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Distanciamento do marxismo e abertura ao pensamento do político

2.1. A visão marxista da história em questão

No Prefácio à 2ª edição de Éléments d’une critique de la bureaucratie, redigido em 1979, ao passar em revista seu percurso filosófico, Lefort indica o ponto central que marca sua tomada de distância com relação à matriz marxista de pensamento, no interior da qual o filósofo havia gestado, entre as décadas de 1940-1950, a primeira formulação de sua crítica à dominação burocrática exercida na URSS140. Como vimos no capítulo

anterior, do fundo dessa crítica destacava-se, por contraste, a concepção de um socialismo democrático e seu vínculo com a revolução proletária.

Durante um tempo, acreditei ver o delineamento de uma revolução que seria a obra dos próprios oprimidos, que saberia se defender contra aqueles que pretendessem dirigi-la. Imaginava que tal revolução, beneficiando-se de toda a bagagem (acquis) do movimento operário, tornaria impossível a formação de um novo Estado e de uma nova classe dominante. As tentativas sucessivas do proletariado para se organizar e, vez ou outra por meio de ações violentas, para se libertar da opressão pareciam-me compor uma experiência na qual tudo contava, tanto os fracassos quanto os sucessos. Eu lhe emprestava o poder de decifrar, pouco a pouco, as figuras de sua alienação, dentre as quais a última e a mais secreta lhe era oferecida pela sua própria burocracia. É dessa

maneira que eu me representava o encaminhamento da verdade na História. No presente, sei que me enganava. Essas ilusões começaram

a se dissipar em 1958 tão logo realizada minha ruptura com Socialismo

ou Barbárie, e desde então eu me obstinei a destruí-las141.

O relato não poderia ser mais contundente. O que impressiona não é apenas a indicação de uma mudança de perspectiva, por mais brusca que seja, mas, principalmente, o estatuto conferido às antigas análises: elas são postas no campo da ilusão e tornam-se

140 “Tendo formado meus primeiros juízos sob a atração do socialismo, eu procurava inicialmente em Marx

argumentos contra o stalinismo, que me inspirava uma aversão instintiva, em razão de seu dogmatismo, de seu cientificismo, de seu nacionalismo e da disciplina de sua organização. Sensível às ambiguidades de Marx, eu me esforcei para defendê-lo contra um marxismo que parte de sua obra secretava”. LEFORT, C. “Préface” (1979). In ECB, p. 13.

alvo de um combate obstinado. Poucos filósofos, diga-se de passagem, fizeram de maneira tão radical a experiência de se contraporem a si mesmos, voltando atrás em seus juízos, admitindo equívocos, em suma, permitindo-se reelaborar o pensamento em contato com a história, sem temer os seus impactos ou desmentidos. Para Lefort, essa contraposição a si não se resume a um mero abandono de antigas crenças; ao contrário, é típico de sua postura intelectual fazer dessas rupturas um exercício privilegiado de (re)elaboração filosófica, por meio do qual o pensador vai abrindo novas frentes de reflexão. Dito isto, o que nos interessa esclarecer é o processo ao longo do qual a base marxista do pensamento de Lefort será progressivamente posta em questão: quando,

como e por que as noções de proletariado e revolução se tornaram ilusões? Para lidar com

tal deslocamento, é preciso, antes, compreender de que maneira a relação com Marx se constituiu originalmente. Retomemos, assim, o relato supracitado e façamos dele nosso fio condutor.

Nele Lefort expõe claramente que o principal sustentáculo de sua crítica ao regime soviético, nos anos de pertencimento ao grupo Socialisme ou Barbarie, consistia numa certa representação da história, cujos princípios sinalizam certa referência ao pensamento de Marx. Aos olhos de Lefort, o pensador alemão havia tornado sensível a radical transformação da história humana com o advento do capitalismo, que inaugura uma temporalidade nova, reordenando e intensificando a luta de classes; e, sobretudo, as análises marxianas apontavam para a superação da divisão social do modo de produção capitalista graças à intervenção de um sujeito capaz de romper a naturalidade do sistema socioeconômico, desnudar sua violência originária continuamente renovada, quebrar o regime do imaginário próprio ao capitalismo e suspender, enfim, a reprodução dos pressupostos e contradições próprios a este sistema142. Trata-se, portanto, de uma

