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PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO DO SERVIÇO SOCIAL

2. BLOCO ÍDEO-POLÍTICOS E TESES NORTEADORAS DA PRODUÇÃO DE CONHECIMENTO SOBRE A QUESTÃO AMBIENTAL

2.1. Ecossocialismo e atualidade do método marxiano

Os críticos de Marx insistem em alegar a insuficiência de seu legado para a elucidação da questão ambiental, ignorando o fato de que o referido autor preocupou-se com a temática e produziu conhecimento neste campo, o qual subsidia estudos até os dias atuais. Durante toda sua vida, Marx se dedicou a estudar a estrutura e dinâmica da sociabilidade capitalista, a partir de um método de análise que possibilita sucessivas aproximações à realidade, tendo em vista as mudanças sócio-históricas.

Nesse sentido, Marx tanto discorreu sobre a relação homem/natureza em sua época, como, a partir do conhecimento que legou acerca da estrutura da sociedade do capital, nos fornece elementos teórico-metodológicos para pensar a atual destrutividade da natureza em sua estreita relação com a organização da sociedade;

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Vale destacar que as teses e tipologias foram eleitas com base nos dados analisados. Longe de reduzir a gama de correntes que discutem a questão ambiental.

65 o fez, sem deixar de reconhecer a profunda dependência do gênero humano em face da natureza78.

Entretanto, na dinâmica de aguda destrutividade dos recursos naturais inseridos no circuito mercantil do modo de produção capitalista, a natureza sofre profundos rebatimentos, que se expressam “na escassez dos recursos não renováveis, nos níveis de aquecimento planetário, nos efeitos catastróficos dos dejetos industriais e poluentes diversos, na produção incessante de mercadorias descartáveis” (SILVA, 2010, p. 45), dentre outros.

Nos países periféricos, a dimensão destrutiva da natureza se acentua, tomando diferentes particularidades em face dos países centrais. Coutinho (2009, p. 24) elucida que a questão ambiental difere nos países de capitalismo avançado (Norte), dos países de capitalismo periférico (Sul), tendo em vista as relações de dependência destes em relação aos primeiros. Dessa maneira, “os riscos das operações que mediatizam a relação do capital com o meio ambiente são desigualmente distribuídos e, nesta divisão desigual, os maiores ônus recaem sobre os segmentos periféricos do sistema”.

As referidas particularidades se integram à Teoria da Dependência79. Galeano (2014, p.19) discorre acerca da apropriação das riquezas e destruição da natureza na América Latina, desde o capitalismo mercantil.

[...] Nossa derrota esteve sempre implícita na vitória dos outros. Nossa riqueza sempre gerou nossa pobreza por nutrir a prosperidade alheia: os impérios e seus beleguins nativos. Na alquimia colonial e neocolonial, o ouro se transfigura em sucata, os alimentos em veneno. Potosí, Zacatecas e Ouro Preto caíram de ponta-cabeça da grimpa de esplendores dos metais preciosos no fundo buraco dos socavões vazios, e a ruína foi o destino do pampa chileno do salitre e da floresta amazônica da borracha; o nordeste açucareiro do Brasil, as matas argentinas de quebrachos ou certos povoados petrolíferos do lago de Maracaibo têm dolorosas razões para

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Ainda que este autor tenha adotado seu objeto de estudo a sociedade burguesa, a exploração do trabalho em particular possibilita capturar a dinâmica e estrutura da ordem do capital, contribuindo para aproximações da relação homem e natureza, propriamente da questão ambiental, como exposto no tópico anterior.

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A teoria da dependência foi desenvolvida, principalmente, por Ruy Mauro Marini e Theotônio dos Santos. A base dessa tese é a relação de dominação, desde tempos coloniais, de “países desenvolvidos” (centrais) que se apropriam da riqueza dos “países em desenvolvimento (periféricos), tanto pela incipiente industrialização dos mesmos, como pela permanente primarização da economia, como o caso do Brasil.

