido na etiologia do fenótipo lipídico aterogênico presente na SM, sendo considerado o compartimento mais patogênico e mais frequentemente associado com a secreção de adipocinas, mediadores da hemostasia e fibrinólise, e fatores de crescimento (Fox et al., 2007). Além disso, em adultos, o acúmulo de gordura visceral é mais fortemente correlacionado com fatores de risco cardiovasculares, como hipertensão, hipertrigliceridemia, glicemia de jejum alterada, síndrome metabólica e resistência à insulina (Després, 2012;Van Gaal et al., 2006; Gast et al., 2013). O tipo de adipócito que se encontra neste sítio tem intensa atividade lipolítica, liberando grandes quantidades de ácidos graxos livres (AGL) na circulação portal e sistêmica.

Estudos recentes sugerem que o tecido adiposo pode ser um alvo direto de vitamina D que pode atuar como um regulador do tecido adiposo branco, através da mobilização e utilização de lipídios neste tecido. Essa modulação ocorre através da indução do aumento da atividade da lipase lipoproteica (LLP) ou da inibição da atividade da ácido graxo sintase (Ding et al., 2012). Sendo assim, um status inadequado de vitamina D pode estar envolvido nas alterações dos

57 níveis de TG, sugerindo que a hipovitaminose D possa ser um forte contribuinte para este fenótipo lipídico aterogênico da SM.

Alguns estudos observaram que a associação dos baixos níveis de 25(OH)D com o excesso de gordura abdominal visceral é mais forte que a associação vista para gordura abdominal subcutânea (Bhatt et al., 2014; Cheng et al., 2010). E adicionalmente, essa relação inversa de 25(OH)D com a adiposidade subcutânea e visceral, foi vista mesmo entre indivíduos magros, ressaltando a importância específica do tecido adiposo, independente do peso corporal, como correlato de status da vitamina D. O presente estudo avaliou somente a adiposidade visceral, encontrando um risco 2,3 vezes maior de hipovitaminose D nos indivíduos que apresentaram área de GV maior que 10 cm3. Permanece a necessidade de um estudo que avalie a relação da adiposidade subcutânea com a hipovitaminose D nessa população para avaliar melhor os dois tipos de tecido adiposo.

Como visto, existem alguns mecanismos que podem explicar a maior associação da hipovitaminose D com excesso de gordura visceral que foi visto na população deste estudo. Se tal relação é reflexo de uma relação causal ou apenas que os indivíduos com boa saúde passam mais tempo ao ar livre sob o sol e, portanto, produzem mais vitamina D na pele, e/ou tem uma alimentação que inclua mais peixes e são mais adeptos à suplementação de vitamina D ainda permanece questionável.

LIMITAÇÕES DO ESTUDO

 Este estudo, sendo de delineamento transversal, não pode se abster das limitações inerentes ao desenho, ou seja, não pode estabelecer relação de causa entre os fatores analisados e hipovitaminose D.

 Outros fatores importantes a serem citados são o uso de filtro solar e a obtenção da vitamina D

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