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Relações entre espaço, economia e sociedade envolvem conjuntos de determinações mútuas, vetores recíprocos e dinâmicas por vezes reprodutoras de processos passados, por outras disruptivas, transformadoras. Compreender a metrópole contemporânea e os processos socioespaciais que a constituem e reproduzem – bem como as possibilidades e aberturas para sua transformação – requer uma apreciação de sua história. Além de resultado de percursos passados, o espaço metropolitano é também produto de uma hiper-concentração de agentes, estoques materiais e imateriais, fluxos e vetores em direções diversas que se interligam em outros planos espaciais e transformam dinâmicas aparentemente distantes e exógenas em realidades cotidianas. Processos metropolitanos atuais se vinculam às geografias relacionais e transescalares que os compõem, não no binário redutor entre o local e o global, mas em formas múltiplas, traçando conexões cruzadas entre agentes e processos que passam por percursos diversos não somente no plano da globalização, mas também dentro do domínio territorial do Estado-nação, que ainda constitui a escala privilegiada das instituições políticas de maior poder e influência. O mapeamento de relações entre escalas, agentes e processos constitui um procedimento imprescindível para se abordar a produção do espaço na metrópole contemporânea. Outro pressuposto da abordagem histórico-geográfica que segue é a importância da “dependência da trajetória”30 em determinada

geografia atualmente existente, sendo a “formação econômico-social e espacial” (Santos, 1982) contemporaneamente vivida em determinado local um produto de suas trajetórias em relação a estes três domínios entrecruzados. Essa dependência da trajetória, na história do espaço, atua tanto no âmbito do espaço percebido e nas cristalizações de paisagens sociais quanto na produção do espaço vivido (Lefebvre, 1974), atuando ativamente sobre sua configuração e reprodução.

O urbano é resultante da relação Estado-espaço com uma dinâmica econômica que lhe dá movimento. Este capítulo procura detalhar este preceito, tendo a metrópole brasileira como um resultado de uma trajetória histórica da ação do Estado sobre o território. Pensar no caso brasileiro envolve trazer à tona a herança colonial nesta relação Estado-espaço, considerando suas presenças e persistências, e em como elas se manifestam espacialmente ao longo dessa trajetória. A relação Estado-espaço sob o neoliberalismo necessariamente interage com o legado de tal percurso

30 A ideia de dependência da trajetória (path dependency) surge a partir de traduções da economia evolucionária de Nelson; Winter (1982) às transformações sócioterritoriais, e tem sido um aparato conceitual e metodológico importante na geografia econômica contemporânea, informando perspectivas acerca da restruturação produtiva, do desenvolvimento, da desigualdade regional etc.

histórico, e esta interação é um aspecto fundamental na produção do espaço na metrópole hoje. Ou seja, abordar o processo de neoliberalização no caso brasileiro invoca a necessidade de compreender a formação econômico-social e espacial resultante de processos históricos anteriores sobre a qual esta dinâmica de aprofundamento do neoliberalismo atua e com a qual ela interage – bastante distinta das geografias resultantes da experiência fordista-keynesiana nos países de centro. As especificidades do processo de neoliberalização em nosso caso advêm inclusive dos formatos de interação entre as dinâmicas de transformação e os legados sobre os quais ela atua. Trata-se assim, de uma tentativa de aproximação de uma história do presente – da identificação de percursos e linhagens históricas por trás de configurações sociais atuais – que auxilie na compreensão de dinâmicas contemporâneas diversas.

A dialética socioespacial (Soja, 1993) que opera nas interações entre espaço e economia engendra na era moderna um conjunto de transformações territoriais de grande escala e profundidade, marcado por uma interação retroativa entre os dois conjuntos. Mesmo partindo dos pressupostos anunciados no capítulo anterior, em que o econômico é derivado do político, do Estado, do poder, ele se torna um agenciamento de grande envergadura na sua capacidade de alteração do espaço e da sociedade, engendrando dinâmicas socioespaciais significativas. É importante manter estes preceitos em mente na leitura das análises mais estritamente econômicas que seguem, pois elas são apresentadas com o intuito de informar a própria interpretação da produção do espaço, que constitui o foco principal de nossa investigação.

