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CAPÍTULO 1 – COMUNICAÇÃO, EDUCAÇÃO, AVALIAÇÃO E INOVAÇÃO:

1.2 Educação em Saúde

1.2.1 Perspectiva Histórica

A educação em saúde assume papel relevante, especialmente em iniciativas inovadoras para enfrentamento e resolução de prioridades em saúde pública. Ao longo do tempo a compreensão de educação em saúde passou por distintas concepções, desde o repasse de informações de regras de um “viver higiênico” para assimilação em nível individual, até a atual perspectiva que inclui a interação dos saberes e a autonomia de decisão (Candeias, 1988; Pelicioni, 2007; Reis, 2006).

O conceito contemporâneo de educação em saúde considerado neste trabalho é o mesmo anunciado por Reis (2006): “um processo teórico-prático que visa integrar os vários saberes: científico, popular e do senso comum, possibilitando aos sujeitos envolvidos uma visão crítica, uma maior participação responsável e autônoma frente à saúde no cotidiano” (p. 19). A seguir serão apresentados exemplos de algumas práticas educativas, de determinação sócio-histórica, em consonância com que Mello (1996) afirma: “Educação quanto Saúde são dois temas que se definem tendo por base uma matriz histórica, política, econômica, social e cultural, e de acordo com a visão que cada sociedade percebe e adota” (p. 23).

Desde a Idade Média, na Europa, já era dada relevância à educação em saúde, recomendando-se boa alimentação, adequadas práticas de higiene e prolongadas horas de sono para conferir mais anos de vida às pessoas (Pelicioni, 2007). Na Inglaterra, a cidade de Liverpool, em 1859, criou a figura da “senhora visitadora” que junto com a enfermeira distrital, visitava os enfermos, para exercer função de educação em saúde. A partir de então, outras cidades inglesas tiveram a mesma iniciativa. Em Manchester, foi designada uma mulher da classe trabalhadora que ia de casa em casa, transmitir noções de saúde e higiene para os pobres (Rosen, 1994).

No começo do século XX, a expansão do movimento da saúde da criança incentivou as enfermeiras a se tornarem visitadoras sanitárias. Florence Nightingale, já em 1893, ressaltava a necessidade da “enfermagem sanitária”, defendendo que a enfermeira distrital além da enfermeira dos doentes, fosse uma “missionária da saúde”. Equipes de visitadoras sanitárias voluntárias e de mulheres designadas como inspetoras ou visitadoras sanitárias estavam presentes em cerca de cinquenta comunidades inglesas, em 1905. Exigências de qualificações do visitador sanitário foram feitas com a sanção do Ato de Assistência à Maternidade e à Criança, em 1918 (Rosen, 1994).

Nos Estados Unidos da América, as associações de enfermagem em saúde pública apareceram em Buffalo, em 1855, e em Boston, em 1886, após algumas denominações iniciais, passaram a ser chamadas de Associação de Enfermeiras Visitadoras. As primeiras enfermeiras das agências de saúde americanas, oficiais e voluntárias, foram nomeadas para atender a problemas específicos. Assim, a maioria dos programas de enfermagem em saúde pública organizou-se sobre especialidades, uma das quais voltada para a saúde da mãe e da criança (Rosen, 1994).

De acordo com Candeias (1988), a profissão de educador sanitário, no mesmo molde concebido pela Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo no começo do século XX, surgiu nos Estados Unidos da América, durante a II Guerra Mundial, tendo como motivação:

É justo afirmar que três fatos favoreceram nos Estados Unidos: os problemas de saúde surgidos durante a II Guerra; o conhecimento científico emergente na década de 30 e 40, na área de ciências sociais, sugerindo novos caminhos para a compreensão do comportamento individual e coletivo; porém não menos importante, a brilhante compreensão de Kurt Lewin, ao introduzir e aprofundar a teoria e a prática da Dinâmica de Grupo. Com Lewin divulgara- se a idéia [sic] de que a mudança da ação individual e coletiva pode ocorrer

mediante a participação no planejamento do programa e nas ações subsequentes. (Candeias, 1988, p.359)

No Brasil, conforme Candeias (1988) em seu resgate histórico do ensino de educação em saúde na Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo, dentre uma das proposições da reestruturação do Serviço de Saúde Pública do Estado de São Paulo, em 1925, constava a oferta da educação sanitária para a população a fim de se apropriar de preceitos necessários de higiene individual. Para tanto, por meio da Lei nº 2.121 de 30 de dezembro de 1925, duas inovações propostas consistiram: (1) a criação do cargo de um auxiliar de nível médio no sistema de saúde para a função de educador sanitário, e (2) a inclusão do Curso de Educação Sanitária no Instituto de Higiene da Faculdade de Medicina de São Paulo, que hoje é a Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo.

A educação sanitária ou educação higiênica como era também chamada dirigia- se a indivíduo, isoladamente ou a grupos, se conviesse, sendo desenvolvida em Centros de Saúde (CS), em visitas domiciliares, em estabelecimentos escolares, hospitalares e fabris, entre outros. O referido curso de Educação Sanitária formou educadores sanitários de nível médio de 1926 a 1960. Esteve suspenso de 1961 a 1966, retornando como curso de nível superior de pós-graduação em 1967, com nova denominação: Educação em Saúde Pública, dando título a seus egressos de educador em saúde pública (Candeias, 1988).

