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EM DIREÇÃO À EVOLUÇÃO: PROCESSOS GENERATIVOS E ALGORITMOS EVOLUTIVOS

Inicialmente, é preciso esclarecer uma questão importante em relação aos termos utilizados, que por serem muito recentes no vocabulário arquitetônico, ainda causam certa estranheza e confusão. De acordo com Gabriela Celani (2011), um processo generativo pode ser utilizado visando à otimização (convergência) ou à variedade (divergência), por meio da geração de múltiplas alternativas. Os métodos generativos em geral utilizam procedimentos sistemáticos que incluem o uso de parâmetros e a avaliação de condicionais. Essas sequências de instruções precisas são chamadas de algoritmos. Ainda segundo a pesquisadora, o conceito de sistema

121 Do original em Inglês: The ope -ended characteristic of evolutionary computation is of particular interest for

architecture, as a design task can usually not be comprehensively described as a problem, but rather as an opportunity for creating novel possibilities within the framework of a given brief. Here, evolution is more about finding than searching, about the continual extension of the search space through novel solutions that emerge as the by-product of the evolutionary dynamics of selection, mutation and inheritance. In this way, evolutionary algorithms, which were traditionally utilised for optimisation, also enable performative morphological processes, adaption genesis and inherent novelty to be investigated in bounds greatly superseding hand-d i e e pe i e tatio .

generativo de projeto acabou sendo associado aos programas de modelagem paramétrica, dando uma falsa impressão de que os sistemas generativos são algo novo e que os sistemas generativos necessitam obrigatoriamente ser implementados em computador. Celani (2011), a partir de Fischer e Herr (2001), figura 62, propõe um esclarecimento sobre a questão:

FIGURA 62: SISTEMA GENERATIVO FONTE: FISCHER E HERR, 2001.

Em vez do designer projetar diretamente o produto, o designer projeta um sistema que projeta o produto, ou seja, um sistema generativo. Este sistema não precisa ser necessariamente digital, mas é com a mediação digital que seu potencial para a ser mais explorado.

Em seu livro Como arquitetos e designers pensam, publicado em sua primeira edição em 1980, Bryan Lawson (2011) apresentava um exame histórico que abordava as modificações do modo como arquitetos e designers projetavam em um processo analógico, passando do ato de se projetar por meio de desenhos para se projetar com a ciência. Logo a seguir especulava possíveis futuros papéis destes projetistas, onde vislumbrava a possibilidade de um caminho equilibrado (entre uma visão que ele considera mais conservadora e outra revolucionária) que busque a participação dos usuários nos processos de projeto (LAWSON, 2011 p. 38). Posteriormente o autor procurava estabelecer um breve olhar sobre as possibilidades que se abriam, na época, relacionadas às conversas com computadores.

Voltemos ao pensamento algorítmico, onde as instruções precisam ser passadas a través de uma linguagem compreensível, interpretadas (com ou sem o auxílio de uma máquina) e executadas de modo mais eficiente possível. As negociações executadas entre problema e solução são, portanto, da ordem interna do próprio sistema que passa a projetar possibilidades (ainda que possam haver influências e acoplamentos externos a partir de outros sistemas).

Chegamos em um momento da história da humanidade onde é possível, não apenas desenhar diretamente o produto, mas sobretudo, projetar o sistema que irá gerar o produto (ou vários).

Este processo de se projetar o sistema, tem levado também a uma observação mais ampla em relação à todos os sistemas, especialmente os naturais, a partir de uma abordagem mais holística. Como vimos anteriormente, conceitos como Emergência, Umwelt e Autopoiésis são totalmente compatíveis na formulação de um estado mental de preparação do processo de projeto e da concepção do Metadesign (ou design do design, conceito que será detalhado posteriormente).

Segundo Mauro Costa122 (2009), a arquitetura está relacionada com o estudo da vida. No

entanto, para o autor, os arquitetos se aproximam das analogias biológicas de muitas maneiras diferentes, muitas vezes com foco apenas na imitação morfológica sem entender os processos que estão na origem das formas observadas. Além disso, Costa (2009) destaca que é comum que arquitetos também reconheçam características específicas que permeiam os seres vivos, o seu potencial na organização social e cultural e até mesmo o impacto de seu trabalho nos ecossistemas, porém se distanciam da responsabilidade de produzir interfaces de grande escala entre os seres humanos e o meio ambiente.

