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A EXPRESSÃO IRRACIONALISTA DA DECADÊNCIA IDEOLÓGICA DO PENSAMENTO BURGUÊS: A “AGENDA PÓS-

2.2 A ECONOMIA NA PÓS-MODERNIDADE

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No âmbito econômico, os autores que defendem a transição paradigmática argumentam que:

Nas modernas sociedades ocidentais, a estrutura social é caracterizada pela existência da sociedade industrial, que condiciona tanto a sua organização do trabalho quanto o ritmo da vida social e independe dos antagonismos entre os seus sistemas políticos. Desse modo, Bell pode adiantar que os princípios axiais da sociedade moderna são: economizar (...); participação (...); e o desejo de realização e

aprimoramento do eu (...). No entanto, a partir do final dos

anos 1950 e mais claramente nos anos 1960, são cada vez mais fortes as evidências de que se experimenta uma transição para um novo período histórico que trará transformações espetaculares, cujas repercussões seriam semelhantes às provocadas pela Revolução Industrial, no final do século 18 (...). Nesse sentido, a generalização, entre os mais distintos analistas contemporâneos, do “uso do prefixo pós seguido de um hífen é assim um indício desta sensação de existência de uma época intersticial. (EVANGELISTA, 2007, p. 99)

Esta noção de um novo sistema econômico se refere a algumas transformações, ainda em curso, em nossa sociedade, referente ao sistema ocupacional, e à nova maneira em que a ciência e a tecnologia tem se relacionado: através de um permanente processo de “inovação requerido pelas demandas derivadas da expansão e sofisticação do setor de serviços na economia contemporânea”. (idem, p. 100)

Num esforço analítico, Daniel Bell aponta que o conceito de

sociedade pós-industrial possui cinco dimensões, nas quais

poderiam ser observadas as novas tendências das transformações sociais. No setor econômico, há “a mudança de uma economia de produção de bens para uma de serviços”. O sistema ocupacional experimenta uma nova distribuição com “a preeminência da classe profissional e técnica”. O princípio axial que está tornando-se dominante consiste na “centralidade do conhecimento teórico como fonte de inovação e de formulação política para a sociedade”. (...) Na sociedade pós-industrial, a maior parte da força de trabalho não mais estaria empregada na agricultura ou na indústria, mas no setor de serviços, que abarca as atividades de “comércio, finanças, transporte,

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saúde, recreação, pesquisa, educação e governo”. (ibidem, p. 100)

Essa noção de sociedade pós-industrial foi a premissa fundamental para a estruturação do pensamento pós-moderno. Essa categoria foi desenvolvida por Alain Touraine, na França e por Daniel Bell, nos Estados Unidos. Buscaram apreender a “transição da chamada sociedade industrial para as novas configurações societárias”, em evidência desde os anos 1950. (cf. Evangelista, 2007)

Essa mudança do contingente da indústria e do campo para o setor de serviços é que justifica a afirmativa de que a economia mudou, de que vivemos um período pós-industrial. A denominação sociedade pós-industrial não é uma unanimidade entre os autores pós-modernos. Alguns defendem que se trata da “sociedade do consumo”, outros preferem a denominação “sociedade da mídia”, e outros julgam se tratar da “sociedade do espetáculo”. O que parece um traço unificador é que para todos eles trata-se da emergência de uma nova sociabilidade (JAMESON, 1985) cujos traços demarcatórios seriam:

“Novos tipos de consumo, obsolescência programada, um ritmo ainda mais rápido de mudanças na moda e no styling, a penetração da propaganda, da televisão e dos meios de comunicação em grau até agora sem precedentes e permeando a sociedade inteira, a substituição do velho conflito cidade e campo, centro e província, pela terceirização e pela padronização universal, o crescimento das grandes redes de auto-estradas e o advento da cultura do automóvel.” (apud EVANGELISTA, 2008, p. 139).

Jameson (1985) argumenta que a pós-modernidade nada mais é que a lógica cultural de uma nova fase do capitalismo: a do capitalismo tardio. Seus traços formais:

(...) “expressam de muitas maneiras a lógica mais profunda do próprio sistema social”. O desaparecimento do sentido da história é o resultado da generalização da esquizofrenia social, agravada pela amnésia histórica promovida pela “saturação informacional gerada pelos meios de comunicação”. A pós-modernidade reproduz “a logica do capitalismo da sociedade de consumo”, através da “transformação da realidade em imagens” e da

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“fragmentação do tempo em uma série de presentes perpétuos”. (apud EVANGELISTA, 2007, p. 139)

