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3 – A ECONOMIA GEOPOLÍTICA DA CIDADE NEOLIBERAL: vantagens comparativas, terciarização e financeirização na metrópole

Este capítulo visa aprofundar no repertório de questões em torno da cidade neoliberal a partir do quadro histórico e conceitual já delineado, mapeando processos socioespaciais da história contemporânea que se fazem presentes na produção do espaço na metrópole hoje através de formas distintas de vinculação ao neoliberalismo. A cidade se torna agenciadora e mediadora transescalar do neoliberalismo, tornando este formato de governo real na vida cotidiana, de forma próxima e imediata, “descendo” do plano da macroeconomia ao espaço da vida. Além de outros domínios diversos, o capitalismo neoliberal se realiza e se reproduz através e a partir de sua relação com a metrópole, que se constrói em fluxos transescalares: é impossível compreender processos socioespaciais que operam na metrópole contemporânea sem ter em conta a interseção Estado- capital-espaço urbano em suas diversas escalas. Estas transformações envolvem a formação e o engajamento dos agentes com particularidades locais que são historicamente construídas e geograficamente variegadas – não se caracterizando, como aparece com frequência em determinadas análises, por um aplainamento geral e homogeneizador, mas muitas vezes criando diferenças entre cidades e regiões a partir da dependência da trajetória de cada local. Como argumentam Jamie Peck e Adam Tickell,

Assim como a globalização, a neoliberalização deve ser entendida como um processo, não como uma situação final. Da mesma forma, ela também é contraditória, tende a provocar contratendências, e existe em formas histórica e geograficamente contingentes. Análises deste processo devem, deste modo, enfocar especialmente na mudança – em transformações em sistemas e lógicas, padrões dominantes de restruturação etc. – ao invés de comparações estáticas e/ou binárias entre um estado anterior e seu sucessor. Também implica que análises da neoliberalização devem ser sensíveis a sua natureza contingente – daí as diferenças não-triviais, tanto teórica quanto politicamente, entre os neoliberalismos de fato existentes, da Grã-Bretanha de Tony Blair, do México de Vicente Fox e dos EUA de George W. Bush. Mesmo que os processos de neoliberalização estejam claramente em curso em cada uma dessas situações diversas, não devemos esperar que isto engendre simples convergências de resultados, um fim da história e da geografia neoliberalizado (PECK; TICKELL, 2002, p. 383).

Dando sequência ao exposto no capítulo anterior, o período de crise gerada pela reestruturação que atinge em cheio o Estado e a economia brasileiros na década de 1980 transforma a metrópole num ponto de grande concentração de eventos e processos derivados da crise. Diminui-

se abruptamente a capacidade de gasto público com estruturas coletivas cuja necessidade se tornava urgente, o desemprego aumenta substancialmente, e entra-se num ciclo de hiperinflação resistente combinada à recessão que perduraria, com intensidades em variação, até meados da década de 1990 e que gera consequências nefastas, sobretudo para a população de baixa renda sem acesso aos mecanismos financeiros de proteção contra seus efeitos. Em contraste com a onda que se fortalecia naquele momento através da retomada dos movimentos de reforma urbana na direção da democratização da política e do planejamento urbano, o neoliberalismo se apresenta neste contexto como um prognóstico de saída da crise através da promoção das virtudes do mercado que seria progressivamente adotado no plano macroeconômico e em diversas cidades e regiões não alinhadas politicamente àquela dinâmica de busca por democratização do planejamento e da gestão na escala urbana.

O imperativo da busca por vantagens comparativas como forma de saída da crise se faz presente de diversas formas, e atinge as relações entre regiões e cidades, que passam ao plano da competição. Como argumentam Peck e Tickell (2002), há um processo de neoliberalização do

espaço em que as relações espaciais são tornadas neoliberais, onde as cidades e regiões se

relacionam umas com as outras a partir de padrões de competição (inclusive entre modos de regulação mais eficientes e favoráveis ao crescimento e ao investimento privado). Esta neoliberalização, segundo aqueles autores,

não pode ser reduzida a um resultado ou um efeito colateral deste ambiente pós- keynesiano. Ao invés disso, pode ser vista no exercício de uma influência cumulativamente significativa e relativamente autônoma na estrutura e na dinâmica da competição interurbana e no desenvolvimento intraurbano. Este não foi um período em que forças inerentemente competitivas foram espontaneamente

‘liberadas’ pela saída de cena do Estado. Mas a ascensão do neoliberalismo esteve

associada à construção política de mercados, acoplada da extensão deliberada de lógicas competitivas e de gestão privatizada em esferas até então relativamente socializadas (PECK; TICKELL, 2002, p. 395).