142 Quanto a este ponto, evocamos em nosso auxílio a síntese de Marilena Chaui: “não pode haver modo de

produção capitalista se dois pressupostos não estiverem realizados: o trabalho livre, isto é, uma propriedade do trabalhador que pode ser vendida por ele, e a separação entre o trabalho e a propriedade dos meios de produção. Ora, esses dois pressupostos do capitalismo foram postos pela última volta do desenvolvimento do modo de produção feudal e o modo de produção capitalista, que parte de algo que não foi posto por ele, pois é condição para que venha existir, os incorpora como seu modo mesmo de existência, realizando um processo pelo qual os repõe; e, a cada volta do seu desenvolvimento, essa reposição põe contradições novas até que seja posta aquela que o sistema não terá condição ou capacidade para interiorizar em seu movimento e que o destruirá, ao mesmo tempo em que será o pressuposto de um novo modo de produção, o comunismo. A força de um modo de produção não vem apenas da sua capacidade econômica para repor seus pressupostos, mas também de sua força para manter nos membros da formação social o sentimento da naturalidade desses pressupostos até que as novas contradições destruam tal sentimento e exibam a violência histórica do sistema”. CHAUI, M. “A história no pensamento de Marx”. In A teoria marxista

concepção da História em sentido forte, que “teve o projeto de abraçar a história da humanidade e fornecer a chave de seu desenvolvimento”143, assentando-se sobre a práxis de um sujeito histórico único (o proletariado) e anunciando o movimento de negação do instituído que recebe o nome de revolução.

Esse esquema interpretativo, embora tenha permanecido num estado mais ou menos implícito, orientou Lefort nas diversas frentes de sua crítica do fenômeno burocrático nos anos 1940 e 1950, quando o pensador francês o discernia especialmente no quadro do regime soviético144. Assim, cumpre enfatizar: da crítica ao funcionamento das microburocracias (partidos, sindicatos, etc.) à caracterização da burocracia como nova classe dominante e fundamento do exercício do poder stalinista (concebido enquanto poder totalitário), atua na reflexão lefortiana um modelo de crítica social e uma visão sobre a história que guardam uma referência às ideias-chave do pensador alemão.

Dizer isto significa, dentre outras coisas, que na visão de Lefort a luta de classes desempenha o papel de motor histórico também no contexto soviético, com a diferença de que, neste, o antagonismo social apresenta uma novidade: a burocracia se mostra o novo oponente da classe operária, assumindo não apenas uma posição equivalente à da burguesia na sociedade capitalista, mas se revelando a última figura das alienações próprias ao proletariado. De maneira semelhante ao procedimento que Marx adota frente à sociedade burguesa, o sistema soviético, para Lefort, tinha que ser visado em sua dupla dimensão, ou seja, em seus fundamentos materiais e ideológicos. Dito de outra maneira,

hoje: problemas e perspectivas. BORON, A. A.; AMADEO, J,; GONZALEZ, S. (orgs.), 2007, p. 3.

Disponível em: http://bibliotecavirtual.clacso.org.ar/ar/libros/campus/marxispt/cap. 5.doc

