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CAPÍTULO II – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.1 Efeito do país de origem

A origem do termo efeito do país de origem remonta a 1965, quando em um estudo seminal Robert Schooler apresentou a estudantes guatemaltecos embalagens de produtos semelhantes, que se diferenciavam entre si apenas pela identificação do país produtor no rótulo. O autor notou que itens domésticos e mexicanos eram favorecidos nas avaliações de qualidade feitas pelos alunos, em detrimento de outros de origem de El Salvador e da Costa Rica. O viés foi explicado pelo pesquisador como resultado de animosidades existentes entre alguns países da América Central.

Pouco tempo depois, estimulados pelos resultados anteriores, SCHOOLER e WILDT (1968) conduziram uma nova pesquisa. Colando rótulos com os dizeres Made in USA e Made in Japan em copos de vidro idênticos, foi solicitado a grupos de consumidores o preenchimento de um questionário comparativo, em escala ordinal. Como os grupos foram homogêneos e os produtos semelhantes, exceto pelo rótulo de origem, as diferenças obtidas nas avaliações colhidas foram atribuídas a pré-conceitos existentes nos integrantes da amostra e relativos ao país de produção do bem.

Porém, o primeiro estudo longitudinal, a fim de compreender como se caracterizavam e evoluíam os pré-julgamentos de imagem dos países com relação aos seus produtos, ocorreu apenas entre 1970 e 1977, conduzido por NAGASHIMA (1977). Ele percebeu que os consumidores possuíam uma imagem estereotipada dos bens relacionados às suas origens. Esta poderia evoluir, principalmente em decorrência da mudança de qualidade dos artigos produzidos em uma nação ao longo do tempo.

Desde então, o tema efeito do país de origem ganhou popularidade entre pesquisadores ao redor do globo, resultando na confecção de diversos trabalhos. Em 1982, BILKEY e NES (1982) realizaram a primeira importante meta-análise nas mais relevantes publicações que abordaram o assunto entre 1965 e 1979. Eles concluíram que, apesar dos importantes avanços para o conhecimento na área, a maioria dos estudos feitos até então se caracterizavam como pesquisas de variável única, isto é, mantendo todos os fatores inerentes ao processo de decisão de compra constantes, modificava-se apenas uma informação sobre o item apresentado aos potenciais consumidores: o país de origem do bem.

Porém, qualquer estudo com variável única tende a fazer com que os efeitos da mesma sejam ampliados. Na ausência de informações adicionais, as pessoas acabam dando maior

importância àquelas a elas apresentadas (CHANTTALAS, 2005, p. 11). Além do mais, em uma situação real de compra, clientes freqüentemente ficam expostos a uma variedade enorme de informações que afetam, em níveis diferentes, suas decisões e escolhas. Por isso BILKEY e NES (1982) aconselharam uma maior difusão de estudos com múltiplas variáveis a fim de entender a real importância do efeito do país de origem no processo de consumo.

A partir desse momento, muitos estudos passaram a ser desenvolvidos com a utilização de variáveis múltiplas, inerentes ao ambiente de compra, que se somavam à variável país de origem do bem. Entre as mais pesquisadas, encontram-se as variáveis extrínsecas ao produto (ex.: preço, marca, reputação do varejista), as variáveis intrínsecas ao produto (ex.: complexidade do mesmo, cor, design), as variáveis individuais no processo de decisão de compra (ex.: nível de envolvimento do consumidor, nível de familiaridade do mesmo com o produto), e as variáveis relacionadas à imagem e valor da marca (brand equity).

Vale notar que o efeito do país de origem deve ser entendido como uma variável extrínseca ao produto, podendo ser manipulado sem diretamente afetar seu desempenho ou suas características físicas (PHARR, 2005, p. 37).

Para ilustrar, em um estudo interessante com o uso de variáveis múltiplas, AHMED, D’ASTOUS e CHAMPAGNE (2005) pesquisaram como as cinco variáveis acima apresentadas podem afetar a formação da imagem de produtos nas mentes dos clientes taiwaneses. Tomando-se dois bens, um de alta complexidade (computadores) e outro de menor complexidade (televisores), os autores realizaram uma análise conjunta ilustrando a atitude dos consumidores face à sua familiaridade com os produtos, à influência da marca e da garantia e à origem das mercadorias (países altamente industrializados, moderadamente industrializados ou de industrialização nascente), sendo os efeitos de origem mensurados em duas categorias: país de criação do design e país de manufatura do artigo. Os resultados mostraram que países menos industrializados gozam de uma imagem mais negativa, principalmente quando se trata de design de bens de maior complexidade. Porém, isso pôde ser atenuado com o uso de garantias ou marcas de empresas bem conceituadas. Ainda, quanto mais familiar uma pessoa se dizia com relação aos produtos de determinado país, melhores as notas a ele atribuídas.

