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A efevididade da inefetividade: a inefetividade crônica dos direitos humanos dos trabalhadores frente aos imperativos autoexpansivos do capital

2 EFETIVIDADE E CRÍTICA ANTICAPITALISTA DOS DIREITOS HUMANOS

2.2 CRÍTICA DA EFETIVIDADE: A INEFETIVIDADE CRÔNICA DOS DIREITOS HUMANOS DOS TRABALHADORES SOB O CAPITALISMO

2.2.2 A efevididade da inefetividade: a inefetividade crônica dos direitos humanos dos trabalhadores frente aos imperativos autoexpansivos do capital

“Uma certa discordância entre a verdade jurídica e a verdade que é o objeto da pesquisa histórica e sociológica é inevitável”. (PASHUKANIS, 1989, p. 123)

Tratemos aqui da questão da efetividade dos direitos humanos e de suas determinações de modo mais detido; “de modo mais detido”, contudo, não pode significar um

49 O governo brasileiro tem considerado a extrema pobreza como a condição de vida daqueles que possuem

isolamento mais do que didático. As questões que determinam a inefetividade dos direitos humanos residem exatamente nos aspectos mais amplos da discussão sobre esse conjunto de direitos, e não em detalhes específicos pertencentes a uma “teoria autorreferente dos direitos humanos”. Não se trata, portanto, de buscar nuances “internas” aos direitos humanos e dissecá-las, mas de uma investigação que considera primordialmente o contexto global dentro do qual se dá o desenvolvimento desses direitos.

Sob essas premissas, a resposta não pode ser excessivamente pragmática. Não deve limitar-se a proposição de “remédios jurídicos” ou de soluções administrativas – embora a disputa em torno das medidas concretas tomadas no âmbito político-jurídico seja, sim, importante; mas precisa analisar e submeter à crítica os elementos fundantes desta ordem. Sob esse prisma, é necessário reconhecer que não há, no Estado e no direito, a autonomia que costuma ser-lhes conferida. Apenas a partir das relações materiais podem ser compreendidos. Numa sociedade cujo fundamento encontra-se na produção para a troca e na reprodução do capital, uma norma positivada que se choque contra essa dinâmica tenderá a cair no vazio, a menos que, na sociedade civil, sejam produzidos tensionamentos na luta entre as classes capazes de fazer valer os interesses da maioria trabalhadora.

Ao mesmo tempo, as possibilidades desse tensionamento, no quadro do capital, são limitadas. A luta dos produtores diretos contra os proprietários, enquanto não rompe – ou não se torna apta a romper – com a ordem, não poderá tornar concretas demandas suas que atinjam o cerne do sistema. Isso porque as compulsões geradas por sua necessidade de autoexpansão forjam necessidades próprias ao sistema. O combate ao núcleo dessas necessidades compulsivas exige força social suficiente para fazer um enfrentamento de classe, então, decisivo, revolucionário. Há, portanto, uma fronteira, definida pelo modo vigente de produzir: de um lado dessa fronteira, imediatamente, algumas vitórias podem ser alcançadas pelos trabalhadores – trata-se de um choque tolerável; outras, não: não são passíveis de harmonização com o movimento do capital – mesmo que seu conteúdo não seja propriamente socialista.

Assim, neste quadro, pode ser possível tornar juridicamente positivas certas demandas, e até tê-las efetivadas em determinado grau: tudo isso ainda em marcos suportáveis ao mercado e a seus imperativos. A esses imperativos está subordinada a efetivação dos direitos humanos dos trabalhadores, em última instância. Uma larga efetividade dos direitos humanos tem-se mostrado uma tarefa irrealizável sob o capitalismo. Nos dias de hoje, esse apontamento apenas ganha força.

Se é verdade que são as compulsões autoexpansivas do capital (entendidas no contexto da luta de classes) os motores da vida social, isso implica numa consequência óbvia: não é um direito, um conjunto de direitos ou um plano político abstrato; assim como não são as necessidades básicas experimentadas pela populações humanas os fators preponderantes. Com relação a estas últimas, opera-se, na verdade, uma disjunção entre necessidades e produção de riqueza (MÉSZÁROS, 2002, p. 605). Torna-se assim impossível, sob o capitalismo, cumprir com as necessidades básicas dos seres humanos:

(...) não é mais crível que a disjunção de necessidade e produção-de-riqueza – que vem a ser uma característica necessária da geração de riqueza sob o domínio do capital – possa sustentar a si própria indefinidamente, mesmo nos páises de capitalismo mais avançado e privilegiado; ainda menos que possa satisfazer “no momento apropriado” (graças a seu glorificado “dinamismo”) as necessidades elementares da vasta maioria da humanidade que agora tão insensivelmente despreza. (MÉSZAROS, 2002, p. 605).