A escala da economia nacional e da política macroeconômica – tanto no sentido da ação governamental de curto prazo voltada para dinâmicas inflacionárias, de crescimento, de câmbio etc. quanto no que diz respeito às políticas de longo prazo, de desenvolvimento ou de restruturação econômica na escala da nação – traça relações diretas com a metrópole. Para além disso, no caso brasileiro, as origens da própria transformação da cidade (administrativa, mercantil, portuária) em metrópole (industrial e sede de uma hiperconcentração de atividades de serviços avançados) são diretamente vinculadas a transformações de ordem macroeconômica e à própria gênese da macroeconomia – enquanto técnica aplicada à governamentalidade. Assumindo-se que existem processos socioespaciais vinculados a lógicas rizomáticas e outros que se concretizam em estruturas arbóreas, com raízes, troncos e desmembramentos sucessivos, através de uma série de mediações, o domínio da política macroeconômica se constitui como raiz de uma série de processos socioespaciais que geram rebatimentos importantes na metrópole, transformando e influenciando diretamente o processo metropolitano, tanto em sua dinâmica interna quanto na relação dos grandes

centros uns com os outros (na escala global, inclusive). Ao longo deste processo, a dialética socioespacial se apresenta na forma de uma retroalimentação transescalar, em que as dinâmicas e transformações metropolitanas se fazem sentir, também através de mediações diversas e passando por inúmeros agentes, na chamada macroeconomia, situada na escala do Estado-nação. Este capítulo busca traçar essas ligações, procurando demonstrar, através de uma economia geopolítica da transescalaridade, como a vida cotidiana na metrópole se relaciona à ordem distante da ação do Estado na macroeconomia, não de forma automática (através do aumento do desemprego resultante de uma política de arrocho fiscal, por exemplo), mas através de processos socioespaciais e políticos por trás da própria formação econômico-social e espacial na qual a metrópole se insere como uma peça-chave.

O período entre 1930 e 1980 conforma no Brasil um arranjo espacial (Harvey, 1982), centrado na metrópole, adequado à centralidade da indústria no formato de acumulação de capitais vigente, onde havia a necessidade de uma ampla oferta de mão de obra de baixo custo, bem como a concentração de condições gerais de produção (Lojkine, 1981) adequadas à fluidez e à expansão da atividade industrial. A metrópole transforma a cidade numa máquina de crescimento econômico com efeitos na escala nacional, agregando elementos necessários para a acumulação centrada na indústria, eliminando – através do Estado – barreiras, gargalos ou ameaças políticas (que a própria cidade engendra, como um produto urbano, da densidade, da pólis). Topalov (1979), em interpretação do mesmo período de predomínio da teorização e da pesquisa acerca da metrópole através da economia política da urbanização no qual se inserem tais contribuições de Harvey e Lojkine, propõe “a urbanização como forma de socialização das forças produtivas”. Numa progressiva complexificação do processo produtivo, em dado momento (etapa da cooperação) necessitava-se simplesmente de um agrupamento dos trabalhadores num mesmo lugar, e na medida em que a divisão do trabalho se acentua (da manufatura até a industrialização mais intensiva em capital automatizado), as necessidades do processo produtivo – em termos de condições de produção externas às firmas – se tornam cada vez mais complexas.

Topalov afirma que tais necessidades industriais são apresentadas como externas à indústria, por serem necessariamente de baixa lucratividade, e aponta para a cidade como o fator que permite “que se exclua da esfera do capital os setores não-rentáveis necessários à produção” (TOPALOV, 1979, p. 25). Numa sequência de complexificação ao longo do tempo da estrutura produtiva urbana, Topalov coloca que, em primeiro lugar, teria existido uma simples infraestrutura física, seguida de uma reserva de mão de obra concentrada nas proximidades da economia

