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1. INTRODUÇÃO

1.3 Grandes temas de interesse

1.3.2 Depressão pós-parto (DPP) investigada em contexto

1.3.2.1 DPP e contexto ecossocial

A DPP pode afetar negativamente a parentalidade através dos danos que pode causar à capacidade parental de fornecer um contexto de criação infantil apropriado (OYSERMAN et al., 2005). Inúmeros são os fatores que promovem estresse contextual que têm sido associados a situações de adversidade social e pessoal (COOPER & MURRAY, 1997) e, mais especificamente, a uma elevada incidência de DPP (KUMAR & ROBSON, 1984). Uma profusão de estressores é capaz de ser encontrada nos mais diferentes contextos, podendo, deste modo, vir a agir sinergicamente com a DPP. Este sinergismo pode potencializar a influência negativa ocasionada pela DPP sobre a interação pais e filhos e sobre o desenvolvimento infantil posterior (PAULI-POTT, 2008). Estudos recentes têm chamado a atenção para a importância destes fatores de risco associados à DPP, pois os mesmos poderiam explicar melhor as diferenças entre os grupos (controle e experimental) do que o próprio diagnóstico de DPP (DEFELIPE, 2009).

Como exemplos de fatores que são considerados fontes contextuais de estresse capazes de promover e/ou potencializar a DPP, podemos citar: 1) pobreza (baixo índice socioeconômico); 2) conflito conjugal; 3) maior número de pessoas morando na mesma casa da mãe; 4) morte de uma pessoa querida; 5) divórcio; 6) perda do emprego; 7) falta de suporte social (considerando o suporte fornecido pelo companheiro, parentes, amigos ou associados); 8) ambiente afetivo familiar empobrecido durante a infância; 9) saúde deficiente; 10) estresse psicológico; 11) histórico psiquiátrico; 12) adversidade social etc. (CAMPBELL & COHN, 1997; CHUNG et al., 2004; FIELD et al., 1990; HALBREICH & KARKUN, 2006; ROBERTSON et al., 2004; SILVA, 2008).

Trabalhos realizados em amostras de alto risco34 encontraram que a adversidade social (definida como falta de suporte social, morte na família, ter três ou mais crianças morando na mesma casa, estar desempregada, dentre outros) é tão relevante quanto a DPP na emergência de potenciais prejuízos interacionais e ontogenéticos infantis (COHN et al., 1986; FIELD, et

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Amostras de alto risco caracterizam um estrato da população com alto índice de estressores, tais como baixa renda/escolaridade, baixo suporte social, presença de histórico psiquiátrico, dentre outros.

al., 1985; 1988; 1990). Para citar alguns exemplos pontuais destes estudos, Teti e Gelfand (1991) encontraram que dentro de uma amostra de mães com indicadores de DPP35, déficits voltados à alimentação e à brincadeira foram significativamente relacionados à presença de adversidade social. Murray et al. (1996), por sua vez, constataram que mães não deprimidas que vivenciavam situações sociais adversas apresentavam déficits interacionais semelhantes aos de mães com DPP. E, por fim, Stein e colaboradores (1991) encontraram que o relacionamento com a criança só era afetado quando, junto com a DPP, a mãe estivesse passando por dificuldades conjugais, financeiras e/ou no trabalho. Em contraste, trabalhos conduzidos com amostras de baixo risco mostraram que, apesar de díades deprimidas enfrentarem dificuldades, estas eram significativamente menos extremas quando comparadas àquelas vivenciadas por amostras de alto risco (COHN et al., 1990; MURRAY et al., 1996). A partir de tal conclusão, a literatura que trabalha com amostras de alto risco conclui que: (1) a adversidade social pode prejudicar as interações mães e filhos e se acumular em amostras de deprimidas (MURRAY & COOPER, 1997b); (2) a DPP pode produzir efeitos mais prejudiciais quando associada a outros fatores psicossociais de risco (CAMPBELL & COHN, 1997); e (3) estes fatores psicossociais de risco podem ser considerados mais importantes do que a própria DPP per se (HAY, 1997; WEINBERG & TRONICK, 1998).

