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Almeja-se ressaltar, neste item, que a crise financeira global atual apresenta uma característica espacial bem definida, com particularidades em relação às crises anteriores no que se refere à sua localização e aos elementos espaciais de sua gestação. Como afirmam Blazek e Netrdová (2012) a corrente crise tem, ainda, levado a uma vasta discussão acerca da sua geografia política e econômica dado que os primeiros países afetados foram os desenvolvidos da América do Norte e da Europa, enquanto um número significante de países em desenvolvimento na Ásia continua a mostrar taxas de crescimento impressionantes.

Na visão de French et al.(2009), acima de tudo, a crise do subprime é uma crise do espaço financeiro. Dessa forma, French et al.(2009), apontam que se deve atentar para a localização das origens da crise, levantando questões acerca dos

centros financeiros, da geografia da moeda, sobre a geoeconomia e geopolítica global da moeda e sobre meios financeiros.

De acordo com French et al. (2009), a crise recente foi gerada em um “uso ativo do espaço” em uma série de escalas e por meio de redes de várias extensões com indivíduos e instituições conectadas e envoltas no sistema financeiro. Dessa maneira, a crise, tem apresentado um mapa de fluxos financeiros, de diferentes efeitos de riqueza, de áreas mais ou menos afetadas, de crise de agentes de vários tipos. O Espaço, segundo eles, tem sido um fator constituinte na formação e desenrolar da crise.

O aspecto espacial da crise está relacionado, ainda, à questão da espacialidade dos centros financeiros internacionais, segundo aponta Wójcik (2013), segundo quem as finanças globais ou mesmo as crises financeiras não podem ser entendidos sem se considerar os centros financeiros. De acordo com o autor, a crise não se originou num espaço abstrato do mercado financeiro, mas em grande escala foi originado no eixo Nova Iorque – Londres, cuja dominância sobre as finanças globais é frequentemente subestimada. Esses dois centros, que possuem alto grau de semelhanças, complementariedades e conectividades, exercem liderança que se fortaleceu com o tempo e sua ligação tem sido central para o processo de globalização, em que o nível de globalização dos outros centros está relacionado às respectivas conexões com tal eixo (WÒJCIK, 2013). Nesse aspecto, a ação dos agentes do mercado financeiro nesses dois grandes centros financeiros, que são significantemente relacionados entre si, foi crucial para a gestação da bolha de ativos, através de elementos como o poder das empresas imobiliárias de Londres e Nova Iorque e o lobby em favor da desregulação financeira que permitiu a emergência do Shadow Banking System nos Estados Unidos.

Wójcik (2013) ressalta, ainda, que o lobby por desregulação financeira é produto da competição espacial. Para isso, segundo o autor, as empresas ligadas ao mercado imobiliário, nesses que são os principais centros do sistema financeiro global, sustentaram uma “exuberância irracional”, perpetuando o mito de

propriedade como um investimento lucrativo e seguro. As ações das companhias financeiras americanas e britânicas, por sua vez, se deram no sentido de pressionar as autoridades desses países para prevenir e combater medidas regulatórias restritivas.

Outro aspecto que, de acordo com Wójcik (2013), facilitou a operação do Shadow

Banking System envolve centros financeiros conectados e coestabelecidos por

firmas financeiras de Londres e Nova Iorque - líderes globais em serviços de contabilidade, serviços legais, redes de consultoria em administração, etc. – de forma que se deve compreender, segundo ele, a crise financeira global como falha não apenas do setor financeiro, mas de um conjunto de produtores de serviços complexos, contexto que coloca o eixo como importante componente desse Mix multicausal que desencadeou a crise financeira global. As posturas financeiras dos agentes econômicos desses centros também possuem uma relação espacial, como afirma Wójcik (2013). Para ele, as características Ponzi, intrínsecas a bolhas de ativos, tem uma dimensão geográfica tanto a nível de países quanto a nível regional e mesmo urbano.

Por outro lado, de acordo com Wainwright (2012), os centros financeiros regionais não foram vítimas passivas da crise financeira, estando imersos nesse espaço poderoso, embutidos ativamente nos mercados globais como emprestadores de hipotecas, o que os expuseram à crise financeira. Ele sugere que os espaços financeiros regionais possuem comunidades financeiras poderosas cujas práticas coordenam o desenvolvimento de novos conhecimentos e inovações financeiras, através de redes de abrangência nacional e internacional. As hipotecas, por exemplo, segundo ele, foram oferecidas inicialmente por construtores imersos nas regiões, servindo a comunidades locais, por agentes completamente vinculados às economias regionais. Novos contextos regulatórios e institucionais, posteriormente, levaram à fusão dessas sociedades e a subsequente crescimento em organizações trans-regionais, além do empreendimento de inovações financeiras radicais para melhoria da performance, num contexto de maior competição, tendo como resultado um modelo centralizado de tomada de decisão sobre a concessão de hipotecas.

Wainwright (2012) mostra, ainda, que as comunidades periféricas, antes vistas como isoladas, desenvolveram fortes relações de network com os mercados intermediários de capital globais através da securitização, especialmente com investidores e agências de avaliação de risco.

Dessa forma, percebe-se a existência de uma lógica por trás da gestação da crise que apresenta contornos e elementos que se definem em unidades espaciais específicas. Da mesma forma, seus desencadeamentos ocorrem sobre territórios distintos, com implicações distintas. Valverde e Cabello (2013), por exemplo, afirmam que esta crise tem transformado a geografia dos mercados financeiros regionais. O próximo capítulo busca entender quais as fontes possíveis de assimetrias regionais na transmissão de choques recessivos, como foi esta crise financeira tratada neste primeiro capítulo, recorrendo sobretudo a uma literatura de finanças regionais, economia pós-keynesiana e a recente corrente de estudos de Resiliência Regional, que se constitui tanto de economistas regionais quanto de geógrafos econômicos.

2 A CRISE FINANCEIRA, SUA TRANSMISSÃO E