• Nenhum resultado encontrado

E Doença Aterosclerótica Coronária

No documento Artigos Volume - ABC Cardiol (páginas 35-38)

Os fatores de risco para a DAC estão tão ou mais presentes nos pacientes cirróticos do que na população geral, principalmente o diabetes. Apesar de a DAC aumentar a morbimortalidade destes pacientes, o grau de comprometimento da estenose não parece se correlacionar com um pior prognóstico.

coronárias com quantificação do escore de cálcio tem se mostrado útil, sendo que um escore de cálcio acima de 400 tem alto poder preditivo para eventos cardiovasculares precoces nestes pacientes.198 No entanto, o uso desta modalidade ainda não pode ser indicado de rotina nesta população.

A opção pelo tratamento destes pacientes deve obedecer ao critério de que a não intervenção pode levar a um risco excessivo durante e após a cirurgia. No entanto, a melhor opção de tratamento não está estabelecida e deve ser individualizada para cada paciente.

Uma controvérsia importante se refere ao uso de stents farmacológicos, por conta da necessidade de uso de antiplaquetários por um tempo mais prolongado em pacientes em que a regra é a existência de plaquetopenia, e o risco de sangramentos é sempre latente.199

A opção de revascularização cirúrgica deve, quando possível, ser postergada para depois do transplante, pela grande chance de ocorrerem eventos hemorrágicos ou agravamento da situação hepática com a cirurgia.200 A cirurgia de revascularização miocárdica antes do transplante deve ser reservada apenas para pacientes em que o risco de morte pela DAC supere o risco de morte de doença hepática.

Por fim, vale ressaltar que o cardiologista faz parte da equipe multidisciplinar que acompanha estes pacientes e, por este motivo, uma eventual contraindicação do procedimento sempre deve ser discutida e individualizada com a equipe multiprofissional e o paciente.

II. Rim

Pacientes com doença renal crônica terminal constituem um dos grupos de maior risco cardiovascular, com taxas de mortalidade por doença cardiovascular de cinco a cem vezes maiores do que aquelas encontradas na população geral.201 A doença cardiovascular é a principal causa de óbito após o transplante renal, especialmente devido à doença arterial coronária.202 Nos primeiros 30 dias após transplante renal bem- sucedido, aproximadamente metade dos óbitos é consequência de IAM.203 Da mesma maneira, no seguimento tardio, a doença isquêmica crônica do coração é responsável por mais de um terço dos óbitos em pacientes com enxerto funcionante.204

Deste modo, a avaliação pré-operatória de candidatos ao transplante renal visa não apenas à redução do risco cardiovascular no curto prazo, relacionado ao procedimento cirúrgico, mas também à redução de eventos cardiovasculares no seguimento tardio.205 Durante a avaliação de candidatos ao transplante renal, a identificação da presença e da extensão da doença arterial coronária se reveste de importância fundamental, por permitir que a equipe médica estabeleça mais precisamente o risco/benefício do transplante, a eventual necessidade de intervenção coronária no pré-operatório, o uso de medidas cardioprotetoras no perioperatório e o controle de fatores de risco no pós-operatório.

O objetivo desta seção é fornecer ao cardiologista os meios mais adequados de estabelecer o risco cardiovascular em uma população muito especial de pacientes, quase sempre excluída dos estudos de estratificação de risco operatório.

A meta principal consiste em identificar, dentre candidatos ao transplante renal, aqueles com maior probabilidade de diagnóstico de doença arterial coronária. Desta maneira, as recomendações aqui incluídas devem ser aplicadas apenas aos pacientes assintomáticos ou com sintomas atípicos; para aqueles indivíduos com evidências clínicas e/ou achados de exames de investigação diagnóstica sugestivos de doença coronária, a investigação complementar e o tratamento devem seguir as regras propostas para a população geral.

A identificação de doença arterial coronária significativa, por sua vez, é um imenso desafio em candidatos ao transplante renal. Pacientes com doença renal crônica terminal frequentemente apresentam sintomas atípicos, ou mesmo encontram-se assintomáticos na presença de doença arterial coronária avançada.206 A aplicação de métodos não invasivos, como TE, CPM e ecocardiograma sob estresse farmacológico − todos rotineiramente usados na população geral −, apresenta sensibilidade e especificidade menores do que em indivíduos com função renal normal, propiciando grande número de resultados falso-negativos.207-209 Por outro lado, o uso indiscriminado da cineangiocoronariografia não se justifica, por se tratar de um método invasivo, não isento de riscos de complicações e com custo elevado. Adicionalmente, a prevalência de doença arterial coronária significativa em pacientes avaliados invasivamente de forma rotineira é inferior a 50%.207,209,210

