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3 ANÁLISE DOS IMPACTOS REGIONAIS DA CRISE FINANCEIRA

3.1. Aspectos Metodológicos: análise descritiva dos dados e referencial

3.1.2 Métodos Econométricos

3.1.2.2 Testando a Resiliência Econômica dos Estados Brasileiros

Poucos trabalhos tem buscado, neste momento, tratar a resiliência de forma empírica, em grande medida devido à dificuldade que até agora se tem de encontrar uma definição universalmente aceita para o seu conceito. Como tratado no capítulo 2, este trabalho reconhece a abordagem evolucionária como a mais apropriada para lidar com o conceito de resiliência. Contudo, as limitações em termos de informações disponíveis para as regiões brasileiras na periodicidade escolhida para a análise desta dissertação e o curto período desde o final da crise financeira global até o período em que se tem informações sobre aspectos mais amplos das economias estaduais inviabilizam uma análise da resiliência a partir da ótica que acredita-se, aqui, ser a mais apropriada.

Em vista de tais limitações, não mostrou-se viável uma análise da resiliência enquanto capacidade adaptativa das economias locais após a crise global, como indicado por Simmie e Martin (2010) e Pike et al. (2010). Dentro das possibilidades metodológicas que se mostraram viáveis, neste momento, este trabalho optou por analisar o comportamento dos estados brasileiros em termos de resistência e recuperação do emprego, admitindo que a metodologia adotada não permite uma análise mais profunda de eventuais mudanças nas estruturas locais.

Para a análise destes dois aspectos, adota-se como referência os artigos recentes de Fingleton et al. (2012) e Cellini e Torrisi (2014) que verificam o comportamento do emprego e do PIB per capita, respectivamente, das regiões do Reino Unido e da Itália frente a choques recessivos através de um exercício de séries temporais via SUR (Regressões Aparentemente Não Relacionadas). Tal metodologia fornece um instrumental simples e útil para uma primeira análise empírica da resiliência nas regiões brasileiras à crise financeira global.

Uma questão sobre a medida de resiliência importante para o entendimento da metodologia é que sua mensuração é relativa. Dizer que a medida de Resiliência é relativa, como o é a medida de eficiência, significa afirmar que esta não traz, em si, uma informação que se baste, a não ser quando comparada a outras unidades espaciais no mesmo tempo ou outras unidades temporais no mesmo espaço. Portanto, o objetivo deste tópico ao tentar estimar valores que indiquem resiliência e, a partir dai, proceder com as comparações entre estados.

A metodologia apresentada permite que se explore, sobretudo, as diferenças entre os estados (ou unidades espaciais que sejam) em termos de resistência – ou sensibilidade – e recuperação dos choques, analisando essencialmente o comportamento das séries de dados utilizados como proxies para a dinâmica da atividade econômica. Optou-se por utilizar a variação do emprego formal como

proxy para a variação na atividade econômica brasileira contendo o período,

conforme já indicado.

Os trabalhos citados não conseguiram verificar a resistência e recuperação das regiões analisadas a esta última crise em função do curto intervalo temporal dos dados utilizados após este choque, informações anuais e trimestrais que consideravam apenas até o ano de 2011. Assim, por utilizar dados mensais que vão até o ano de 2014, este trabalho será o primeiro utilizando tal metodologia a conseguir analisar tais comportamentos das regiões frente à crise financeira. Contudo, mais uma vez é importante ressaltar que esta metodologia ainda não consegue incorporar todas as dimensões e aspectos envolvidos na discussão resiliência regional, sobretudo do ponto de vista evolucionário.

Quando se busca responder quão resilientes tem sido as regiões a choques recessivos, quando e em que medida as regiões recuperaram-se deles ou quando as trajetórias de crescimento foram permanentemente afetadas, envolve-se, de acordo com Fingleton et al. (2012), testar a existência de possíveis deslocamentos nas trajetórias de crescimento regional e taxas de crescimento regional.

Para uma análise exploratória inicial, Fingleton et al. (2012) propõem o uso de dois indicadores distintos. O Índice de Resistência busca captar a sensibilidade da região ao choque específico, sendo calculada pelo declínio percentual no emprego regional relativo ao emprego nacional durante a recessão. Uma região com um Índice de Sensibilidade (IS) maior que a unidade pode ser considerada menos resistente a um choque recessivo nacional que uma região com um índice menor que a unidade.

               1 1 1 1 BR BRF i iF E E E E IS (3.7) Em que, iF

E : Emprego da região i no último mês de recessão t = F.

1

i

E : Emprego da região i no mês inicial da recessão t = 1.

BRF

E : Emprego no Brasil no último mês da recessão t = F.