industrial, em terceiro lugar, um conjunto de empresas cuja cooperação no espaço aumenta a produtividade, sendo que por último aparece a necessidade (a partir de um incremento na interdependência entre elas) de tais condições se articularem espacialmente, formando o que o autor denomina de valor de uso complexo, “que se desprende do sistema de todos estes valores de uso simples”. Neste processo, a cidade se transforma em metrópole, tem seu tecido social desmantelado e reorganizado em outras bases, o bairro deixa de ser unidade de sociabilidade e vivência, e aprofundam-se relações que perpassam o domínio do econômico, em detrimento do comunitário, das relações de vizinhança. A trajetória descrita abaixo corresponde em certa medida a este processo de metropolização, tendo em vista o caso brasileiro e o quadro político e econômico mais amplo no qual ele se insere, considerando, ao longo deste percurso, o estabelecimento da macroeconomia como uma fonte de onde partem vetores que determinam em grande medida a dinâmica econômica e metropolitana. Neste percurso, buscaremos manter um eixo histórico sequencial, inserindo discussões de temas diversos que se fazem pertinentes em cada período e que dialogam com o objeto principal dos capítulos subsequentes, qual seja, a produção do espaço na metrópole neoliberal/contemporânea. Neste sentido, também são trazidos comentários e análises de processos atuais na medida em que aparecem paralelos e/ou raízes no percurso.

Origens da metrópole e modernização conservadora na virada industrial e urbana

A metrópole brasileira contemporânea é resultado de um processo de transformação econômica e social do país que se inicia na virada do século XX, com o processo de industrialização resultante da destinação de excedentes agrícolas, sobretudo da economia cafeeira na direção da cidade de São Paulo, rumo a economias urbanas que eram predominantemente administrativas e mercantis. A década de 1930 é um primeiro ponto de inflexão significativo desta transformação da cidade em metrópole, promovendo, através de uma versão inicial do Estado desenvolvimentista pautado por um projeto nacionalista, uma industrialização de maior vulto induzida pela forte presença do Estado em setores considerados estratégicos para a autossuficiência nacional, e no provimento de infraestrutura para um salto quantitativo na produção e uma tentativa de diversificação setorial interna à indústria que ainda não havia ocorrido na economia brasileira. Anteriormente, a ação do Estado na regulação da acumulação no contexto da economia cafeeira como carro-chefe da estrutura produtiva ao longo da república velha – através de créditos generosos e subsidiados concedidos ao setor, intervenções no câmbio favorecendo suas exportações, garantias

de compras públicas de estoques excedentes e da eventual eliminação destes, dentre outras formas de proteção e manutenção da valorização da produção cafeeira – constituem passo decisivo na conformação de um novo campo de ação estatal na direção da intervenção estatal direta na dinâmica econômica.

Embora existisse na república velha uma ligação direta entre o investimento industrial e os excedentes advindos da produção cafeeira, são as pressões urbanas crescentes em oposição ao favorecimento do setor pelo Estado, somadas a frações das forças armadas localizadas sobretudo no sul do país, que engendram o ponto de inflexão na direção do nacional-desenvolvimentismo que se inicia na década de 1930 (e perdura, em diferentes formatos, até a crise da dívida do início da década de 1980). Faz-se necessário um retorno ao período histórico anterior a esta guinada para a compreensão das origens desse processo de adensamento urbano que resultaria na virada de 1930. Este meio urbano em fortalecimento era composto por um amplo e heterogêneo leque de grupos distintos e conflitantes, mas tendo nas velhas oligarquias rurais um inimigo em comum. Dentre estes grupos eminentemente urbanos, destacam-se: a pequena burguesia comercial; os industriais (em parte com um nexo financeiro complementar ao setor cafeeiro mas em geral em disputa por mão de obra barata com o setor31); a burocracia/tecnocracia estatal crescente; profissionais liberais; intelectuais e o operariado. Formava-se nestes grupos uma maioria em prol de um progressismo conservador e sobretudo a favor do rompimento com a hegemonia dos grandes proprietários de terra e grandes produtores rurais, que apesar de seu discurso agressivamente liberal, conformava uma hegemonia dependente do sistema estatal de garantias e proteção da valorização da produção cafeeira, o que abriria espaço para reivindicações dos setores urbanos em fortalecimento.