Apenas a partir da separação entre o valor de uso e o valor de troca, sob a supremacia do valor de troca, foi possível operar a separação entre necessidades e produção. Ou seja, não se trata de uma separação a-histórica, mas de uma especificidade capitalista – diante dos demais modos de produção. Houve, assim, uma “reversão radical dos princípios orientadores que caracterizavam a produção na Antiguidade clássica” (MÉSZAROS, 2002, p. 606).

A supremacia do valor de troca e a preponderância da autorreprodução do capital sobre quaisquer outros critérios como princípios orientadores da produção – incluindo-se aqui o atendimento às necessidades básicas humanas –, se não é natural às sociedades humanas, é natural ao capital. Isso significa que é tão verdadeira a disjunção entre necessidades humanas e produção sob o capitalismo quanto é falsa a disjunção entre o capital e essa sua caraterística própria. “A completa subordinação das necessidades humanas à reprodução de valor de troca – no interesse da autorrealização ampliada do capital – tem sido o traço marcante do sistema do capital desde o seu início”, afirma MÉSZÁROS (2002, p. 606).

O conjunto de conexões que se conforma a partir do movimento do capital induz os indivíduos a internalizar sua lógica: como sua e como uma lógica geral. Se, somente através do capital é possível garantir os meios de reprodução da vida material, estabelece-se uma relação entre meios e fins na qual apenas a adequação à ordem pode ser coerente50. Essa

50 É o que pode ser notado com exuberância no atual momento de crise do capital. Os Estados salvam os bancos,

pois, sem os bancos, o sistema não se sustenta; se o sistema não se sustenta, diz-se que as empresas vão falir e que, finalmente, você perderá o seu emprego, não terá como garantir sua subsistência, enfim, também não se “sustentará”. Tudo como se o sistema fosse não um modo historicamente situado, mas insubstituível,

operação incide sobre a relação entre as necessidades dos trabalhadores e as necessidades (oriundas do seu ímpeto autoexpansivo) do capital. As necessidades do capital, nessa relação, convertem-se nas necessidades humanas. O “metabolismo” do capital não só estabelece os limites e as condições de acesso aos bens, como dita as necessidades.

Desse modo, a destroçada unidade de necessidade e produção acima mencionada é “remendada”, mesmo que de uma forma caracteristicamente perversa, de modo a se ajustar aos limites do processo metabólico do capital. O que agora conta como “necessidade” não é a necessidade humana dos produtores, mas os imperativos estruturais da própria valorização e reprodução do capital. Sendo assim, o trabalhador somente pode obter acesso a uma determinada classe e quantidade de valores de uso – correspondendo ela ou não às suas necessidades reais – enquanto o capital, com base na unidade reconstituída de necessidade (troca) e produção (reprodução), os legitima como viáveis e lucrativos no interior da estrutura de homogeneização corrente. Por essa via o trabalhador internaliza as necessidades e os imperativos do capital com seus próprios, como inseparáveis da relação de troca, e por isso aceita a imposição dos valores de uso capitalisticamente viáveis como se emanassem de suas próprias necessidades. E, pior do que isso, simultaneamente o trabalhador também se acorrenta à sorte do sistema produtivo dominante pela internalização do que ele aceita serem suas próprias necessidades “legítimas”. De tal modo que, no devido tempo, sob as condições do “capitalismo de consumidores” internalizado, o trabalhador, se ousar desafiar a ordem estabelecida, tem de fato, muito mais a perder que seus “grilhões externos”. (MÉSZÁROS, 2002, p. 628)