Contudo, nem todos os estudos já realizados conferem a mesma importância para a variável origem do bem. ETTENSON, WAGNER e GAETH (1988), captando as impressões de voluntários antes e depois de expostos a uma campanha do tipo Made in the USA, concluíram que essa mudança trouxe baixos efeitos, inferiores aos provocados por mudanças de preço ou qualidade, na avaliação final dos consumidores. Assim, afirmaram que os

consumidores apenas utilizariam a variável de origem do produto na presença de informações limitadas ou baixo nível de familiaridade com o mesmo. Em contraste, TEAS e AGARWAL (2000) descobriram que o efeito do país de origem e a marca do produto possuem níveis de influência semelhantes e significantes, inferiores apenas àquele exercido pelo preço. Diferenças de resultados como estas refletem a profundidade do assunto, que abrange não apenas aspectos comportamentais do consumidor, mas também as características e tipos de produtos, pois um mesmo país pode ser bem avaliado por um cliente para determinado tipo de bem e mal avaliado para outros (CENGIZ e KIRKBIR, 2007, p. 76).

Ainda assim, o que se constata é que a maior parte dos estudos que aborda a questão do efeito do país de origem prova uma influência significativa desse fator na construção da imagem da marca, valor da marca (brand equity) e valor do produto. Analisando os resultados de diversos estudos sofre efeito do país de origem, CHANTTALAS (2005), confirmou que esse fator atua de maneira direta na avaliação de qualidade dos bens, e que por isso, mesmo que de forma indireta, tende a influenciar a disposição dos clientes para a aquisição dos mesmos. Porém, pouco tem se conseguido provar sobre sua influência direta no processo de decisão de compra dos indivíduos (PHARR, 2005, p. 39). Em um interessante levantamento sobre essa questão, PETERSON e JOLIBERT (1995) descobriram que em quase dois-terços (63%) dos trabalhos sobre efeito do país de origem realizados até então (1995), esse tema foi abordado sob a ótica da influência que a origem do bem gerava na percepção de qualidade e confiança dos produtos pelos clientes, dando-se pouca atenção aos seus verdadeiros impactos na decisão final de compra. Isso porque os estudiosos costumavam diretamente pedir aos consumidores para avaliarem a qualidade, valor, risco, etc. dos produtos feitos em diferentes países, gerando um viés nas respostas. Apresentar de uma maneira explícita a origem do bem faz com que os membros da amostra dêem a essa variável um valor superior àquele que ela realmente possui no processo de compra, onde a obtenção dessa informação pode requerer um esforço maior (LIEFELD, 2004, p. 85).

Atento a esse fato, LIEFELD (2004) pesquisou a importância do fator procedência do artigo para as decisões de compra de consumidores americanos e canadenses, por meio de uma abordagem menos intrusiva aos participantes do estudo. Após o pagamento de suas compras, clientes foram indagados sobre a sua consciência a respeito das origens dos bens adquiridos. Dentre as 1248 pessoas que compuseram a amostra, mais de 93% desconheciam as raízes dos artigos comprados e apenas 2,2% do total pesquisado informaram que além de conhecer as procedências dos bens, estas haviam tido algum papel em seu processo de decisão final de compra. Porém, esse estudo possui dois pontos merecedores de atenção. Primeiro, ele

se concentrou em pontos de venda cujos produtos ofertados são, em média, de baixa complexidade, como Wal-Mart (supermercado), Home Depot (material de construção e decoração), Canadian Tire (acessórios para a casa) e Future Shop (eletroeletrônicos, informática e seus acessórios em geral) (ibidem, p. 88). Mas, é principalmente quando o consumidor se depara com produtos mais complexos e de maior dificuldade de avaliação que a variável país de origem desempenha seu papel mais explícito (CENGIZ e KIRKBIR, 2007, p. 75). Segundo, a preocupação maior dos pesquisadores foi sobre o conhecimento dos consumidores com relação ao país de produção do bem e não ao país de origem da marca, variável que tem se mostrado mais importante.