A partir de Freyre (1936)32, Jessé de Souza (2006) considera o ponto de inflexão histórica que permite apreender o progressivo fortalecimento do meio urbano frente à hegemonia das oligarquias rurais no Brasil no ano de 1808, com o início do período joanino, e sua nova rodada de importações de instituições europeias. Abriam-se os portos, eliminava-se o monopólio comercial da metrópole portuguesa, e ocorria, simultaneamente, um fortalecimento do Estado e do mercado,

31 Estas relações contraditórias e ambivalentes entre o setor cafeeiro e a indústria nascente são destacadas por Cardoso de Mello (MELLO, 1982, p. 103-4): “ora o café estimula a indústria, ora, ao contrário, a bloqueia”. Isto é, o setor cafeeiro todavia hegemônico direciona excedentes para o investimento industrial, mas disputa mão de obra com o

setor, e trava sua expansão no âmbito do Estado. No entanto, “a burguesia cafeeira não teria podido deixar de ser a

matriz social da burguesia industrial, porque única classe dotada de capacidade de acumulação suficiente para

promover o surgimento da grande indústria” (MELLO, 1982, p. 143).

32 E em desacordo com a interpretação de Florestan Fernandes, que situa esta entrada do mercado e do Estado em novos patamares em 1822.

que ganham terreno material e simbólico no espaço social. O sistema casa grande e senzala progressivamente sai de cena no declínio do patriarcado rural para a progressiva ascensão do nexo

sobrados e mocambos, a partir de uma re-europeização urbanizadora da sociedade brasileira tendo

como referências simbólicas a Europa ocidental industrializada e moderna (sobretudo França e Inglaterra), com a introdução de valores burgueses e individualistas conformando, na abordagem bourdieusiana de Jessé de Souza, um habitus e uma dinâmica de campos e de distinção num patamar renovado com estas novas referências. Além do refinamento e do “bom gosto“ europeizado nos costumes, em contraste com a estrutura de valores patriarcais grosseiros, valoriza- se o conhecimento e o talento individual, abrindo espaço para a ascensão do doutor, do bacharel educado na Europa, e da figura do mulato talentoso como artesão, trabalhador manual habilidoso no mercado, ou como bacharel competente no Estado, o que só é permitido (numa sociedade profundamente racista e ainda dentro de uma economia baseada na mão de obra escrava) por um padrão de impessoalidade anteriormente ausente, ligado à burocracia e ao mercado importados nessa nova rodada de europeização/modernização (Souza, 2006, p. 141). No argumento de Souza, que busca compreender a reprodução contemporânea da exclusão social brasileira a partir de padrões e institucionalidades impessoais, trata-se de uma passagem para uma sociedade não mais marcada pelo personalismo resultando em relações patrimonialistas com o Estado, mas da gênese de uma dinâmica em que o abismo social perpassa a impessoalidade das instituições modernas paulatinamente introduzidas a partir da vinda da corte portuguesa33.

No entanto, o coronelismo que sobrevive a essa transição persiste na estrutura de poder até a virada (também urbana) de 1930, sob a forma de resquícios das relações de parceria de senhores regionais com o governo central do Império, que também se fariam presentes no formato já mais sofisticado do voto de cabresto. Na república velha, apesar do paulatino adensamento do nexo econômico e político urbano, o poder é efetivamente exercido pela economia agrária do setor cafeeiro como carro-chefe da estrutura produtiva orientada ao mercado externo do período. Através do controle do comércio (numa economia complementar à agropecuária, em que os excedentes eram reinvestidos entre os setores), os coronéis se tornavam “donos da cidade”, sendo que muitas vezes, anteriormente à criação da polícia em 1842, os juízes de paz locais eram diretamente controlados pelos coronéis. As relações familiares e de redes comunitárias que atuavam como

33 No entanto, como será aprofundado adiante, é importante notar como formas renovadas de patrimonialismo e clientelismo se mantêm ao longo das diversas rodadas de modernização subsequentes, se fazendo presentes até hoje num quadro de neoliberalismo com fortes inserções de grupos privilegiados por relações pouco ligadas à lógica do mercado ou do Estado moderno impessoal e isonômico.