O fato de se determinar desse modo o acesso – subordinado às relações de troca, regidas pela lucratividade acima e por cima de tudo51, num contexto em que os excedentes são apropriadas pela classe proprietária – aos valores de uso implica-nos a seguinte questão: como conceber que serão alteradas as condições de vida dos trabalhadores, que, hoje, como o demonstram “números insuspeitos”, encontram-se, aos bilhões, distantes da satisfação das suas necessidades elementares, sem uma alteração em profundidade do modo de produção e distribuição dos bens? Aliás, é impossível não conectar as “necessidades humanas elementares” ao que se tem entendido por direitos humanos. Observe-se, por exemplo, o artigo XXV da Declaração Universal dos Direitos Humanos:

“Todo homem tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e à sua família, saúde e bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis, e direito à segurança em caso de desemprego, doença, invalidez, viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle.” (ONU, 2005, p. 11).

eternamente inseparável do próprio mundo como o conhecemos. O desmoronamento do sistema, tão “natural”, aproxima-se assim do fim dos tempos.

51 Ver MÉSZAROS (2002, p. 662): “A ubíqua determinação operativa no sistema do capital é, e continuará a ser,

o imperativo da lucratividade. É esta que deve sobrepujar todas as outras considerações, quaisquer que sejam as implicações” – incluam-se aqui as mais explícitas violações de direitos humanos.

Não é a busca pela universalização desse “padrão de vida” que orienta a produção como vimos; não é o atendimento universal dessas necessidades o princípio orientador da produção e da distribuição das riquezas, em nível global. Ao contrário, este sistema de produção produz as violações de direitos humanos – é sob a batuta de sua lógica intrínseca que se criam as condições em que vivem os seres humanos – que são hoje atestadas pelos muitos relatórios publicados a cada ano. E não será por suas mãos que essas necessidades serão satisfeitas. Considere-se ainda que os avanços passíveis de serem alcançados neste quadro, ao mesmo tempo em que se dão às custas da ordem, realizam-se sob os limites da ordem.

Ao contrário do que as respostas sistêmicas poderiam sustentar, o crescimento econômico sob o paradigma hegemônico não só não tem apontado, como sua tendência, para uma redução das desigualdades, em nível global, no que diz respeito ao acesso aos bens de uso fundamentais, como também não se tem fortalecido qualquer tipo de racionalização da produção a partir do controle social. Ao contrário, as suas tendências a isso se opõem: o sistema distribui desigualmente, distanciando-se cada vez mais das necessidades humanas e expressando a transformação cabal das forças de produção em forças de destruição (cf. MARX, 2007, p. 41); ainda, expande-se o alcance de seus imperativos e sua autonomia diante do corpo social, cada vez mais como um “poder estranho sobre os indivíduos”52. Em outras palavras, uma engrenagem desgovernada e destrutiva constitui o que temos chamado de “desenvolvimento econômico”53.

Na atual fase de seu desenvolvimento, uma contundente manifestação da irracionalidade destrutiva do modelo é a forma como nele se expressa a “lei tendencial da taxa de utilização descrescente” (MÉSZÁROS, 2002, p. 653). A tendência, com o desenvolvimento das forças produtivas, é de que uma quantidade maior de “tempo disponível total para a produção” esteja a serviço da produção de bens de consumo duráveis e que uma quantidade menor de tempo de produção esteja associada à produção de bens de consumo não duráveis. Tal fato pode converter-se num fator positivo – se a produção estiver dirigida à promoção do bem-estar humano, ao atendimento das necessidades humanas. Seria possível, assim, uma vez atendidas as demandas elementares (através dos bens de uso não duráveis capazes de suprí-las, como os alimentos) mediante um menor desprendimento do tempo total

52 Como já colocava MARX (2007, p. 40).

53 Obviamente não se trata de se impedir todo e qualquer desenvolvimento econômico, mas de subordiná-lo ao controle dos

de produção, dedicar maiores esforços à produção de bens econômicos mais complexos, duráveis (MÉSZÁROS, 2002, p. 639-640).

Contudo, sob o capitalismo, não só não são satisfeitas as necessidades básicas, como o imperativo de autorreprodução impulsiona o consumo a ponto de induzir, simultaneamente, à redução da taxa de utilização dos bens produzidos e, assim, à exploração indiscriminada dos recursos naturais e ao desperdício: o que prevalece é o papel que se cumpre na retroalimentação expansiva do capital54. O desperdício destrutivo não apenas convive com a carência, como é dela indissociável. A disjunção entre necessidades humanas e produção; a subordinação do valor de uso ao valor de troca; a manifestação da lei tendencial da taxa de utilização descrescente sob o capitalismo; assim como a “metamorfose dos meios de produção em capital” são expressões da necessidade do capital – intrínseca – de manter-se em expansão contínua.