O primeiro curso de educação sanitária no Instituto de Higiene da Faculdade de Medicina de São Paulo foi constituído de nove disciplinas, dentre as quais a de Higiene Infantil. Ao longo dos anos, mudanças no programa do curso de educação sanitária ocorreram. A profunda revisão curricular de 1955 introduziu a disciplina de Métodos de Educação Sanitária com os conteúdos de: Relações Humanas; Trabalho de Grupo; Entrevistas – Palestras; Meios Auxiliares para a Educação Sanitária; Rádio, Cinema, TV; Folhetos; Cartazes – Exposições; Relatórios; Jornais e Revistas. Em 1962, o Programa de Formação do Educador em Saúde Pública apresentou proposta de dois cursos: (1) Curso Básico de Saúde Pública com sete disciplinas, dentre as quais, a de Higiene Materno-Infantil; e (2) Curso de Especialização com uma carga horária total de 440 horas, sendo 50 dedicadas ao estudo de educação sanitária na comunidade (Candeias, 1988).

Influenciando muito a educação em saúde, o ensino de Higiene, no século XIX, fazia parte do currículo das Faculdades de Medicina do Rio de Janeiro e da Bahia, cada

uma inicialmente com a denominação de Escola Anatômica, Cirúrgica e Médica, de 1808 até o ano de 1823. A disciplina de Higiene constava no programa do ensino médico do Rio de Janeiro em 1813, passando a ser denominada de Higiene Geral e Particular em 1825 e de Higiene e História da Medicina em 1833, quando era ministrada a partir do terceiro ano com duração de três anos. Tanto na Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro como na da Bahia, a disciplina de Higiene permaneceu no ano de 1891 entre as ciências relativas à estática e dinâmica do homem são e do homem doente. Em 1925, no Rio de Janeiro, a disciplina de Higiene passou a fazer parte do quinto ano de medicina, e no sexto ano, era ensinada na Clínica Pediátrica Médica e Higiene Infantil (Pelicioni, 2007). A consulta ao currículo dessas duas faculdades médicas, em janeiro de 2016, revela para a do Rio de Janeiro, a disciplina de Educação e Saúde, como optativa de dois créditos, incluindo como conteúdos: paradigmas conceituais e modelos assistenciais em saúde; constituição histórica da educação e saúde no Brasil; principais modelos educativos em saúde; educação popular e saúde; experiências inovadoras em educação e saúde (Universidade Federal do Rio de Janeiro, 2016). Embora no currículo do curso médico baiano não haja uma disciplina específica de educação em saúde ou similar, conteúdos de educação em saúde estão diluídos nas oito disciplinas do eixo ético-humanístico (Universidade Federal da Bahia, 2016).

Flores (2007), em sua tese de doutorado intitulada “O Agente Comunitário de Saúde: a caracterização da sua formação sócio-histórica como educador em saúde”, resgata os fatos mais importantes das políticas de saúde do Brasil, anunciadores do atual ACS, instituído pelo Programa Nacional de Agente Comunitário de Saúde – PACS, em 1991. Dentre os referidos fatos estão aqueles que culminam na criação do educador em saúde nas figuras: (1) da enfermeira visitadora em ações de profilaxia de doenças transmissíveis por volta de 1920; (2) do educador sanitário e inspetor (guardinha) na campanha de erradicação da malária e na campanha de erradicação da varíola; (3) da visitadora sanitária do Serviço Especial de Saúde Pública – SESP, na década de 1940; (4) do agente de saúde da Medicina Comunitária, materializada por meio do Programa de Interiorização de Ações de Saúde e Saneamento – PIASS, na década de 1970; e (5) do ACS do Programa de Agente Comunitário de Saúde implantado no Ceará, em 1987. Dentre as atribuições do visitador sanitário do SESP constavam: (1) atendimento às gestantes e recém-nascidos de baixo risco, (2) visitas domiciliares a puérperas e recém- nascidos, e (3) acompanhamento de nascidos vivos e óbitos em menores de um ano de idade (Flores, 2007).

De acordo com o Ministério da Saúde (2004b), a estrutura curricular do curso de Técnico de Agente Comunitário de Saúde contempla desenvolvimento de competências, algumas das quais no âmbito da promoção da saúde e prevenção de doenças, dirigidas a indivíduos, grupos específicos e doenças prevalentes. Dentre muitas habilidades (saber fazer), a formação profissional está organizada para que o agente comunitário desenvolva ações na área de saúde materno-infantil: (1) apoiar o acompanhamento da gravidez e puerpério, conforme orientações da equipe de saúde; (2) orientar as gestantes e seus familiares nos cuidados relativos à gestação, parto e puerpério; (3) orientar gestantes, puérperas e grupo familiar quanto ao aleitamento materno e cuidados com o recém-nascido; e (4) acompanhar o crescimento e o desenvolvimento infantil e a situação vacinal das crianças, conforme planejamento da equipe de saúde.