• Nenhum resultado encontrado

4 IMPLICACÕES EDUCACIONAIS DAS CONCEPÇÕES

4.1 EDUCAÇÃO CIENTÍFICA

Educação é um conceito com múltiplos sentidos. Em meio a essa polissemia, nesta

pesquisa, entende-se educação como o processo de desenvolvimento das capacidades humanas, visando a uma integração entre indivíduo e sociedade (FERREIRA, 1999). Esse processo é concebido em seu sentido integral, envolvendo a formação social, moral, intelectual, cultural – dentre outros – do indivíduo e da sociedade.

Dentre as possibilidades de processos educativos, enfatizam-se aqui os que envolvem o conhecimento científico. Mais especificamente, a avaliação das implicações educacionais faz referência ao conceito de educação científica, cuja concepção detalha-se a seguir.

A ciência com as características que lhe são atribuídas, hoje, teve sua gênese cultural no século XVII na Europa, mas entrou no currículo escolar apenas no século XIX, tanto em seu continente de origem, quanto nos Estados Unidos. No Brasil, isso aconteceu mais tarde, na década de 30, quando até então o currículo era baseado, predominantemente, na tradição literária jesuíta (SANTOS W.L.P., 2007).

Desde sua institucionalização, até os dias atuais, o conceito de educação científica vem ganhando diversos sentidos, e sua função muda conforme o contexto histórico. Na década de 50, nos Estados Unidos, por exemplo, o cenário político era o da Guerra Fria. Isso influenciou uma educação científica com objetivos de desenvolver o espírito científico nos estudantes, mediante uma vivência do método científico (SANTOS WLP, 2007). Essa ênfase mudou, consideravelmente, no final dos anos 70 e começo dos anos 80, quando uma inter- relação entre ciência, tecnologia e sociedade passa a ser destacada. São os chamados currículos CTS.

A educação científica envolve o interesse de diversos grupos sociais, e os objetivos que lhe são atribuídos variam conforme o contexto. Há diversos tipos de argumentos para justificar a educação cientifica na sociedade. Wildson Santos (2007), baseando-se em

Millar31, os agrupa em cinco categorias: (a) argumento econômico, que conecta o nível de conhecimento público da ciência com o desenvolvimento econômico do país; (b) utilitário, que justifica o letramento por razões práticas e úteis; (c) democrático, que ajuda os cidadãos a participar das discussões, do debate e da tomada de decisão sobre questões científicas; (d)

social, que vincula a ciência à cultura, fazendo com que as pessoas fiquem mais simpáticas à

ciência e à tecnologia; e (e) cultural, que tem como meta fornecer aos alunos o conhecimento científico como produto cultural (SANTOS WLP, 2007).

Dentre os diferentes sentidos atribuídos à educação científica, Norris e Phillips (2003) fazem uma revisão, destacando os seguintes:

(a) conhecimento do conteúdo substantivo da ciência e habilidade de distinguir a ciência da não ciência; (b) compreensão da ciência e de suas aplicações; (c) conhecimento do que conta como ciência; (d) independência na aprendizagem da ciência; (e) habilidade para pensar cientificamente; (f) habilidade de usar conhecimento científico na solução de problemas; (g) Conhecimento necessário para participação inteligente em questões sociais baseadas na ciência; (h) compreensão da natureza da ciência, incluindo as suas relações com a cultura; (i) apreciação do conforto da ciência, incluindo admiração e curiosidade por ela; (j) conhecimento dos riscos e benefícios da ciência; e (k) habilidade para pensar criticamente sobre ciência e lidar com especialistas32. (NORRIS, 2003, p. 225).

Esses significados podem ser distinguidos em duas categorias complementares da função da educação científica (SANTOS, W.L.P., 2007), uma relacionada ao conhecimento científico em si e outra à compreensão de seus aspectos sociais, culturais e filosóficos. Nesta pesquisa, concebe-se que ambas as funções são necessárias para uma educação científica integral. De modo que, a educação não se refere apenas à manipulação lógico-formal de algumas estruturas das teorias científicas, mas, juntamente com isso, à construção de significados conceituais, à consciência epistemológica e à capacidade de a inter-relacionar com âmbitos sociais, políticos e ambientais.

Os fatores que envolvem tanto a educação quanto a educação científica são                                                                                                                

31 MILLAR, Robin. Towards a science curriculum for public understanding. School Science Review, v. 77, n.

280, p. 7-18, 1996.

32 Tradução nossa. Texto original: (a) Knowledge of the substantive content of science and the ability to

distinguish science from nonscience (CMEC, 1997; Mayer, 1997; NRC, 1996; Shortland, 1988); (b) Understanding science and its applications (DeBoer, 2000; Eisenhart, Finkel & Marion, 1996; Hurd, 1998; Shen, 1975; Shortland, 1988); (c) Knowledge of what counts as science (DeBoer, 2000; Hurd, 1998; Kyle, 1995a, 1995b; Lee, 1997); (d) Independence in learning science (Sutman, 1996); (e) Ability to think scientifically (DeBoer, 2000); (f) Ability to use scientific knowledge in problem solving (AAAS, 1989, 1993; NRC, 1996); (g) Knowledge needed for intelligent participation in science-based social issues (CMEC, 1997; Millar & Osborne, 1998; NRC, 1996); (h) Understanding the nature of science, including its relationships with culture (DeBoer, 2000; Hanrahan, 1999; Norman, 1998); (i) Appreciation of and comfort with science, including its wonder and curiosity (CMEC, 1997; Millar & Osborne, 1998; Shamos, 1995; Shen, 1975); (j) Knowledge of the risks and benefits of science (Shamos, 1995); or (k) Ability to think critically about science and to deal with scientific expertise (Korpan et al., 1997; Shamos, 1995).

concebidos, neste estudo, como complexos; sendo assim, análises reducionistas são inadequadas para sua compreensão. No entanto, visando à finalidade metodológica, distinguem-se dois domínios responsáveis pela formação da educação científica de um indivíduo: o domínio das experiências curriculares e o domínio das imagens públicas.

O domínio das experiências curriculares refere-se ao contexto de educação científica formal, ou seja, à compreensão científica de que o indivíduo constrói a partir do ensino de ciências que lhe é oferecido em instituições educacionais, como a escola e a universidade.

O domínio das imagens públicas alude ao contexto da educação científica informal e é concebido como a compreensão científica produzida por qualquer discurso que envolva referências à ciência, excluídos os discursos formais citados anteriormente. Dentro das inúmeras possibilidades de gêneros que compõem esse domínio, aqui se enfatiza o discurso científico veiculado pela mídia. Por mídia, entende-se o conjunto de meios de comunicação, que inclui diversos tipos de suportes de difusão de informação como televisão, rádios, revistas, jornais, internet etc. Dentre esse leque de possibilidades midiáticas, esta investigação voltou-se à mídia impressa (que envolve suportes físicos de impressão).