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1.4. Doenças associadas ao tabagismo

1.4.3. Doenças do aparelho respiratório

O pulmão é um órgão de tecido esponjoso e elástico, cuja principal função é a respiração14 (externa e interna), mas também a defesa contra os agressores ambientais e a secreção de agentes humorais. Com o objectivo de captar o oxigénio (O2) do ar

ambiente e de eliminar o anidrido de carbono (CO2) produzido nos tecidos, o pulmão

providencia uma extensa área de contacto entre o ar, contido nos alvéolos, com o sangue venoso proveniente do coração, em direcção aos vasos capilares pulmonares. Assim, a respiração externa tem como objectivo arterializar o sangue, isto é, saturá-lo de oxigénio (oxi-hemoglobina) e expurgá-lo do CO2 em excesso, decorrente do

metabolismo. Para cumprir esta finalidade, é imprescindível a conjugação de três funções (Couto & Ferreira, 2004; Jacob, Francone & Lossow, 1990):

Ventilação.

Função através da qual o ar ambiente é forçado a entrar no organismo, percorrendo as vias aéreas até aos alvéolos, onde, depois de deixar parte do oxigénio, regressa à atmosfera carregado de CO2.

Perfusão.

Esta função assegura a passagem do sangue ejectado pelo coração direito, transportando o CO2 da circulação sistémica através da rede capilar

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A respiração normal, de repouso, é conhecida como eupneia. Apneia é a cessação temporária da respiração. Dispneia é a dificuldade em respirar. Ortopneia é a incapacidade de respirar facilmente na posição horizontal. Hiperpneia é um aumento na profundidade respiratória. Taquipneia é uma respiração excessivamente rápida e superficial (Jacob, Francone & Lossow, 1990).

alveolar, onde larga para os alvéolos o referido gás e capta o O2, regressando ao

coração esquerdo já arterializado.

Difusão.

Consiste na combinação dos dois sentidos contrários da passagem de gases na extensa membrana respiratória.

À medida que decorre a respiração externa, o sangue arterializa-se e ocorrem trocas gasosas entre a célula e os líquidos que a rodeiam, ou seja, a respiração interna (Couto & Ferreira, 2004). As doenças mais importantes do sistema respiratório são, assim, aquelas em que o sangue é incapaz de se oxigenar, provocando hipoxia que se pode manifestar através de cianose15. Entre os quadros crónico degenerativos do aparelho respiratório mais fortemente promovidos pelo hábito de fumar, encontram-se as neoplasias do pulmão e a doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC) que inclui o enfisema e a bronquite crónica. Por outro lado, o tabagismo aumenta também o risco de infecções respiratórias como a influenza, a bronquite ou a pneumonia (ASH, 2004a Sep.; Brodish & Ross, 1998; Godtfredsen et al., 2002; Hays et al., 1998; Sherman, 1991, TRCPL, 1962; USDHEW, 1964; USDHHS, 1984, 1990).

Os internamentos por doença respiratória nos hospitais públicos portugueses subiram 54%, de 1990 a 1998, particularmente devido às pneumonias (mais 53%) e à DPOC (mais 67%, DGS, 2003). Juntando as neoplasias do pulmão, do aparelho respiratório e as doenças do aparelho respiratório, ocorreram em Portugal 15779 mortes (/100000 hab.), durante o ano 2002 (DGS, 2004), o que pode constituir a segunda causa de mortalidade por doença crónico-degenerativa. Se, porém, forem agregadas as neoplasias (aparelho digestivo e peritoneu, estômago e cólon) e as doenças do aparelho digestivo, estas passarão a representar a segunda causa de morte (16638 / 100000 hab.).

Doença pulmonar obstrutiva crónica (DPOC).

A DPOC (bronquite crónica e enfisema) é uma doença progressiva, caracterizada pela destruição definitiva das paredes alveolares, perda da elasticidade dos pulmões e, consequentemente, declínio do volume expiratório máximo por segundo16. Um

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A cianose resulta da hipoxia e manifesta-se pela alteração do tom da pele, das mucosas e das unhas, as quais adquirirem uma coloração azulada, em consequência da presença aumentada de hemoglobina desoxigenada nos capilares (Jacob, Francone & Lossow, 1990).

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O volume expiratório máximo por segundo (forced expiratory volume in one second - FEV1) refere-

se à quantidade máxima de ar em litros que, partindo de uma inspiração máxima, pode ser expulso dos pulmões no primeiro segundo. Para determinar o FEV1 é necessário realizar uma expiração

forçada à máxima velocidade possível. Este valor que se chama índice de Tiffeneau pode utilizar-se na avaliação do índice de obstrução (Couto & Ferreira, 2004).

dos aspectos fisiopatológicos mais importantes no desenvolvimento desta condição, é a lesão da rede de fibra elástica da parede alveolar, pela enzima elastase. Habitualmente os pulmões estão protegidos contra tais lesões pela antielastase circulante. Nos fumadores, contudo, ocorre um desequilíbrio entre a actividade da elastase e da antielastase. Por outro lado, está aumentada a probabilidade de obstrução dos brônquios, porque os bronquíolos terminais se encontram estreitados pela hiperplasia (aumento do número de células) e hipersecreção de muco. Nesta sequência, pode ocorrer hipoxia, hipercapnia (aumento da concentração de CO2 no sangue), acidose e a hipertensão pulmonar

(McIvor et al., 2002; Jacob, Francone & Lossow, 1990).

A nível mundial tem-se assistido, durante os últimos quinze anos, ao aumento dos sintomas respiratórios (dificuldade em respirar, tosse, produção de saliva, pieira e infecções respiratórias) em fumadores de todas as idades. Estima-se que 80% das mortes por DPOC estejam relacionadas com o hábito de fumar, tendo os fumadores um risco dez vezes superior ao dos não fumadores, para quem a DPOC é uma condição muito rara. Em termos da incidência, cerca de 15%-20% dos fumadores desenvolvem esta doença, representando a DPOC a quarta causa de morte e doença crónica nos países industrializados. Tal como em outras doenças, existe uma relação dose-resposta, mediada pelo número de cigarros fumados por dia. Um estudo retrospectivo de coortes, com 12504 fumadores (Patel et al., 2004), concluiu que, quando as mulheres começam a fumar antes dos dezasseis anos de idade, aumentam não apenas o risco de sofrer DPOC, mas também de desenvolver a doença mais precocemente, de retardar o ritmo de crescimento do pulmão e a sua capacidade pulmonar. Assim, comparativamente aos homens, as mulheres parecem ser mais susceptíveis aos efeitos adversos que o tabaco exerce sobre o pulmão. Por outro lado, se é habitual ocorrer um declínio da função do pulmão a partir dos trinta anos de idade, nos fumadores este processo inicia-se mais cedo e a partir de uma capacidade pulmonar menor.

Com a abstinência tabágica, a taxa de declínio da função pulmonar estabiliza, especialmente quando a cessação ocorre numa idade jovem. Em fumadores que param mais tarde, esta melhoria não é possível, embora o ritmo da deterioração do pulmão se aproxime daquele que é apresentado pelos não fumadores.