Nisto, as cidades e regiões se tornam agentes neoliberais fundamentais, pois a própria competição inter-territórios se torna um fator importante na dinâmica geo-econômica do neoliberalismo, passando a ser insumo de decisões de investimento e localização que rebatem sobre a própria dinâmica regional e nos próprios padrões de regulação praticados de forma decisiva. E assim, os capitais em busca de oportunidades criadas por ambientes tornados mais favoráveis a sua reprodução ganham vantagens criadas por esta transformação das cidades e das regiões em agentes

neoliberais importantes. A autonomia relativa que as escalas local e regional ganham na restruturação pós-fordista se torna um plano importante de ajuste regulatório que os capitais buscam influenciar e criar combinações favoráveis. Cria-se aí uma dialética espacial entre capitais relativamente fluidos no território em busca de oportunidades mais favoráveis, outro conjunto de capitais que atuam ativamente na definição dos próprios aparatos regulatórios regionalizados, e as próprias regiões interagindo entre si a partir destes distintos arranjos e ajustes em seu formato de regulação da produção (que se tornam cada vez mais específicos da região). Refletindo acerca do padrão com que este processo ocorre no norte global, Peck e Tickell defendem que

claramente, este regime de competição interurbana não foi simplesmente um produto do neoliberalismo, nem pode ser inteiramente reduzido a sua lógica, mas a ascensão paralela do neoliberalismo foi crucial no reforço, na extensão e na normalização destas tendências transurbanas na direção da governança empreendedora reflexiva de [diversas] formas: o neoliberalismo promove e normaliza um formato de desenvolvimento urbano que privilegia o crescimento, re-enquadrando arranjos de bem estar social como custos anticompetitivos e tornando questões de redistribuição e investimento social como antagônicas aos objetivos de desenvolvimento econômico. Objetivos distributivos e de bem estar social só podem ser visados após o crescimento, os empregos e o investimento serem assegurados (...); o neoliberalismo se assenta sobre uma naturalização penetrante de lógicas de mercado, se justificando através da eficiência ou mesmo

da ‘justiça’ como métricas dominantes da avaliação de políticas públicas. Nesta

análise, as medidas de política urbana devem antecipar, complementar, e em alguns casos mimetizar a operação de mercados competitivos; como a ideologia escolhida tanto pelas principais agências de financiamento e pelos ‘mercados’, o neoliberalismo não somente privilegia o governo enxuto, a privatização, a desregulação, mas através de uma combinação de regimes competitivos de alocação de recursos, políticas de empréstimo municipais enviesadas e pressões políticas abertas, ele enfraquece e interrompe caminhos alternativos de políticas de desenvolvimento urbano baseadas, por exemplo, na distribuição social, nos direitos econômicos ou no investimento público (PECK; TICKELL, 2002, p. 394).

Trazer tal discussão para o contexto brasileiro é uma tradução que passa necessariamente pela perspectiva apresentada no capítulo anterior, em que o chamado Estado de bem estar social assume formatos distintos de seus equivalentes nos países centrais, e é mais caracterizado por um padrão semiperiférico de nacional-desenvolvimentismo com diversos resultados diretamente advindos de seus períodos autoritários. Deste modo, o processo de neoliberalização, de transformação daquele aparato regulatório num formato sintonizado à globalização e ao neoliberalismo opera sobre outras bases, engendrando resultados socioespaciais necessariamente distintos. O próprio déficit de estruturas coletivas advindo da derrocada do modelo anterior seria

posteriormente lançado ao mercado, para que seus mecanismos supostamente mais eficientes atuassem, de modo retratado no discurso como difuso e espontâneo, no provimento de saídas e soluções. E nesta coloração específica da trajetória regulatória (e política) brasileira, o neopatrimonialismo reaparece como um elemento importante, por perpassar justamente a dita “construção política dos mercados” identificada por Peck e Tickell na citação anterior.