143 LEFORT, C. “Marx: de uma visão da história a outra” (1965). In FH, p. 248.

144 Sem dúvida, o fenômeno burocrático tem uma especificidade muito particular no contexto soviético,

que permite compreendê-lo sob uma forma bem ampliada e desenvolvida. Na URSS, a burocracia, enquanto classe dominante, ocupa uma posição decisiva no campo produtivo e participa diretamente da apropriação coletiva da mais-valia. Além disso, ela se integra ao aparelho administrativo do Estado, do qual recebe sua unidade, e, em contrapartida, ela fornece um fundamento renovado ao poder totalitário: a burocracia é, ao mesmo tempo, um núcleo de sustentação e de reprodução desta forma de poder. Mas o fenômeno burocrático, ou melhor, a burocratização, não se limita a esse contexto, mas também se encontra presente no modelo de organização capitalista industrial. Neste, a burocratização realiza aquilo que lhe é próprio: fragmenta e isola as atividades, instaura em todos os setores de atividade uma divisão entre dirigentes e executores, para encarnar perante esta dispersão o núcleo dirigente situado à parte, que se autodefine pela competência, pela eficácia, pelo controle das regras, etc. A diferença fundamental é que, sob o capitalismo, a burocracia não chega rigorosamente a se constituir enquanto classe, pois permanece dispersa pelo campo social, desprovida da consciência de sua unidade; para isto, ela precisaria da intervenção de um princípio político e de uma unificação em torno do Estado. Cf. LEFORT, C. “Qu’est-ce que la bureaucratie” (1960). In ECB, pp. 271-307.

uma crítica marxista do sistema soviético deveria focalizar a imbricação entre a nova figura da divisão social que funda o regime (a divisão dirigentes-executores) e o trabalho do imaginário coordenado por uma instituição central (o Partido Comunista), responsável por dissimular a apreensão dessa divisão e, ao mesmo tempo, submeter as atividades sociais e os processos de socialização ao controle da ideologia oficial.

Sendo assim, poderíamos dizer que a relação com Marx é da ordem da partilha de uma atitude filosófica. Inspirando-se no “proceder crítico” de Marx, Lefort chega, entretanto, a formulações próprias, que podem ser consideradas até mesmo estranhas ao pensamento do filósofo alemão. Por exemplo, sua crítica ao regime burocrático-stalinista tem como princípio a ideia de um socialismo democrático, vislumbrado enquanto uma nova ordem social fundada não apenas na gestão proletária da produção, mas na positivação do poder proletário em toda a extensão social por meio de instituições conformes à liberdade e à democracia – concepção fundada na centralidade institucional dos conselhos operários145. No entanto, é observando sua destinação que a crítica lefortiana revela sua fidelidade a Marx. Essa destinação não é outra senão a reabertura teórica do horizonte revolucionário por meio da redefinição da natureza do proletariado; e, por isso, a crítica da dominação burocrática e das relações de classe na URSS se mostra inserida no quadro mais amplo de uma teoria da revolução146.

Quando discerníamos na URSS a existência de uma classe dominante cuja potência se fundava na propriedade coletiva dos meios de produção, julgando que todo o sistema econômico se ordenava de maneira a manter a divisão de uma massa de executantes e de uma minoria que monopolizava as tarefas de direção, supúnhamos – sem

mesmo fazer disso uma hipótese explícita – que o novo antagonismo de

classe recobria a oposição denunciada por Marx no exame da sociedade burguesa. A burocracia, embora se constituísse seguindo um processo

145 Cf. Capítulo 1.

146 Nas linhas finais do artigo “Qu’est-ce que la bureaucratie?”, Lefort mostra em que sentido ocorre uma

reconfiguração da luta de classe no interior do regime soviético e como a burocracia vem ocupar o lugar da burguesia num conflito cuja dinâmica Marx havia desvendado no quadro da sociedade capitalista. “Socialismo ou Barbárie explica a existência da Burocracia pela luta de classe e não pelas exigências do progresso técnico. O advento da burocracia responde, com efeito, a uma tendência histórica fundamental, evidenciada por Marx, de ‘socialização da sociedade’; a burocracia tende a assegurar uma comunicação de todas as atividades, ela convoca uma participação de cada indivíduo na totalidade social, negando formalmente toda distinção de classe, mas, ao mesmo tempo, ela contradiz radicalmente essa tendência por sua existência, seu sistema de opressão, de hierarquia, de compartimentação. (....) Esse duplo movimento faz com que ela exista somente nos horizontes do comunismo, que ela porta e desenvolve a exigência de sua destruição como nenhuma classe que a precedeu. Para Socialismo ou Barbárie, a Burocracia é um fenômeno social total que só é inteligível na perspectiva da história moderna da luta de classes. E a teoria

da Burocracia é uma teoria da revolução”. LEFORT, C. “Qu’est-ce que la bureaucratie?” (1960). In ECB,

diferente, tinha, a nosso ver, se substituído à burguesia; em face dela, o proletariado se mantinha numa posição inalterada; ele estava em condições apenas de descobrir a natureza verdadeira de seus objetivos até então dissimulada sob a necessidade da luta contra a propriedade privada, de reconhecer, portanto, na gestão das empresas e das coletividades pelos trabalhadores o fundamento do socialismo147.

