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DOPROCESSAMENTO DA LEITURA

LINGUAGEM, MENTE E CÉREBRO

DOPROCESSAMENTO DA LEITURA

Autora: Sabrina Lopes dos Santos (CNPq) Orientador: Marcus Antonio Rezende Maia

Investigamos relações de causa intraoracionais, buscando entender o papel dos conectivos no processamento gramatical e na compreensão de sentenças. Esta pesquisa, na Psicolinguística Experimental, explora possibilidades de translação para a Educação Básica desenvolvendo atividades teórico-práticas com vistas à formação de leitores críticos.

Conectivos atuam como guia do parser e podem ser interpretados como o cornerstoneno processo de compreensão. Em (1) e (4), temos duas orações independentes, porém, em (1), é possível estabelecer uma relação de causa diretamente a partir do conteúdo semântico das orações, o que não ocorre em (4). Como estão em coordenação, não ofereceriam custo ao processador pela baixa complexidade estrutural, mas será que se incluíssemos conectivos causais essa equidade se manteria?

Causa inferencial

1. Futebol é uma paixão nacional, mas os jogadores realizam poucos treinos, eles encaram derrotas com frequência.

2. Futebol é uma paixão nacional, mas os jogadores realizam poucos treinos, já que encaram derrotas com frequência.

3. ?Futebol é uma paixão nacional, mas os jogadores realizam poucos treinos porque encaram derrotas com frequência.

Causa não inferencial

4. Futebol é uma paixão nacional, mas os jogadores desapontam o povo, eles encaram derrotas com frequência.

5. Futebol é uma paixão nacional, mas os jogadores desapontam o povo já que encaram derrotas com frequência.

6. Futebol é uma paixão nacional, mas os jogadores desapontam o povo porque encaram derrotas com frequência.

Em (2) e (3), temos, respectivamente, os conectivos já queeporque, mas veja que o uso deles não é totalmente intercambiável. Enquanto, em (5) e (6), as relações de causa podem ser guiadas tanto por já que quanto por porque, em (3), a utilização do porque provoca um

Cadernos de Resumos do SEPLA 2018– Seminário de Pesquisas Linguísticas em Andamento estranhamento. Substituindo pelo conectivo já que, como em (2), a sentença passa a ter maior naturalidade na leitura. Contudo, entendo que o comportamento do parser e a compreensão sentencial dependem diretamente da habilidade leitora. Além disso, a composicionalidade dos conectivos também tem seu papel na condução do processamento. Note que, enquanto porque é uma conjunção formada pela combinação de uma preposição mais o complementizador, a locução verbal já que é a combinação de um advérbio com complementizador, o que por si só já as coloca em níveis de derivação distintos. Com isso, cabe recurso experimental para investigar as diferenças de processamento que essas sentenças podem configurar.

Nesse momento, está em curso a realização de um experimento de rastreamento ocular para verificar: i) se relações de causa inferencial, como de (1)-(3), geram maior custo de processamento; ii) investigar o correlato entre a computação de processos inferenciais e proficiência leitora; iii) avaliar se os conectivos per se ativam processos derivacionais distintos. O teste se configura em design 3x2, gerando 6 condições experimentais com 24 sentenças por condição:

O experimento será realizado com graduandos de Letras de 1º e 8º semestres, separadamente. A previsão é que os padrões de leitura se diferenciem, principalmente, sobre as relações inferenciais. Estas devem resultar em maiores tempos e números de fixação ocular nas áreas críticas para ambos os grupos. Porém, espera-se que esses dados sejam mais elevados para o grupo do 1º período, uma vez que processos inferenciais dependem de alta habilidade leitora para serem processados. Os índices de resposta à pergunta interpretativa também devem revelar a disparidade de proficiência com mais erros para o grupo do 1º semestre nas sentenças com inferência. As condições, como (3), devem apresentar os maiores tempos e números de fixações, para ambos os grupos, pois, nesse contexto, o conectivo porque não seria capaz de guiar o processo de relação de causa inferencial, situação em que o conectivo já que se mostra o operador mais apropriado, como em (2).