É importante notar também como o patrimonialismo muito frequentemente se torna alvo da crítica dos próprios neoliberais, por distorcer o funcionamento dos mercados através de intervenções personalistas e mecanismos de proteção e estabelecimento de barreiras à entrada de concorrentes livremente em determinados mercados. Exclusividade de mercado garantida a empresas de transporte público, por exemplo, são atacadas por muitos em função desta criação de uma distorção nos mecanismos de oferta e demanda no livre mercado em que a restrição legal à livre entrada de novos ofertantes deixa de permitir que o próprio mercado dê conta, através dos sinais enviados pela dinâmica de preços aos investidores em potencial, de ajustar oferta e preços de acordo com as condições vigentes. O mesmo nexo se aplica no caso da regulação de uso e ocupação do solo nas grandes cidades, em que o argumento neoliberal aponta o problema do alto custo de localização, moradia e aluguéis em certas áreas como decorrente das restrições à ampliação da construção que geraria maior oferta nas localidades mais demandadas. Tais regulações restritivas muito frequentemente advêm de políticas de proteção do patrimônio histórico e arquitetônico (ou seja, uma intervenção estatal impedindo o livre funcionamento dos mercados), que seriam, deste ponto de vista, as responsáveis pelos processos de gentrificação e expulsão daqueles que não são capazes de arcar com os preços altos praticados como consequência da oferta congelada, resultante das restrições impostas pelo planejamento (ver Glaeser, 2011). O discurso de ataque ao Estado, passa assim, por uma visão de que sua interferência gera distorções no funcionamento do livre mercado cujas consequências muito frequentemente são nefastas para os próprios grupos mais vulneráveis. Em relação a estes preceitos, é importante não somente separar os discursos daquilo que se caracteriza como o “neoliberalismo realmente existente”, e considerar que

o neoliberalismo só existiu em formas ‘impuras’, e de fato só pode existir em

híbridos bagunçados. Sua visão utópica de uma sociedade e uma economia livres é, em última análise, irrealizável. No entanto, a clareza de sua aparição ideológica, o livre mercado, aliado às repetidas frustrações advindas do fracasso inevitável de se alcançar este destino ilusório, confere um grau significativo de força para que o projeto neoliberal prossiga adiante. Ironicamente, o neoliberalismo possui uma dinâmica progressiva e inclinada para frente em virtude da própria

referiu a uma liberalização de uma vez por todas, uma evacuação do Estado. Ao invés disso, ele sempre se associou a programas contínuos de reformas orientadas para o mercado, um tipo de revolução permanente que não pode ser simplesmente julgado de acordo com suas próprias fantasias de uma liberação do livre mercado (PECK, 2010, p.7).

Deste modo, a busca por este ideal inatingível cria formações econômico-sociais e espaciais que são próprias de cada modo de interação entre os processos contemporâneos e as conformações anteriores, bem como com o aparato regulatório delas resultante e o conjunto de forças políticas atuando em cada configuração regional, sendo que estas dinâmicas têm um elemento socioespacial fundamental na sua conformação e reprodução.

Por sua própria natureza, como uma forma, ligada a um oxímoro, de ‘governo do

mercado’, o neoliberalismo é contraditório e polimórfico. Ele não será fixo.

Provavelmente, ao invés disso, o mais próximo que se torna possível de se alcançar o entendimento da natureza do neoliberalismo é perseguindo seus

movimentos, e triangulando entre suas correntes ideológicas, ideacionais e

institucionais, entre filosofia, política e prática. Ademais, este é um exercício em geografia histórica, assim como qualquer esforço deve estar atento aos espaços através dos quais o projeto neoliberal tem sido (re)construído (PECK, 2010, p. 8).

