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Existe uma certa confusão na literatura sobre os seguintes efeitos: spin galvanic effect (SGE), seu efeito inverso inverse spin galvanic effect (ISGE) e os efeitos Rashba-Edelstein e seu inverso (REE e IREE). No SGE, uma corrente de spin gera uma corrente de carga enquanto no ISGE uma corrente de carga gera um acúmulo de spin fora do equilíbrio, ou seja, uma corrente de spin. O ISGE é muitas vezes confundido com o SHE. Podemos fazer uma breve revisão histórica para tentar esclarecer o assunto. O termo spin galvanic effect apareceu pela primeira vez em 2002 (Spin-galvanic

effect, [126]), portanto dois anos após o artigo de J. Hirsch 1999. Neste artigo, o artigo do Hirsch não

é citado. A física do ISGE e do SHE estão conectadas pela interação spin-órbita e aparentemente representam duas famílias de efeitos relativísticos relacionados à geração e detecção de acúmulos de spins fora do equilíbrio.

O termo spin galvanic effect é derivado da analogia com células galvânicas (voltaicas), só que em vez da tensão ser gerada por uma reação química, é gerada por um acúmulo (polarização) de spin no meio. O SGE foi primeiro observado em um gás de elétrons bidimensional 2DEG (two-

dimensional electron gas) assimetricamente confinado num poço quântico de GaAs. A principal

caraterística do SGE é o surgimento de uma corrente elétrica induzida por um acúmulo de spins fora do equilíbrio. A diferença de populações de spin up e down foi induzida incidindo-se luz circularmente polarizada no meio, criando assim um deslocamento nas sub-bandas de spins, ver [126]. O fenômeno que foi batizado como spin galvanic effect em 2002, na verdade foi proposto teoricamente em 1978 por Ivchenko e Pikus, que publicaram um artigo intitulado “New

photogalvanic effect in gyrotropic crystals” [127]. Este efeito foi explicado por Edelstein [59] como sendo um Rashba 2DEG com acoplamento spin órbita.

O que está começando a ficar claro na literatura é que o SHE ocorre no volume, em 3D, enquanto o ISGE ocorre em 2D (interfacial). Como é um efeito interfacial e depende fortemente da quebra de simetria e da interação spin órbita, o ISGE também é chamado de Edelstein ou Rashba- Edelstein. Aparentemente os artigos de revisão mais importantes publicados recentemente, [128], [129], dão preferência à nomenclatura Rashba-Edelstein effect (REE) ou Edelstein effect para a conversão de corrente de carga em corrente de spin e o inverse Rashba-Edelstein effect (IREE) para a conversão de corrente de spin em carga. Ambos os fenômenos, REE e IREE, são mediados pela interação spin-órbita interfacial.

O termo inverse Rashba-Edelstein effect (IREE) se popularizou a partir de 2013 com o trabalho de Rojas-Sanchez et al. (“Spin-to charge conversion using Rashba coupling at the interface between non-magnetic materials”, [60]), onde foi demonstrada a conversão de corrente de spin em corrente de carga na interface metálica Ag/Bi. Teoricamente já se sabia que esta interface possui um dos maiores coeficientes Rashba interfaciais. Foi este trabalho que nos inspirou para interpretar o fenômeno de conversão de corrente de spin em corrente de carga na interface YIG/grafeno que será discutido mais adiante. O efeito interfacial Rashba-Edelstein pode ser aplicado em estados de superfície existentes em isolantes topológicos (TIs) e também nos inspirou para explicar resultados de conversão de spin em carga na interface YIG/TI.

O efeito Edelstein (Edelstein effect - EE) se baseia na geração de uma polarização líquida de spin, em um sistema de elétrons bidimensionais. Estes sistemas sob a interação Rashba, como descrito no apêndice A, cria uma separação na relação de dispersão de momentos diferentes para diferentes spins. O Hamiltoniano de Rashba pode ser escrito por:

𝐻𝑅 =

𝛼𝑅

ℏ (𝜎⃗ × 𝑝⃗) ∙ 𝑧̂ = 𝛼𝑅(𝜎⃗ × 𝑘⃗⃗) ∙ 𝑧̂. 3-35 A equação acima causa uma relação de dispersão mostrada nas Figura 3-12 a) e b). Neste sistema na ausência de corrente elétrica, a população de spin up e down é a mesma, portanto, não existe acumulação de spin, Figura 3-12 c). No entanto, quando se aplica um campo elétrico ℰ𝑥,

gerando uma corrente na mesma direção, ocorre uma translação das bandas de energia. Nesta situação, a população com momento 𝑘𝑥 e spin up é favorecida, resultando em um acúmulo de spin, este acúmulo resultante do travamento entre momento 𝑘𝑥 e spin up pode ser entendido com uma corrente de spin Figura 3-12 d).

