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Emergência e popularização das redes sociais

Percurso 2: Entre política e meios

2.3. Emergência e popularização das redes sociais

A popularização da Internet é crescente e, cada vez mais, nítida, o que faz com que o uso de diversas mídias de interatividade social represente um aspecto constitutivo do cotidiano da sociedade contemporânea. Tal advento hodierno produziu mudanças significativas e fundamentais para a sociedade como um todo, uma vez que passou a haver a “possibilidade de expressão e sociabilização através das ferramentas de comunicação mediadas pelo computador (CMC)” (RECUERO, 2009, p. 24). Tais ferramentas fizeram com que os atores – definidos pela autora como as pessoas, instituições ou grupos que se utilizam

da rede, mas que, no caso da Internet, não são sempre discerníveis, uma vez que estes são submetidos ao distanciamento inerente às interações sociais (virtuais) – pudessem construir- se, interagir e comunicar com outros atores. É a partir dessa perspectiva de interação que surge, a partir da década de 1990, o estudo das redes sociais digitais. “É, neste âmbito, que a rede como metáfora estrutural para a compreensão dos grupos expressos na Internet é utilizada através da perspectiva de rede social.” (RECUERO, 2009, p. 24) Para a autora, os sites de redes sociais comportam a categoria de sistemas focados na exposição pública dos atores, além da publicização das conexões com os indivíduos, características que não são inerentes aos sites que não são de redes sociais.

Ainda é preciso destacar que, para a autora, há dois tipos de redes sociais: as de filiação e as emergentes. Estas tendem a ser menores, pois exigem maior esforço do usuário para a manutenção da rede, uma vez que o usuário é responsável inteiramente pela produção de seu conteúdo, além da limitação do número de atores efetivamente participantes da interação - já que muitos sites de redes sociais limitam a quantidade de comentários - gerando maior qualidade de conexões, como o Fotolog17 e o weblog18. Já as redes sociais de filiação, mantidas pelo sistema e mais estáveis, pois há a produção de conteúdos e relações ainda que o usuário não mantenha regularidade de acesso, permitem que os atores tenham listas de contatos extensas, pois uma vez adicionado o indivíduo, ali ele permanece, sem que necessariamente haja interação, como é o caso do Orkut19 e Facebook.

De maneira geral, para Recuero, citando Boyd & Ellison (2009, p. 102), tanto as redes de filiação como as emergentes permitem

i) a construção de uma persona através de um perfil ou página pessoal; ii) a interação através de comentários; e iii) a exposição pública da rede social de cada ator. Os sites de redes sociais seriam uma categoria do grupo de softwares sociais, que seriam softwares com aplicação direta para a comunicação mediada por computador. Embora esses elementos sejam mais focados na estrutura do sistema utilizado pelos autores é, entretanto, na apropriação que reside a principal diferença apontada pelas autoras. Nesta definição, o foco da atenção dos sistemas não está mais na busca dos atores pela formação das redes sociais através de novas conexões. A grande diferença entre sites de redes sociais e outras formas de comunicação mediada pelo computador é o modo como permitem a visibilidade e a articulação das redes sociais, a manutenção dos laços sociais estabelecidos no espaço off-line. (RECUERO, 2009, p. 102).

17 O Fotolog permite ao usuário a postagem de fotos acompanhadas de pequenos textos e comentários de outros

usuários.

18 O weblog é um diário online, no qual as postagens são alinhadas de forma cronológica e que permite

comentários de outros usuários.

19 O Orkut é uma rede social semelhante ao Facebook que permite a confecção de um perfil de usuário, a

aquisição de inúmeros contatos, a interação entre os usuários, e a formação de grupos em comunidades específicas.

É preciso então destacar que, embora os laços sejam construídos on-line nas redes sociais, estes podem transcender tal espaço, produzindo efeitos fora dele.

A aparição, assim, e expansão das Tecnologias da Informação e da Comunicação estão transformando o sistema midiático, uma vez que a digitalização das comunicações e a emergência de uma rede mundial integrada pela qual circula informação provocou o surgimento de novos tipos de comunicação, aos quais Scolari (2008) denomina “comunicação digital interativa”. Dessa forma, essa nova conjuntura desafia a hegemonia de comunicação de massas, pois os novos meios interativos, pautados nas redes e na colaboração dos usuários, estão desafiando os antigos meios de comunicação de massa.

Tendo em vista tal conjuntura, o autor destaca as características, apontadas por diversos autores, desse novo cenário:

(i) Sua digitalização: a informação deixa de ser manejada analogicamente para ser convertida em bits;

(ii) Sua hipertextualidade: a linearidade do texto tradicional combina-se com outros textos a partir dos quais se pode ter acesso a outras informações;

(iii) Seu caráter reticular: em contraposição ao esquema de “de uma pessoa a muitas”, próprio da comunicação de massas, vai-se configurando um modelo organizado em forma de rede que permite a comunicação “de muitas pessoas a muitas”;

(iv) Sua interatividade: ao invés de um receptor passivo que apenas recebe a informação, surge um receptor ativo com capacidade de produzir conteúdos comunicativos;

(v) Sua multimodalidade: confluem em um mesmo suporte informações de diferentes naturezas (textos, sons, vídeos) que antes requeriam suportes específicos.