Portanto, torna-se necessário avaliar os processos de transformação socioespacial engendrados por esta busca pelo neoliberalismo inatingível, que ao mesmo tempo em que vai transformando o ideário neoliberal em senso comum, deve lidar com desafios, dificuldades, conflitos e limitações concretas e que também são geograficamente expressivas:

(…) existem tantas variedades de neoliberalismo quanto formações sociais a

serem neoliberalizadas. (…) tentativas de ‘afixar’ o neoliberalismo de forma

transcendental são destinadas à frustração, e por bons motivos. (…) por toda sua

certeza doutrinária, o projeto neoliberal é paradoxalmente definido justamente pela impossibilidade de se atingir seu objetivo fundamental – o domínio do mercado sem atritos. Não é o próprio objetivo em si, mas as oscilações em torno das tentativas frustradas de atingi-lo que dão forma ao neoliberalismo como um modo contraditório de governança do mercado. Definições totalmente claras da neoliberalização simplesmente não existem; no seu lugar, relatos concretamente fundados do processo precisam ser esculpidos dos interstícios das configurações do estado/mercado (PECK, 2010, p. 15-16).

Idealistas do Estado mínimo sempre discutiram a respeito de onde ‘traçar a linha’ em relação aos papéis positivos do Estado, ou dos limites adequados da intervenção e dos gastos públicos. Se a neoliberalização descreve um padrão de restruturação (incompleta, contraditória e propensa a crises), que foi historicamente dominante desde a década de 1970, mas que sempre esteve associada ao desenvolvimento socioespacial desigual, logo não se deve antecipar

uma convergência unidirecional em formas de Estado menores e mais ou menos idênticas. O desenvolvimento socioespacial desigual não é um estado transitório na direção do neoliberalismo puro. É por este motivo que o reconhecimento das geografias históricas complexas da neoliberalização não diz respeito somente à identificação de contingências excepcionais, mas é fundamental para o entendimento do próprio processo (PECK, 2010, p. 20).

A persistência de formas antigas (e arraigadas na formação social brasileira) de relações Estado-capital-sociedade e de regulação da acumulação capitalista se torna um destes diversos elementos histórico-geográficos específicos que interagem com o processo de neoliberalização de forma decisiva, carregando-o para regiões distintas daquelas propugnadas pelos discursos, tais quais nos exemplos apontados acima. Assim, o resultado, no âmbito do “neoliberalismo realmente existente” é, no que diz respeito à cidade brasileira, marcado por uma mescla entre neoliberalização e persistência do neopatrimonialismo, que mesmo sendo em princípio contraditórios, operam de forma conjunta, com este último agrupamento utilizando ativamente – e de forma distorcida – o discurso da eficiência do setor privado para que possa permanecer em cena sob roupagens renovadas (no financiamento direto de campanhas políticas como moeda de troca, por exemplo). Utiliza-se também de aspectos práticos e objetivos, como a restrição orçamentária dos municípios em grande medida advinda de imposições legais de cima – na Lei de Responsabilidade Fiscal, por exemplo -, para o mesmo fim, qual seja, a abertura de oportunidades de investimento e de formas de reprodução de capitais com rendimentos mínimos garantidos através do vínculo direto com o Estado. Ou seja, o próprio neopatrimonialismo mobiliza um discurso neoliberal, e ganha espaço para sua atuação e reprodução a partir de condições criadas pela neoliberalização. Estas considerações devem acompanhar a discussão que segue, pois estes dois processos aparecem juntos com muita frequência nos processos socioespaciais metropolitanos contemporâneos, bem como na conformação de direções para a política urbana e seus componentes e desdobramentos diversos (nos transportes, na regulação do uso e da ocupação do solo e na habitação, por exemplo).

Retomando o tema da busca por vantagens comparativas como um princípio norteador e uma prática que tende a se tornar onipresente no neoliberalismo, a cidade regida a partir deste preceito opera predominantemente a partir do mercado – ou seja, as decisões acerca do que se fazer em determinados territórios tendem a seguir lógicas semelhantes àquelas que se operam no domínio dos agentes privados, otimizando custos e benefícios. Neste processo o solo urbano se torna uma mercadoria da própria cidade-empresa, agenciado pelo seu planejamento, com desdobramentos importantes na direção da financeirização do espaço urbano, como veremos adiante. A partir do

