A compreensão do DM como de origem multifatorial, associado a fatores genéticos e
a fatores ambientais, vem sendo objeto de vários estudos e abre a possibilidade de prevenção
ou de prorrogação do seu diagnóstico. Essa constatação tem repercussões para a atenção à
saúde, indicando a necessidade de os serviços de saúde darem ênfase ao modo de viver dessas
pessoas, através da educação em saúde, que auxilie na opção por um estilo de vida de
proteção à saúde. Para que isso possa se tornar realidade, os programas de atenção primária
estão focalizando cada vez mais em atividades educativas e também há maior investimento
em estudos acerca dessa temática.
Os profissionais de saúde têm a responsabilidade de propiciar condições que
favoreçam a educação em saúde, envolvendo os indivíduos e a comunidade no cuidado com
sua saúde. Assim, a participação da população em todas as fases de planejamento,
desenvolvimento e realização das estratégias educativas é a base para intervenções
preventivas e para a promoção da saúde. (BRICEÑO-LEON, 2000; CARTA DE OTAWA,
1986).
O caminho entre saúde e doença, segundo Buss (2003), pode se realizar distanciando-
se da doença, mas mantendo-a como foco (estratégias preventivas), ou aproximando-se da
saúde como referência (estratégia de promoção). Ao se olhar o risco de adoecer e a
necessidade de prevenção, estes podem servir como estímulos para hábitos mais saudáveis, do
viver melhor, assim, também se estará melhorando o nível de saúde, que acabará repercutindo
no sentido da promoção da saúde e prevenção da doença.
Os avanços no gerenciamento biomédico e comportamental aumentaram de forma
significativa a capacidade de prevenir e controlar com eficácia condições crônicas como o
DM. (OMS, 2003). Segundo Zagury (2005), desde a descoberta da insulina, em 1922, a vida
das pessoas com DM tem se modificado e melhorado o tratamento. Porém, mesmo com vários
avanços tecnológicos que vêm despontando, nenhum substitui o que produz maiores
resultados, que é a educação. Essa educação não como uma mera instrução, mas como um
conceito mais amplo, que se utiliza da comunicação eficaz como instrumento. Assim, pode-se
chegar ao indivíduo e contribuir para a consciência da importância do seu cuidado. A
educação é essencial para conseguir-se a transformação de hábitos, com conseqüente melhora
na qualidade de vida das pessoas.
Em se tratando de educação em DM, Silva (2001) fala que esta ainda não superou o
modelo biomédico, estando normalmente voltada para passar o conhecimento. Corroborando
com essa idéia, Teixeira e Figueiredo (2001) assinalam que inicialmente o discurso da prática
pedagógica do profissional da saúde caracteriza-se por uma concepção cognitivista, ou seja,
dar informações e aconselhar as pessoas a mudarem de hábitos, numa perspectiva de
educação depositária de conteúdos.
modificar as condições das pessoas com DM, apesar dos esforços dos profissionais da saúde
no sentido de explicar os riscos e a importância do tratamento. (SILVA, 2001). A autora ainda
comenta que a educação em DM não repercute de forma positiva na mudança de
comportamento das pessoas com a doença porque existe um hiato no diálogo entre estas e os
profissionais da saúde. Na perspectiva atual, não ha espaço para ouvir as pessoas com DM e
seus familiares, considerando as interpretações que estas fazem do que lhes está acontecendo,
portanto o foco permanece no conhecimento do profissional da saúde. Gazzinelli et al. (2005)
referem que há necessidade de superação do caráter meramente instrumental da educação em
saúde, cujos princípios se apóiam exclusivamente no saber científico. Hoje se sabe que há um
trabalho educativo a ser feito, que extrapola o campo da informação, ao integrar a
consideração de valores, costumes, modelos e símbolos sociais que levam a formas
específicas de condutas e práticas, dando importância aos saberes do senso comum na relação
das pessoas com a doença.
Coelho (2004) reforça esse pensamento ao afirmar que a realização dos cuidados com
a saúde não depende somente de informações e conhecimentos. Ele é incorporado pela
conscientização. A busca do cuidado está relacionada ao “querer cuidar-se”, que ultrapassa o
“saber”. Este é impulsionado pela construção da consciência social do cuidado, através das
experiências, do observar, do sentir, do partilhar com os outros sujeitos as situações que
envolvem o viver com a doença crônica.
Para Spink (2003), a aquisição de conhecimentos é um processo ativo de construção
em dois sentidos complementares. Primeiramente, porque o sujeito dá sentido aos objetos
sociais, materiais ou educacionais que o cercam, ele constrói representações sobre os objetos.
