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A interação social se realiza por intermédio de signos, sejam lingüísticos ou não lingüísticos. Eles só são significativos, se fazem parte de conjuntos organizados. Assim, a atividade social se encarrega de produzir sistemas de signos, para que seja possível uma

comunicação eficiente. Há uma ciência, denominada Semiótica, que se propõe investigar os sistemas de significação em geral e os sistemas de signos. Pode ser definida como a ciência que estuda a natureza e a função dos variados sistemas sígnicos: naturais ou artificiais; visuais, auditivos, olfativos, etc.

Como a linguagem humana é fonte geradora de sentidos, todos aqueles que por ela se interessam, como lógicos, filósofos, psicólogos e lingüistas, entre outros, se debruçam, adotando perspectivas diferentes, sobre as dificuldades ligadas à significação lingüística. A significação lingüística é um campo que oferece dificuldades porque, conforme destaca Lopes (1997, p. 233), “o sentido não é nunca uma evidência, sendo, como sabemos, o plano dos significantes a única manifestação lingüística. O sentido, em si, é sempre o resultado de uma interpretação”.

Definida a semiótica, passemos à conceituação de Semântica, que é um ramo daquela. Essa disciplina se ocupa da significação ou dos sentidos veiculados pela linguagem humana.

Para que se efetue a análise do componente semântico de uma dada língua, faz-se mister levar em conta as postulações de uma teoria semântica geral, isto é, é preciso não se afastar de uma teoria dos universais semânticos, que defina termos básicos, estabeleça princípios metodológicos e determine as leis semânticas. Sabendo-se que a determinação do valor lingüístico dos componentes do enunciado não garante a significação, uma teoria semântica não pode deixar de recorrer ao contexto e à referência, sempre que necessário, para a realização de uma descrição mais segura. (Cf. Borba, 1986, p. 226).

Para não dificultar a análise, aspectos como subjetivismo e introspecção devem ser excluídos da descrição semântica, que deve guiar sua investigação pelo critério da regularidade no uso da língua. A regularidade é o conjunto de elementos que possibilitam o

processo de compreensão entre os interlocutores, pois seu valor é mais ou menos uniforme no uso da língua, independentemente da variação individual.

O estudo dos fenômenos semânticos pode centrar sua análise sobre o valor significativo das unidades léxicas ou sobre o valor da associação de tais unidades nos enunciados. No primeiro caso, estamos diante da semântica lexical, no segundo, da semântica frasal. Um grande número de semanticistas enxerga a oração como unidade de expressão. A palavra seria apenas um elemento integrante dos enunciados. Mas os semanticistas lexicais defendem que a palavra é a unidade codificada (do código lingüístico), alegando que têm de descrever a língua, o código, e não o discurso. Essas duas perspectivas não são opostas, são complementares na verdade. O conhecimento das unidades codificadas, palavras, pode nos levar à produção e à compreensão das orações. E o sentido completo da oração só pode ser compreendido pela associação bem estruturada dos itens léxicos.

O objetivo final da semântica, seja ela lexical ou frasal, é descrever a estruturação do léxico, tendo, para tanto, de construir métodos de análise e critérios de abordagem do significado e da significação como também determinar a estrutura dos significados e da significação.

Essas duas perspectivas de focalização dos fenômenos semânticos centram-se no significado, promovendo uma abordagem abstrato-conceitual, caminho que trilharemos neste trabalho. Ao lado dessas perspectivas, há outras que focalizam a significação, levando em conta não só o ambiente lingüístico, mas sobretudo o extralingüístico, no qual têm papel decisivo o contexto, a situação e as atitudes e disposições dos interlocutores, conforme as análises propostas por Ducrot, Greimas, configurando o arcabouço de uma semântica textual.

