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de formação de gestores culturais é fundamental focar esta problemática, pois a economia da cultura movimenta por ano dezenas de bilhões de reais no país (obtém apoio de outros bilhões anuais, através de reduções da base de cálculo, créditos ou imunidades tributárias); o setor público, através das verbas do Ministério da Cultura, Secretarias Estaduais e Municipais de Cultura, realiza investimentos anuais diretos, investimentos discretos, que chegam a somente centenas de milhões de reais em eventos, conservação do patrimônio histórico e artístico, museus, bibliotecas, teatros, galeria de arte e escolas de música, dança, circo e artes plásticas.

Os recursos disponibilizados pelas leis de incentivo à produção cultural, realizada através de autorizações na tributação de serviços (Imposto Sobre Serviços - ISS, imposto municipal), na tributação de bens industriais (ICMS, imposto estadual) ou na tributação do imposto de renda (imposto federal), são migalhas perto dos incentivos oferecidos pelas estruturas fazendárias – federal, estaduais e municipais - direcionados para as empresas privadas da indústria cultural.

Os indicadores municipais sobre infraestrutura de equipamentos culturais atingem somente uma média de 12% no Rio de Janeiro, contra 11% em São Paulo e 8% no Brasil, conforme “Pesquisa Municipal”, dos anos de 1999 e de 2003, realizadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Esses dados demonstram a falta de acesso a bens e serviços culturais por grande parte da população. Mesmo aqueles consumidores que desejam não podem ter acesso a produtos e serviços culturais, porque não têm nas suas localidades salas de

teatro, de música, de cinema, museus, livrarias, entre outros equipamentos. A infraestrutura existe somente onde há concentração de renda.

Dessa maneira, a população depende das empresas da indústria cultural, que leva até ela, através dos meios de comunicação,filmes, músicas e livros. O que cria um padrão cultural que limita a diversidade.

Escreve o professor Dênis de Moraes, no livro O Concreto

e o Virtual (p.17-19) “Os conglomerados multimídias assemelham- se a arquipélagos transcontinentais, cujos parâmetros são a produtividade, a lucratividade e a racionalidade gerencial. Operam como verdadeiros centros globais de poder, com diagnósticos e prioridades decorrentes de visões geoeconômicas peculiares, não mais sintonizadas com as cartografias convencionais. A liberdade de movimentos foi facilitada pelas desregulamentações neoliberais, pela supressão de barreiras fiscais, pela acumulação de capital nos países industrializados, pela deslocalização das bases de produção e por redes de múltiplos usos. No âmago da chamada ‘flexibilização dos investimentos empresariais’ – eufemismo para o processo de concentração multinacionalizada de bens e serviços -, a realização de lucros implica maior acumulação de capital ao menor custo possível. O que pressupõe:

a) amplos contingentes de consumidores;

b) concorrência intensa entre um número cada vez menor de grupos, graças a fusões e incorporações;

c) centralização das decisões básicas nas matrizes dos grupos transnacionais, que também supervisionam as operações no exterior.” (...)

E “a cadeia de inovações [onde as questões relativas à

propriedade intelectual são estruturantes] atrela-se às MAJORS,

tanto em função dos altos custos fixos, como os de pesquisa e desenvolvimento, quanto pela necessidade de obter retornos de escala. As companhias evoluem de uma mercadoria a outra com tamanha rapidez que quase não sobram chances para firmas de médio porte. As que não se vinculam a conglomerados estão condenadas a desaparecer.” (...) “Numa economia madura, três companhias gigantes, invariavelmente, acabam com 70% do mercado. (...) A indústria fonográfica permanece nas mãos das chamadas cinco irmãs: Universal, BMG/Sony, Warner Music e EMI. (...) O mercado da mídia gira em torno de cinco a oito conglomerados, com duas dezenas de empresas consideravelmente grandes, ocupando os segmentos regionais e tendo acordos com um ou mais players. (...) As dez primeiras no ranking de mídia figuram entre as 500 maiores companhias do mundo. São elas: America Online-Time Warner, Vivendi Universal, Disney, Bertelsmann, News Corporation, Viacom, Sony,TCI, Thomson e NBC. Quatro não estão sediadas nos EUA: a alemã Bertelsmann, a francesa Vivendi Universal, a canadense Thomson e a japonesa Sony. Juntas, arrecadaram cerca de US$200 bilhões em 1999 – equivalentes a aproximadamente 40% do Produto Interno Bruto – PIB, do Brasil.”