Sendo assim, para contrapor as características entre o novo e o velho, o autor elabora uma oposição entre as formas de comunicação digital e a tradicional comunicação de massas:

Comunicação de massas (“Velhos meios”)

Comunicação digital interativa (“Novos meios”)

Difusão (de uma pessoa a muitas) Caráter reticular (de muitas pessoas a muitas)

Sequencialidade Hipertextualidade

Monomodalidade Multimodalidade

Passividade Interatividade

Tabela 1: Velhos meios frente a novos meios (SCOLARI, 2008, p. 79)

Dada a conjuntura atual, o autor argentino afirma que “a transição do átomo ao bit é um dos cavalos de batalha preferidos dos ciberfilósofos da sociedade digital” (2008, p. 80). A digitalização, processo no qual os sinais elétricos passam de um domínio analógico a um binário, surge como resposta às distorções e perdas de informação do sistema analógico:

Por meio desse processo o sinal analógico original se converte em um valor numérico em sistema binário. Dessa maneira, um simples sinal analógico – a voz do cantor - se registra como uma massa de valores numéricos expressados por meio do sistema binário, os quais se podem reconverter em sinal analógico em qualquer momento e sem nenhum tipo de distorção. Os sistemas digitais também permitem que os sinais sejam amplificados, modulados, arquivados, identificados, reconvertidos e reproduzidos mantendo-se idênticos ao original, sem perder informação. (SCOLARI, 2008, p. 80, tradução nossa20)

Sem digitalização não haveria hipertexto nem interação, uma vez que ao reduzir a textualidade a uma série de bits, pode-se navegar, modificar ou construir uma rede de documentos de forma simples e rápida. Atualmente, toda a comunicação midiatizada é digital, pois muito além do suporte (papel, emissão radiofônica, televisão), em maior ou menor medida o processo de produção é digitalizado. Portanto, a digitalização é fundamental por permitir a irrupção de novas formas de comunicação.

A partir dessas características, é preciso debruçar-se sob a aparição de novos modos de produção de comunicação mais cooperativos, de novos produtos comunicativos hipertextuais e multimídia, e de novas formas de consumo midiático mais participativas do que as propiciadas pelos meios de massa. Dessa forma, o autor propõe voltar o olhar às hipermediações (os processos) e não mais aos novos meios digitais (os objetos). Nessa esteira

20 Texto original: “Por medio de este proceso la señal analógica original se convierte en un valor numérico en

sistema binario. De esta manera una simple señal analógica -la voz del cantante-se registra como una masa de valores numéricos expresados por medio del sistema binario, los cuales se pueden reconvertir en señal analógica en cualquier momento y sin ningún tipo de distorsión. Los sistemas digitales también permiten que lasseñales sean amplificadas, moduladas, archivadas, identificadas, reconvertidas y reproducidas manteniéndose idénticas al original, sin perder información.”

de pensamentos, o autor define como hipermediações: “processos de intercâmbio, produção e consumo simbólico que se desenvolvem em um entorno caracterizado por uma grande quantidade de sujeitos, meios e linguagens interconectados tecnologicamente de maneira reticular entre si.” (SCOLARI, 2008, p. 113-114, tradução nossa21)

Considerando assim as hipermediações, Slimovich (2012, p. 3) propõe alguns questionamentos, como: que discursividades políticas geram as redes sociais? Como se dá a interação entre o candidato e os internautas? Que tipo de democracia se joga na arena política de um espaço público alargado? Exemplo disso é o caso de Obama nos Estados Unidos, que renovou a esfera pública ao incorporar o cidadão de uma maneira ativa na vida política e mudou as regras e formas de interação. Além disso, durante o processo eleitoral americano, as plataformas digitais ampliaram o diálogo entre a própria cidadania e produziram novas formas de persuasão política, ao estabelecer um novo tipo de vínculo entre ativistas e governantes. Assim, nas palavras da autora:

Nesse sentido, e tendo em conta que se expande o poder da Internet sem decrescer o dos meios de massa, a multiplicidade de vozes que se somam nas redes sociais e espaços digitais contribui para alertar os cidadãos que observam o entorno e que aplicam suas perícias de consumidores às responsabilidades cívicas. Também é necessário especificar que com o surgimento das redes sociais ficou claro que o público replicante na Internet não só está constituído por cidadãos militantes ou pertencentes a partidos políticos; mas também por seu alargamento. (SLIMOVICH, 2012, p. 3, tradução nossa22)

Portanto, é possível observar, nas últimas décadas, a transição que está ocorrendo não só no consumo dos meios, mas também na ressignificação de práticas em torno disso. Do telégrafo aos dispositivos móveis com acesso à internet muito se caminhou. Do acesso às notícias por meio da imprensa escrita até a conectividade do século XXI também. A sociedade, em certa maneira, reorganizou-se a partir dessas novas práticas de comunicação, orquestrando o rearranjo da comunicação política, que acompanhou de muito perto as novas configurações tecnológicas. Sendo assim, cabe agora pensar na dinâmica de consumo da

21 Texto original: “procesos de intercambio, producción y consumo simbólico que se desarrollan en un entorno

caracterizado por una gran cantidad de sujetos, medios y lenguajes interconectados tecnológicamente de manera reticular entre sí.”

22 Texto original: “En este sentido, y teniendo en cuenta que se expande el poder de Internet sin decrecer el de

los medios masivos, la multiplicidad de voces que se suman en las redes sociales y espacios digitales contribuye a ciudadanos alerta que observan el entorno y que aplican sus pericias de consumidores a las responsabilidades cívicas. También, es necesario especificar que con el surgimiento de las redes sociales se puso de manifiesto que el público replicante en Internet no sólo está constituido por ciudadanos militantes o pertenecientes a partidos políticos; sino que también se ha ensanchado.”

televisão até o uso da Internet frente ao cenário político, uma vez que este passa a ser cada vez mais interativo e menos verticalizado. Propomos, portanto, breve reflexão acerca do papel e da relevância das redes sociais na conjuntura política atual.