1

BR

E : Emprego no Brasil no mês inicial da recessão t = 1.

O segundo indicador utilizado na análise exploratória sugerida por Fingleton et al. (2012) consiste no Índice de Recuperação do Emprego Regional, calculado como o crescimento percentual do emprego regional pós-recessão como proporção do crescimento percentual nacional. Neste caso, um IR maior que 1 (um) indica

regiões com melhor recuperação pós-crise e IR menor que a unidade indica regiões com recuperação pós-crise inferior que a média nacional.

BR i E E IR % %    (3.8)

Em seguida, a estimação proposta se dá através do SUR (Seemingly Unrelated

Regressions), ou Regressões Aparentemente Não-Relacionadas, seguindo a

abordagem metodológica proposta por Finlgeton et al. (2012) .

De acordo com Fingleton et al. (2012) o modelo SUR é bastante flexível e, apesar de as interdependências inter-regionais não estarem expressas explicitamente em uma função particular e parametrizada e de não ser necessário a especificação a priori de uma matriz de pesos espaciais, o modelo permite ligações entre as unidades espaciais por serem deixadas indeterminadas como uma co-variância geral no termo de erro para cada equação de crescimento do emprego regional. Dessa maneira, um choque que afeta o crescimento do emprego em uma região pode afetar simultaneamente o crescimento do emprego em outras regiões (Fingleton et al. , 2012). O pressuposto implícito nesta utilização do modelo SUR é, segundo ele, que os efeitos espaciais decorrem do componente do erro não observado no modelo e não se devem a uma interação espacial direta em que a taxa de crescimento do emprego em uma região i é uma resposta direta das taxas de crescimento do emprego nas regiões j e k.

Para Cellini e Torrisi (2014), o modelo é um útil ponto de partida analítico para identificar a capacidade de resiliência das regiões. Consiste, segundo eles, de uma análise de regressões bastante simples, permitindo verificar de que forma as regiões reagem e se recuperam de choques em diferentes formas. Ademais, conforme já ressaltado em, Rodriguez-Fuentes e Padrón Marrero (2008), outra vantagem da estimação SUR é a sua eficiência no tratamento de dados de regiões heterogêneas, tal como é o caso da Espanha (no artigo em questão) e, por esta mesma lógica, a ser considerada no Brasil.

Cellini e Torrisi (2014) ressaltam que esta metodologia permite a geração de algumas respostas para questões relevantes de uma maneira simples e intuitiva. Segundo eles, os resultados permitem responder se as regiões tem respondido ao mesmo choque da mesma forma; se as regiões tem se recuperado dos mesmos choques de formas semelhantes; se há alguma diferença, ao longo do tempo, nas formas como as regiões reagem e se recuperam dos choques; quais são as regiões que apresentam os maiores graus de resistência aos choques recessivos; quais delas são as mais aptas a se recuperarem; se os choques recessivos tem o mesmo papel no formato da performance regional e se há alguma relação entre a performance de crescimento regional e a forma como as regiões reagem e se recuperam dos choques. Por outro lado, não se consegue levantar informações suficientes a fim de captar as formas como as regiões se adaptaram e modificaram suas estruturas, ou se ainda estão em processo de

adaptation e adaptability.

As duas experiências recentes de aplicação desta metodologia se referem a casos de países com disparidades regionais Norte-Sul, Reino Unido (Fingleton et

al., 2012) e Itália (Cellini e Torrisi, 2014), divisão que também se verifica entre as

regiões brasileiras, de forma significativamente potencializada, quando se comparado aos dois casos europeus estudados nas referências para esta parte da metodologia.

Fingleton et al. (2012) utilizam dados de emprego regional, dado que, para eles, no Reino Unido, nas recessões passadas, o declínio no emprego tem sido proporcionalmente maior que o declínio no produto. Dentro de uma configuração regional, afirmam eles, grande parte do impacto de choques recessivos severos são suportados pelo mercado de trabalho. Os dados utilizados referem-se a séries trimestrais entre 1971 e 2010 para as 12 maiores regiões do Reino Unido. Diferente de Fingleton et al. (2012), Carllini e Terrisi (2014) utilizam dados anuais para uma análise de longo prazo (1890-2009), o que possibilita, segundo eles, a captação dos efeitos regionais a choques extremos, como as Guerras Mundiais. Além disso, utilizam dados de PIB per capita, ao invés de dados de emprego em

função de uma rigidez no mercado de trabalho italiano, que o diferencia do caso britânico.