momento em que a competição pelo solo metropolitano atinge determinados patamares, e que ele se torna mercadoria disputada, valorizada enquanto tal pelo mercado, o planejamento sintonizado a estes mesmos preceitos busca agenciar estes espaços para venda, ao mesmo tempo alimentando e atuando a reboque da valorização fundiária, que cria um ciclo retroalimentado através da alta arrecadação de impostos de propriedade imobiliária. Ações do planejamento que reduzam o valor da terra em determinada região – como a oferta de habitação de interesse social - tendem a ser evitadas, e as ações planejadas tendem a seguir uma lógica de potencialização da valorização, que em um nexo de parceria entre o público e o privado em termos amplos beneficia diretamente o segundo e agencia os objetivos do primeiro, sendo que neste modelo os dois atuam em sintonia. Assim, é importante entender a atuação do mercado imobiliário no planejamento urbano neoliberal como um híbrido que exemplifica a discussão acima, ao mesmo tempo patrimonialista e neoliberal, driblando, no plano do “neoliberalismo realmente existente”, a contradição em princípios (e no discurso) que existe entre estes dois blocos.

Este caráter da especificidade brasileira nos remete a uma discussão que tem ocupado espaço importante no debate contemporâneo no campo dos estudos urbanos que merece uma breve digressão, para chamar atenção para sua pertinência numa discussão mais ampliada, entre uma vertente mais centrada numa concepção crítica da economia política urbana em conjunto com uma orientação regulacionista (como os autores citados acima, dentre vários outros) e um segundo grupo, mais caracterizado por uma orientação pós-estruturalista, que vem se debruçando sobre a metrópole do sul global como um campo de pesquisa fértil para a análise de processos múltiplos, multifacetados, pouco ou mal entendidos por categorias advindas do norte (como seria, supostamente, o caso do neoliberalismo). O próprio Peck (2015) faz uma leitura ampliada deste debate, situando-se no diálogo, e propondo avanços na direção de proposições conciliatórias entre os dois grupos. A crítica ao paradigma da cidade neoliberal a partir de um ponto de vista supostamente representativo da metrópole do sul global (ver Seekings, 2013) baseia-se numa ideia da teoria urbana como um discurso intrinsecamente em busca de formulações teóricas universais. Toma-se a cidade sul-africana como exemplo de um processo de urbanização cuja complexidade escapa a tentativas, supostamente advindas do norte, de teorização universal, sobretudo aquelas ligadas ao neoliberalismo urbano, em função de uma série de dinâmicas contemporâneas que iriam na direção oposta, da reconstrução da coletivização a partir do crescimento econômico engendrado pela vinculação das economias da região ao dinamismo chinês. Sem entrar no mérito da própria África do Sul – que nos escapa em muito, mas poderia ser abordada através do relato acerca da

entrada do neoliberalismo naquele país provido por Naomi Klein (2009) – essa hibridização neoliberalismo-patrimonialismo evidenciada na regulação e na dinâmica de acumulação entrecruzada à urbanização contemporânea brasileira serve como um contraponto em potencial.

Nos termos dos próprios críticos da conceituação da cidade neoliberal que pretendem falar pelo sul, deixa-se de reconhecer a diversidade de situações e de trajetórias geo-históricas muito distintas que compõem o amplo repertório da categoria da metrópole do sul global, unidas por suas relações com o norte e a herança colonial quase sempre presente nestes territórios, mas com diferenças e especificidades marcantes entre elas. Deixa-se também de tratar das origens meridionais do próprio neoliberalismo na experiência do Chile como laboratório dos Chicago boys no início do regime Pinochet (também tratado por Klein, 2009). Ademais, como relatado na Introdução acima, o alcance do neoliberalismo no contexto meridional do caso brasileiro é decisivo ao ponto de criar uma força contrária à dinâmica de democratização iniciada na década de 1980, neutralizando partes importantes de seus efeitos em potencial, o que gera consequências significativas para a metrópole, inclusive num conjunto de restrições às experiências das gestões municipais antenadas ao ideário distributivo, de justiça social e de democracia participativa da reforma urbana. Como indicado por Emilio Pradilla Cobos (2014),

A privatização do público, que entrega ao capital privado as empresas produtivas,