Em segundo, porque ele cria o mundo social através de sua atividade. O homem transforma a
natureza e ao transformá-la gera as condições sociais para o processo.
Atento para as questões que envolvem a educação em DM, o NUCRON vem
desenvolvendo pesquisas com pessoas com essa doença, buscando considerar o subjetivo
desses sujeitos e dos familiares como fundamento para a educação em saúde. (SILVA, 2001;
FRANCIONI, 2002; SANDOVAL, 2003, MATTOSINHO, 2004; COELHO, 2004). O estudo
de Silva (2001) identificou, nas narrativas de pessoas com DM, diferentes maneiras de
experienciar e significar sua doença. Destaca, ao longo do estudo, a importância do
conhecimento de quem vive com a doença, reconhecendo que esse conhecimento deve ser
considerado como fundamental para o diálogo entre profissionais da saúde e pessoas com
DM.
com DM1 e seus familiares, evidenciou a importância da compreensão do itinerário como
fundamento para orientações referentes aos cuidados e tratamentos. A autora refere que o
saber científico não é o único quando falamos em cuidados e tratamento do DM, pois diante
da incerteza do futuro, as pessoas não deixam de buscar diversas alternativas para melhorar
sua condição de saúde. Essa busca está enraizada no que faz sentido para as pessoas, bem
como na compreensão de como é viver com uma doença. Isso é convergente com os achados
de Silva (2001).
Sandoval (2003), Francioni (2002) e Coelho (2004) desenvolveram estudos em grupo
de convivência, focalizando o processo educativo e resgatando o saber popular dos
integrantes, nas várias dimensões do processo de viver. Essa estratégia contribuiu para a
construção de conhecimentos, possibilitando um novo olhar para sua situação crônica e
enfrentamento dessa realidade.
Segundo Teixeira e Figueiredo (2001), o processo de mudança de comportamentos
não passa exclusivamente pela cognição, mas pelas motivações e emoções dos sujeitos
envolvidos no processo. O saber desenvolvido na educação em saúde passa por uma
consciência corporal, que pode ser facilitada e ampliada pelo profissional da saúde, se este
estiver sensibilizado para essa dimensão.
Silva (2001) ainda fala das doenças crônicas, e mais especificamente do DM, como
uma construção sociocultural, que envolve relacionamentos, a visão que a pessoa tem de si e
os comportamentos diante da situação, indo além das mudanças orgânicas. Assim sendo, essa
pluralidade de conhecimentos, experiências e representações que subsidiam os
comportamentos devem ser considerados. Não negando o valor do conhecimento biomédico,
destaca que este não é o único válido e de interesse para os profissionais da saúde, sendo que
a doença está na pessoa e faz parte de sua vida.
Esses trabalhos na área do DM trazem a perspectiva da educação em saúde a partir da
realidade vivida pelas pessoas. Seguindo essa linha de pensamento, o presente estudo procura
resgatar a realidade do DM2 na percepção do familiar, que é considerado mais vulnerável à
doença. A compreensão da dinâmica da representação do DM no cotidiano dessas pessoas,
através da sua dimensão cognitiva, de sua atitude e seu comportamento, é subsídio importante
que vai ao encontro dessa proposta educativa. A educação em saúde, quando comprometida
com a transformação dos sujeitos, deve articular-se ao pensamento social, que é a sua base.
Assim, a representação social e a educação em saúde inter-relacionadas criam possibilidade
de transformação em ambas e podem construir a promoção da saúde de familiares de pessoas
com DM.
O processo educativo deve considerar que as pessoas estão inseridas num contexto
com histórias de vida, com um conjunto de crenças e valores, e com a própria subjetividade
do sujeito que requer soluções sustentadas socioculturalmente. (ESMEKE; OLIVEIRA,
2001).
O campo teórico aberto pela possibilidade de se trabalhar com representações sociais
na educação significa, ao mesmo tempo, a superação da visão cientificista e um avanço
significativo em termos da compreensão da complexidade de que se reveste a educação em
saúde. Nesse momento preciso, a aposta localiza-se, então, em torno das representações dos
sujeitos e do seu papel na (re) criação de novas práticas. (GAZZINELLI, 2005).
2.4 ESTUDOS SOBRE DIABETES MELLITUS UTILIZANDO A ABORDAGEM DAS
No documento
Representações sociais de familiares de pessoas com diabetes mellitus sobre essa condição crônica
(páginas 38-42)