Em uma extrapolação radical, mas consistente em função das hipóteses científicas atualmente disponíveis, Costa considera que as características utilizadas para definir o fenômeno vida podem ser aplicadas a entidades normalmente considerados não-vivas, como por exemplo, a arquitetura:

Através destas analogias se propicia a compreensão da complexidade da vida e do potencial da extrapolação desse conhecimento para outros campos do saber. Entre as áreas de conhecimento que se beneficiam dessas investigações se destaca a arquitetura biodigital para suas conexões com os processos de auto-organização, evolução e desenvolvimento presentes tanto nos seres vivos como em outros processos generativos, incluindo o próprio processo criativo. (COSTA, 2009 p. 75. Tradução nossa123

A aplicação de estratégias evolutivas na arquitetura a partir de analogias generativas e adaptativas baseia-se no conceito de complexidade, uma vez que deverão ser considerados tanto as questões de morfogenética internas aos processos, quanto as relações sistêmicas com condicionantes externos.

Costa (2009) também aponta para o fato de que o estudo da complexidade e da auto- organização permite programar organismo virtuais capazes de emular as interações existentes

122 Mauro Costa Couceiro é Arquiteto e Professor no d'ARQ FCTUC, Universidade de Coimbra.

123 Do original em Espanhol: A t a s de estas a alogías se p o o io a la o p e si de la o plejidad de lo i o

y del potencial de las extrapolaciones de estos conocimientos hacia otros campos del saber. Entre los campos del saber que se benefician de estas investigaciones se destaca la arquitectura biodigital por sus conexiones con los procesos de autoorganización, evolución y desarollo presentes tanto en los seres vivos como en otros procesos generativos, entre los cuales se destaca el propio proceso creati o.

nos ecossistemas. Essa capacidade de programação se dá através do desenvolvimento de regras e instruções específicas a serem seguidas, os algoritmos.

Segundo Tedeschi124 (2011), um algoritmo define o caminho pelo qual um resultado é obtido, a

partir dos dados iniciais. Os dados iniciais são chamados de entradas (inputs) e os resultados são chamados de saídas (outputs). Pa a o auto , um algoritmo especifica uma sequência de passos para se obter um resultado desejado, a partir dos dados de entrada. É uma sequência lógica e finita de instruções básicas, concebida por um ser humano e efetuada por um computador. (TEDESCHI, 2011. p.15. Tradução nossa125).

Na figura abaixo, Tedeschi (2011) apresenta um diagrama esquemático para a compreensão da ideia geral de um algoritmo:

FIGURA 63: ALGORITMO FONTE: TEDESCHI (2011)

O diagrama demonstra que, a partir de entradas ou questões iniciais que alimentam o sistema, um conjunto de instruções é aplicado (algoritmos) e o resultado é a saída, ou a resposta para as entradas apresentadas. Outra característica que o autor destaca, é que um algoritmo apresenta solução, não apenas para um problema específico, mas para todos os problemas que se assemelhem a este, ou seja, para uma classe de problemas.Para Terzidis126 (2011), a maioria das

teorias relacionadas aos princípios criativos da forma tratam principalmente de percepções e interpretações subjetivas, enquanto a lógica algorítmica, ao contrário, apresenta uma

124 Arturo Tedeschi (1979), arquiteto, desde 2004 têm complementado sua prática profissional na Itália, com uma

pesquisa pessoal sobre design paramétrico, com foco na relação entre arquitetura e novas ferramentas de design. Do

original em Inglês: A tu o Tedeschi, architect, since 2004 complemented professional practice in Italy with a personal

esea h o pa a et i desig , fo usi g o elatio ships et ee a hite tu e a d e desig tools. Fonte: Tedeschi 2011.

125 Do original em inglês: An algorithm specifies a sequence of steps to obtain a desired result, starting with input

data. It is a logical and finite sequence of basic instructions, designed by a human being and carried out by a computer.