Não podemos ignorar o fato que essa concepção da revolução, cujos princípios elementares são extraídos da obra de Marx, possui um enraizamento histórico muito particular. Se, por um lado, tal concepção permite pensar um movimento geral do processo revolucionário nas sociedades modernas em direção de um “socialismo autêntico”, por outro, é importante pontuar que ela se nutriu e ao mesmo tempo se viu corroborada por acontecimentos históricos concretos, a exemplo da onda contestatória que se ergueu no Leste europeu, sobretudo a Revolução Húngara de 1956.

Embora tenha um enraizamento histórico particular (o alvo da crítica: URSS; o despontar de uma nova ordem social possível: a Revolução Húngara), a concepção da revolução que Lefort esposa até o final dos anos 1950 é sustentada pela estrutura geral da visão marxista da história, na qual a ação do proletariado é absolutamente fundamental para o enfrentamento da sociedade capitalista/burocrática e para a construção de uma sociedade outra. Mais do que o desenho de sociedade que a revolução permite esboçar – neste ponto, há diferenças sensíveis entre Lefort e Marx – é a posição do proletariado que evidencia uma linha de continuidade entre os dois pensadores148. Ao transpor o esquema marxista tradicional da luta de classes ao exame da natureza da dominação burocrática soviética, Lefort continua a conceber o proletariado de acordo com o entendimento que Marx havia estabelecido a seu respeito no quadro da sociedade burguesa. Qual entendimento? O da classe “excluída do processo de socialização instituído pelo capitalismo, uma classe condenada a se descobrir estrangeira na sociedade burguesa, uma classe não classe, testemunhando na sua existência mesma – desde que escape do estatuto de uma categoria econômica da qual recebe sua definição de fora – sua vocação ao comunismo”149.

147 LEFORT, C. “Le nouveau et l’attrait de la répétition” (1970). In ECB, p. 364, grifos nossos.

148 O ensaio “L’expérience prolétarienne”, publicado por Lefort em 1952, é o mais paradigmático a esse

respeito. Cf. “L’expérience prolétarienne” (1952). In ECB, pp. 71-97.

Nos primórdios dos anos 1970, sob um olhar retrospectivo, Lefort criticará a si mesmo por ter deixado “intacta a imagem do proletariado como classe revolucionária, como portador dos fins universais da História”150. O filósofo sintetiza:

(...) em nossa mente, a análise da gênese da burocracia no curso do processo de organização da classe operária e de institucionalização de seus modos de resistência, não colocava em causa, ao contrário, tornava evidente a vocação do proletariado para instaurar uma sociedade livre de todo órgão de dominação; ela nos persuadia que era preciso uma experiência [épreuve] da alienação, levada até o empreendimento de emancipação, para que a crítica de todas as alienações se realizasse151.

Vale acrescentar que tal vocação se mostrava a mesma tanto a Leste quanto a Oeste, tornando claro o caráter universal do proletariado e de sua obra. Isto porque, nas sociedades burguesas contemporâneas, o processo de burocratização “criava para a classe operária uma consciência análoga [a da classe operária da URSS] acerca de suas finalidades” e, assim, “nós supúnhamos, dessa vez de uma maneira mais geral, uma etapa alcançada pelo proletariado mundial, na qual a tarefa que lhe atribuía Marx podia ser conduzida a seu termo”152.