Referências

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Cadernos de Resumos do SEPLA 2018– Seminário de Pesquisas Linguísticas em Andamento A PERCEPÇÃO DAS CRIANÇAS NÃO ALFABETIZADAS ACERCA DO COMPRIMENTO DA PALAVRA ARTICULADA: UM ESTUDO EXPERIMENTAL

Autor: Sammy Cardozo Dias

Orientadora: Aniela Improta França

Para usar um sistema de escrita alfabético, as crianças devem aprender mapeamentos complexos entre grafemas e fonemas. A dificuldade reside no fato de que há sempre um nível de inconsistência nesse mapeamento e os sistemas de escrita podem demorar para serem dominados até por crianças que já passaram do período de alfabetização (TREIMAN E KESSLER, 2014; BYRNE, 1998). No entanto, mesmo no período pré-alfabético, as crianças já começam a se interessar pela escrita e pela leitura e começam a entender a noção de símbolo e que a palavra escrita se relaciona a um aspecto significante. Ou seja, antes mesmo de chegar à classe de alfabetização as crianças procuram dar conta de padrões que ela já percebeu que existem. Ativam, então, suas capacidades cerebrais à cata de padrões que possam oferecer a elas o maior nível de compreensão e preparação para o mundo em torno delas. De fato, elas percebem, organizam e absorvem padrões com grande facilidade. Alguns desses padrões são essenciais para entender e sistematizar informações acerca do mundo e são, portanto, cooptados pelos sistemas cognitivos principais. Outros são apostas de organizações dos fatos do mundo que não dão retorno. Na medida em que inconsistências aparecem, essas sistematizações são abandonadas, substituídas ou ajustadas pelas crianças e caem em desuso.

Nesta pesquisa investigamos uma dessas apostas infantis: o realismo nominal1. O realismo nominal prevê uma relação de iconicidade, entre o tamanho da palavra escrita e o tamanho da coisa que ela representa no mundo. Por esse raciocício, a fruta jaca, a maior do Brasil, deveria ser escrita com muitos grafemas e o inseto formiga deveria ser escrito com pouquíssimos grafemas, já que representa um bichinho tão pequenino. A questão teórica que ganha relevo e torna-se objeto de investigação aqui é de que forma o tamanho de um objeto pode influenciar a percepção das crianças em fase pré-alfabetização acerca da palavra escrita?

A noção de iconicidade na linguagem, por sua vez, se opõe a um dos conceitos mais fundamentais da Linguística moderna: a arbitrariedade saussuriana. Segundo Saussure (1857-

1 O termo “realismo nominal” foi introduzido pelo psicólogo construtivista Jean Piaget para designar um tipo de associação entre o nome e o objeto feita pela criança durante o desenvolvimento infantil (PIAGET, 1967).

Cadernos de Resumos do SEPLA 2018– Seminário de Pesquisas Linguísticas em Andamento 1913), o signo linguístico é arbitrário porque é sempre uma convenção acatada passivamente e reconhecida pelos falantes de uma comunidade linguística. Por exemplo, a criança ainda bebê entende o conceito bola e o seu significante [bola] sem intermediações icônicas, sem que haja alguma relação natural entre a realidade fonética de um signo linguístico e o seu significado.No entanto, muitos autores relatam um tipo de realismo gráfico que parece influenciar a escrita ou simulação de escrita e mesmo uma simulação de leitura de crianças e que apresentariam motivação icônica: palavras grandes para designar objetos grandes, palavras pequenas para designar objetos pequenos (FERREIRO E TEBEROSKY, 1986).

No experimento em fase de testagem no momento, verifica-se a existência da iconicidade entre a articulação da palavra e o tamanho do objeto no mundo real. Na tarefa, as crianças pareiam um filme de uma boca articulando uma palavra para escolher entre uma palavra escrita com poucos grafemas, 2 ou 3, e uma palavra com muitos grafemas, mais do que 6. Como grupo controle mostra-se a boca articulando o nome de objetos desconhecidos e pediremos o mesmo tipo de pareamento com a palavra escrita. Espera-se que os resultados indiquem que esse efeito da iconicidade se desfaça com o tempo e o princípio da arbitrariedade seja estabelecido.

Referências:

FERREIRO, Emília; TEBEROSKY, Ana. Psicogênese da língua escrita. Porto Alegre: Artes Médicas, 1986.

PEIRCE, Charles S. Semiótica. Trad. J. Teixeira Coelho. 2 ed., São Paulo: Perspectiva, 1990. PIAGET, J. A representação do mundo na criança. Rio de Janeiro, Record, 1967.

TREIMAN, Rebecca; KESSLER, Brett. How children learn to write words. Oxford: Oxford University Press, 2014.

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