126 Kostas Terzidis é Professor Associado na Harvard Graduate School of Design. Ele tem um PhD em Arquitetura pela

Universidade de Michigan (1994), mestrado em Arquitetura pela Universidade Estadual de Ohio (1989) e um Diploma de Engenharia da Universidade Aristóteles de Salónica, na Grécia (1986). Do original em Inglês: Kostas Te zidis is a Associate Professor at the Harvard Graduate School of Design. He holds a PhD in Architecture from the University of Michigan (1994), a Masters of Architecture from Ohio State University (1989) and a Diploma of Engineering from the A istotle U i e sit i Thessalo iki, G ee e . Fonte: http://icar2012.uauim.ro/committees/kostas-terzidis/. Acesso em 08/08/2014.

abordagem mais determinística, sugerindo coerência, organização e sistematização, dentre outras características. Assim, ele define um algoritmo:

Um algoritmo é um procedimento computacional para abordar um problema em um número finito de passos. Ele envolve dedução, indução, abstração, generalização e lógica estruturada. É uma extração sistemática de princípios lógicos e um desenvolvimento de um plano genérico de solução. Estratégias algorítmicas utilizam a busca por padrões repetitivos, princípios universais, módulos intercambiáveis e capacidades indutivas. O poder intelectual de um algoritmo encontra-se na sua habilidade de inferir novos conhecimentos e de estender alguns limites do intelecto humano. (TERDIZIS, 2011, p. 94. Tradução nossa127).

Algoritmos são entendidos, ainda segundo o autor, como operações matemáticas universais e abstratas que podem ser aplicadas para quase todo o tipo e para quaisquer quantidades de elementos. Quando os objetivos destas operações envolvem processos de inspiração ou mimese biológica, levando-se em conta conceitos evolutivos oriundos da genética, entramos nos domínios dos algoritmos genéticos.

Os algoritmos genéticos provêm de uma analogia em que se mimetizam os processos de hereditariedade, variação e seleção natural, e podem ser usados para obter soluções otimizadas. Algoritmos genéticos podem ser aplicados mesmo manualmente, através de pseudocódigo em qualquer das fases do processo conceitua, analisando um conjunto de problemas com um grande número de variáveis. Esses métodos de investigação, além de estimular uma metodologia proativa, permitem reconhecer que os processos de busca em campos infinitos de variabilidade só podem ser conseguidos através da otimização. Segundo Bentley128 e Corne129

127 Do original em inglês: A algo ith is a computational procedure for addressing a problem in a finite number of

steps. It envolves deduction, induction, abstraction, generalisation and structured logic. It is the systematic extraction of logical principles and the development of a solution plan. Algorithmic strategies utilise the search for repetitive patterns, universal principles, interchangeable modules and inductive skills. The intellectual power of an algorithm lies in its ability to infer new knowledge and to extend certain limits of the hu a i telle t.

128 Peter John Bentley (nascido em 16 de maio de 1972) é um autor britânico e cientista da computação baseado na

University College London. Nascido em Colchester, Inglaterra, possui uma licenciatura em Inteligência Artificial da Universidade de Essex) e um Ph.D. em Projeto Evolutivo. Sua tese de doutorado foi intitulada Design de Objetos Sólidos Usando um Algotitmo Genético. Do original em Inglês: Pete Joh Be tle o Ma is a B itish author and computer scientist based at University College London. Born in Colchester, England, he achieved a B.Sc. in Artificial Intelligence from the University of Essex and a Ph.D. in Evolutionary Design. His doctorate thesis was entitled Generic Evolutionary Design of Solid Objects usi g a Ge eti Algo ith . Fonte:

http://en.wikipedia.org/wiki/Peter_J._Bentley. Acesso em 08/08/2014.