Figura 3-12: A atuação do efeito Rashba, ou campo Rashba, causa uma deflexão na relação de dispersão de energia causando um travamento entre o spin e o momento do elétron a) e b). Em c) temos a visão superior

da relação de dispersão sem a aplicação de campo elétrico. d) A atuação do campo elétrico resulta em um acúmulo liquido de polarização de spin. Adaptado de [129], [130].

O efeito inverso, chamado efeito Edelstein inverso (IEE), ocorre quando para o mesmo sistema uma corrente de spin 3D é injetada, desbalanceando a distribuição de spin na superfície, portanto aumentando a população de elétrons com spin up e momento 𝑘𝑥. O excesso de elétrons com momento

𝑘𝑥 resulta em uma corrente de carga 2D.

Uma forma simples de escrever esta relação é expressada por:

𝑗𝑐 = 𝜆𝐼𝐸𝐸𝐽𝑆, 3-36

onde 𝜆𝐼𝐸𝐸 é o parâmetro de efeito Edelstein, possuindo unidade de comprimento. 𝜆𝐼𝐸𝐸 = 𝛼𝑅𝜏

ℏ , onde

𝛼𝑅 é a constante de Rashba, que mede a intensidade da interação e depende do campo elétrico, da interação spin-órbita e de outras propriedades dependentes do material, e 𝜏 o tempo de relaxação do momento 𝑘 [60], [129].

Figura 3-13: No processo inverso, o acúmulo de spin na interface, favorece a população de elétrons com spin “up” e momento k, desse modo, a maior quantidade de elétrons com momento k resulta em uma

corrente elétrica 2D.

Utilizando 3-36, podemos escrever a corrente e a tensão de carga gerada pelo efeito Edelstein, sob a ação de uma corrente de spin. Esta relação é expressa por:

𝑉𝐼𝐸𝐸 = 𝑅𝑆𝑤𝑗𝑐 = 𝜆𝐼𝐸𝐸𝑅𝑆𝑤𝐽𝑆𝑧(0). 3-37

Assim como ocorre para o efeito ISHE, 𝐽𝑆𝑧(0) pode ser gerado por spin pumping, ou spin Seebeck, ambos os tipos de injeção de corrente de spin em sistema Rashba são mostrados nesta tese. Para o caso do bombeamento de spin, o valor máximo da tensão IEE é expresso por:

𝑉𝐼𝐸𝐸𝑝𝑒𝑎𝑘 = 𝜆𝐼𝐸𝐸𝑅𝑆𝑤𝑓𝑔𝑒𝑓𝑓↑↓ 𝑒 (

ℎ Δ𝐻)

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4 Tensão MCP e conversão Edelstein inverso

Neste capítulo serão apresentados e discutidos com detalhes, resultados que envolvem fenômenos spintrônicos em sistemas bidimensionais ou em que anisotropias de superfície são extremamente importantes. A metodologia utilizada para a obtenção dos resultados discutidos neste capítulo segue mais ou menos as seguintes etapas: (i) Fabricação de amostras com diferentes arranjos estruturais; (ii) Caracterização magnética básica; (iii) Tensões elétricas na condição de ressonância ferromagnética além de tensão geradas por gradientes de temperatura. Na primeira parte é analisada a tensão elétrica em um filme simples de Py para entender sua contribuição no processo de bombeamento de spin. Na segunda parte serão apresentadas medidas de injeção de corrente de spin e conversão em corrente de cargas em monocamadas de grafeno sobre YIG. E na terceira parte, veremos tensões elétricas no isolante topológico (Bi0.22Sb0.78)2Te3 por SPE e SSE. Nas últimas duas

partes, a conversão de corrente de spin em corrente de carga se deve ao efeito Edelstein inverso.