Nesse sentido, o desenvolvimento dos meios de produção não está mais diretamente ligado ao desenvolvimento das necessidades humanas (nem é impulsionado por elas, com maior ou menor vigor). Nem pode responder e se beneficiar diretamente das potencialidades emergentes do avanço do próprio conhecimento ligado à produção. Ao contrário, já que os meios de produção foram convertidos em capital (isto é, constituem os meios de produção da sociedade dada somente na medida que possam se definir e provar a si mesmos, prática e economicamente, como parte orgânica do capital), eles têm de se opor às necessidades humanas, se a lógica do capital o exigir, sobrepondo às necessidades humanas existentes e potencialmente emergentes as assim chamadas “necessidades da produção”, que correspondem diretamente ao interesse de salvaguardar a expansão do capital. (MÉSZAROS, 2002, p. 663)

A compulsão por lucratividade imposta pelo movimento do capital, portanto, faz com que a taxa de utilização decrescente assuma centralidade no momento atual – ou “uma posição de domínio na estrutura capitalista do metabolismo socioeconômico” (MÉSZAROS, 2002, p. 655). De modo que, para assegurar a produção em nome do desperdício, o fundo público é cada vez mais onerado – e posto a serviço direto da burguesia – em detrimento de serviços básicos (cujas verbas são “cortadas” através dos “planos de austeridade” e cujas garantias pelo Estado constituem deveres seus e direitos humanos). Isso não se dá apenas na periferia do sistema, mas também nos países onde o capitalismo alcançou níveis de desenvolvimento elevados55.

54 “Desse modo, a sociedade se mantém como um sistema produtivo manipulando até mesmo a aquisição dos

chamados “bens de consumo duráveis” que necessariamente são lançados ao lixo (ou enviados a gigantescos ferros-velhos, com os “cemitérios de automóveis etc.) muito antes de esgotada sua vida útil. (...) Consomem destrutivamente na sua produção, imensos recursos materiais e humanos (...)” (MÉSZAROS, 2002, p. 640).

Em ligação com a taxa de utilização descrescente e com a dinâmica de maximização dos lucros, três questões, indissociáveis de qualquer leitura atual sobre a efetividade dos direitos humanos, emergem e devem ser pautadas: a primeira, a questão ambiental; segundo, o “complexo militar-industrial” (MÉSZAROS, 2002, p. 675 e ss.) e a guerra como via para assegurar a reprodução do capital; e, terceiro, a contenção do “círculo de consumo” .

Quanto à primeira, é verdade que não há, na Declaração Universal dos Direitos Humanos, qualquer menção à questão ambiental. Contudo, a Declaração de Estocolmo sobre o Ambiente Humano, realizada em 1972, prevê que

O homem tem o direito fundamental à liberdade, à igualdade e ao desfrute de condições de vida adequadas em um meio ambiente de qualidade tal que lhe permita levar uma vida digna e gozar de bem-estar, tendo a solene obrigação de proteger e melhorar o meio ambiente para as gerações presentes e futuras. A este respeito, as políticas que promovem ou perpetuam o apartheid, a segregação racial, a discriminação, a opressão colonial e outras formas de opressão e de dominação estrangeira são condenadas e devem ser eliminadas. (BRASIL, s/d)

Firma-se, assim, portanto, o direito humano ao meio ambiente, de modo a assegurar qualidade de vida às “gerações presentes e futuras”. Quando tornamos a estabelecer a relação entre as normas jurídicas e a base material, no entanto, verificaremos que, sob os imperativos do mercado, não há espaço real para a garantia dessa previsão normativa. Ao contrário, os caminhos forjados pelo “desenvolvimento econômico” avançam agressivamente sobre os recursos naturais, de modo que, se num primeiro plano, podemos localizar a violação da norma diante da degradação de ambientes naturais específicos, em prejuízo da qualidade de vida de populações humanas específicas, em profundidade temos ameaças concretas e de caráter definitivo e genérico ao planeta e as formas de vida nele encontradas, no que se inclui a vida humana56. Isso é o que se apresenta em um contexto no qual a produção e a distribuição estão orientadas para o lucro cego e o desperdício, ou seja: a destruição não representa o preço que se paga por uma “ótima” condição de vida desfrutada coletivamente, mas a consequência do desperdício e do luxo de poucos. Em outras palavras, estamos sendo “suicidados”.

