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CONCLUSÕES DO ESTUDO

EMPÍRICA

O estudo que agora se disponibiliza constitui, a nosso ver, uma primei- ra e necessária abordagem ao fenómeno do voluntariado missionário. Sendo um estudo eminentemente exploratório, a sua importância sairá tanto mais reforçada quanto este mesmo estudo for secundado por um outro que lhe identifique os “ganhos” efetivos obtidos pela intervenção do voluntário no terreno durante a sua estadia. Dito de outra forma, este estudo carece de um outro que avalie o impacto a curto, médio e longo prazo da ação voluntária missionária, quer do ponto de vista dos efeitos “visíveis”, quer do ponto vista mais simbólico, de forma imediata ou dife- rida no tempo (lembre-se, a propósito, que a relação de dádiva constitui, antes de mais, uma mediação simbólica).

Assim, propõem-se um conjunto de dimensões e categorias de análise que carecem de elaboração de indicadores de impacto no terreno mais detalhados. Alguns exemplos:

O presente estudo permitiu “mapear” e organizar as áreas de atuação preferenciais levadas a efeito pelas organizações no terreno, ao longo destes anos. Todavia, torna-se necessário encontrar indicadores claros e objetivos que permitam avaliar a eficácia das intervenções realizadas no terreno em cada uma das áreas consideradas (educação, alfabetização, formação; saúde; promoção humana; infraestruturas; desenvolvimento

indicadores devem ser estruturados a partir das informações obtidas através de um conjunto vasto de fontes e protagonistas, tais como de re- gistos provenientes das instituições no terreno, as comunidades-alvo de intervenção e ainda complementadas com os relatos que resultam das experiências dos voluntários missionários.

O impacto da ação voluntária missionária nas comunidades de acolhi- mento pode ser verificado nas diferenças existentes no terreno antes e depois da presença do voluntário missionário. Questionados sobre este aspeto, os nossos entrevistados referiram mudanças objetivas ocorri- das do ponto de vista material, educativo, cultural e até económico. Seria importante sistematizar e verificar estas alterações, de modo técnico e científico, procurando, desta forma, ultrapassar a mera perceção indivi- dual do voluntário missionário, uma limitação natural deste primeiro es- tudo. Por isso, numa segunda fase, seria de todo conveniente entrevistar também os autóctones e as pessoas-líder dos projetos que, de facto, per- manecem no terreno, com o objetivo de analisar fatores determinantes e materialmente relevantes dessa transformação. Tal análise permitirá clarificar se houve uma apropriação efetiva da dinâmica dar-receber-re- tribuir própria da relação de dádiva e até que ponto esta é reproduzida e partilhada na experiência e vivência com os outros, explicitando o seu impacto.

Para além da eficácia dos meios ou das técnicas que se implementaram no terreno, seria interessante encontrar/nomear mediações concretas do “laço-para-o-vínculo” na relação de dádiva estabelecida entre o vo- luntário e as populações-alvo, mediações que se terão traduzido em ex- pressões reais de transformação pessoal e comunitária ocorridas nas populações-alvo depois da ação do voluntário. Tratando-se de dimensões

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simbólicas e culturais, tal intenção requererá, a nosso ver, a realização de en- trevistas com os habitantes locais, especialmente os mais comprometidos ou afetados pela ação dos voluntários. Na medida em que as populações locais têm a oportunidade de contactar com outras representações de vida e mo- delos culturais, proporcionadas pela presença dos voluntários, será de aferir em que medida ocorreram alterações nos estilos de vida dos autóctones após a passagem dos voluntários nas suas vidas, assim como perceber as altera- ções de perspetivas de vida assumidas pelos voluntários após o regresso. Para medir o impacto da ação no terreno, torna-se importante compreender uma cadeia de interrelações, tais como os recursos materiais disponibiliza- dos, o esforço realizado pelo voluntário, o investimento feito pela instituição e os “ganhos” obtidos pelas populações. Será de particular interesse avaliar até que ponto existe uma relação positiva entre as competências técnicas e pessoais do voluntário, a formação dada pelas instituições aos voluntários antes da partida e os resultados concretos observados no terreno através de indicadores de eficácia dos projetos em que estiveram envolvidos.

Por outro lado, aconselha-se uma análise mais cuidada às formas como as instituições fazem a preparação, monitorizam a execução e realizam avalia- ção dos projetos levados a efeito pelos voluntários, percebendo se existe uma evolução neste processo. Tal análise permitirá, entre outros aspetos, afinar diagnósticos de necessidade de intervenção, traçar perfis de voluntários a enviar e, respeitando a missão específica de cada uma das instituições, pro- mover, sempre que possível, a construção de parcerias e a definição de estra- tégias comuns, de modo a aumentar a eficácia da ação no terreno. O sentido desta cooperação torna-se premente se se levar em consideração que a maio- ria destas instituições é animada por uma mesma intencionalidade cristã. Partindo da constatação de que o voluntário missionário sai enriquecido des- ta sua experiência de missão, seria pertinente clarificar em que dimensões se

traduzem este “ganho” na sua vida e como é que ele é rentabilizado pelo pró- prio voluntário na sua vida pessoal, cívica e de fé, ou seja, importa perceber que níveis de mudança se operaram na própria pessoa e na instituição que a enviou e se estes ganhos são valorizados e reaproveitados pelas instituições. Para evitar o excesso de tecnicidade na intervenção ou a pura emotividade na doação, e partindo da ideia de que a relação de dádiva e a competência técnica não são incompatíveis, seria interessante averiguar, através das histórias de vida qual é a relação/tensão existente entre estes dois pólos na experiência vivida pelos voluntários missionários. Ou seja, como equilibra o voluntário competências e motivações, eficácia na ação e compreensão do significado profundo da sua entrega? Consegue interpretar/separar quando está imerso numa experiência de alcance ético e não somente de contornos estéticos? O inquérito por questionário sobre as motivações já deu muitas indicações a este respeito, mas o aprofundamento desta questão pode trazer luz sobre o desenvolvimento pessoal do voluntário.

Num outro plano muito próximo deste, seria de avaliar se a permanência maior ou menor no terreno tem influência direta na equação expressa no número anterior ou se, pelo contrário, ela depende mais de outros fatores exógenos, tais como os condicionalismos do terreno e as características da população-alvo, a natureza da missão, a especificidade da instituição que envia, a equipa que integra (se integra), ou outros que se venham a apurar... Para além deste fator de ordem temporal, será de averiguar acerca da impor- tância que a continuidade ou não dos projetos no terreno exerce sobre as ex- pectativas do voluntário, à partida e à chegada da missão. Por fim, ainda neste registo, convém avaliar se e em que condições aqueles que permanecem no terreno, após a intervenção, têm os recursos e a capacidade para exponen- ciar o que foi feito e, com isso, alimentar ou frustrar um olhar esperançoso de quem foi enviado.

No documento Voluntariado: Missão e Dádiva (páginas 89-91)