extensão da família dominada pelo patriarca permaneceram sustentando este padrão personalista de poder que seria progressivamente corroído pelo crescimento demográfico, pela urbanização, pelo voto secreto nos anos 20 (pelo qual as camadas médias muito lutaram) e finalmente pela decolagem da industrialização (QUEIROZ, 1997). Otavio Ianni (numa análise cujos paralelos com o contexto atual são marcantes) interpreta as condições de manutenção do predomínio agrário em sua inserção num nexo externo, onde a reprodução de atributos coloniais se efetiva através das relações internacionais – ao que deve-se acrescentar que é justamente o núcleo urbano que vai abrigar as possibilidades para que a ruptura parcial com esta lógica se efetive:

Como o segmento agrário-colonial era dominante na economia nacional, ele marca e domina toda a sociedade, penetrando a estrutura das instituições e as ideologias. Em consequência, diante das forças econômicas e políticas em desenvolvimento no seio da nação, a burguesia agrária que domina o aparelho estatal não formulava as instituições e as técnicas que deveriam possibilitar a manifestação, expansão e consolidação dos novos grupos econômicos. O estilo de dominação exercido por essa burguesia não permitia a organização e canalização construtiva das reivindicações da burguesia industrial e financeira incipiente, do proletariado em formação e da classe média urbana. Essa rigidez foi uma das condições do processo revolucionário, que reduziu grandemente o poder dos grupos ligados ao segmento agrário-comercial. Compreenda-se, no entanto, que essa rigidez não era somente o resultado da estrutura interna do sistema, em que o segmento exportador era, até princípios [do século XX], efetivamente dominante. Ela era também uma decorrência do capital externo, que preservava no exterior a quase totalidade dos centros de decisão sobre as atividades econômicas e também políticas. Portanto, em consequência das próprias condições de existência de um sistema de tipo colonial, este sistema não conta com a flexibilidade mínima necessária à reformulação de outros níveis de integração e funcionamento. Como o sistema se orienta para fora, já que é produzido pelo capitalismo internacional, todas as mudanças precisam ser geradas no exterior, que é o sentido em que foram organizados os canais e mecanismos de alteração. Quando geradas internamente, as transformações precisam manifestar- se com violência para se impor (IANNI, 1964, p. 48-49).

Ainda neste progressivo aprofundamento do domínio da cidade sobre o campo do século XIX, entra em cena um aspecto marcante na urbanização brasileira, que é o crescimento dos espaços dos pobres, constituindo as raízes do comum urbano, da cidade enquanto espaço de todos, aberto à apropriação por parte de destituídos, despossados, ex-escravos e “homens livres” em geral34. Como observa Gilberto Freyre, no período anterior ao avanço do saneamento urbano, os

34 Como aqueles estudados por Franco (1997), homens livres, muitas vezes posseiros mas não proprietários de terra, que cumpriam papéis importantes tanto no coronelismo quanto na agricultura capitalista nascente no setor cafeeiro (sobretudo no Vale do Paraíba), seja no desbravamento de novos territórios ou em tarefas de vigilância e de vingança dentre grupos rivais (de capangas a serviço de grandes chefes). Franco destaca a prática da violência como traço comum

morros tendiam a ser ocupados pelas camadas privilegiadas, sendo as baixadas pouco salubres territórios dos cortiços cada vez mais presentes, ainda anteriores à forma favela que inverteria esta relação entre baixadas e morros a partir do urbanismo higienista da virada do século.

Os morros foram, a princípio, aristocráticos (...), lugares onde era chic descer de rede ou de palanque nos hombros dos negros. Estabeleceram-se desde então contrastes formidáveis de espaço dentro da área urbana e suburbana: o sobrado ou a chácara, grande e isolada, no alto, ou dominando espaços enormes; e a aldeia de mucambos e os cortiços em baixo, um casebre por cima do outro, numa angustia de espaço. Isto nas cidades de altos e baixos como o Rio e a Bahia. No Recife os