O debate sobre o poder dessas estruturas da economia da cultura precisa avançar na construção de políticas públicas, acadêmicas e empresariais que levem em consideração os valores analítico e simbólico. Num momento em que as relações internacionais baseiam-se cada vez mais nas regras e instituições, fica claro que o poder dos países do Primeiro Mundo está

estruturado em um conjunto de métodos complexos, difíceis, custosos e inseguros.

A atmosfera da proximidade, quase fusão do trabalho, estudo e lazer, constitui uma parte inalienável da cultura, entendida no sentido filosófico e existencial, como certa unidade da atividade material e espiritual. Seria um equívoco continuar com a lógica herdada do século passado. Em determinados círculos, o ódio misturado com a inveja, no que se refere ao Primeiro Mundo, supera qualquer racionalidade. Inclusive, no debate sobre a hegemonia do segundo século americano, entendemos que podemos fazer uso do potencial daquela nação para a criação e o desenvolvimento de instituições internacionais e no processo sócio-econômico-cultural.

Até as classes que antes tinham uma posição de destaque na arena social entraram em declínio. Antes, isso se aplicou a escravos, servos da gleba, camponeses; agora, entrou em declínio a classe operária tradicional – a da grande indústria. A revolução científica e tecnológica cada vez mais dispensa as antigas formas do trabalho concreto e, com isso, afeta seus portadores sociais. Já não se pode contar com êxito no futuro um movimento social cuja principal base de apoio seriam esses operários que estão cumprindo serviços rotineiros de produção. Em 1990, o trabalho de produção rotineira compreendia apenas um quarto das funções ocupadas nos países desenvolvidos, e o número continua declinando, cedendo lugar aos serviços pessoais e aos serviços analítico-simbólicos. Essa situação

profeticamente foi identificada por Karl Marx em Grundisse:

...Caducará a tradicional divisão de trabalho, com a separação dos homens em trabalhadores ‘manuais’ e ‘intelectuais’.

O desafio que se apresenta é o de definir a amplitude da aplicação de questões normativas, doutrinárias e de planejamento setorial para a economia da cultura, dentro do Estado e da iniciativa privada. Nas Federações das Indústrias e Comércio, nas universidades e, especialmente, no Ministério da Cultura, existe um não entendimento deste desafio. Lembra o advogado autoralista Sydney Sanches, na revista ‘Cultura em Números’, n°1, página 5, editora PUC-Rio,

que “o sociólogo Domenico de Masi, ao analisar a distribuição de

forças econômicas no mundo atual, distribui a economia mundial em três grupos de países:

a) os pós-industriais, dedicados ao desenvolvimento e à produção de informações, ciência, pesquisa, arte, entretenimento, conteúdo, comunicação etc, como principal atividade econômica, que detêm uma posição hegemônica: EUA, Japão e Europa Ocidental;

b) os industriais, regulados de forma a buscar o fomento das indústrias convencionais e poluentes, os quais atraem as fábricas e o capital do grupo pós-industrial, tais como Brasil, China, Rússia e outros;

c) os países que não conseguem reunir condições para produção de bens materiais, que consomem as sobras do primeiro e do segundo grupos.”

Esta análise demonstra que a economia da cultura está inserida no contexto econômico contemporâneo de qualquer país, mesmo daqueles que, por conta do seu atraso, são meros consumidores de bens materiais e imateriais, apesar de ter língua própria e cultura original. As populações desses países, como a

maior parte da população do interior do Brasil, consomem o que os conglomerados de TVs, rádios, indústria fonográfica e de livros distribui e comercializa.

Como foi destacado anteriormente, as estruturas fazendárias – federal, estaduais e municipais - definem os princípios dos negócios da economia da cultura. Das especificidades setoriais, relativas à criação e à veiculação do conteúdo, não são levadas em conta quando é realizada a normatização ou é elaborada legislação para o setor. Enquanto têm forte regulamentação áreas consideradas estratégicas como energia, transporte e agricultura.

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