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Documentação dos cuidados de enfermagem

No documento CMESMP 4546 (páginas 34-39)

2. ENQUADRAMENTO TEÓRICO

2.4. Documentação dos cuidados de enfermagem

A preocupação em torno da documentação em enfermagem decorre desde o séc. XIX, quando, tal como já foi referido, Florence Nightingale conceptualizou pela primeira vez a prática de cuidados de enfermagem. Nightingale preocupava-se com a realização de registos que representassem, de forma fiel, a prática clínica, garantindo assim a continuidade de cui- dados e, consequentemente, a melhoria da qualidade dos mesmos (Alligood & Tomey, 2004; George, 2000; Mota, 2010). “A enfermagem produz, diariamente, muitas informações ineren- tes ao cuidado dos pacientes (…) [tornando-se] possível estimar que ela seja responsável por mais de 50% das informações contidas no prontuário do paciente” (Santos, Paula & Lima, 2003, p. 81).

Num estudo realizado por Santos, Paula e Lima (2003) sobre a perceção dos enfermei- ros face aos registos elaborados manualmente, os autores referem que estes se encontram insatisfeitos com o registo manual dos mesmos e apontam para a necessidade de mudanças neste sistema. “As informações transcritas não revelavam qualidade, não observavam uma sequência lógica, não objectivavam a situação do paciente, enfim não revelavam o adequado procedimento nos cuidados para atender às necessidades de cada paciente” (Santos, Paula & Lima, 2003, p. 81). Os registos “são inconsistentes, ilegíveis e subjetivos, não havendo uma definição metodológica estruturada” (Santos, Paula & Lima, 2003, p. 81). Cook et al. (2000), citados por Mota (2010), revelaram que a maior parte dos gaps que se identificam na conti- nuidade dos cuidados de saúde, são habitualmente associados a carências na qualidade e/ou quantidade de informação que se regista.

Os RE revestem-se de grande importância para a prática clínica, “(…) pelo que devem ser rigorosos, completos e realizados correctamente (…)” (Martins et al., 2008, p. 54), sendo que é através da elaboração dos mesmos que os enfermeiros dão visibilidade ao seu desempe- nho e reforçam a sua autonomia e responsabilidade profissional. “Dado que o tempo despen- dido pelos enfermeiros a documentar compete com o tempo disponível para os cuidados directos aos clientes (…) [e de que] há a consciência da necessidade e obrigação legal de documentar os cuidados de enfermagem” (Silva, 2006, p. 18), o enfermeiro, por vezes, obri- ga-se a conferir maior importância à documentação, em detrimento do tempo que despende junto do cliente. Lessa et al. (n.d.), num estudo elaborado sobre o impacto da informatização

dos RE, identificou, como uma das vantagens da sua utilização, a redução do tempo despen- dido na documentação dos cuidados.

Martins et al. (2008) dedicaram-se no seu estudo denominado de “Qual o lugar da

escrita sensível nos registos de enfermagem?” a pensar sobre de que forma os RE traduzem a dimensão da RT com os clientes, referindo que:

tem que estar bem presente na escrita o significado do cuidado, a vertente da comunicação, o estabeleci- mento da relação do cliente/família, a demonstração da empatia, a escuta, a resposta do enfermeiro às questões verbais e não verbais, por forma a construir um pensamento inerente ao cuidar (p.55).

Reforçam também que se a tradução na escrita de todas as dimensões do cuidar, for cla- ra para todos os enfermeiros, durante o processo de reflexão e prestação de cuidados, “(…) a adopção duma linguagem comum como a CIPE® (…) estará claramente facilitada” (Martins et al., 2008, p.53).

2.4.1. Linguagem CIPE®

David Benton, CEO4 do CIE, apresenta a CIPE® “como membro (…) da Família de Classificações Internacionais da OMS [Organização Mundial de Saúde]” (CIE, 2011, p. 11), desde 2008. O CIE (2011) define-a como “uma ferramenta (…) fundamental para o desenvol- vimento contínuo da profissão” (p. 3).

A ausência de uma linguagem comum em enfermagem foi o fator impulsionador do desenvolvimento de um sistema de classificação internacional que permitisse produzir infor- mação fiável para a gestão dos cuidados e de custos, e para o desenvolvimento das políticas de saúde, tendo sido pensada pela primeira vez em 1989, num congresso do CIE, em Seul, na Coreia do Sul (Garcia & Nóbrega, 2005).

