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Efeitos do flamejamento sobre as plantas daninhas

No documento Controle de Plantas Daninhas (páginas 186-192)

Diferentemente do uso do fogo para a queima dos restos culturais e para a limpeza de pastagens, o flamejamento é a exposição do vegetal à chama produzida pelo equipamento. Não ocorre a queima, mas a geração de um distúrbio fisiológico induzido por uma exposição ao calor em um curto espaço de tempo.

O solo é um isolador eficiente de calor, capaz de absorver valores

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expressivos de energia térmica sem que isso implique grandes variações de temperatura. Por esta razão, assim como o fato de que o flamejamento é realizado numa fração de segundo sobre a mesma superfície, apenas os milímetros mais superficiais do solo são aquecidos de forma temporária (Ascard, 1995).

O flamejamento, realizado com o uso Gás LP, apresenta como vantagem sobre o controle químico a particularidade de não deixar resíduos no solo e na água (Favarato et al., 2016), além de não ser seletivo a nenhuma planta-alvo, sendo vantajoso para uso em áreas com plantas tolerantes ou resistentes aos herbicidas. A técnica possui também pontos positivos em relação às práticas de controle mecânico, visto que não revolve solo e, portanto, não o perturba, minimizando os efeitos erosivos, e não expõe sementes de plantas daninhas enterradas à superfície, fator que propicia a germinação, além de poder ser utilizada mesmo quando o solo se encontra muito úmido para o cultivo (Stepanovic, 2013).

O flamejamento induz à eliminação das plantas daninhas ao submetê- las a intensas ondas de calor em espaços de tempo pré-determinados. A literatura aponta faixas de temperatura letais aos vegetais de controle entre 55 e 94 ºC, o que pode ser alcançado em 0,65 a 0,13 segundos de exposição. Os queimadores podem gerar até 1.900 ºC de temperatura de combustão. As chamas produzidas pelos queimadores provocam um rápido aquecimento interno dos tecidos vegetais expostos, acarretando a desnaturação de proteínas da membrana celular e a perda de água. O calor induz ainda à inativação de enzimas bem como à coagulação do protoplasma. Como resultado, as células perdem as suas funções, levando a uma redução drástica da habilidade competitiva da planta, à inibição do seu processo fotossintético ou mesmo, eventualmente, à morte (Stepanovic, 2013).

A relação entre o tempo de exposição e o calor necessário para levar o alvo à morte influencia no consumo de combustível, pois as plantas que requerem maiores temperaturas para a sua eliminação necessitarão de uma velocidade de trabalho mais reduzida e maior consumo de GÁS LP. A faixa de velocidade de operação mais efetiva para o controle de plantas daninhas é

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descrita entre 1,0 a 4,0 km h (Burin & Fuentes, 2015).

As plantas daninhas podem ser agrupadas em quatro tipos em relação à sensibilidade que apresentam ao tratamento térmico, de acordo com Ascard (1995):

proteção para seus pontos de crescimento.

· Plantas de fácil controle: embora apresentem algumas proteções nos seus pontos de crescimento, não representam grandes dificuldades para o tratamento térmico.

· Plantas tolerantes: em razão da sua alta capacidade de rebrota, as plantas consideradas tolerantes só podem ser efetivamente controladas nas fases iniciais de desenvolvimento.

· Plantas muito tolerantes: o hábito rasteiro destas espécies e o fato de seus pontos de crescimento serem muito bem protegidos as tornam muito pouco susceptíveis a sentirem os efeitos do flamejamento. A eficácia do flamejamento pode ser constatada em campo ao pressionar uma folha com o dedo polegar e o indicador (teste de impressão digital). Caso seja verificada uma impressão escurecida sobre o limbo foliar, é provável que tenha ocorrido a perda de pressão interna em decorrência do extravasamento celular, consequência do rompimento das paredes celulares (Stepanovic, 2013).

Uma comparação do efeito do tratamento térmico com o controle mecânico de plantas daninhas na cultura da cebola foi realizada experimentalmente por Virbickaite et al. (2006). A supressão manual foi realizada três vezes durante o ciclo da cultura, ao passo que o tratamento térmico foi realizado duas vezes durante o mesmo período. Verificou-se que o flamejamento foi 22,5% mais eficaz que o mecânico para as espécies anuais, ao passo que o controle mecânico se provou 32% mais efetivo para a eliminação de plantas daninhas perenes. O tempo médio de exposição das plantas daninhas ao calor foi de 2,0 s.