Dentro do campo de enfoque dos estudos tradicionais de semântica, a lexical e a frasal, a significação, em termos apenas lingüísticos, resulta da compatibilidade semântica

dos elementos constitutivos do enunciado. O significado dos enunciados, vale lembrar, não é unitário, é constituído por feixes de traços, o que significa que a compatibilidade se define em termos de combinatória de traços, como bem observa e exemplifica Borba (1986, p. 231):

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a. A criança corre. * b. A árvore corre.

No exemplo acima, a sentença b é inaceitável porque a forma verbal corre apresenta um traço (+ movimento) que não se combina com árvore (– movimento).

Porém, para não se obter uma visão fragmentada sobre o sentido, é preciso levar em conta que :

Como a significação está sujeita a um complexo de fatores, a densidade semântica dos enunciados varia segundo a atuação maior ou menor desses ingredientes. Por isso se diz que a significação é uma questão de grau que vai do aceitável e regular ao inaceitável ou anômalo ... (Borba, 1986, p. 229).

A observação de Borba esclarece que a anomalia semântica é relativa. Depende sempre do contexto, pois uma sentença tida como inaceitável pode tornar-se aceitável por sua colocação num contexto apropriado ou por ser retirada do isolamento, ampliando sua significação, tal como no exemplo a seguir, também extraído da referida obra de Borba (p.232):

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* a. A pedra come a faca.

b. Não use pedra para afiar suas facas porque a pedra come a faca.

A discussão sobre a relação de aceitabilidade / inaceitabilidade das sentenças é interessante porque nos fornece uma visão do modo como se dá a associação dos significados tanto no eixo paradigmático quanto no sintagmático.

Considerando as unidades semânticas em dois níveis, o nível do item lexical e o nível dos traços semânticos, pode-se compreender melhor como se dão tais processos associativos, denominados processos semânticos. O nível do item lexical pontua que a unidade semântica é morficamente delimitada, possui certo grau de autonomia do ponto de vista semântico e pode ocorrer em situações diversas. No nível dos traços, observa-se que há um conjunto de elementos mínimos semanticamente pertinentes que se combinam dentro do item lexical. Exemplificando, podemos dizer que a palavra gato, tratada no nível do item lexical, pode ocorrer em diversos contextos, independente do matiz semântico em que seja empregada. No nível dos traços, descrevemos gato como animal, doméstico, manso, felino.

Esses processos semânticos revelam que a formação do vocabulário é dada por leis associativas de compatibilidade de traços. No sintagma, esses traços se combinam com outros, próprios do enunciado ou do contexto, para que cumpram a função significativa. Dessa combinatória surgem fenômenos como a projeção, desfazendo casos possíveis de anomalia semântica, pela informação semântica que o significado de um termo fornece sobre outro(s). Vejamos um exemplo de Borba ( p. 232):

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a. Jandira tomou guaraná. b. Jandira já comeu guaraná.

c. Jandira comeu um cupuaçu inteiro.

d. Os japiins gorjeavam e voavam em algazarra.

Através do fenômeno da projeção, consegue-se inferir que cupuaçu é algo comestível e que japiim é uma ave canora. Descobre-se também que guaraná pode ser líquido ou sólido.

Como estamos enfocando a questão do significado e da significação, já é momento de lembrar que a variação significativa pode estar ligada ao contexto cultural (lugares, hábitos, crenças, atividades típicas entre outros traços). As variações se dão até mesmo dentro de um mesmo código lingüístico comum a mais de uma nação. Na relação entre Brasil e Portugal há certas diferenças desconcertantes. Por exemplo, o termo rapariga é bem

aceito em Portugal, equivalendo a moça; já no Brasil, tem um tom altamente pejorativo. A propósito, é difícil falar de semântica sem falar de lexicologia, afinal de acordo com Rey (apud Lopes, 1997), uma semântica lingüística deve abranger: a) o estudo léxico e b) o estudo das estruturas gramaticais. E como semântica, lexicologia e cultura mantêm relações significativas, os dois próximos capítulos versarão sobre lexicologia e cultura, respectivamente. Antes, porém, apresentaremos algumas teorias sobre o significado.

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