Em 1991, o CIE iniciou o projeto CIPE®, precedido por uma exaustiva pesquisa biblio- gráfica e de um pedido de colaboração de vários países, que também reconheciam a importân- cia da criação de uma linguagem comum. Após cinco anos de produção, o CIE publica em 1996 a “Classificação Internacional para a Prática de Enfermagem – Versão Alfa: Um Marco Unificador”, constituída pela classificação dos fenómenos de enfermagem e das IE, estimu- lando e apelando aos comentários, observações, críticas e recomendações de melhoria, tendo,

por isso, o documento, sido traduzido em várias línguas. Esta partilha de conhecimentos deu origem à versão Beta, em Julho de 1999, ano do centenário do CIE. Três anos depois, em 2002, foi divulgada a versão Beta 2, prevendo a divulgação da versão 1 para 2005, na sequên- cia do congresso quadrienal do CIE, na Tailândia/China. Até à atualidade foram produzidas mais duas versões da CIPE®, a versão 1.1, em 2008, e a versão 2, em 2009. (Garcia & Nóbre- ga, 2005).

Um dos objetivos da CIPE® passa por tornar homogéneos os vocabulários de cada local (geográfico, unidade de cuidados) com as terminologias existentes a nível mundial, no sentido de melhorar a assistência de saúde à população (Cubas, Silva & Rosso, 2010). “A CIPE® um contributo significativo para a obtenção de dados sobre a prestação de cuidados de saúde [já que] sendo uma terminologia padronizada, (…) consegue gerar dados fiáveis e válidos acerca do trabalho de enfermagem” (CIE, 2011, p.14). A utilização da CIPE® ajuda a cumprir os seus próprios objetivos (Cubas, Silva & Rosso, 2010) e, consequentemente, a promover a adesão à mesma, sendo que quanto maior a sua mobilização nos mais variados contextos e, particularmente, neste contexto singular, maior aplicabilidade prática a linguagem adquire.

Num estudo realizado sobre a influência que a implementação de SIE, que mobilizam a CIPE®, tem sobre a aprendizagem dos estudantes de licenciatura, Almeida e Ferreira (2010) afirmaram que a utilização desta linguagem classificada permite, entre outros aspetos:

estabelecer uma linguagem comum, para descrever a prática de enfermagem; possibilita a elaboração de um plano de cuidados, (…) que permite a construção de diagnósticos de enfermagem e a organização das intervenções a prestar (…); facilita a reflexão sobre a prática clínica (…); diminui o tempo gasto na reali- zação dos registos de enfermagem, permitindo uma melhor gestão do mesmo; [e] melhorando a comuni- cação entre os enfermeiros e mesmo entre outros profissionais (p. 1).

A OE (2007) justifica a escolha de uma linguagem classificada para os SIE pelo facto de uma linguagem comum representar “(…) um aspecto importante para a formalização do conhecimento próprio da disciplina e para o respectivo desenvolvimento” (p.3) e por ser teo- ricamente consensual que, a sua mobilização, promove a visibilidade dos cuidados prestados. A opção pela linguagem CIPE® prendeu-se com o facto de em Portugal não existir a “(…) tradição de utilização de classificações formais que abranjam os três domínios específicos de conteúdos de enfermagem” (OE, 2007, p.3), pelo que se optou pela preconizada pelo CIE.

2.4.2. Sistemas de Informação em Enfermagem

Decorrente dos SIS, os SIE traduzem “o esforço de análise, formalização e modelação dos processos de recolha e organização de dados, e de transformação dos dados em informa- ção e conhecimento (…) [que visam] alargar o âmbito e aumentar a qualidade da prática pro- fissional de enfermagem” (Goosen, 2000a, citado por Silva, 2006, p. 33).

Mais concretamente nos últimos dez anos são vários os estudos que ilustram e definem as vantagens da utilização de SIE que mobilizem a linguagem CIPE®, nos vários contextos de cuidados (Mota, 2010; Lessa et al., n.d.; Cunha, Ferreira & Rodrigues, 2010; Santos, Paula & Lima, 2003; Almeida & Ferreira, 2010). Apesar das dificuldades iniciais da mobilização dos SIE, quando perfeitamente instalados e adaptados, são várias as vantagens enumeradas. Cunha, Ferreira & Rodrigues (2010), num estudo denominado de “Atitude dos Enfermeiros face ao Sistema Informatizado de Informação em Enfermagem”, concluíram que:

os enfermeiros incorporam favoravelmente os novos SIE nos seus processos de trabalho, considerando-os úteis e atribuindo-lhe vantagens a nível da qualidade da informação (qualidade dos registos, mais infor- mação registada, acesso rápido à informação), da qualidade dos cuidados (cumprimento de todas as eta- pas do processo de enfermagem, prática baseada na evidência, continuidade e integração de cuidados) e da visibilidade dos cuidados de enfermagem (p. 10).

A OE (2007) previu ainda que os SIE suportassem a definição de um foco, do seu respe- tivo status e resultados esperados, das IE a desenvolver para dar resposta ao diagnóstico e a possibilidade de se escrever texto livre que “(…) clarifique os aspectos que o enfermeiro entender adequados” (OE, 2007, p.3), tendo por base as diferentes etapas do, já referido, pro- cesso de enfermagem.

No documento CMESMP 4546 (páginas 34-39)