A alteração mais visível se deu pelo incrível desenvolvimento tecnológico ocorrido, que alguns autores denominaram de “Terceira Revolução Industrial” ou “Era da Informação”. Especificamente, a tese unificadora dos pós- modernos, em relação às mudanças econômicas, centra-se na distinção de Daniel Bell entre sociedades industriais e pós-industriais. Enquanto as primeiras se baseiam no dispêndio de energia, numa organização hierarquizada da produção sustentada em força de trabalho semiqualificada ou não, e na produção de bens físicos, as segundas se baseiam na produção de serviços, sejam eles no âmbito da saúde, da educação, do lazer, das artes, entre outros. O protagonista principal dessa oferta de serviços não é mais o trabalhador, mas o profissional. (EVANGELISTA, 2007, p. 235)

A fim de sustentar a tese da transição de um modelo para outro, são exploradas as estatísticas que demonstram a diminuição de pessoas empregadas no setor manufatureiro e o crescimento de pessoas empregas no setor de serviços.

Fredric Jameson (1985) discorda dessa periodização estabelecida por Bell e apresenta uma tese mais refinada sobre as significativas alterações econômicas contemporâneas:

Baseando-se em Ernest Mandel, ele distingue três momentos sucessivos do capitalismo: o capitalismo de mercado, limitado a espaços nacionais, o monopolista ou imperialista, que procura anexar outros mercados, e o multinacional, que se estende à maior parte do planeta. Esse último estágio, longe de representar um desvio com relação ao modelo marxista original, corresponde pelo contrário ao capitalismo em sua forma pura, porque significa a extinção das formas pré-capitalista que ainda resistiam, na época de Marx, à penetração do capital. Paralelamente a essa periodização por fases do desenvolvimento do capital, Mandel propõe uma periodização por fases do desenvolvimento tecnológico, segundo a natureza das máquinas que predominam num momento dado. Podemos assim distinguir a produção de motores a vapor a partir de 1848, de motores elétricos e de combustão, a partir do final do século XIX, e de motores eletrônicos e nucleares a partir dos anos 40 do século XX. Estaríamos vivendo, segundo

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Jameson, o terceiro estágio do capital – o multinacional – e a terceira idade da máquina, ou talvez a quarta, se considerarmos que a produção dos computadores está substituindo a produção de motores nucleares. Há assim um corte genuíno, não com relação ao sistema capitalista, como sugere a tese de Bell, mas dentro desse sistema. (apud EVANGELISTA, 2007, p. 235-236)

Jameson julga que a cultura pós-moderna está em correspondência com o atual estágio do capitalismo. Acrescenta, ainda, que o modernismo correspondeu ao segundo estágio e o realismo ao primeiro (Cf. EVANGELISTA, 2007).

À civilização industrial estão associadas características que não chegam a entusiasmar os teóricos do pós-moderno: a mística do desenvolvimento, a poluição ambiental e a violência de classe, que em geral é vinculada ao “sistema industrial” e não ao capitalismo em si. A passagem para a fase pós-industrial é vista como positiva, na medida em que os mecanismos de exploração se tornam menos evidentes e constitui a base para a utopia pós-moderna por excelência: a sociedade informatizada, com tudo o que isso possa implicar de manipulação e repressão, mas também de jogo, liberdade e estetização da vida. (idem: p. 236)

Para Jameson, não há nada de positivo na passagem da fase imperialista para a fase multinacional, muito menos nas manifestações superestruturais correspondentes: a cultura pós-moderna. Apesar disso, julga que o pensamento marxista deve reconhecer o fato da transição e analisar suas consequências para o projeto revolucionário. (idem: p. 236)

Alain Touraine afirma que “o sucesso intelectual do pós-modernismo foi, no final dos anos 1970, um efeito direto da crise do esquerdismo revolucionário” e sugere a existência de uma conexão entre o pós-modernismo e o neoliberalismo.

O neoliberalismo que triunfa na vida econômica e política durante os anos 1980 e o pós-modernismo cultural são os produtos paralelos da decomposição do esquerdismo, forma extrema de modernismo, sobretudo para os trotskistas, que desde o início da Revolução Soviética cultivaram a utopia da máquina central, tornada plano central, transformada mais recentemente em ordenador central, que se supunha que

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transformaria o governo dos homens em administração das coisas e assim os libertaria dos males do subjetivismo político. (TOURAINE, 1994, p. 198 apud EVANGELISTA, 2007, p. 94)

Dessa forma, percebemos a relação entre o fim do socialismo real, das

sociais democracias e a abertura de espaço para uma concepção anti- -humanista de economia como o neoliberalismo, que defende o não

envolvimento do Estado na economia, ou seja, tenta afastar qualquer possibilidade de crescimento de qualquer sistema que tenha por base o “social”.

Esse posicionamento “pós-social” reflete também no âmbito da política, em que não se tem um protagonismo popular, mas sim do grande capital financeiro especulativo. E os movimentos sociais vão se dizimando e se ensimesmando em processos microscópicos.