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5 ANÁLISE DA JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

5.1 SÚMULAS

De início, cabe destacar a análise das súmulas sobre a imunidade recíproca. A discussão sobre o referido instituto sempre esteve presente no Supremo Tribunal Federal. Insta frisar, que dentre as quinze súmulas editadas pela corte sobre a imunidade tributária, nove se dignam a regular, em algum aspecto, a imunidade recíproca.184

Cabe denotar, portanto, que dentre as nuances analisadas com frequência pela Suprema Corte Brasileira, a principal preocupação repousa sobre a aplicabilidade da imunidade nas pessoas jurídicas da administração pública indireta. Isso pode ser verificado pelo fato de que dentre as nove súmulas editadas referentes a imunidade tributária, sete referem-se a autarquias e uma a sociedade de economia mista.

Nesse passo, iniciando os estudos sobre as súmulas do Supremo Tribunal Federal, Regina Helena Costa leciona que “as primeiras quatro súmulas foram editadas sucessivamente em 16.12.1963, ocasião em que a imunidade das autarquias, no texto constitucional de 1946 - como ocorrera no texto de 1937 -, restava apenas implícita185. São, portanto, as seguintes súmulas editadas nesta ocasião:

SÚMULA 73

A imunidade das autarquias, implicitamente contida no art. 31, V, a, da Constituição Federal, abrange tributos estaduais e municipais186.

SÚMULA 74

O imóvel transcrito em nome de autarquia, embora objeto de promessa de venda a particulares, continua imune de impostos locais187.

184 Regina Helena Costa admoesta que não existe súmula vinculante em se tratando de imunidade tributária.

COSTA, 2015, p. 252.

185 COSTA, 2015, p. 252.

186 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula nº 73: A imunidade das autarquias, implicitamente contida no

art. 31, V, a, da Constituição Federal, abrange tributos estaduais e municipais. Disponível em: <

http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=jurisprudenciaSumula&pagina=sumula_001_100> Acesso em 10 jan 2017.

SÚMULA 75

Sendo vendedora uma autarquia, a sua imunidade fiscal não compreende o imposto de transmissão inter vivos, que é encargo do comprador188.

SÚMULA 76

As sociedades de economia mista não estão protegidas pela imunidade fiscal do art. 31, V, a, Constituição Federal189.

Consoante o exposto, no que se refere a imunidade recíproca, a grande preocupação da Corte Constitucional foi de estabelecer os limites e extensões de seu alcance. A previsão legal advinda do artigo 150, inciso IV, alínea a da atual Constituição Federal foi fruto da consolidação do entendimento jurisprudencial sobre a primeira extensão dos efeitos da imunidade recíproca, o qual seja: o alcance das autarquias.

Com isso, a súmula 73, editada na vigência da constituição de 1946, veio para firmar, diante da ausência de previsão legal específica, o alcance da imunidade tributária recíproca sobre as autarquias.

Nesta mesma seara, as súmulas 74 e 75 seguiram a linha da disposição da súmula 73 com a finalidade de regular alguns aspectos da incidência da imunidade tributária sobre as autarquias.

Enquanto a súmula 73 reconhecia, mesmo sem a expressa previsão legal, a incidência da imunidade recíproca sobre as autarquias, as súmulas 74 e 75 dispunham sobre a regulamentação de sua incidência, com enfoque específico sobre a incidência da imunidade na transferência dos bens de sua propriedade.

Ainda sobre o tema, a súmula 74 foi objeto de crítica por Aliomar Baleeiro. O autor, com propriedade, salienta que a edição da referida súmula privilegia, evidentemente o Direito Privado. Em suas palavras, a súmula 74 estava “assegurando a imunidade que redundava em favor dos prometidos compradores, sem levar em conta que o tributo não atingia a autarquia”.190

187 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula nº 74: O imóvel transcrito em nome de autarquia, embora

objeto de promessa de venda a particulares, continua imune de impostos locais. Disponível em: <

http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=jurisprudenciaSumula&pagina=sumula_001_100> Acesso em 10 jan 2017

188 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula nº 75: Sendo vendedora uma autarquia, a sua imunidade fiscal

não compreende o imposto de transmissão inter vivos, que é encargo do comprador. Disponível em: < http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=jurisprudenciaSumula&pagina=sumula_001_100> Acesso em 10 jan 2017

189 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula nº 76: As sociedades de economia mista não estão protegidas

pela imunidade fiscal do art. 31, V, a, Constituição Federal Disponível em: <

http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=jurisprudenciaSumula&pagina=sumula_001_100> Acesso em 10 jan 2017

A crítica exposta por Baleeiro encontrava-se perfeitamente correta. Compartilha-se o entendimento de que a imunidade recíproca, quando aplicada à autarquias, deva preservar dos efeitos da tributação apenas a pessoa jurídica de direito público e não ao particular como antes era levado ao entendimento pela súmula 74. Parece-nos, que por esta razão, o Supremo Tribunal Federal tenha efetuado a edição da súmula 75, deixando evidente que somente não incidiria o imposto inter vivos, nos casos em que a autarquia fosse a promitente compradora e, por consectário, a responsável legal pelo recolhimento do imposto.

No que concerne a súmula 76, coaduna-se com Regina Helena Costa quando disserta que ''esta perdeu parte de seu significado diante do atual Direito Positivo''.191 Isto porque, na atual Constituição ocorre uma vedação expressa no preceito do artigo 150, parágrafo 3o. Regina Helena Costa ainda continua dissertando que ''destarte, se a sociedade de economia mista tiver por objeto a exploração de atividade econômica, e não a prestação de serviço público, resta claro, diante do texto constitucional, o não cabimento da imunidade''.192

Atualmente, apesar de não declarada como revogada, a súmula n. 76 não possui mais razão para existir no direito brasileiro, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal já se posicionou no sentido de que, obedecidos os requisitos do instituto, a sociedade de economia mista é beneficiária da imunidade recíproca.

