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Dispositivo teórico e dispositivo analítico da Análise de Discurso

4.2 PRINCÍPIOS E PROCEDIMENTOS DO DISCURSO

4.2.1 Dispositivo teórico e dispositivo analítico da Análise de Discurso

e,b,c,d, ↓ e,f,c,d, ↓ e,f,g,d, ↓ e,f,g,h Fonte: Orlandi (2015, p. 77).

Nessa representação, o ponto de partida é (a,b,c,d,) e o ponto de chegada é (e,f,g,h). Percebe-se que o dito nas formas/palavras, sofre um deslocamento. Este deslizamento leva a que a forma/palavra seja sempre outra, e elas podem significar de modos diferentes sob a mesma forma. As palavras mudam de sentido conforme lugar e tempo de enunciação e aqueles que as empregam. “As palavras falam com outras palavras. Toda palavra é sempre parte de um discurso. E todo discurso delineia na relação com outros: dizeres presentes e dizeres que se alojam na memória” (ORLANDI, 2015, p. 41).

4.2.1 Dispositivo teórico e dispositivo analítico da Análise de Discurso

Para estabelecer as noções de Dispositivo Analítico e Teórico nesta pesquisa, recorremos aos conceitos presentes na tese de Ferrari (2008)3. Nela, a autora se detém na análise do lugar social dos escravos que, embora não possuíssem voz na sociedade colonial, a sua presença como força de trabalho, os incluía em diversas materialidades, uma vez que a sociedade da época não podia prescindir do seu trabalho braçal. Então, seu objeto de estudo centrou-se em anúncios de fuga de escravizados (FERRARI, 2008).

3 Texto completo da Tese doutorado: “Nomes próprios de pessoa e descrição: estudo da descrição e do nome próprio a partir da análise de anúncios de fuga de escravos. FERRARI, Ana Josefina. Campinas, SP : 01-263 p. ano: 2008. apresentada ao curso de Linguística do Instituto de Estudos da Linguagem da Universidade Estadual de Campinas.

Segundo Ferrari (2008, p. 118), “tomando como ponto de partida uma pergunta, o analista mobilizará alguns conceitos e outros simplesmente não serão utilizados”. No caso desta pesquisa, em face do documento BNCC, houve uma aproximação considerando-o um texto inovador para a educação brasileira. Nossa pergunta inicial foi: qual foi o âmbito de abrangência que se quis dar ao tema EA, e de que forma foi contemplada a temática EA, na versão final do documento BNCC?

A primeira leitura representou a expressão do desejo da classe de professores. No entanto, numa leitura crítica, evidenciou-se a necessidade de ir ao texto com outros olhos. A pergunta da pesquisa emergiu de um não-dito, de um silêncio, e não da materialidade do texto. Procedeu-se, então, a uma nova seleção, a um novo recorte, que constituiu o Dispositivo Analítico deste trabalho de pesquisa.

Tomando como ponto de partida essa contribuição, podemos estabelecer, para esta pesquisa sobre o silenciamento do termo EA, um paralelo com a tese de Ferrari, no sentido de que as questões ambientais se impõem na BNCC pela sua ausência, por ser alcançado pelo pesquisador no que tem de omitido pelo documento. “Esta autora entende por Dispositivo Teórico aquele que dá ao analista o método a partir do qual ele pensará o

corpus” (FERRARI, 2008, p. 117 apud ORLANDI 1999, 2001). Desse modo, no referencial teórico se recorreu, no presente texto, às bases filosóficas de vários pensadores tais como: Aristóteles, Santo Agostinho, São Tomás de Aquino, Bacon, Descartes, Espinosa, Marx, Vygotsky, Paulo Freire e outros na percepção do conceito de natureza e na relação ser humano-natureza, buscou associar com características da Educação Ambiental Crítica de Loureiro (2012) e Gonçalves (2005). E para estimular a reflexão sobre a importância da EA os autores Diamond (2005) e Acosta e Breda (2016).

Assim, a partir da constatação de que houve o estabelecimento de uma nova ordem na colocação dos conteúdos curriculares na BNCC, especificamente a separação em dois blocos: conteúdos comuns e conteúdos diversificados, e, verificando ainda que o objetivo tenha sido produzir um “nivelamento” na aprendizagem dos alunos no país inteiro, estes elementos indicaram a direção para a formação do corpus da pesquisa. Ainda segundo Ferrari (2008, p. 117): “como o Dispositivo Teórico, por um lado, é uma

construção do analista, uma parte da análise e responsabilidade exclusiva do analista. […], depende do analista, neste dispositivo, a formulação do problema que atravessará a análise do corpus”. Dessa forma, procedeu-se ao mapeamento do termo EA para percorrer o caminho do deslizamento sofrido pelo termo, até sua colocação entre outros temas de relevância, porém silenciados, na parte diversificada da normativa. O problema encontrado foi a ausência do termo, um silêncio, entendendo o silêncio no seu espaço simbólico, como veremos adiante.

AD visa à compreensão de como um objeto simbólico produz sentidos, como ele está acometido de significação para e por sujeitos. Cada análise é uma nova prática de leitura, na qual há mobilização de dispositivos teóricos a partir da questão formulada pelo analista. Por outro lado, Orlandi (2015), define o dispositivo teórico como aquele que “objetiva mediar o movimento entre a descrição e a interpretação” e sustenta-se em princípios gerais da AD e dispositivo analítico como o construído pelo analista a cada análise, compreendendo que ambos estão em relação.

Para Ferrari (2008, p. 118), para tratar do dispositivo da AD e preciso que:

“primeiramente é preciso deixar claro que todo método nessa área depende do objeto. Compreende-se que qualquer análise se inicia a partir da escolha do objeto discursivo e da constituição do corpus. Tomando como ponto de partida uma pergunta, o analista mobilizará alguns conceitos e outros simplesmente não serão utilizados. Justamente dessa seleção, desse corte de categorias utilizadas para a análise, será construído o Dispositivo Analítico, por outras palavras, o Dispositivo específico a ser utilizado na análise em questão. Portanto, o Dispositivo Teórico inclui o Dispositivo Analítico. A pergunta do analista perante seu corpus será a que dará forma a esse constructo e as possibilidades de análise que o corpus apresenta também contribuirão para tal. Desse modo, as conclusões que o analista chega dependerão em grande medida deste último (FERRARI, 2008, p. 117).

O dispositivo analítico consiste na maneira como o analista utiliza, “individualiza” o dispositivo teórico, considerando a natureza do material e a finalidade da análise. Desse lugar teórico, estabelece um objeto de análise próprio, o discurso, que tem a linguagem enquanto lugar de manifestação da ideologia e do inconsciente e onde a História incide sobre o simbólico.