Além dos fatores contextuais de estresse supracitados, existem também fontes contextuais de suporte (BELSKY, 1984) que podem amenizar os potenciais efeitos prejudiciais da DPP. Como exemplos, podem ser citados o suporte social, a religião e o alto índice socioeconômico. Em relação ao primeiro fator protetivo da DPP, Harkness (1987) e Stewart e Jambunathan (1996) concluíram que a prática de um mês de descanso após o parto e o suporte familiar (oriundo da mãe ou da sogra) amenizavam a DPP em mães africanas e americanas de classe média, respectivamente. Aqui vale fazer uma ressalva: apesar de o suporte social ser um potencial fator protetivo da DPP, vale lembrar que quando este suporte é fornecido por uma pessoa que a mãe não tem uma boa relação (mesmo que esta pessoa seja a própria mãe ou a sogra da puérpera), o mesmo pode ser responsável por potencializar a DPP (LEE et al., 2000). Além disso, segundo nos lembram Stuchbery, Matthey e Barnett (1998), não é nem a quantidade nem a qualidade do suporte social, mas sim as percepções maternas relacionadas a ele que irão predizer a DPP.

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Embora tenhamos usado uma escala de rastreamento da DPP e de nossa amostra ser, portanto, subclinica, para fins de simplificação os termos “mães com indicadores de DPP” ou “mães potencialmente deprimidas” a partir daqui serão substituídos por “mães com DPP” e “mães deprimidas”, respectivamente (ver seção 4).

Quanto ao segundo fator protetivo da DPP, Dankner e colegas (2000) encontraram que a religiosidade associada à estruturação social, característica de comunidades israelitas, mitigavam a DPP. Cartwright-Jones (2002), por sua vez, apontou que práticas religiosas islâmicas, judaicas, hindus e cristãs faziam parte do sistema de manejo da DPP na Índia, Norte da África e Oriente Médio. Isto porque, serviam como suporte físico e emocional às novas mães, ao ajudá-las em sua reintegração dentro da comunidade após a recuperação do parto. Corroborando estes achados, Mann et al. (2008) encontraram que mulheres que participavam de atividades religiosas pelos menos algumas vezes por mês tinham menor probabilidade de exibir altos escores de DPP.

Com relação ao terceiro fator protetivo, Marmot (2002) concluiu que quanto maior a renda pessoal, maior a probabilidade das pessoas relatarem mais saúde e menos depressão geral. Scarinci e colaboradores (2002), ao investigarem especificamente a DPP, concluíram que: (1) quanto maior a renda e a escolaridade, menores eram os indicadores de DPP; e (2) apesar de escolaridade e renda influenciarem a DPP, alta renda foi a maior responsável por mitigá-la. Miyake e colaboradores (2011), por sua vez, ressaltaram a importância do fato das mães terem um emprego na redução do risco da DPP. E, por fim, Patel, Rodrigues e DeSouza (2002) sugeriram que todos os fatores sociais supracitados (emprego, alta renda e alta escolaridade) amenizavam conjuntamente a emergência da DPP. Assim, dependendo da presença ou ausência, da quantidade e de como se relacionam entre si, estes fatores de estresse e/ou suporte são capazes de construir contextos psicossociais de risco e de proteção que potencializam e/ou amenizam os efeitos prejudiciais da DPP (ver Figura 8).

Figura 8 - Esquema gráfico reunindo alguns fatores contextuais de risco e de proteção que são encontrados na literatura. Apenas alguns deles (em negrito) foram exemplificados no texto devido a uma questão de espaço. As cores vermelha e verde representam maior e menor chance de se encontrar DPP nos contextos de risco e de proteção.

Contexto de risco

1) baixo índice socioeconômico; 2) conflito conjugal;

3) maior densidade habitacional; 4) morte de uma pessoa querida; 5) divórcio;

6) perda do emprego; 7) falta de suporte social;

8) ambiente familiar ruim durante a infância; 9) saúde deficiente;

10) estresse psicológico; 11) histórico psiquiátrico;

12) viver em condições de adversidade social

Contexto de proteção

1) alto índice socioeconômico; 2) boa relação conjugal;

3) menor densidade habitacional; 4) não ter perdido nenhum ente querido; 5) não ter se divorciado recentemente; 6) estar empregada;

7) presença de suporte social (incluindo religião); 8) bom ambiente familiar durante a infância; 9) boa saúde;

10) ausência de histórico psiquiátrico;