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CAPÍTULO 1 O TRABALHO NOTURNO DA ENFERMEIRA E A TEORIA DAS

1.2 ENFERMAGEM: TRABALHO E VOCAÇÃO

A enfermagem, inicialmente, era exercida por leigos que prestavam cuidados aos doentes em seus domicílios. Na era pré-cristã, as pessoas que possuíam alguma habilidade e conhecimento, inclusive sobre o preparo de remédios, como sacerdotes, feiticeiros e mulheres em geral, prestavam esses cuidados. Na Roma antiga, a enfermagem, assim como a medicina, era considerada um trabalho indigno para os cidadãos romanos, sendo, portanto, exercida por estrangeiros ou escravos (TONINI e FLEMING, 2002).

Na Idade Média, entre os séculos V e XIII, a enfermagem era considerada prática leiga, desenvolvida por religiosos, e deixou como legado uma série de valores que, com o passar dos tempos, foram aos poucos legitimados e aceitos pela sociedade como características inerentes à profissão. Assim, a abnegação, o espírito de servir e a obediência dão a enfermagem, não uma conotação de prática profissional, mas de sacerdócio (ABEN-PE, 2007). Freqüentemente, era uma mulher que assumia o cuidado aos doentes, advindo dessa época a origem do trabalho de enfermagem associado ao trabalho feminino, pouco valorizado socialmente (SILVA, 1989).

No século XIII, a enfermagem é introduzida nos hospitais por meio das religiosas, as quais não possuíam conhecimento cientifico para embasar a sua prática, e cujo trabalho era baseado na filosofia do amor ao próximo. Tal concepção permaneceu por muitos séculos. Entre os séculos XVII e XVIII, surgiram as organizações hospitalares, originadas das congregações religiosas e a partir daí começou a se designar de matron, a mulher que dirigia o serviço e de sister, a encarregada das enfermarias. No século XIX, na Inglaterra, a enfermagem se institucionaliza, através da comprovação de que sem as condições assépticas, adequada nutrição, monitoria pré e pós-operatória e cuidados com a reabilitação, nenhum diagnóstico ou capacidade cirúrgica salvaria vidas (TONINI e FLEMING, 2002).

Em 1854, o governo inglês convida Florence Nightingale para atuar nos hospitais militares durante a guerra da Criméia, pois estes hospitais não dispunham de enfermeiras

regulares e os pacientes eram assistidos por militares sem preparo adequado para atuar. Florence desenvolve um trabalho de qualidade, reduzindo significativamente o índice de mortalidade entre os soldados. Ela exerceu a função de superintendente, selecionou enfermeiras para cuidar dos soldados feridos e transformou a organização do hospital, concebendo-o como espaço para recuperação da saúde dos soldados, imortalizando-se como a “Dama da Lâmpada” para estes, por percorrer as enfermarias com uma lamparina, prestando- lhes assistência. Posteriormente, em 1860, ela criou a Escola Nightingale no St. Thoma‟s Hospital com a finalidade de preparar enfermeiras para o serviço nos hospitais, a qual serviu de modelo para as escolas de enfermagem fundadas posteriormente (GIOVANINI et al., 2002).

Segundo estas autoras, a enfermagem moderna nasceu neste período, ligada à guerra, sendo Florence Nightingale considerada sua precursora, reproduzindo a divisão social do trabalho entre duas categorias distintas, lady-nurse e nurse. Estas últimas eram destinadas ao serviço hospitalar, prestando cuidados aos pacientes sob a supervisão da lady-nurse, a qual era preparada para as atividades relacionadas ao ensino e supervisão do pessoal, em nome de um saber teórico mais profundo, realizando as atividades ditas intelectuais.

No Brasil, a enfermagem reporta-se ao período colonial, quando os jesuítas na missão de catequizar os índios e facilitar a dominação européia, introduziram-lhes novos costumes que alteraram a sua cultura e causaram-lhe doenças endêmicas e epidêmicas, dizimando muitas civilizações. Neste contexto, surge a necessidade de alguém para cuidar dos doentes e são os próprios índios que assumem essa tarefa em suas tribos. Mais tarde, com a colonização, outras pessoas passam também a se ocupar desta responsabilidade, dentre estas os jesuítas, religiosos, voluntários leigos e escravos escolhidos para este trabalho, sendo a enfermagem exercida por homens (GIOVANINI et al, 2002).

Nesse período, por volta de 1540, surgem as primeiras Santas Casas de Misericórdia e a enfermagem aí exercida tinha caráter essencialmente prático, não havendo a exigência de preparo formal para aqueles que a exerciam. Nesse contexto, os voluntários e escravos trabalhavam prestando os cuidados aos doentes e os religiosos faziam essencialmente, a supervisão da assistência de enfermagem, situação esta que perdurou até o início do século XX (TONINI e FLEMING, 2002).

Prosseguem estas autoras, comentando que, ainda no século XIX, a brasileira Ana Justina Ferreira Néri, mais conhecida como Ana Néri, ganhou destaque pelo trabalho realizado nos campos de batalha da Guerra do Paraguai, prestando cuidados aos soldados

feridos em combate, tendo sido condecorada pelo Governo brasileiro por sua abnegação, esmerado espírito de dedicação e incansável assistência prestada aos soldados.

Nesse sentido, Tonini e Fleming (2002) destacam que a ideologia da enfermagem desde sua origem e, em particular, a de Ana Néri para os brasileiros, significando abnegação, obediência e dedicação, marcam profundamente esta profissão até os dias atuais.

No Brasil, o ensino de enfermagem, por sua vez, surge no final do século XIX, com a criação pelo governo da Escola de Formação Profissional para Enfermeiros e Enfermeiras junto ao Hospital Nacional de Alienados do Ministério dos Negócios do Interior, no Rio de Janeiro, hoje, Escola de Enfermagem Alfredo Pinto da Universidade do Rio de Janeiro, em resposta a necessidade de formação de pessoal para o serviço de enfermagem em hospitais, uma vez que as doenças infecto-contagiosas trazidas pelos europeus e escravos africanos tornaram-se um problema de saúde pública, dificultando a expansão do comércio brasileiro e o desenvolvimento sócio-econômico do país àquela época (ABEN-PE, 2007).

Mais tarde, em 1921, foi fundada a Escola de Enfermagem Ana Néri, no Rio de Janeiro, por um grupo de enfermeiras americanas convidadas por Carlos Chagas, então diretor do Departamento Nacional de Saúde Pública, enfatizando a formação dessas profissionais na área da educação sanitária, uma vez que as doenças transmissíveis assolavam o país. Apesar de em 1949 o Projeto de Lei n°775 incorporar esta escola à Universidade do Brasil, só em 1961, com a Lei n° 2995/56 é que todas as escolas de enfermagem passam a exigir o curso secundário completo ou equivalente. Entretanto, só no ano seguinte a Enfermagem passou a ensino de nível superior.

Desse modo, a enfermagem sofreu influência do contexto histórico-social das sociedades, transformando-se no decorrer dos tempos de uma prática fundamentada em saber empírico, exercida no âmbito domiciliar e com um caráter de arte, vocação e manifestação da caridade - concepções estas que perduram, em alguma medida, até os dias atuais - em trabalho institucionalizado, pautada em conhecimento científico, e, só recentemente no Brasil, assume o status de ensino superior, consolidando-se como uma profissão científica.

1.3 O TRABALHO NOTURNO DA(O) ENFERMEIRA(O) E A TEORIA DAS