129 David W. Corne é coordenador do curso em computação evolutiva (CE) da University of Reading. Sua primeira

pesquisa sobre horários evolutivos (com Peter Ross) resultou no primeiro programa de horários disponíveis gratuitamente bem sucedido e baseado em CE geral para as instituições de ensino e outros. Seus trabalhos posteriores em CE têm ocorrido em áreas como mineração padrão de DNA, modelagem promotora, filogenia, programação, design layout, telecomunicações, mineração de dados, questões de comparação entre algoritmos, e otimização multiobjectivo. Do original em Inglês: Da id W. Co e is a eader in evolutionary computation (EC) at the University of Reading. His early research on evolutionary timetabling (with Peter Ross) resulted in the first freely available and successful EC-based general timetabling program for educational and other institutions. His later EC work has been in such areas as DNA pattern mining, promoter modeling, phylogeny, scheduling, layout design, tele o u i atio s, data i i g, algo ith o pa iso issues, a d ultio je ti e opti izatio . Fonte:

(2011), para que se constitua um framework voltado para a evolução criativa, são necessários cinco elementos:

- Um algoritmo evolutivo; - Uma representação genética;

- Uma embriogenia usando componentes; - Uma representação fenotípica;

- Funções de aptidão e/ou processamento dos inputs do usuário. (BENTLEY e CORNE, 2011 p. 121. Tradução nossa.)130

Assim, para haver um sistema evolutivo de criação, é necessário que haja um algoritmo evolutivo que gere novas soluções. Bentley e Corne (2011) admitem que há quatro modos de algoritmos evolutivos serem aplicados: algoritmos genéticos, programações genéticas, estratégias evolutivas e programações evolutivas, todos variando o modo como genótipos e fenótipos são mapeados e representados no processo. Muitas questões podem ser exploradas por algoritmos evolutivos, como por exemplo, múltiplos objetivos, multimodalidades, convergências, ruídos, fuzzy, entre outras estratégias.

A representação genética a partir do genótipo, define um espaço de busca de um algoritmo. Para uma computação evolutiva criativa, onde os genes representam um número variável de componentes, o espaço de busca é variável e uma representação mal feita pode colocar soluções diferentes muito próximas, de um ponto de vista da homogeneização da informação, e tornar a busca pelas melhores soluções muito difícil (BENTLEY e CORNE, 2011).

A embriogenia é um tipo de processo de mapeamento a partir do genótipo para o fenótipo, onde uma série de instruções de crescimento acontecem dentro do sistema e que vão determinar como o fenótipo irá se desenvolver. O processo de embriogenia é muito usado por sistemas evolutivos exploratórios porque ela fornece os mecanismos para construir todas as soluções a partir dos elementos componentes.

A representação fenotípica acontece em decorrência da embriogenia, e deverá ser projetada para permitir a avaliação direta das funções de aptidão, sem cálculos ou transmissões intermediárias. Bentley e Corne (2011) citam como exemplo que se estamos projetando circuitos, a representação deverá definir redes de componentes conectados; se estamos projetando edifícios, a representação deverá prever a forma externa e/ou paredes internas,

130 Do original em inglês: A e olutio a algo ith ; A ge eti ep ese tatio ; A e oge usi g o po e ts;

pisos e escadas. (BENTLEY e CORNE, 2011). Mas sobretudo, o critério mais importante e imprescindível é relacionado à capacidade de avaliação. Assim, são as funções de aptidão aquelas responsáveis por fornecer um valor de avaliação para cada solução, o que muitas vezes não é uma tarefa fácil, em função de que em sistemas parametrizados, os resultados podem ser caóticos, por assim dizer, em função das aleatoriedades implicadas no processo.

Nos parece importante destacar, é que estes sistemas estão sendo usados para fornecer possibilidades criativas durante o processo. A programação pode ajudar a otimizar os processos de projeto em arquitetura, possibilitando uma grande variedade de soluções para serem experimentadas e testadas em tempo real. Os projetistas cada vez mais se veem apoiados por uma série de instrumentos e processos que fornecem possibilidades de melhorar e otimizar a performance dos projetos. Sabemos que esta comunicação entre o projetista e ele mesmo, e entre ele e outras pessoas, pode ser mediada digitalmente e deste modo, exploramos até aqui a possibilidade ligada a algoritmos com a influência direta da biologia e da genética. Existem outras possibilidades, como a que analisaremos a seguir, que explora questões ligadas à linguagem como elemento estruturador da programação, gerando gramáticas e vocabulários como estratégias de projeto e de produção arquitetônica.