LIN e CHEN (2006) também estudaram a importância da origem do bem, no caso, serviços de seguro e de alimentação para eventos (buffet), no processo de decisão de compra. Eles concluíram que conforme o envolvimento das pessoas com os artigos pesquisados aumentava, tornava-se também mais importante o fator origem do bem para os mesmos. Ainda assim, estes mesmos consumidores também buscavam e valorizavam outras informações, como marca e preço, o que contraditoriamente diminui a influência conferida pela origem do artigo.

Críticos ao estudo do tema do efeito do país de origem alegam que esse assunto vem perdendo a relevância no mundo moderno, onde a comercialização mundial produção, a globalização das marcas e a não obrigatoriedade de rótulos de origem, segundo algumas determinações da Organização Mundial do Comércio, fazem com que o assunto se esvazie gradativamente em importância (USUNIER, 2006, p. 61).

Com a globalização da economia em que estão inseridas as empresas, amplia-se cada vez mais a quantidade de produtos híbridos, isto é, aqueles idealizados em uma nação, fabricados em outras, com peças de diversas procedências e vendidos nos mais variados países.

Para uma grande legião de pesquisadores, no entanto, essas novas formas de relacionamento estabelecidas recentemente no comércio internacional apenas adicionam novos ingredientes ao estudo do tema. Isso gerou o nascimento de uma vasta gama de termos, a fim de tentar explicar, de maneira mais precisa, as raízes dos produtos, tais como: país de design, país de partes, país de montagem e país de origem da marca, entre muitos outros.

Para CENGIZ e KIRKBIR (2007, p. 76), há ainda que se observar o nível de desenvolvimento de um país. Consumidores de países menos desenvolvidos e com economias mais fechadas possuem um menor leque de informações e experiência de compra de produtos estrangeiros, principalmente quando se trata de produtos mais caros e complexos. Sendo

assim, eles podem sentir uma maior necessidade em utilizar a informação do país de origem para a sua tomada de decisão de compra. Sendo assim, se esses clientes não se sentirem familiarizados com o fato de que algum tipo de bem possa vir de determinados países, eles poderão “sofrer” o chamado efeito halo, onde não só sua confiança com relação ao item exposto será afetada, mas também toda a sua avaliação posterior sobre o mesmo (JOHANSSON, RONKANINEN e CZINKOTA, 1985).

Finalmente, ainda há uma carência por mais estudos que busquem entender como os meta-brands se inserem no contexto de efeito do país de origem. Meta-brand é a designação dada a commodities que buscam diferenciação através do atributo país ou região de origem (PHARR, 2005, p. 42). Essa prática vem sendo especialmente explorada na União Européia, onde mais de 500 denominações de produtos foram criadas e registradas, só na última década. BONETTI (2004) cita o exemplo da mussarela de búfala. Vários países e regiões podem fazer mussarela de leite de búfala, porém, apenas os produtores da região de Campana, Itália, podem vender a Muzzarella de búfala Campana, denominação registrada nos órgãos de comércio internacionais, que serve como uma espécie de rótulo de procedência que garante sua qualidade e características únicas.

Assim, é possível concluir que, apesar de todo o desenvolvimento recente ao redor do tema efeito do país de origem, os esforços nessa área ainda são muito modestos se comparados a outras questões relacionadas ao comportamento do consumidor (CENGIZ e KIRKBIR, 2007, p.75). Tal fato torna esse intrigante assunto merecedor de maior atenção por parte de cientistas do mundo todo. Ainda, a grande maioria das pesquisas focaliza o assunto sob o enfoque da imagem que o produto estrangeiro possui, e não propriamente a imagem que determinada nação goza em outro país. Na medida em que o processo de globalização evolui, consumidores ficam cada vez mais expostos aos produtos e informações de diferentes nações. Conforme o nível de familiaridade das pessoas com os países estrangeiros aumenta via consumo de bens e serviços, a formação de estereótipos dos países passa a basear-se cada vez mais na avaliação dos produtos a eles relacionados (CHANTTALAS, 2005, p. 87-88), não se restringindo, porém, a apenas esse fator, o que abre um vasto campo de pesquisas no que tange a reputação e os estereótipos das nações.