66 acreditar na mortalidade das fortunas que a natureza dá e o imperialismo toma. A chuva que irriga os centros do poder imperialista afoga os vastos subúrbios do sistema [...]”.

Nesse histórico processo de dependência, tem-se a contínua abertura dos Estados nacionais para o oligopólio estrangeiro. A implantação de investimentos e sedes de indústrias e empresas internacionais é consentida e estimulada através de isenções fiscais, doações de terras e demais vantagens para os desbravadores. Tais “aventureiros” buscam na América Latina e demais países emergentes as “facilidades” para espraiar e consolidar seu poderio, como o afrouxamento das leis trabalhistas e incipientes/frágeis organizações dos (as) trabalhadores (as) e ausência ou ineficiência de regulação ambiental.

Dessa forma, intensificam a exploração do trabalho, por pagar míseras remunerações, bem como se utilizar do trabalho informal, como no caso de empresas estadunidenses que fabricam suas mercadorias em países como Bangladesh, Filipinas, Índia, ou que até mesmo importam produtos da China e revendem com alto lucro, visto as péssimas condições trabalhistas desses países, comparados ao trabalho escravo da modernidade.

Além disso, mantém-se como tendência, desde tempos coloniais, a primarização da economia. Hoje, as commodities (soja, milho, laranja, minérios, etc.) dão a tônica das exportações brasileiras. Exportando produtos primários, o Brasil fica à mercê da taxa do dólar e da economia imperialista, e ainda do consumo dos produtos que retornam ao país, com maior valor agregado. Vale mencionar a degradação ambiental causada por esse retrocedente modelo de desenvolvimento, visto o desgaste do solo com o plantio da monocultura e retirada dos minérios naturais, além do uso de agrotóxicos para acelerar a produção de grãos, hortaliças, etc.

Diante desse emblemático e desafiante cenário, torna-se fundamental realizar um debate crítico sobre a questão ambiental. A corrente teórico-política intitulada ecossocialismo fundamenta-se no método marxiano e cumpre seu papel ao intervir criticamente na referida discussão.

67 [...] é impossível pensar em uma ecologia crítica à altura dos desafios contemporâneos sem ter em conta a crítica marxiana da economia política, o questionamento da lógica destrutiva induzida pela acumulação limitada de capital. Uma ecologia que negligencia o marxismo e sua crítica do fetichismo da mercadoria está condenada a não ser mais do que uma correção dos ‘excessos’ do produtivismo capitalista.

Diante disso, o ecossocialismo atua na luta contra a mercantilização da natureza e na defesa de uma sociedade ambientalmente sustentável; na resistência à ditadura das multinacionais; no combate de toda a mundialização capitalista/liberal (ibid, p. 66), bem como a luta contra toda a ordem societária que tem por base a exploração do trabalho alheio e a propriedade privada. No processo de transição para o socialismo, Löwy (2005, p. 52) aponta que essa nova sociabilidade, em construção, estaria “fundada na escolha democrática das prioridades e dos investimentos pela própria população – e não pelas ‘leis de mercado’”.

Além disso, ainda afirma que

Essa transição levaria não apenas a um novo modo de produção e a uma sociedade igualitária e democrática, mas também a um modo de vida

alternativo, a uma civilização nova, ecossocialista, para além do reino do

dinheiro, dos hábitos de consumo artificialmente induzidos pela publicidade, e da produção ao infinito de mercadorias nocivas ao meio ambiente (ibid, p. 53).

O ecossocialismo centra-se no movimento de desconstrução de uma cultura fetichizada, moralizante, assentada nas saídas individuais e a reconstrução desta, rumo a uma nova civilização/sociedade, que só é possível quando relacionada à luta pela tomada do controle da produção pela classe trabalhadora.

2.2. Ecodemocracia: conservação do meio ambiente e justiça ambiental em