Estudos observacionais mostram que pacientes com doença renal crônica terminal e doença arterial coronária submetidos à revascularização miocárdica percutânea ou à cirúrgica apresentam risco de eventos cardiovasculares semelhante àqueles com doença renal crônica terminal sem doença arterial coronária significativa. Já aqueles com coronariopatia obstrutiva e não submetidos à revascularização miocárdica apresentam taxas significativamente mais altas de eventos cardiovasculares.207,208

Desde modo, deve ser definida uma estratégia que permita a identificação daqueles pacientes com maior chance de apresentarem doença arterial coronária significativa e que devem ser encaminhados para estudo angiográfico. Assim, seria possível diminuir o número de pacientes inadequadamente classificados como de baixo risco cardiovascular por falha na estratificação de risco pré-operatória e, consequentemente, a exposição deles a um maior risco de eventos cardiovasculares.

Estratificação do risco da presença de DAC

Os parâmetros clínicos mais fortemente associados à doença cardíaca isquêmica pós-transplante renal são idade > 50 anos, diabetes melito e evidência prévia de doença cardiovascular (história clínica e/ou achados de exames).211 A prevalência de DAC significativa (estenose ≥ 70%) aumenta de acordo com o número de fatores de risco presentes. Estes três fatores de risco têm servido de base na formulação de algoritmos de investigação de doença coronária em pacientes com doença renal crônica. Outros fatores considerados preditores de eventos cardiovasculares nesta população são: hipertensão arterial sistêmica, hipertrofia ventricular esquerda, tabagismo, dislipidemia e tempo em diálise acima de 1 ano.212

Baseados nos resultados dos estudos, propusemos um modelo de estratificação de risco dos pacientes renais crônicos assintomáticos do ponto de vista cardiovascular, em avaliação para transplante renal, conforme a presença ou ausência dos três fatores de risco citados.213-216 Caso haja alguma latência entre a estratificação inicial e a realização do transplante, sugerimos um período de 3 anos para a necessidade de nova estratificação, caso o paciente se mantenha estável e sem novos sintomas ou eventos cardiovasculares.

Recomendação recomendaçãoGrau de evidênciaNível de

Eletrocardiograma e raio X de tórax devem ser solicitados para todos os pacientes I C Ecocardiograma deve ser solicitado para todos os pacientes I B Para pacientes com ecocardiograma mostrando pressão de artéria pulmonar > 45 mmHg, deve ser solicitado o cateterismo

cardíaco direito com medida da pressão em artéria pulmonar I C Para pacientes com três ou mais fatores de risco para DAC*, uma prova de estresse com ecocardiografia ou cintilografia

miocárdica deve ser solicitada IIa B A cineangiocoronariografia deve ser realizada em pacientes com provas de estresse positivas de alto risco, apesar das

complicações hemorrágicas serem mais comuns e as alterações, como elevação da creatinina, poderem contribuir para o

aumento na morbidade dos cirróticos IIa C A intervenção coronariana percutânea com colocação de stents deve levar em conta a possibilidade de o paciente falecer

em função da doença hepática enquanto aguarda o período de antiagregação, e o benefício real da intervenção em

minimizar riscos perioperatórios IIa C Os inibidores da fosfodiesterase podem ser usados para tentar reduzir a hipertensão pulmonar em pacientes com pressão

da artéria pulmonar média entre 35 e 45 mmHg, embora não haja provas conclusivas do benefício desta conduta IIb B Realizar transplante hepático em pacientes com hipertensão pulmonar severa em centros que não ofereçam terapias

agressivas para redução da pressão da artéria pulmonar ou, ainda, a possibilidade de transplante concomitante de pulmão III B

B) Cirurgia Bariátrica

Com a epidemia de obesidade e o crescimento da prevalência de Diabetes Melito Tipo 2 (DM2), as intervenções cirúrgicas bariátricas ou metabólicas se tornaram uma opção muito interessante, e os resultados dos estudos de longo prazo (ainda que não randomizados) parecem indicar benefício na redução de mortalidade. Por outro lado, há ainda muitas indefinições, em especial sobre qual o perfil de paciente que poderá ser beneficiado e qual o tipo de intervenção cirúrgica para cada caso em particular.