Quanto ao segundo ponto, o “complexo militar-industrial” apresenta-se como uma importante saída para a reprodução do capital em larga escala. Este é um aspecto que assume progressiva importância, sobretudo se levarmos em conta a estratégia de guerra permanente

assumida pelo governo estadunidense57. Assim como não se trata de pura “caça a terroristas”, o foco das ações militares não é unicamente um recurso natural – o petróleo iraquiano, por exemplo – ou a extensão da influência política dos Estados Unidos e a garantia de mais um mercado seguro sob as vestes da democracia burguesa. A produção de armamentos e o consumo proveniente da destruição consistem em importantes combustíveis para manter a engrenagem sistêmica sob “bom funcionamento”.

A relação entre essa via e a taxa de utilização decrescente é clara. A destruição dos bens antes existentes gera, então, a procura por novas mercadorias, verificando-se assim uma “legitimação da oferta real pela demanda fictícia” (MÉSZAROS, 2002, p. 693). Reduz-se a durabilidade dos bens (ou seja, sua utilização) através da destruição direta. O próprio Welfare State, ou Estado de Bem-Estar Social, teria, nos impactos pró-capital da atividade de guerra, suas bases.

O instrumento disposto e capaz de romper com o nó górdio de como combinar a máxima expansão possível com a taxa de utilização mínima apresentou-se ao capital na figura do complexo militar-industrial, após uma série de tentativas fracassadas em lidar com os problemas da superprodução de modo menos perdulário a partir da crise econômica mundial de 1929/33. Ainda que os primeiros passos para encontrar uma solução para a superprodução, por meio da produção militarista, tivessem sido dados já antes da Primeira Guerra Mundial, como vimos nas proféticas observações de Rosa Luxemburgo, sua adoção geral ocorreu somente após a Segunda Guerra Mundial. (MÉSZAROS, 2002, p. 685)

O desenvolvimento do complexo militar-industrial como essa resposta gera, por sua vez, suas expressões político-ideológicas. O Estado e os meios de comunicação, em especial, revestem a atividade destrutiva de uma retórica, a um só tempo, do medo, da democracia e dos direitos humanos. Desse modo, confere-se a base social exigida para levar a cabo essa exigência material58.

Pouco se pode falar da concretização do próprio direito à vida (ou da realização de qualquer direito humano) sob mecanismos de compulsão econômica que conduzem a humanidade a um estado de guerra – permanente. Sob outra perspectiva, a injeção de grande quantidade de recursos na indústria bélica revela, ainda, as prioridades do Estado em relação às políticas voltadas para assegurar os direitos da maioria da população. Tanto o complexo militar-industrial como a degradação avassaladora do meio ambiente representam faces intensamente destrutivas do modelo dominante, que não só apontam para violações de direitos

57 Contudo, a destruição como solução não é uma novidade sob o capitalismo, como se verifica nos momentos de

crise de superprodução (sobre isso ver MÉSZAROS, 2002, p. 689). Basta lembrar a queima dos estoques de café no Brasil, sob os impactos da crise de 1929.

humanos em uma escala assombrosa como colocam em risco a vida humana em proporções nunca antes dadas. Paradoxalmente ou não, os direitos humanos têm constituído a principal base retórica das investidas militares impetradas pelas potências capitalistas ocidentais na última década.

Com relação ao terceiro ponto – a contenção do “círculo de consumo”: o movimento de reprodução do capital tende a seguir a “linha de menor resistência”59. Isso quer dizer que esse movimento seguirá o caminho mais viável para sua continuidade-reprodução. Hoje, apesar da tendência do capital a ampliar o consumo de mercadorias, esse mesmo consumo vem ser ampliado não através de novos mercados e novas estratégias, mas dentro de um mesmo circuito, sem que seja necessário uma alteração do que já é porto seguro para a produção e a distribuição (MÉSZÁROS, 2002, p.679-680).

A taxa de utilização decrescente, enquanto lei tendencial, oferece ao capital a possibilidade de expandir o consumo em um círculo reduzido, sem que seja preciso

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