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3.1 O Cenário: uma nova demanda

3.1.1 Em foco: o Conflito

A palavra conflito, de acordo com os dicionários de língua portuguesa, significa oposição de interesses, sentimentos, ideais; luta, disputa, desentendimento; briga, confusão, tumulto, desordem.

O conflito ocorre sempre que há divergência de opiniões. Quem vive em sociedade experiencia situações de conflito; faz parte integrante da vida social – seja contemporânea ou antiga. Mas, em geral, só se percebe o conflito quando este produz manifestações violentas.

O tema do conflito na escola, sobretudo sob o significante violência, vigora hoje nas mídias, nos debates educacionais, nos centros de pesquisa. Chrispino (2007) ressalta que os novos problemas de violência escolar no Brasil são antigos em outros países, como Estados Unidos, França, Reino Unido, Espanha, Chile, Argentina, entre outros. Nestes países, já se registra um conjunto de políticas públicas eficientes, dirigidas aos diversos atores componentes desse complexo sistema que é o fenômeno da violência escolar. Tais países possuem já alguma tradição em programas de redução da violência escolar.

No Brasil, é possível enumerar alguns estudos pontuais até por volta de 2000, aumentando de modo significativo a partir de então28. Registram-se pesquisas relacionadas à violência escolar com enfoque na visão docente29; relacionadas a elementos da comunidade30; referentes ao rendimento escolar31; à gestão escolar32; aos alunos33.

Segundo Nebot (2000), os conflitos educacionais provêm de ações próprias dos sistemas escolares ou são oriundos das relações que envolvem atores da comunidade mais ampla. Ainda, segundo o autor, podem vir categorizados em organizacionais, culturais, pedagógicos e de atores. Aqui, interessam estes últimos, descritos pelo autor como: os conflitos entre grupos e subgrupos que ocorreram em algum âmbito (turma, corpo docente, direção, por exemplo); em relação aos familiares; e os individuais, em que o causador do conflito recai em um membro da comunidade escolar, muitas vezes estigmatizado pelo todo. Chrispino (2007) defende que o processo de massificação do acesso à escola revela-se o grande causador dos conflitos na educação, uma vez que passa a vigorar a heterogeneidade no alunado – de culturas, de opiniões, de modos de aprender –, sobretudo na escola pública. Para essa autora, a escola não se programou, predominando o mesmo modelo idealizado para um público restrito e similar.

Talvez se possa pensar o conflito como pertinente à interação dos seres humanos – falantes –, que se relacionam por meio da linguagem, a qual encerra em si mesma o mal- entendido. No processo de transmissão que compõe a educação, esse mal-entendido é constituinte; ou seja, nunca se escuta exatamente o que foi dito pelo outro, e sempre se transmite algo além do que se deseja. Logo, a escola é um lugar de produção de conflito.

A Psicanálise aborda o conflito do ponto de vista psíquico, o qual envolve diferentes elementos – desejos, pulsões, sentimentos, representações, estrutura. A concepção freudiana parte do estudo de casos de histeria e constata a presença irremediável de conflitos que fazem do mundo interior um verdadeiro tumulto de contradições que lhe são intrínsecas.

Desse modo, a resolução de um conflito não consiste em procurar silenciar por completo uma pulsão, já que isso dificilmente seria possível, ou mesmo desejável. De acordo com Laplanche & Pontalis, a psicanálise considera o conflito como constitutivo do ser

28 Abramovay e Rua (2002), Ortega e Del Rey (2002), Chrispino e Chrispino (2002), entre outros. 29 Oliveira (2003); Oliveira (2004).

30 Silva (2004). 31 Vale (2004). 32 Carreira (2005).

humano, e, desse modo, pode-se sistematizar diferentes tipos em diversas perspectivas: conflito entre o desejo e a defesa, conflito entre os diferentes sistemas ou instâncias, conflitos entre as pulsões, e por fim o conflito edipiano, onde não apenas se defrontam desejos contrários, mas onde estes enfrentam a interdição (1986:131).

Portanto, para o enfrentamento destes, o sujeito deve se haver com o próprio desejo inconsciente, fazendo-se necessário perceber o conflito dentro do contexto de uma história pessoal para que se possa entender seu papel.

Já para o Teatro, o conflito é o que permite o desencadeamento de uma ação. Numa proposta de improvisação e criação, parte-se de uma situação de conflito para a busca de uma solução cênica, possibilitando uma construção teatral. Nesse sentido, torna-se elemento bem- vindo nessa modalidade artística.

A maioria dos autores defende que, para lidar com o conflito na educação, deve-se aprender o ofício da mediação – procedimento no qual os participantes, com a assistência de uma pessoa imparcial, o mediador, colocam a questão em disputa com o objetivo de desenvolver opções, considerar alternativas e chegar a um acordo mutuamente aceitável. As vantagens da medição mostram-se numerosas, mas ainda pouco se mensura a respeito dos resultados das ações desenvolvidas no Brasil.

Muitas ações e programas que começam a se delinearem, de modo geral, vêm sustentados em parcerias com as instâncias de defesa social34, colocando a questão do conflito na escola no campo do delito, orientados pelos pressupostos que balizam as condutas policiais. Por vezes, as ações na escola culminam em atos de violência que extrapolam as possibilidades de controle por parte dos educadores, os quais demandam uma intervenção do setor de segurança. Mas Chrispino (2007:6) destaca:

Se o conflito se manifesta de forma violenta é porque já existia antes na forma de divergência ou antagonismo, e nós não soubemos ou não fomos preparados para identificá-lo; além disso, toda vez que o conflito se manifesta, nós agimos para resolvê-lo, coibindo a manifestação violenta, esquecendo que os problemas mal resolvidos se repetem!

Os conflitos em educação perpassam questões relacionadas à aprendizagem e ao comportamento dos alunos – a recusa em relação ao saber e em relação às regras, as quais

34 Em Minas Gerais, desde 2005, o programa Mediação de Conflitos da Secretaria de Defesa Social vem atuando de modo intersetorial. Atualmente, tem seu programa ampliado, em parceria com a Secretaria da Educação com a capacitação de educadores, no sentido de se prepararem para a prevenção e mediação de conflitos na escola.

são atribuídas, muitas vezes, pela escola, às famílias e/ou às demais questões referentes ao ambiente socioeconômico e cultural dos alunos.

As causas não se resumem a fatores objetivos. E a generalização das mesmas por vezes acaba por orientar ações pedagógicas sem maiores resultados, persistindo situações que, não raro, requerem a presença da polícia nos estabelecimentos escolares. Desse modo, culminam, muitas vezes, no adoecimento de educadores e na desistência da profissão.

Este se aponta como um contexto onde se constata a vigência do fracasso escolar. Trata-se de uma gama de conflitos, no que se refere aos jovens e suas relações na escola.