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CAPÍTULO II CERIMÔNIAS E SÍMBOLOS NACIONAIS: PARA DIVULGAÇÃO

2.5 Por uma educação estética brasileira

A educação, para a formação de uma consciência cívico-patriótica, foi intensamente debatida, ao longo da primeira metade do século XX, por educadores, militares, religiosos e governantes. Durante a consolidação da República e no primeiro período de Vargas no poder (1930-1937), mesmo com todas as campanhas em favor de uma educação cívico-patriótica e da nacionalização do ensino, ainda havia espaço para a permanência de símbolos e rituais concorrentes no interior das escolas. No entanto, com a imposição do Estado Novo, pautado no autoritarismo e na centralização das decisões políticas, as ações interventoras para consolidar a ordem e unidade à nação brasileira foram intensificadas (CHAUÍ, 2012, p. 37). Se desde os anos iniciais da República houve debates em torno da formação de uma identidade nacional, foi durante o Estado Novo que as medidas repressoras com este fim mais se impuseram. O esforço

intensificado para a inculcação de uma crença comum a todos os cidadãos dava ao Estado e aos grupos dirigentes mais força de atuação, pois permitia sufocar a existência de diferentes ambições sociais e ideologias.

Houve iniciativas que antecederam o Estado Novo. Várias leis foram comentadas nas páginas anteriores. Vale lembrar ainda que, na reforma de Francisco Campos, em 1931, o canto orfeônico passou a ser disciplina obrigatória nas escolas de ensino secundário no Brasil. De acordo com Campos, os hinos e canções patrióticas executados em coro eram destinados a “inspirar o amor e o orgulho pelo Brasil, forte e pacífico”. Em 1934, a obrigatoriedade escolar se estendeu ao ensino primário. E, finalmente, em 1936, o canto do Hino Nacional tornou-se obrigatório tanto nos estabelecimentos públicos quanto nos privados e em todos os níveis de ensino. A sua utilização como instrumento de promoção do civismo e da disciplina coletiva foi uma constante durante todo o período que inclui o primeiro governo de Vargas e durante o Estado Novo (LEMOS JÚNIOR, 2001, pp. 286-292).

Os orfeões escolares e os hinos patrióticos tornaram-se extremamente importantes na promoção cultural do Estado brasileiro, principalmente durante a ditadura de Vargas. Nas festas cívicas, eles deveriam compor os rituais de valorização da identidade nacional. “O lugar, o cerimonial, a música, os movimentos, o vestuário, o registro fotográfico” compunham os detalhes de toda a “encenação teatral” (DUTRA, 2013, p. 256).

Francisco Campos, ao elaborar a Constituição de 1937, “havia deixado caminho aberto” para a fundação de instituições destinadas à organização da juventude para o “trabalho anual nos campos e oficinas, assim como promover-lhe a disciplina moral e o adestramento físico, de maneira a prepará-la ao cumprimento dos seus deveres para com a economia e a defesa da Nação” (HORTA, 1994, p. 205).

De acordo com a Constituição de 1937, o Estado deveria “fixar as bases e determinar os quadros da educação nacional, traçando as diretrizes a que deve obedecer a formação física, intelectual e moral da infância e da juventude”. Além disso, nenhum outro símbolo, estadual, municipal e/ou principalmente de outra nacionalidade, poderia concorrer com “a bandeira, o hino, o escudo e as armas nacionais”, que passaram a ser “de uso obrigatório em todo país” (OLIVEN, 2006, p. 3).

Em conferência proferida em outubro de 1939, Lourenço Filho afirmou que o projeto educacional do Estado Novo tinha como:

[...] fito capital homogeneizar a população, dando a cada nova geração o instrumento do idioma, os rudimentos da geografia e da história pátria, os elementos da arte popular e do folclore, as bases da formação cívica e moral, a feição dos sentimentos e ideias coletivos, em que afinal o senso unidade e de comunhão nacional repousam141

(LOURENÇO FILHO, 1939 apud BOMENY et al., 2000, p. 93). Enquanto diretor do Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (1938-1946), o conferencista era responsável por dar subsídio à política nacionalizadora empreendida pelo Ministro da Educação Gustavo Capanema. No Estado Novo, a escola deveria promover o projeto político empenhando-se em cultivar todos os símbolos, conteúdos e ritos relativos a uma suposta unidade cultural nacional brasileira. O Ministro da Educação determinou que a Juventude Brasileira serviria como auxiliar na função educativa. A partir do Decreto-Lei nº. 2.072, de março de 1940, o militarismo estava presente nas escolas, “no culto mais ou menos ritualístico das grandes datas nacionais” (BOMENY, 2000, pp. 147-151).

Até o ano de 1942, mesmo com as advertências tomadas em virtude das legislações, a instituição não havia sofrido intervenção e também nenhuma ação de repressão no que diz respeito às manifestações de apoio ao regime fascista.

No entanto, muitas escolas passaram a ser, durante o Estado Novo, alvo de vigilância e palco de repressões. Os discursos e reformas em favor da educação nacional brasileira foram incluídos na nova política de Segurança Nacional, que substituía a concepção de Defesa Nacional, com o intuito de agir em favor da ordem, da contenção de ideologias concorrentes com a do Estado brasileiro e da consolidação do projeto de formação da nacionalidade brasileira. O militarismo, que ganhou espaço nos discursos, na prática da educação cívica e moral e na educação do corpo, também passou a investir a polícia de poderes para a repressão política e social.

O próximo capítulo aborda a intervenção para a nacionalização do IMDA e o papel da polícia política nesse processo. Se, até então, coexistiam práticas e símbolos de duas nacionalidades intermeadas por ideologias políticas em voga no período, a partir de 1942, a primeira providência a ser tomada foi relacionada ao símbolo primordial da

141 LOURENÇO FIILHO, Manuel B. Conferência na Escola do Estado-maior do Exército, 27 de Outubro

identidade de uma instituição: o seu nome. Diante da intervenção para a nacionalização, o IMDA passou a ser denominado como Colégio Visconde de São Leopoldo142.

142 José Feliciano Fernandes Pinheiro, o primeiro Visconde de São Leopoldo, defendia já no século XIX,

a criação das universidades brasileiras, para que os estudantes não precisassem sair do país para continuar os estudos no ensino superior.