De qualquer maneira, uma vez considerado o procedimento cirúrgico bariátrico, é importante prestar atenção para as contraindicações para este tipo de operação: Diabetes Melito Tipo 1 (DM1), abuso de drogas ou álcool, doença psiquiátrica não controlada, falta de compreensão sobre os riscos, alternativas e complicações da intervenção, e falta de compromisso com a necessidade de suplementação nutricional e seguimento clínico.

No Brasil, estão aprovadas quatro modalidades diferentes de cirurgia bariátrica (além do balão intragástrico, que não é considerado cirúrgico): o bypass gástrico, a banda gástrica ajustável, o duodenal switch e a gastrectomia vertical. Não existem, entretanto, dados conclusivos que fundamentem a escolha do procedimento com base na superioridade ou menor incidência de complicações, por exemplo. É também importante lembrar que devem ser consideradas diversas variáveis como idade, sexo, Índice de Massa Corporal (IMC), presença de comorbidades e o desejo do paciente. Assim, por exemplo: hérnia hiatal importante contraindica a gastrectomia vertical; paciente com IMC muito elevado não pode receber a banda gástrica ajustável; para um paciente que come continuamente, a gastrectomia vertical tem menor eficácia; ou se o paciente é diabético de longa evolução, o bypass gástrico possivelmente funcionará melhor.

Com relação à avaliação perioperatória para pacientes com indicação de cirurgia bariátrica, além das recomendações gerais descritas para pacientes obesos em outro item desta diretriz (consultar item 9.D desta diretriz), existem algumas considerações específicas, que levam em conta estudos que observaram a ocorrência de complicações. DeMaria e colaboradores avaliaram 2.075 pacientes submetidos à intervenção cirúrgica bariátrica (todos submetidos ao bypass

gástrico) no estudo Obesity surgery mortality risk stratification score (OS-MRS) e encontrou risco de morte aumentado na presença de determinados fatores: Tromboembolismo Pulmonar (TEP) ou risco para TEP, IMC > 50 kg/m2, sexo masculino, hipertensão arterial sistêmica e mais de 45 anos de idade. Risco para TEP foi definido como TEP prévio, presença de filtro de veia cava, IC direita e/ou HP, estase venosa crônica e síndrome de apneia obstrutiva do sono. A partir destes dados, DeMaria et al.,217 construíram um escore de risco conforme o número de fatores de risco (A para zero a um fator, B para dois ou três, e C para quatro ou cinco), que correspondem, respectivamente, a um risco estimado de mortalidade perioperatória de 0,31, 1,90 e 7,56%. Por meio da avaliação dos pacientes submetidos à cirurgia bariátrica do NSQIP, foram desenvolvidas e validadas ferramentas para cálculo de risco de mortalidade218 e morbidade219 especificamente para este tipo de intervenção e que podem ser acessadas e utilizadas online (http://www. surgicalriskcalculator.com/bariatric-surgery-risk-calculator).

O maior estudo prospectivo realizado até hoje, o LABS (Longitudinal Assessment of Bariatric Surgery), cujos resultados foram publicados em julho de 2009, analisou 4.776 intervenções cirúrgicas bariátricas e observou taxas de complicações menores, não corroborando os achados de DeMaria et al.217 Os autores encontraram mortalidade geral de 0,3% em 30 dias e desfecho composto por morte, Trombose Venosa Profunda (TVP), TEP, reintervenção e internação maior que 30 dias em 4,3% dos pacientes. Alguns preditores do desfecho composto foram semelhantes aos encontrados por DeMaria et al.,217 como IMC > 70 kg/m2, TVP ou TEP prévio (8,8% de eventos) e apneia do sono (5,0% de eventos). Foi encontrada ainda correlação entre o desfecho composto e diabetes (5,5% de eventos), tipo de cirurgia e baixa capacidade funcional (incapacidade de andar mais de 61 m sem dispneia com 15,9% de eventos). Neste estudo, o tipo de cirurgia com melhor desfecho foi o bandeamento gástrico laparoscópico (1,0%) comparado ao bypass gástrico associado a Y de Roux laparoscópico (4,8%), e bypass gástrico associado a Y de Roux por cirurgia aberta (7,8%).220

Um outro estudo, com mais de 91 mil pacientes, observou que o Tromboembolismo Venoso (TEV) ocorreu, nos primeiros 30 dias de pós-operatório, em 0,29% dos casos de pacientes