Em função dos períodos utilizados pelos dois trabalhos, que se encerram em 2010 e 2009, a análise da crise recente é necessariamente restrita, como admite Fingleton et al. (2012). Entretanto, a análise desta dissertação diferencia-se de ambos, neste aspecto, tanto por utilizar uma amostra com periodicidade mensal quanto por abranger um período que se expande até janeiro de 2014. Com esses dois fatores, obtém-se informações suficientes para captar a análise de resistência e recuperação regional à crise financeira.

A fim de detalhar a estrutura do modelo a ser testado, seguiremos a notação apresentada por Celline e Torrise (2014) para o modelo de Fingleton et al. (2014). As variáveis principais utilizadas são:

it

y : log do nível de emprego na região i no tempo t.

it

g : primeira diferença de yit. Medida do crescimento do emprego.

T t N i ,.... 2 , 1 ,... 2 , 1   k

D : Variável dummy associada a cada choque recessivo k. k 1,2,...K.

k

S : Variável dummy correspondente ao período pós-recessão, seguinte a cada

choque. Fingleton et al. (2012) assumem que o período pós-crise dure até o choque subsequente. Entretanto, segundo Cellini e Torrise (2014), pode-se assumir que o período pós-recessão tenha uma duração fixa.

De posse das variáveis, o modelo a ser estimado a fim de captar os impactos diferenciados dos choques nas economias dos estados é o seguinte;

i k ik i i k k i i i it it

D

D

D

S

S

S

e

g

(1) 1

(2) 2

...

( )

(1) 1

(2) 2

...

(3.9) Ou, de forma reduzida,

i K k k ik K k k k i it it

D

S

e

g

 1 1 ) (

(3.10) Em que, it

: Taxa de crescimento autônoma do emprego.

i

e : Termo de erro.

Através da estimação desta equação via SUR (Regressões Aparentemente Não Relacionadas), segundo os autores, tem-se a possibilidade de comparar os coeficientes e entre as regiões. O coeficientei(k) mostra a reação da região

i ao choque k e o coeficiente ik a recuperação da região i ao choque k. A

heterogeneidade entre os coeficientes i(k) e ik referentes a um choque

específico significam diferentes comportamentos de resiliência entre as regiões. Caso o coeficiente estimado ( ou ) tenha valor zero, isto é, não seja significativo, diz-se que não há efeito específico do choque k sobre a região i. Uma vez que o emprego formal, em nível e em índice, é não-estacionário, utilizou- se a variação do emprego formal com ajuste sazonal, que se mostrou estacionário para a grande maioria de estados brasileiros. Para os demais casos, a utilização de uma segunda diferença do emprego não iria gerar informações úteis para a análise que se propõe. Desta maneira, optou-se por proceder a estimação desta mesma forma, com esta ressalva. De acordo com Fingleton et al. (2012), ao proceder-se uma estimação deste tipo, não se tem interesse em quão bem o modelo SUR irrestrito se ajusta aos dados para cada região. O objetivo do exercício, segundo ele, é a comparação entre as regiões que o modelo possibilita. O período utilizado para a estimação desta etapa da metodologia compreende os meses entre janeiro de 2000 a janeiro de 2014, em função da disponibilidade de dados por parte do CAGED/MTE. Neste período, foram identificados três momentos de piora nas expectativas em relação à economia brasileira que mereceram intervenção da política econômica, por exemplo, com alterações na

taxa de juros (cuja inflexão para baixo se deu a partir de 2009). Dessa forma, a equação a ser estimada neste trabalho terá K=3 choques testados, embora o nosso foco recaia apenas sobre o terceiro deles, a crise financeira global. Tomazzia e Meurer (2009) evidenciam que os dois primeiros momentos escolhidos como choques demandaram respostas específicas de política econômica por parte do governo federal.

1

D : Terceiro Trimestre de 2001, período sob os efeitos da crise energética na

economia brasileira, Crise da Argentina e Efeitos sobre a economia mundial dos ataques terroristas de 11 de setembro nos Estados Unidos.

2

D : Quarto Trimestre de 2002. Período de elevação nas incertezas quanto à

economia brasileira com a eleição para presidente de Luis Inácio Lula da Silva, com o conhecido “Efeito Lula”.

3

D : Quarto Trimestre de 2008. Período dos impactos generalizados da crise

financeira global sobre os estados brasileiros.

O método utilizado para estimação das equações do modelo acima o SUR com regressores idênticos em todas as equações. Segundo Greene (2010), este é um caso comum em que o estimador por Mínimos Quadrados Generalizados é equivalente ao estimador da equação individual por Mínimos Quadrados Ordinários.

3.2. EVIDÊNCIAS EMPÍRICAS DOS DESDOBRAMENTOS DA CRISE