Delineado esse quadro de preocupações e instrumentos teóricos comuns, podemos fazer a seguinte síntese. Até o fim dos anos 1950, Lefort traz consigo uma leitura muito específica da concepção da história de Marx, leitura que aparece interiorizada às suas próprias análises, conferindo-lhes apoio e sentido, mas que não se apresenta sob a forma explícita de uma exegese. Em outras palavras, à época de suas primeiras análises sobre a URSS, Lefort não teoriza a concepção marxista da história (enquanto objeto de conhecimento à parte), mas faz dela uma prática de leitura da realidade social, necessária para lidar com as questões que emergem em sua própria experiência histórica. Assim, poderíamos afirmar que se trata de uma concepção que confere a Lefort um potencial de crítica e intervenção, investindo-o de um poder desmistificador que lhe permite enfrentar o dito comunismo soviético, revelar a nova configuração da luta de classes, expor as contradições do regime e reformular os princípios da ação revolucionária.

150 LEFORT, C. “Le nouveau et l’attrait de la répétition” (1970). In ECB, p. 363. 151 Ibid., Id., p. 364.

É apenas num curso dado na Sorbonne em 1965 que Lefort apresenta uma leitura minuciosa das visões de Marx sobre a história, passando por obras como o Manifesto

Comunista, os Grundrisse, o Capital e o 18 Brumário153. Percorrendo-as, Lefort não busca encontrar a unidade de fundo sob as oscilações de superfície ou a versão unívoca da “teoria da história” em Marx; ao contrário, o pensador francês se propõe a mostrar as ambiguidades de Marx nesse campo, as dificuldades em que se enreda, os desmentidos que inflige às suas próprias formulações nas diferentes obras assinaladas. E, sobretudo, Lefort chama a atenção do leitor à sobreposição constante de dois esquemas explicativos da história humana que Marx acaba por estabelecer no interior do exame crítico da sociedade capitalista: de um lado, uma visão da história como continuidade (nesse caso, a unidade da história humana aparece centrada sobre a luta de classes, que no curso do tempo permanece estruturando os conflitos históricos, apesar da mudança de seus atores, de suas pausas ou regressões) – visão que se depreende notadamente do Manifesto

Comunista154; de outro, uma visão da história como descontinuidade radical (nesse caso,

o advento do capitalismo é caracterizado como a inauguração de uma história inteiramente nova, marcada pela separação do homem e da terra, pela separação dos homens entre si e pelo fim da forma comunitária da propriedade) – tal como os

Grundrisse155 permitem apreender ao examinar a passagem dos modos de produção pré-

capitalistas ao modo de produção capitalista.

Lefort observa que essas oscilações, constitutivas da visão de Marx sobre a história, estão presentes tanto no exame do pré-capitalismo, que se efetua sob o fundo do capitalismo, quanto no exame do capitalismo em si mesmo, tomado em sua especificidade. Ambas as perspectivas indicam que a crítica à sociedade burguesa e 153 Anos depois, esse curso aparece sintetizado no ensaio “Marx: de uma visão da história a outra”, que

integra a coletânea As formas da história: ensaios de antropologia política. São Paulo: Brasiliense, 1979.

154 Eis a visão predominante no Manifesto: “unidade do drama centrado sobre o conflito de classes,

continuidade do processo histórico, formação com o modo de produção capitalista de uma sociedade cujos antagonismos são simplificados, as atividades rigorosamente interdependentes, a evolução liberada do peso das tradições e que se torna, assim, pela primeira vez a si mesma inteligível – não há neste esquema nenhum traço que não seja desmentido pelo próprio Marx”. Desmentido, continua Lefort, que não é senão “o efeito de um outro modo de apreensão da história e da vida social”. LEFORT, C. “Marx: de uma visão da história a outra” (1965). In FH, p. 213.

155 Sobre os Grundrisse, “é preciso convir que seu propósito (...) não é apenas o de identificar os traços de

cada um dentre [os modos de produção] e acompanhar as etapas de um desenvolvimento, de que o capitalismo seria o ponto culminante. Ao contrário, ele se esforça em pôr em evidência seu parentesco e em opô-los globalmente ao modo de produção fundado sobre a divisão entre o capital e o trabalho. Não é a continuidade do processo histórico que ele faz aparecer, ou seja, uma mudança de formas comandada por

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