Ultrapassada, portanto, as primeiras súmulas pontuais sobre a extensão dos efeitos da imunidade das pessoas políticas, ainda na vigência da Constituição de 1946, foram editadas as súmulas 324 e 336, aqui transcritas:

SÚMULA 324

A imunidade do art. 31, V, da Constituição Federal não compreende as taxas193.

SÚMULA 336

A imunidade da autarquia financiadora, quanto ao contrato de financiamento, não se estende à compra e venda entre particulares, embora constantes os dois atos de um só instrumento194.

191COSTA, 2015, p. 253.

192 COSTA, 2015, p. 253.

193 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula nº 324: A imunidade do art. 31, V, da Constituição Federal não

compreende as taxas. Disponível em: <

http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=jurisprudenciaSumula&pagina=sumula_301_400 > Acesso em 10 jan 2017

194 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula nº 336: A imunidade da autarquia financiadora, quanto ao

contrato de financiamento, não se estende à compra e venda entre particulares, embora constantes os dois atos de um só instrumento. Disponível em: <

http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=jurisprudenciaSumula&pagina=sumula_301_400 > Acesso em 10 jan 2017

Observe-se, que a súmula 324 já delineia os contornos do que será futuramente previsto na Constituição Federal de 1988, que a imunidade compreende, salvo previsão específica, conforme já dissertado, apenas impostos.

Nas linhas constitucionais, a imunidade, ordinariamente, compreende apenas impostos. Todavia, devido a evolução do pensamento doutrinário sobre a matéria, foi defendido que toda imposição negativa de competência tributária veiculada em sede da constituição federal é, em verdade, uma hipótese de imunidade tributária.

Assim, não obstante a nomenclatura utilizada pelo legislador constituinte, a Constituição Federal de 1988 previu hipóteses específicas de imunidades para taxas e contribuições especiais.

Além do exposto, já foi defendido o posicionamento no capítulo anterior, postula-se que pela própria natureza do instituto, deve ser reconhecida e admitida amplamente a incidência da norma imunizante em qualquer espécie tributária e não somente sobre a figura dos impostos como aduzido pelo legislador constitucional.

Ademais, no que concerne a súmula 336, esta veio a novamente explicitar que as transações imobiliárias entre particulares não devem ser objetos da imunidade tributária.Com isso, no caso de um autarquia financiar a aquisição imobiliária de um particular, tal ato não está incluso como objeto da imunidade recíproca, devendo incidir os encargos tributários devido.

Diga-se, na Constituição de 1969, foram editadas mais duas súmulas:

SÚMULA 553

O Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante (AFRMM) é contribuição parafiscal, não sendo abrangido pela imunidade prevista na letra d, inciso III, do art. 19, da Constituição Federal195.

SÚMULA 583

Promitente-Comprador de imóvel residencial transcrito em nome de autarquia é contribuinte do imposto predial territorial urbano196.

195 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula nº 553: O Adicional ao Frete para Renovação da Marinha

Mercante (AFRMM) é contribuição parafiscal, não sendo abrangido pela imunidade prevista na letra d, inciso III, do art. 19, da Constituição Federal. Disponível em: <

http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=jurisprudenciaSumula&pagina=sumula_501_600> Acesso em 10 jan 2017

196 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Súmula nº 583: Promitente-Comprador de imóvel residencial transcrito

em nome de autarquia é contribuinte do imposto predial territorial urbano l. Disponível em: <

http://www.stf.jus.br/portal/cms/verTexto.asp?servico=jurisprudenciaSumula&pagina=sumula_501_600> Acesso em 10 jan 2017

Admoeste-se, também, que a previsão da súmula 583, ao afirmar que a imunidade não exonera o promitente comprador de recolher o imposto de transmissão relativamente a bem imóvel de propriedade de entidade imune, veio a ser reconhecido na Carta Magna pela disposição do artigo 150, parágrafo 3o, in fine.

Por fim, a súmula 591 foi constituída à luz de uma mudança do pensamento do Supremo Tribunal Federal referente a incidência da imunidade sobre os impostos indiretos. Nesse cenário, assim é redigida:

SÚMULA 591

A imunidade ou a isenção tributária do comprador não se estende ao produtor, contribuinte do imposto sobre produtos industrializados.

Tal pensamento é melhor esclarecido quando Regina Helena Costa, manifestando-se sobre o Recurso Extraordinário n. 68.215/SP e 68.097 que motivou a edição da súmula 591, salientando que o referido entendimento levou a conclusão o Supremo Tribunal Federal, quando este ''passou a afirmar que a imunidade recíproca não protegia os vendedores de mercadoria a entes públicos. Tal conclusão cristalizou-se na súmula 591, enunciada em 15 de dezembro de 1976197.

À luz do exposto, percebe-se que não somente a atividade legislativa, como demonstrado pela análise das constituições brasileiras, mas também a jurisprudência, debruçou-se imensamente sobre a análise dos efeitos e extensões da imunidade recíproca.

Dessa forma, através das súmulas editadas sobre a matéria, a imunidade recíproca sofreu diversas transformações ao longo da evolução do direito brasileiro até culminar com o posicionamento cristalizado na Constituição Federal de 1988, que, como melhor esclarecido adiante, ainda encontra-se muito aquém de uma regulação satisfatória da matéria.