Em trabalho semelhante realizado por Kerpauskas et al. (2009), verificou-se que o rendimento para o tratamento térmico durante 2,0 s de exposição foi cerca de 30% maior que no controle mecânico. Os autores atribuem esse ganho em produção à não perturbação do sistema radicular, sendo limitado, no entanto, pelo estresse causado por uma injúria térmica parcial no pescoço da cebola. O trabalho em questão apontou ainda uma faixa entre 2,15 s e 2,20 s de exposição ao calor para um rendimento ideal.

As desvantagens do flamejamento em comparação aos métodos convencionais de controle são: o alto custo do equipamento; elevado consumo de combustível; deficiência na seletividade de alvos durante a operação com vistas a garantir a segurança das plantas cultivadas; velocidade reduzida de aplicação; baixa capacidade operacional, uma vez que as larguras

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de trabalho são menores; efeito apenas sobre a parte aérea do vegetal, permitindo a rebrota; e ausência de efeito residual de controle sobre as plantas daninhas que virão a emergir. O flamejamento pode ainda induzir ao aumento da germinação de determinadas espécies, fator compensado pela não perturbação do solo, o que possibilitaria a emergência de outras tantas (Bond & Turner & Grundy, 2003).

Os custos com a mão de obra destinada à remoção manual das plantas-daninhas constituem um peso no orçamento das grandes propriedades. Em comparação ao controle químico de plantas daninhas, o flamejamento requer maiores gastos com a supressão manual suplementar delas (Ascard, 1995).

O tempo necessário de exposição das plantas à chama para o seu controle é determinado de acordo com fatores como a morfologia e a arquitetura da espécie (portanto, é importante realizar o levantamento de espécies infestantes), assim como as condições climáticas (incidência de ventos e a umidade relativa do ar). No geral, vegetais de maior porte são mais tolerantes ao flamejamento, por causa principalmente da maior superfície das folhas e do caule, o que implica uma razão de aquecimento de biomassa. Fatores anatômicos como a presença de pelos, ceras ou lignificação também contribuem para uma maior tolerância. Esses obstáculos devem ser contornados com temperatura e tempo de exposição à chama mais elevados (Stepanovic, 2013).

As diferenças no que diz respeito à tolerância ao flamejamento por parte de espécies de folhas largas e de folhas estreitas foram verificadas por Silva (2008). Comparando as gramíneas capim braquiária e colonião com a corda-de-viola e o picão-preto, plantas de folha larga, constatou-se a maior eficiência do flamejamento sobre as plantas de folha larga. Essa diferença também é observada entre as plantas cultivadas, sendo as gramíneas como o milho ou o sorgo muito mais tolerantes ao flamejamento que a soja, por exemplo.

Considerações finais

O método do flamejamento é uma tecnologia consolidada internacionalmente e, mais recentemente, no Brasil. Os equipamentos flamejadores foram desenvolvidos para inúmeras aplicações, atendendo às especificações agronômicas das culturas, podendo ser utilizados na dessecação em área total e nas entrelinhas das culturas anuais e perenes.

Podem ser utilizados em outras aplicações não agrícolas, como no controle de plantas daninhas em áreas urbanas.

No Brasil, desde 1999, o método vem sendo testado em diversas culturas com desempenho satisfatório, porém ainda não existe uma produção em escala dos flamejadores.

Nos trópicos, a alta produção de fitomassa de plantas daninhas talvez seja o maior limitante ao uso dos flamejadores por causa do risco de incêndio, porém os fabricantes têm buscado desenvolver mecanismos que venham a minimizar o problema.

O controle tem maior eficiência nas fases iniciais de desenvolvimento das espécies daninhas com o menor consumo de combustível. Vale ressaltar que as plantas daninhas que possuem resistência às moléculas de herbicida são totalmente controladas pelo flamejamento.

O flamejamento é considerado uma tecnologia limpa, tendo a sua aplicação amparada na legislação e nos órgãos reguladores de produção orgânica.

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Acervo fotográfico do desenvolvimento e aplicações

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