Recomendação Grau de recomendação Nível de evidência

Pacientes sem fatores de risco principais* são considerados de baixo risco cardiovascular, sem indicação de

investigação complementar I C Pacientes com apenas um dos fatores de risco principais* são considerados de risco cardiovascular

intermediário e devem ser submetidos à estratificação não invasiva. Se positiva, prosseguir na investigação

invasiva com cineangiocoronariografia; se negativa, proceder ao transplante renal IIa C Pacientes que apresentem pelo menos dois dos fatores de risco principais* são considerados de alto risco

cardiovascular e deverão ser encaminhados diretamente para estudo invasivo antes do transplante IIa C Pacientes com DAC obstrutiva envolvendo os segmentos proximais das artérias coronárias epicárdicas

principais podem ser submetidos à revascularização miocárdica cirúrgica ou percutânea visando à redução

no risco cardiovascular IIa C

metabólica. Mais de 80% dos casos de tromboembolismo, entretanto, ocorreram após a alta hospitalar. IC, paraplegia, dispneia em repouso e reoperação foram associadas com o maior risco de tromboembolismo. Os autores sugeriram que tromboprofilaxia farmacológica rotineira deve ser considerada para pacientes com estimativa de risco elevado (> 0,4%).221

Não há consenso sobre qual o esquema profilático mais adequado. Uma metanálise recente não identificou benefício em nenhuma das diferentes estratégias, que variaram de 40 mg por dia até 60 mg de enoxaparina duas vezes ao dia.222

Por outro lado, um estudo analisou a estratégia de dividir os grupos de pacientes submetidos à cirurgia bariátrica (93% bypass gástrico) segundo o IMC: pacientes com IMC menor ou igual a 50 kg/m2 receberam enoxaparina 40 mg duas vezes ao dia e pacientes com IMC > 50 kg/m2 receberam enoxaparina 60 mg duas vezes ao dia. A maioria dos pacientes (74%) atingiu níveis terapêuticos de anti-Xa e somente 1,79% precisou de transfusão sanguínea. Este estudo, entretanto, não tinha poder para identificar superioridade de um ou outro esquema terapêutico em termos de desfechos duros.223

Além das recomendações para pacientes obesos descritas em outro item nesta diretriz (consultar item 9.D desta diretriz),

bariátrica, acrescentamos as que se seguem. C) Cirurgias Vasculares Arteriais

As cirurgias vasculares arteriais representam o grupo de intervenções associadas à maior incidência de complicações cardiovasculares, que podem chegar a taxas de quase 50% em alguns casos, questionando-se, inclusive, a validade da realização do procedimento.224 Por outro lado, é importante conhecer as indicações baseadas em evidências que comprovaram relação risco/benefício favorável, e identificar todas as variáveis envolvidas com a estimativa de risco para este tipo de intervenção. O assunto encontra-se mais detalhado na Atualização da II Diretriz de Avaliação Perioperatória, com enfoque em operações vasculares arteriais, que pode ser consultada no link50,225

http://publicacoes.cardiol.br/consenso/2013/II_Diretriz_ de_Avalia%C3%A7%C3%A3o_Perioperat%C3%B3ria.asp.

As recomendações e cuidados gerais desta diretriz são necessárias também para esta população específica. Por outro lado, existem questões adicionais específicas, abordadas a seguir.226,227

Recomendações para Pacientes em Programação de Cirurgia Bariátrica

Recomendação Grau de recomendação Nível de evidência

Excluir as contraindicações gerais para cirurgia bariátrica: diabetes melito tipo 1, abuso de drogas ou álcool, doença psiquiátrica não controlada, falta de compreensão sobre os riscos, alternativas e complicações da

intervenção e falta de compromisso com a necessidade de suplementação nutricional e seguimento clínico I C Realizar a avaliação do risco de morbidade e mortalidade por meio da ferramenta de cálculo específica para

cirurgia bariátrica: http://www.surgicalriskcalculator.com/bariatric-surgery-risk-calculator I B Utilizar de forma rotineira tromboprofilaxia com heparina de baixo peso molecular, heparina não fracionada

profilática a cada 8 horas, fondaparinux ou a associação de um método farmacológico com a compressão

pneumática intermitente I C

Para pacientes com índice de massa corporal menor ou igual a 50 kg/m2, utilizar doses maiores de heparina

de baixo peso molecular (enoxaparina 40 mg subcutânea a cada 12 horas) ou heparina não fracionada (7500

UI subcutânea a cada 8 horas), do que as habitualmente utilizadas em profilaxia de pacientes não obesos IIa B Para pacientes com índice de massa corporal maior que 50 kg/m2, utilizar doses maiores de heparina de

baixo peso molecular (enoxaparina 60 mg subcutânea a cada 12 horas) IIa B

No documento Artigos Volume - ABC Cardiol (páginas 35-38)