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3 COMPREENDENDO CONTEXTOS E RELAÇÕES: A EDUCAÇÃO FÍSICA, O ENSINO

5.2 DADOS QUE INCIDEM DIRETO OU INDIRETAMENTE SOBRE O PROCESSO DE

5.2.3 Educação Física no Ensino Médio: obrigatória ou facultativa?

Durante a aplicação das atividades do Manual de Educação Olímpica, uma outra dificuldade enfrentada pelos professores na efetivação das propostas do material esteve relacionada à baixa participação dos alunos nas aulas de Educação Física, o que não necessariamente possui relação com o caráter das atividades apresentadas pelo manual, uma vez que tal fato, pelo relato dos professores, é uma situação constante nas aulas da disciplina no Ensino Médio.

E você acha que é só na realização das atividades do manual que eu tenho dificuldades? Nas aulas práticas também não é todo mundo que participa não. No primeiro ano ainda tem uma participação muito boa, mas no segundo ano e terceiro ano a coisa já começa a mudar. O terceiro ano então é mais problemático ainda. Eles já não têm muita vontade de fazer atividade física. Como eles já estão saindo, não estão muito a fim de fazer esforço, não estão muito a fim de suar. O primeiro ano não, o primeiro ano só quer isso. (Professor 2)

[...] eu tenho um problema na escola de alunos que não querem participar da minha aula. Eu já me posicionei, já falei, e como eu acho que eles estão no último ano da Educação Física, eu não quero tornar o monstro de forçá-los a participar. Se não quer participar, não participa! Eu não vou ficar forçando adolescente de fazer atividade física, faz quem quer! A aula é essa! Vai fazer? Não vai fazer? Eu não vou forçar ninguém. (Professor 3)

Estudos sobre a presença da Educação Física no Ensino Médio, como os de Pereira e Moreira (2005), Zaim de Melo e Ferraz (2007) e Feitosa et al. (2011) já evidenciam a baixa participação dos alunos matriculados no nível médio de escolarização nas aulas desse

componente curricular, o que tende a se agravar com o passar das séries desse segmento de ensino.

Se a situação parece ganhar contornos cada vez mais preocupantes à medida que se avança ao longo das séries do Ensino Médio, para as instituições em que as aulas de Educação Física são oferecidas no contraturno, a participação dos alunos nessa disciplina parece se reduzir ainda mais (FEITOSA et al. 2011). É o problema que enfrenta a professora 1 colaboradora deste estudo, cujas aulas de Educação Física em sua escola são desenvolvidas em horário diferente do turno escolar.

[...] a dificuldade em si está na disponibilidade dos alunos. A escola trabalha com o horário da Educação Física no contraturno, e isso já dificulta. O aluno vem de manhã, vai para casa, almoça, e depois tem que vir pra cá só pra fazer Educação Física, então muitos se recusam, tem preguiça ou bate preguiça. Eu reconheço que é muito difícil trabalhar desta forma, e além disso muitos utilizam de desculpa de fazer outra prática corporal pra conseguir dispensa da minha disciplina, o que já reduz o número de alunos. Tem muitos que vem por obrigação porque o pai obriga, então não vem aberto a fazer muita coisa. (Professora 1)

Neste sentido, além da baixa participação dos alunos, ainda é possível extrair do relato da professora um outro indicativo preocupante em relação à adesão dos discentes a esse componente curricular: a possibilidade de dispensa legal das aulas de Educação Física.

No Brasil, apesar da Educação Física ser considerada componente curricular obrigatório da educação básica, por lei, são garantidas dispensas da disciplina aqueles alunos que possuem uma jornada de trabalho superior a seis horas diárias, tenham idade igual ou superior a 30 anos, tenham prole ou algum problema médico que lhes impossibilite a participação. Além disso, aos homens que prestam serviço militar também a Educação Física coloca-se como facultativa.

Porém, a investigação de Feitosa et al. (2011) sobre o contexto da Educação Física presente no Ensino Médio da rede pública estadual de Caruaru, em Pernambuco, mostrou que nos casos de alunos que não frequentam as aulas desse componente curricular, em 46,8% das ocasiões a não participação está associada a dispensas conseguidas por estes discentes, sendo que entre essas dispensas, 66% não se encaixam em nenhum dos critérios previstos por lei, número mais representativo quando as aulas são oferecidas no contraturno. Assim, como conclusão, Feitosa et al. (2011) afirma que apesar de ter alcançado o status de disciplina, a Educação Física tornou-se facultativa na prática, pelo menos dentro do contexto do município de Caruaru.

Embora as características deste trabalho não nos permita apontar generalizações que indiquem uma Educação Física tida como facultativa nos contextos investigados, alguns relatos da professora 2 mostram que essa docente tem vivenciado em certos momentos e com algumas turmas um cenário parecido com aquele descrito por Feitosa et al. (2011).

Eu tenho alunos que têm dispensa porque moram longe, eu tenho alunos que têm dispensa por questões médicas, e eu tenho alunos que têm dispensa porque fazem outra atividade física. Em alguns casos a própria escola acaba facilitando a questão da liberação da dispensa pra não ter problemas com os pais dos alunos. Isso porque mudou muito ainda. Porque ano passado eu tinha aluno que tinha dispensa das aulas porque malhava. E problema é que esses alunos malhavam na mesma academia que eu, e eu ia nove horas da noite pra academia e o aluno estava lá. Então foi uma coisa que eu consegui minimizar esse ano conversando com a diretora dizendo que eu não ia aceitar dispensa de academia, ou que pelo menos viesse o cronograma de horário que frequentava. Só que eu sei que tem aluno que realmente tem dispensa porque pratica outra coisa, mas que realmente poderia estar vindo se quisesse. E tem os casos de quem faz inglês, ou outra aula como violão, que é no mesmo dia ou coincide horário e aí também tem a dispensa. (Professora 1)

Portanto, é possível que não respaldada a sua obrigatoriedade, a Educação Física passe a ser entendida como facultativa no contexto escolar, o que pode representar mais um empecilho para o desenvolvimento das propostas do Manual de Educação Olímpica, uma vez que com isso o envolvimento dos alunos tende a se reduzir cada vez mais.