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CAPÍTULO 1 – COMUNICAÇÃO, EDUCAÇÃO, AVALIAÇÃO E INOVAÇÃO:

1.2 Educação em Saúde

1.2.4 Educação Popular em Saúde

A ação educativa desta pesquisa, por meio das oficinas em dinâmica de grupo, apoia-se em argumentos do pedagogo Paulo Freire e visa contribuir para a autonomia das mulheres na defesa dos direitos das gestantes e dos recém-nascidos e na busca do bem-estar materno e prevenção de óbitos maternos e infantis.

O referido autor define a prática educativo-progressiva como aquela a favor da autonomia do ser dos educandos que aprendem para ensinar, para conhecer e para intervir (Freire, 2008, pp. 13, 32). Em outras palavras, Freire reconhece homens e mulheres como seres fazedores da História e por ela feitos, seres da decisão, da ruptura, da opção (Freire, 2008, p. 129).

Em relação às atividades educativas do pré-natal, diferentemente da palestra que é de caráter informativo dos conteúdos pré-selecionados pelo palestrante, a oficina em dinâmica de grupo escuta seus participantes, dando-lhes oportunidades para falar, expressar suas percepções e sentimentos. Conforme Paulo Freire, o ensinar exige saber escutar, pois o educador ao escutar as dúvidas, receios e incompetências provisórias do educando, aprende a falar com ele, e é escutando bem que o educador se prepara para melhor se colocar, ou melhor, se situar do ponto de vista das ideias (Freire, 2008).

Na linha da prática educativo-progressiva, uma vez estabelecida a comunicação entre educador e educando, Freire convida o primeiro a desafiar o segundo com quem se comunica e a quem comunica, produzir sua compreensão do que vem sendo comunicado, por isso, afirma que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção (Freire, 2008).

Na concepção de Stotz, a educação popular em saúde é um campo de teoria e prática que, enraizada em matrizes diferentes – humanista cristã e socialista – encontra seu denominador comum no pensamento de Paulo Freire. Esse autor argumenta, ainda, que a educação popular em saúde se contrapõe ao autoritarismo vigente na cultura sanitária e no modo tradicional de definir técnica e politicamente intervenções na área da saúde e orienta-se por modos alternativos e bastante diferenciados de lutar pela transformação das relações de subordinação e de opressão, em favor da autonomia, da participação das pessoas comuns e da interlocução entre os saberes e práticas (Stotz, 2004).

A educação popular em saúde é definida pelo Ministério da Saúde como: “Ações educativas que têm como objetivo promover, na sociedade civil, a educação em saúde, mediante inclusão social e promoção da autonomia das populações na participação em saúde” (Ministério da Saúde, 2009, p. 23).

Movimento surgido na América Latina, entre o final da década de 1950 e o início da de 1960, a educação popular compreende com um dos seus sentidos, o trabalho político de luta pelas transformações sociais, como emancipação dos sujeitos, democratização e justiça social (Araújo, Almeida, & Nóbrega-Therrien, 2013; Brandão & Assumpção, 2009).

Ainda que a “educação popular não seja o único projeto pedagógico a valorizar a diversidade e heterogeneidade dos grupos sociais, a intercomunicação entre diferentes atores, o compromisso com as classes subalternas, as iniciativas dos educandos e o diálogo entre o saber popular e o saber científico” (Vasconcelos, 2004, p 73), tem se

mostrado capaz de identificar e instrumentalizar a diversidade de práticas emergentes, já que se apresenta, ao mesmo tempo, como fenômeno sociocultural e concepção de educação.

A Portaria nº 2.761, de 19 de novembro de 2013, instituiu a Política Nacional de Educação Popular em Saúde no âmbito do Sistema Único de Saúde (PNEPS-SUS), cuja implementação vinha sendo demandada pelas Conferências Nacionais de Saúde, em especial a 12ª de 2004, a 13ª de 2008 e a 14ª de 2011 (Portaria nº 2.761 de 19 de novembro de 2013).

Na pesquisa de campo, apresentada nesta tese, os temas discutidos, a partir dos interesses definidos pelas próprias gestantes, versaram sobre: (1) direitos da gestante como usuária do SUS em relação aos princípios de universalidade, equidade e integralidade; (2) direitos da mulher em relação à atenção humanizada à gravidez, ao parto e ao puerpério; (3) direitos da gestante à maternidade segura; e (4) direitos da criança ao nascimento seguro. A abordagem das gestantes no formato, de oficinas e os respectivos conteúdos considerados, como uma ação educativa para qualificar e fortalecer as gestantes na tomada de cuidados para a promoção de saúde, encontram consonância com o que diz o Artigo 2º da PNEPS-SUS:

A PNEPS-SUS reafirma o compromisso com a universalidade, a equidade, a integralidade e a efetiva participação popular no SUS, e propõe uma prática político-pedagógica que perpassa as ações voltadas para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a partir do diálogo entre a diversidade de saberes, valorizando os saberes populares, a ancestralidade, o incentivo à produção individual e coletiva de conhecimentos e a inserção destes no SUS. (Portaria nº 2.761 de 19 de novembro de 2013)

Inclusive os princípios orientadores da PNEPS-SUS, alguns dos quais abaixo relacionados, com sua definição trazida pela Portaria nº 2.761 de 19 de novembro de 2013, foram buscados para a aplicação prática nas oficinas em dinâmica de grupo com as gestantes desta pesquisa (Portaria nº 2.761 de 19 de novembro de 2013):

Diálogo é o encontro de conhecimentos construídos histórica e culturalmente por sujeitos, ou seja, o encontro desses sujeitos na intersubjetividade, que acontece quando cada um, de forma respeitosa, coloca o que sabe à disposição para ampliar o conhecimento crítico de ambos acerca da realidade, contribuindo com os processos de transformação e de humanização.

construção de práticas em saúde alicerçadas na leitura e na análise crítica da realidade.

A construção compartilhada do conhecimento consiste em processos comunicacionais e pedagógicos entre pessoas e grupos de saberes, culturas e inserções sociais diferentes, na perspectiva de compreender e transformar de modo coletivo as ações de saúde desde suas dimensões teóricas, políticas e práticas.

A emancipação é um processo coletivo e compartilhado no qual pessoas e grupos conquistam a superação e a libertação de todas as formas de opressão, exploração, discriminação e violência ainda vigentes na sociedade e que produzem a desumanização e a determinação social do adoecimento.

Assim, a oficina caracterizada como uma prática de intervenção psicossocial no contexto pedagógico e comunitário, ao usar a informação e reflexão, além de abordar com os significados afetivos e as vivências relacionadas ao tema em foco (Afonso, 2010), neste caso o do bem-estar materno e o da prevenção de mortes maternas e infantis, vai ao encontro dos princípios da PNEPS-SUS relativos ao diálogo, amorosidade e problematização. Assim um dos resultados almejados das oficinas, especialmente a partir da construção compartilhada do conhecimento, consistiu no alcance da emancipação pelas gestantes visando à melhoria de seu bem-estar e, consequentemente, a prevenção do adoecimento e morte materna e do concepto.