• Nenhum resultado encontrado

5 ANÁLISE DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

5.3 EMPRESAS PÚBLICAS

Já nota-se, pelo exposto, que coube à jurisprudência elucidar o alcance das normas imunizantes, em especial, as normas de não incidência tributária sobre as pessoas políticas e seus decorrentes.

Destarte, mesmo não sendo explícito os alcances da imunidade recíproca, a matéria foi extensamente tratada na jurisprudência pátria, pontuando, assim, suas extensões e limites de incidência.

Assim, mesmo que não da forma vanguardista como se propõe, a admissibilidade e reconhecimento e alcance da aplicação da imunidade recíproca sobre as pessoas jurídicas de direito privado, já se encontram aplicados pelo Supremo Tribunal Federal, como pode ser visto no aresto do Recurso Extraordinário 407099/RS206.

No referido julgado, o Ministro Carlos Velloso, reconheceu a extensão da imunidade tributária à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. No acórdão, o relator aduz que as empresas públicas que atuem na prestação de serviço público sem exploração da atividade econômica e de prestação obrigatória pelo Estado estão abarcadas pela incidência da imunidade recíproca.

Nesse sentido, afere-se, que mesmo sem previsão específica, a imunidade aplicada sobre as empresas públicas é conhecida como implícita nos preceitos da regra contida no artigo 150, inciso IV, alínea a da Constituição Federal.

Dessa forma, o Recurso Extraordinário n. 407099/RS consolidou o posicionamento do Supremo Tribunal Federal sobre a incidência da imunidade tributária recíproca às pessoas jurídicas de direito privado consoante defendido neste trabalho.

Sob esse prisma, é necessário averiguar os alcances que a jurisprudência brasileira tem conferido ao preceito imunizante no que concerne à aplicação sobre pessoas jurídicas de direito privado.

Nessa linha de raciocínio, a Corte Constitucional, no que se refere as empresas públicas, enfrentou duas situações. Primeiro, se a empresa pública prestadora de serviço público, em regime de substituição tributária de terceiros, seria abrangida pela imunidade tributária recíproca. Depois, se as empresas estatais, que, no exercício de sua atividade

206BRASIL., Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 407099/RS. Tribunal Pleno. Relator Ministro

realizassem além do serviço público outras atividades que incluíssem exploração econômica, deveriam ter o benefício da imunidade tributária.

No que se refere à empresa estatal prestadora de serviço público em substituição de terceiro, a matéria foi resolvida pelo Supremo Tribunal Federal, no Agravo Regimental em Recurso Extraordinário n. 446530/SC207. O relator, Ministro Ricardo Lewandowski, ao conhecer do Recurso onde a Infraero pleiteava a não incidência tributária quando, em regime de substituição tributária, desejava não recolher o imposto por serviço prestado por terceiro, reconheceu que era indevido o pedido da estatal.

Nesse aspecto, concorda-se com o relator do referido recurso, a imunidade tributária recíproca é um instituto de índole essencialmente subjetiva. Assim, a sujeição passiva, objeto da imunidade recíproca, deve ser a sujeição de fato e não a de direito.

A sujeição de direito gera para o substituto apenas a obrigação acessória de recolher o tributo, o contribuinte de fato, substituído, é que tem o ônus de arcar com o tributo.

Deste modo, sendo a imunidade recíproca instituto de aplicabilidade inerente a natureza subjetiva do contribuinte, devido a ausência de ônus financeiro para a empresa pública, não se entende justo a concessão da extensão dos efeitos da norma imunizante para as situações de substituição tributária.

Concluindo, assim, à análise sobre a aplicação da imunidade recíproca à empresas públicas, impende discorrer sobre as empresas que possuam objeto misto. Nesse aspecto, determinadas empresas estatais, pela sua própria finalidade, desempenham atividades que convergem, simultaneamente, em disponibilização de um serviço público e atividades secundárias de exploração econômica.

Neste caminho, novamente a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos foi a responsável por levar ao Supremo Tribunal Federal, através do Recurso Extraordinário n. 601.392/PR208, a discussão sobre a incidência da imunidade, uma vez que, no exercício de sua atividade, conjuga a disponibilização dos serviços de postagem com outros serviços de natureza eminentemente privada tais como venda de títulos, banco postal, dentre outros, realizando, simultaneamente, prestação de serviços públicos e atividades de exploração econômica.

No julgado, o relator foi vencido e o voto do Ministro Gilmar Mendes firmou o entendimento de que, convergindo, simultaneamente, a prestação de serviço público e

207BRASIL., Supremo Tribunal Federal. Agravo Regimental no Recurso Extraordinárionº446530/SC. Tribunal

Pleno. Relator Ministro Ricardo Lewandowski. Diário de Justiça 29mai 2012.

208BRASIL., Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 601.392/PR. Tribunal Pleno. Relator

atividades secundárias de exploração da atividade econômica, é devido o benefício da imunidade às empresas públicas.

Em outros julgados, o Supremo Tribunal Federal manteve a decisão esposada, conforme denotado no RE 610.517/RJ209 consolidando a decisão do Tribunal sobre a matéria.

Acerca do posicionamento firmado pela Suprema Corte, Regina Helena Costa tece severas críticas a decisão do Recurso Extraordinário n.601.392/PR. A referida autora defende o entendimento vencido no Recurso, uma vez que a imunidade, por suplante no princípio da generalidade da tributação, deveria incidir apenas ''às atividades qualificadas como serviço público, não se justificando o elastério conferido à exoneração constitucionalmente outorgada a atividades que são igualmente exercidas pela iniciativa privada.210

Na mesma linha, conclui a referida autora que nas empresas estatais de objeto misto, ou seja, ''que desempenhe atividades nos regimes de exclusividade e de concorrência, simultaneamente, - a imunidade deve cingir-se ao patrimônio, renda e serviços afetados à prestação de serviço público, tão somente211.

Nesse ponto, discorda-se do pensamento apresentado por Regina Helena Costa e coaduna-se com o pensamento apresentado no RE 601.392/PR. Como defendido neste trabalho, o serviço público é o elemento que afere o norte da incidência da imunidade recíproca as pessoas jurídicas de direito privado.

Desta forma, há de se considerar, para a incidência da regra imunizante, a atividade fim desempenhada pela empresa estatal.

Assim, se a atividade fim da empresa pública for uma prestação de serviço público, contudo, paralelamente e de forma secundária, a empresa exerça atividades econômicas, não se entende prejuízo para que tais atividades secundárias também não possam ser objetos de incidência da imunidade recíproca.

Na realidade, como são atividades secundárias, não se pode concluir que possam vir a influir de forma contundente para desequilibrar o mercado econômico ou a livre iniciativa, não causando prejuízo, portanto, a ordem econômica e financeira.

Verifica-se, que em consonância com o atual posicionamento jurisprudencial, a atividade fim da empresa estatal é que deva ser utilizado como parâmetro qualificador de incidência da norma imunizante, devendo ser desconsiderado a análise isolada do conjunto de atividades que a empresa estatal desenvolve.

209BRASIL., Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 610.517/RJ. Tribunal Pleno. Relator Ministro

Celso de Mello. Diário de Justiça 3jun 2014.

210COSTA, 2015, p. 276. 211COSTA, 2015, p. 276.