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Esquema 15: Síntese interpretativa Ricardo Graham

4.1 DO MANUAL AO INDUSTRIAL

A suposta relação de oposição entre o artesanal e o industrial é uma questão recente na história, começa na Revolução Industrial e de lá pra cá vem mudando a realidade da sociedade como conhecemos. Mas ao atentar para o início da existência da humanidade, estimada em alguns milhões de anos e para o fato da industrialização ter começado a ocorrer no século XVIII, percebe-se que a cultura material tem sido construída em sua maioria de forma artesanal. Só depois de entrar em contato com produtos de origem industrial é que o homem se refere aos artefatos artesanais como “feitos à mão” ou

handmade, antes disso eles eram apenas artefatos, sem adjetivos, fruto do

único tipo de produção que conheciam.

Encarar o design como uma evolução do artesanato, associando o fazer manual ao primitivo e ao design à representação do desenvolvimento tecnológico como se conhece hoje, pode levar à falsa impressão de que seu processo natural é desaparecer frente aos demais processos produtivos.

Barroso (2010) lembra que por mais que alguns não percebam, o artesanato convive com os produtos industriais desde então, e nas últimas décadas viu-se ressurgir um interesse pelos objetos feitos à mão. Lody (2013, p. 11) diz que o mercado voltado para a produção artesanal está crescendo, em especial os de utensílios para a casa, brinquedos e elementos necessários para a arquitetura. O autor aponta ainda para o crescimento da produção de ferramentas para o desenvolvimento de ofícios como a agricultura e a pesca, “integrando assim um elenco de objetos que apoiam o amplo conhecimento patrimonial”

70 Herdeiro de uma atividade artesanal tradicional, a essência do design foi sempre sobre resolver problemas de maneira criativa. A tecnologia foi avançando, e isso permitiu que os designers criassem produtos inteligentes, interativos e altamente complexos, com os quais o homem moderno não se imagina viver sem. Através das atuais possibilidades tecnológicas, novas oportunidades de design podem ser exploradas.

A sociedade hoje se depara com questões que não eram relevantes, como preocupações com o meio ambiente e qualidade de vida, isso traz novos desafios para os designers contemporâneos, e inevitavelmente sobre os processos de produção. Conscientes das questões éticas e climáticas, as pessoas buscam produtos que agridam menos o ambiente, buscam saber da procedência dos materiais e que eles não sejam produzidos através da exploração do trabalho. Encontram no consumo de artefatos de produção artesanal ou semi-artesanal uma solução para essas questões.33 Segundo Ono (2012), hoje o design seria influenciado pelo impacto do desenvolvimento tecnológico e dos processos técnicos, e por outro, sofreria as pressões de transformações culturais decorrentes do surgimento de novos usos e necessidades”.

Tomas Maldonado é usado como referência por Castro (2009), Moraes (2006) e Cutolo (2014) por observar no design italiano já na década de sessenta o surgimento de um movimento contrário à linguagem global dos produtos na época, ainda regida pelo legado da boa forma. Ele fala de um design tido com frio, referente à produção seriada e massificada, e de um design quente, que seria fruto de uma produção artesanal, “feito para poucos, com poucos meios e destinado para poucos” (CASTRO, 2009, p.91). Quanto à segunda afirmação, apesar de entender que “não atende às necessidades do consumo crescente e não cumpre as funções do industrial design, o autor não nega sua legitimidade” (id.).

O design italiano observou as evidências de uma nova realidade comportamental e de consumo, onde as pessoas já superavam as imposições do início da produção industrial, quando tudo o que se produzia era facilmente comercializado, uma vez que a demanda superava a oferta (MORAES, 2008).

33

MEGENS et al. New craftsmanship in industrial design towards a transformation economy. In: European Academy of Design Conference – Crafting the future, 10, 2013.

71 No atual contexto contemporâneo, os avanços tecnológicos, em especial os da comunicação, promoveram um nivelamento na condição produtiva e nos seus insumos, resultando em produtos massificados, estéreis. Esta projeção do que o indivíduo considera como sua identidade nos artefatos que consome, é o que torna a atividade de projetar na contemporaneidade tão complexa.

Cardoso (2012) conclui que se os artefatos são portadores de informações, e essas informações estão fundamentadas nas associações que o homem faz entre a aparência e o contexto, então seria possível induzir o usuário, através dessa aparência, a fazer certas analogias. Ou seja, é possível “programar o artefato”. Nesse sentido, o design pode atribuir certas características que promovam associações ligadas à identidade, estilo e outros fatores, e essa seria a essência do valor agregado.

Um exemplo prático desta indução é a linha de secadores Tomahawk34 (figuras 53, 54 e 55), do designer Jean-Baptiste Fastrez. Inspirados numa ferramenta tradicional indígena, o secador teve a parte mecânica produzida industrialmente e cada um de seus cabos confeccionados por um artesão diferente e com técnicas distintas, torneados, esculpidos, escareados, entre outros processos.

O designer tinha a intenção clara de externar o confronto de um produto contemporâneo com a tradição artesanal, de conferir beleza e funcionalidade assim como interferir no uso por sugerir uma nova maneira de segurar a peça, remetendo ao artefato que inspirou o conceito. Por esse motivo, a linha

Tomahawk faz parte do acervo permanente do Centro Pompidou – situado em

Paris – além de participar de uma exposição35

onde os produtos tinham seus

34

Tomahawk é uma espécie de machado utilizado por tribos indígenas norte-americanas.

35

Exposição Croisements domestiques, no ano de 2013. Paris, França.

Figuras 53, 54 e 55: secadores Tomahawk, de Jean-Baptiste Fastrex Fonte: www.jeanbaptistefastrez.com

72 processos de fabricação detalhados e expostos em vitrines para quem caminhasse em sua calçada.

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